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ANÁLISE | As laranjas de Bebianno e os atritos das alas do governo Bolsonaro

Ao sair da internação Jair Bolsonaro acreditou que aterrisaria em terras minimamente estáveis para seguir os planos após ficar 17 dias afastado do centro político do país, mas o que encontrou foi mais uma tempestade que afasta qualquer sinal de calmaria de seu governo nesses 46 dias. Desta vez, a tempestade é aberta por denúncia divulgada pela Folha, que aponta destino de verbas milionárias do fundo partidário para candidatas laranjas do PSL nas eleições do ano passado, por parte do então presidente do partido, Gustavo Bebianno, que atualmente ocupa o cargo de ministro da Secretaria Geral da República concedido pelos "favores prestados" nas eleições.

sexta-feira 15 de fevereiro de 2019 | Edição do dia

Ao sair da internação Jair Bolsonaro acreditou que aterrisaria em terras minimamente estáveis para seguir os planos após ficar 17 dias afastado do centro político do país, mas o que encontrou foi mais uma tempestade que afasta qualquer sinal de calmaria de seu governo nesses 46 dias. Desta vez, a tempestade é aberta por denúncia divulgada pela Folha, que aponta destino de verbas milionárias do fundo partidário para candidatas laranjas do PSL nas eleições do ano passado, por parte do então presidente do partido, Gustavo Bebianno, que atualmente ocupa o cargo de ministro da Secretaria Geral da República concedido pelos "favores prestados" nas eleições.

Bebianno, homem de confiança pessoal de Bolsonaro, chegou ao cargo da presidência do PSL durante as eleições como parte das negociações com o partido, presidido por Luciano Bivar na época, para a confirmação de sua candidatura pela sigla. Após isso Bebianno que também é advogado coordenou toda a campanha, que foi bem sucedida mas agora terá seu carreirismo manchado, dentro ou fora do governo, com as inesperadas denúncias da Folha sobre o uso de candidatas laranjas. Deixou no ar durante alguns momentos se pediria demissão ou não do governo, mas foi aconselhado por aliados a manter a cautela e se resguardar, esperar decisão de Bolsonaro.

Crise no PSL ou crise no governo?

O que num primeiro momento aparece como uma crise envolvendo apenas o partido, torna-se uma crise no núcleo do governo, de proporções ainda abertas. Destemperado na forma, que fez atrair os holofotes para a crise, o filho presidencial possivelmente enxergou nas denúncias da Folha uma oportunidade para aumentar a influência do clã bolsonarista dentro do PSL, que hoje, mesmo após a enorme transformação da qual passou o partido desde as eleições (passando de um partido qualquer para a segunda maior bancada da Câmara), ainda é controlado por Gustavo Bebianno e por Luciano Bivar. Mas o tiro pode ter saído pela culatra e, ao tentar aumentar a proeminência do clã dentro do partido, abriu brecha para uma enorme crise de conjunto do governo. Outra possibilidade é de que o clã, ao ter contato com as denúncias da Folha, precisou repentina e bruscamente se separar do ex-presidente do PSL e assim desvincular à sua imagem mais um caso envolvendo laranjas.

Dessa forma, toda a situação abre espaço para muitas incertezas entre os aliados de Bolsonaro. Maia, que possui importante relação com Bebianno - que também é articulador político - vazou sua insatisfação e desconfiança, uma vez que o clã aponta que pode estar disposto a passar por cima de acordos e rifar aliados para sobrepor seus interesses em detrimento dos interesses do governo e dos aliados.

Os atritos também preocupam aos militares do governo

Uma das mais fortes marcas deste episódio é que mais uma vez a atitude de um dos filhos provoca a ira das alas militares ligadas ao governo. Não digerem as interferências da família e consideram “inadmissível” que o presidente lide com o escândalo de forma a aparentemente rifar um aliado de grande peso político como o atual ministro da secretaria geral. A ala fardada atua para apagar o fogo do escândalo pois sabe que, aos olhos das massas, não há uma separação clara entre o clã e os militares do governo, e que portanto ferir ao candidato eleito do PSL, o partido das laranjas, seria ferir também as figuras importantes como o vice general Mourão, Augusto Heleno, Carlos Alberto Cruz, Fernando Azevedo e Silva. Eis então o que explica a declaração de Mourão: "ele [Bebianno] sempre foi muito respeitoso comigo, gosto dele. Vamos com calma".

Se sai deste cenário muito debilitado, Bebianno afetaria também aos militares não somente pelo efeito dominó da crise, mas inclusive por sua relação direta com Maynard St Rosa e Floriano Peixoto (quem liderou as tropas brasileiras que assassinavam no Haiti), que são vistos como generais garantidores do funcionamento da secretaria da qual preside.

