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Entre o trabalho e a arte. O cartão de ponto e o combate.

Rodrigo Tufãodiretor do sindicato das Metroviárias e Metroviários de SP e do Movimento Nossa Classe

sexta-feira 21 de julho de 2017 | Edição do dia

A potencialidade artística da humanidade é extraordinária. Expressa toda energia e contradição da vida social. Toda beleza, feiura, alegria e tristeza, que envolve nosso cotidiano, duro e lindo.

"A arte existe porque a vida não basta"

Essa frase de Ferreira Gullar me marcou muito. No dia a dia alienado, entre o ir e vir da cidade, a correria para vestir o uniforme, bater o cartão a tempo,de não ser punido pelo chefe. Encontrei nela as letras de fogo que faltavam, para conseguir desenvolver minhas sensibilidades, em forma de arte.

O trabalho no capitalismo poda a humanidade no desenvolver pleno de suas habilidades. Precisamos destinar pelo menos 10h de nosso dia, para trabalhar para alguém ter lucro e nos pagar um salário. Uma jornada excessiva, que nos faz ficar inertes, frente a toda potencialidade que nosso cérebro pode produzir.

Resolvi desafiar essa inércia e começar a escrever. No primeiro poema feito no trabalho,me senti leve. Como se tivesse conquistado a liberdade. Uma sensação de alívio e alegria que me contagiaram. Do vai e vem apressado da população, as madrugadas frias e solitárias entre os túneis do Metrô, aquele poema parecia tirar a gravidade, que me prendia no chão. Era eu flutuando, entre as rígidas regras do mundo do trabalho.

Escrevi sobre o amor. Sobre as lutas e greves. Sobre minhas futilidades e minhas genialidades. Era o espaço onde eu me refugiava, das regras desumanas impostas pelo capitalismo. Era meu desafio a um sistema que usa nosso tempo, para o enriquecimento de poucos.

Gostaria que nossas vidas fossem feitas para gozarmos o tempo. Que nosso trabalho fosse dividido entre muitos, para trabalharmos menos e trabalharmos todos. Gostaria de ter pelo menos metade do meu dia, para aproveitar como quiser, usá-lo para o outro ou para nenhum.

Muitas pessoas envolvidas pela ideologia burguesa, poderão dizer que isso é coisa de vagabundo, de esquerdista. Talvez eu seja mesmo. Um vagabundo que escreve poemas, ao invés de trabalhar como um soldado para seu patrão. Um esquerdista que quer uma sociedade sem classes,sem ricos e pobres. Acho que com certeza sou isso.

Cada greve que participo. Cada pessoa que convenço a militar e se organizar. Cada frase que escrevo em meus poemas. É uma forma de dizer para esse mundo, que não o quero como ele é. Tenho certeza que o planeta me entende. Ele sabe que no passado não era assim. E que no futuro também não será. E já me confessou em algumas batalhas que vivi, "o sempre Rodrigo, não é sempre aqui".

Meu poema final
Não é o último
Suspiro

Nem todos
Os sonhos
Que desisto

Nem todos
Os amores
Que conquisto

Meu poema final
É o imprevisto

Que apareceu
Com um sorriso

Cortando a corda
Do equilíbrio

Que cultivei
Em meus delírios

Meu poema final
Continua

Na tormenta social
É infinito

Para o conservador
É proibido

Desafia
O que é rígido

Desequilibra
O que é fixo

Meu poema final
É um perigo

Fica escondido
Entre meus gritos

No meu silêncio
Enfurecido




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