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ACIDENTES DE TRABALHO | Comparação entre pesquisa do IBGE e dados da Previdência Social apontam que número de acidentes de trabalho é 7 vezes maior do que o registrado

Evandro NogueiraSão José dos Campos

quinta-feira 28 de abril de 2016 | Edição do dia

É fato amplamente conhecido e divulgado os números recordes de acidentes de trabalho que o Brasil acumula, estando entre os campeões dessas estatísticas há décadas. Por outro lado, também, não é menos conhecido o fato de que existe uma enorme subnotificação desses acidentes. Em 2013 o IBGE iniciou uma nova pesquisa periódica, a Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), realizada por meio de entrevistas nos domicílios, apresentando em junho de 2015 novas informações que permitiram uma base de dados a serem confrontados com as estatísticas da Previdência Social sobre os acidentes de trabalho.

A comparação feita por técnicos da Fundacentro, órgão do próprio Ministério do Trabalho, mostrou que a PNS aponta números quase 7 vezes maiores que os da Previdência, em termos percentuais, 589% a mais de acidentes. Para quem tinha dúvidas, o fosso da subnotificação é grande. Além disso, nos estados das regiões norte e nordeste a diferença é ainda maior, o que está relacionado à baixa taxa de formalização do emprego nessas regiões.

Milhões de trabalhadores seguirão convivendo com as consequências dos acidentes

De acordo com a PNS, 1.626.871 pessoas deixaram de realizar quaisquer de suas atividades habituais (trabalhar, realizar afazeres domésticos, ir à escola etc.) em decorrência de acidentes do trabalho considerados mais graves, o que corresponde percentualmente a 32,90% do universo de 4.948.000. Dos que referiram acidentes do trabalho nos últimos 12 meses na PNS, 284.097 pessoas (5,47%) precisaram ser internadas por 24 horas ou mais, e 612.551 pessoas (12,4%) referiram que tiveram ou tem alguma sequela e/ou incapacidade. Comparando-se com os acidentes de trabalho registrados pela Previdência Social no mesmo ano, chega-se ao valor de 610.804 de acidentes do trabalho que geraram incapacidade temporária e 14.837 que geraram incapacidade permanente, totalizando 625.641.

Com relação às limitações das atividades diárias causadas pela DORT, como dificuldades em trabalhar, ir ao trabalho, realizar afazeres domésticos e de autocuidado, como vestir-se e tomar banho, quase 16% dos entrevistados enfrentam dificuldades intensas ou muito intensas. Somente menos da metade dos entrevistados (41,84%) afirmou que não houve limitação nas atividades diárias. Considerando que a metade dos acidentes referidos na PNS é de população segurada, ou seja, do total dos 4.948.000, que pelo menos 2.474.000 seriam trabalhadores formais e segurados, temos em termos percentuais cerca de 245% a mais de acidentes identificados pela PNS do que os registrados na Previdência Social.

Além das diferenças regionais, o acidente de trajeto quase não existia nos registros

É importante observar o registro dos dados segundo a unidade federação, pois se percebe as discrepâncias entre as regiões Nordeste e Norte e o Sul e o Sudeste. Enquanto em São Paulo há maior número empregos formais, a proporção foi de 263% a mais de acidentes, seguido de Espirito Santo (360%), Santa Catarina (370%) e Rio Grande do Sul (393%) com as diferenças mais baixas. Por outro lado, Maranhão, seguido por Pará (2.525%), Tocantins (2.279%) e Roraima (1.663%) apresentou a impressionante proporção de 3.833% a mais de acidentes.

Os acidentes de trajeto foram os que apresentaram a maior razão, quase 13 vezes, o que aponta ausência de registro desses acidentes na Previdência Social. Apesar disso a PNS identificou 1.440.833 pessoas que responderam sim à pergunta “Algum dos acidentes de trânsito ocorreu quando o(a) Sr(a) estava trabalhando, indo ou voltando do trabalho?”

Diferenças entre os bancos de dados

Enquanto a pesquisa do IBGE refere-se a uma declaração do trabalhador sobre um acidente ou doença que sofreu, a da Previdência trata somente os acidentes e doenças que foram reconhecidos pelo INSS em seu caráter ocupacional e tiveram concessão de benefício acidentário. Outra diferença é que para cada pessoa que tenha afirmado positivamente ter sofrido um ou mais acidentes do trabalho, a PNS contabiliza “uma pessoa”, e não “um ou mais acidentes sofridos”, já a base da Previdência Social computa o número de acidentes do trabalho reconhecidos como tal, além de incluir os de trânsito, não contabilizados na PNS.

O sistema de informação da Previdência Social contabiliza trabalhadores registrados pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), no qual a ideia é que a empresa deve fazer a notificação, mas a legislação também permite que a comunicação de acidente de trabalho (CAT) seja feita pelo médico que atendeu o trabalhador ou pelo sindicato. Nisso, muitas vezes já se cria um empurra-empurra no qual todos querem reduzir as estatísticas de acidentes, seja como for – aí entram aqueles casos de realocação, por exemplo, quando o trabalhador só cumpre horário, não trabalha, mas também não se afasta. Outro problema identificado pelos técnicos é o sistema de perícia altamente falho, que não consegue captar as centenas de tipos de adoecimentos ocupacionais inclusive previstos em legislação.

Com isso, temos uma dimensão um pouco melhor da realidade dos acidentes, doenças e consequências para os trabalhadores, considerando ainda que muitas sequelas não são identificadas pelos próprios trabalhadores como ligadas à função que exerciam, além da profunda naturalização que existe devem apontar para uma subnotificação ainda maior. Somente os trabalhadores organizados e controlando a produção é que poderiam desenvolver um sistema mais seguro e eficiente para o trabalho, que não estivesse pautado pela lucratividade.




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