Bolsonaros abrem mais espaço para “ala Lava Jato” no Executivo

A prontidão e a firmeza com que Bolsonaro respondeu à crise, rapidamente pedindo para o superministro Moro e a Polícia Federal investigarem o caso, contrasta com a forma com que lidou com o caso envolvendo seu outro filho, Flávio Bolsonaro. O fato é que, precocemente desgastado pelos escândalos envolvendo sua esposa e seu filho em movimentações bancárias suspeitas do assessor Queiroz - que inclusive chegou ao ponto de revelar associações do gabinete do atual senador com milícias envolvidas no caso Marielle -, o presidente necessita sinalizar ao seu eleitorado que ainda existe o “inabalável comprometimento com o combate à corrupção” e entrega o ministro às investigações chefiadas por Sérgio Moro. Dessa forma, também cede terreno à ala Lava Jato dentro do próprio governo, que por sua vez aproxima a “espada de Dâmocles” das cabeças do clã e dos ministros do Executivo, restringindo suas margens de atuação e debilitando ainda mais sua influência. Esse controle, por parte da ala Lava Jato, disciplina Bolsonaro e o Executivo para que não desviem do foco: ou a garotada se aquieta e garante logo a reforma da previdência para acalmar o coração do mercado financeiro ou guerra será declarada.

E, em meio a essa lama, Moro, que vinha tendo atuação mais resguardada até então no governo, se esquivando e sem saber se delimitar dos escândalos de corrupção, volta a ter protagonismo, primeiro com o anúncio de seu pacote anticrime - que trouxe uma série de alterações autoritárias com vistas ao endurecimento do regime, dando licença para os policiais matarem -, e agora sendo nomeado para “resolver” a nova crise e apaziguar os ânimos. A reputação de Moro após este episódio é a de quem passa a confiança de que garantirá um “Brasil sem corrupção”, não necessariamente rifando Bebianno, mas atuando para manter a confiança do eleitorado, o qual também é um dos importantes atores para medir a aceitação e a possibilidade da aprovação da reforma da previdência.

No extremo oposto do objetivo de acabar com a corrupção - que, como apontamos, é inerente ao capitalismo e às suas estruturas políticas, e inclusive é típica de setores aliados à própria Lava Jato - a entrada de Moro significa a mais descarada blindagem do governo de mais um escandaloso caso de corrupção que envolve o clã, e agora também envolve o PSL, um setor dos militares e no limite o conjunto do governo.

No imediato, a ala ideológica do clã se enfraquece

Até o momento, quem sai mais arranhado dessa batalha de grandes é, mais uma vez, a ala ideológica, que tem sofrido a maioria dos revezes nesses primeiros dias do governo.

O saldo imediato debilita o clã bolsonarista em detrimento da ala representada pelos fatores reais de poder (militares e Lava Jato), que assumem ainda mais o papel de estabilizadores ou de “bombeiros” de toda a situação política no país. PSL, o partido dos laranjas, também sai enfraquecido, inclusive pela predominância interna da ala ideológica.

A blindagem à corrupção oferecida por Moro e a “moderação” dos militares incluindo Mourão ajudam a amenizar os impactos de mais esse escândalo do governo precoce, e resguarda o objetivo central de todos eles, que é a implementação dos ataques, mais precisamente da “mãe de todas as reformas”, a reforma da previdência. E, nesse sentido, mesmo com todos esses episódios que vêm à tona e se acumulam com o risco de destapar um mar de esgoto, apesar do enfraquecimento da ala ideológica a relação das massas com o governo de conjunto ainda é de “lua de mel”, que abraçam Bolsonaro sem que isso signifique abraçar o programa do ultra neoliberal Paulo Guedes.

As divisões do governo expressam profundas debilidades

Apesar de todas as frações do governo concordarem no ponto essencial, que é sobre a necessidade de descarregar a crise econômica sobre as costas dos trabalhadores, a tramitação das reformas não tem sido simples e pode causar ainda mais instabilidade política ao governo. O fantasma da reforma da previdência segue assombrando aos trabalhadores, que vêm cumprindo papel de espectadores da política nacional, com forte passividade resultada das sistemáticas traições por parte das grandes centrais sindicais do país, que seguem sem impulsionar um concreto plano de lutas para erguer uma greve geral que seja capaz de barrar a reforma da previdência e frear o governo. Essas mesmas centrais não apenas não impulsionam novas lutas como sequer fortalecem as lutas já existentes, como é o caso da greve do funcionalismo municipal de SP que luta para derrubar a reforma da previdência local, o Sampaprev.

Organizar um “dia nacional de lutas” por fora dos locais de trabalho, de assembleias, de participação massiva dos trabalhadores, de um concreto plano de lutas... são palavras ao vento. As centrais seguem buscando ’diálogo’ com Bolsonaro/Guedes, que esfregam as mãos pra acabar com a aposentadoria de milhões, num projeto ainda pior que o de Temer. O que a CUT, CTB e FS estão esperando pra organizar assembleias de base em cada fábrica, empresa, serviços e universidade, pra que os trabalhadores decidam como enfrentar a reforma da previdência anunciada?




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