Vazaram milhares de arquivos sobre movimentos suspeitos de bancos de mais de dois trilhões de dólares. Deutsche Bank, JP Morgan e HSBC entre os principais envolvidos.
terça-feira 22 de setembro de 2020 | Edição do dia
Desde este domingo, o Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ) começa a divulgar na mídia de todo o mundo as informações vazadas do FinCEN, unidade de inteligência do Departamento do Tesouro dos Estados Unidos (Financial Crimes Enforcement Network). Como no caso dos Panama e Paradise Papers, os documentos confidenciais foram divulgados à mídia por uma fonte não pública. A diferença nesse caso é que os dados correspondem a alguns dos maiores bancos do planeta, como Deutsche Bank, JP Morgan e HSBC. Em meio à crise econômica internacional e poucos meses antes das eleições presidenciais nos Estados Unidos, as consequências podem ser extremamente importantes.
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A investigação trata de alertas emitidos por instituições financeiras sobre operações que poderiam estar relacionadas a crimes. A maior parte dessas comunicações não havia sido apurada e os bancos ficaram com comissões dessas operações que no total ultrapassam 2 trilhões de dólares entre 2011 e 2017. O número pode ser difícil de medir, é mais de seis vezes a dívida externa Argentina. Do total, 1,3 trilhão correspondem a operações realizadas por meio do Deutsche Bank (o maior banco da Alemanha) e 510 bilhões por meio do JP Morgan (um dos principais bancos dos Estados Unidos). O alvoroço fez com que as ações do Deutsche Bank caíssem cerca de 8% na Bolsa de Valores de Frankfurt na segunda-feira e as ações do HBSC perdessem mais de 5% em Hong Kong, atingindo seu nível mais baixo em 1995.
Os arquivos revelam segredos financeiros de um conjunto de políticos, traficantes de drogas e empresas em julgamento ou suspeitos de crimes financeiros. Partindo de documentos emitidos pelos grandes bancos e centralizados por um órgão dependente do governo dos Estados Unidos, as informações refletem os interesses de setores dominantes dos países imperialistas. Por exemplo, um dos expostos é o ex-gerente de campanha de Donald Trump, Paul Manafort, que já havia sido condenado por fraude e evasão. Em seu caso, o JP Morgan Chase relatou movimentos de fundos entre Manafort e empresas de fachada em setembro de 2017; isto é, depois de ser acusado de lavagem de dinheiro e de ter ligações com a Ucrânia e a Rússia.
Os documentos também revelam operações de um ex-ministro de energia do Cazaquistão; da bilionária angolana Isabel dos Santos, a quem os procuradores angolanos acusaram de fraude e lavagem de dinheiro no valor de 1,1 mil milhões de dólares; e o assessor presidencial da Ucrânia, Andriy Klyuyev, sancionado pela União Europeia por supostamente saquear fundos estatais, entre outros. Na Venezuela, estão sendo divulgadas as reportagens mantidas no FinCEN sobre o empresário colombiano Alex Saab, a quem o governo dos Estados Unidos acusa de ser o testa de ferro do presidente Nicolás Maduro.
O FinCEN armazena milhões de relatórios que as entidades financeiras de diferentes tipos são obrigadas por lei a emitir; os arquivos vazados são apenas uma pequena parte. No entanto, os documentos são suficientes para ver como o baixo controle e as liberdades permitem que a lavagem de dinheiro seja realizada com facilidade graças aos bancos. Pelo menos 20% dos relatórios continham um cliente com endereço em um dos principais paraísos financeiros do mundo, as Ilhas Virgens Britânicas, e em metade dos relatórios os bancos não haviam concluído o processo de identificação das partes intervenientes. Os bancos cumprem a formalidade mínima de transferência das informações (e na maioria dos casos vários meses após a operação) e o FinCEN se limita a acumular os arquivos, só isso. Com este tipo de mecanismo não é de estranhar que, apesar das promessas de governos e bancos de mudar a situação, os paraísos fiscais não param de crescer.
Esses recursos, que fogem ao pagamento de impostos em todo o mundo, poderiam ser usados para aumentar os recursos que os Estados destinam a itens essenciais da situação atual como saúde, moradia e assistência social, mudando substancialmente a vida de milhões de famílias. De acordo com a última estimativa da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL), o custo regional da evasão e elisão fiscal atingiu 6,3% do produto interno bruto (PIB) em 2017, o que equivale a US$ 335 bilhões. Em 2016, a Argentina deixou de arrecadar US $ 21,4 bilhões com manobras de evasão fiscal, segundo relatório publicado pela Tax Justice Network (TJN).
Grandes empresários acumulam grandes lucros, enquanto a pobreza cresce na esteira da crise econômica e de saúde. Como se não bastassem fortunas que qualquer trabalhador não poderia obter nem mesmo trabalhando muitas vidas, eles evitam impostos com a ajuda dos bancos. É necessário aplicar um imposto extraordinário a todos eles para atender às necessidades urgentes da maioria da população e a unificação dos bancos em um banco estatal para acabar com as evasivas manobras financeiras.