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ELEIÇÕES ESTADO ESPANHOL | Andaluzia e os limites do efeito Podemos

O primeiro embate eleitoral do ano no Estado Espanhol deu vitória ao PSOE. O PP se afunda em seu pior resultado e o mesmo ocorreu ao ex-aliado do governo, o IU. Também marca os limites do novo reformismo para repetir o “efeito Syriza” nas eleições nacionais.

Santiago Lupe@SantiagoLupeBCN

terça-feira 24 de março de 2015 | Edição do dia

As eleições em Andaluzia renovaram a maioria dos parlamentares do PSOE, e Susana Díaz se manteve como presidente da comunidade autônoma mais povoada e uma das mais golpeadas pela crise econômica. O número de deputados foi mantido, 47, mesmo que tenha caído em 5 pontos em número de votos. Esta é uma consequência das leis eleitorais do regime político espanhol, nascido em 1978, que privilegiam sempre os partidos mais votados.

A decadência do bipartidarismo vinha golpeando especialmente a sua “ala esquerda”. No entanto, desde julho, o PSOE está num operativo de renovação, encabeçado pelo novo secretário geral, Pedro Sánchez, que teve em Andaluzia sua primeira prova de fogo. Neste território, seu bastião histórico, Susana Díaz conseguiu que apenas assumir a fatura de ter governado em coalizão com a Izquierda Unida (IU), administrando os ajustes antissociais ou os grandes escândalos de corrupção descobertos ao redor dos EREs (Expedientes de Regulação de Emprego, medidas de reforma trabalhista neoliberal) e da ajuda aos desempregados. Um resultado que expressa que, apesar de tudo, o PSOE ainda está longe de uma “pasokização” (PASOK é a socialdemocracia grega, profundamente devastada nas últimas eleições, atingindo apenas 4% dos votos).

O partido que foi castigado por seu compromisso com o governo de austeridade tem sido a IU. Este partido passou de 12 a 5 deputados, ficando com o mínimo para formar um grupo de parlamentares. A política de compromissos do governo de coalizão com o PSOE, sendo sócia do PSOE nos cortes em saúde e educação, fez com que a IU perdesse um eleitorado mais de esquerda, que tem visto no Podemos uma nova opção que não está manchada com estes pactos.

Do outro lado do tabuleiro, o PP demonstra que possui sérias dificuldades para impor-se numa comunidade afetada por um desemprego estrutural elevadíssimo – agora em 36% - na qual a direita é vista como os representantes políticos dos “senhores” e caciques. Ficaram com 33 deputados, em comparação aos 50 que obtiveram em 2012 (seu melhor resultado da história). Uma advertência do que, com toda a probabilidade, acontecerá durante as eleições municipais e estaduais, em maio, e nas eleições gerais de novembro. O PP, após quatro anos do governo Rajoy - marcados pela pior ofensiva contra os trabalhadores e setores populares - se prepara para uma derrota que pode deixá-lo à beira da implosão.

Mas este afundamento da direita vem com “ressalvas”. Nas últimas semanas, vimos como as pesquisas estatais passaram de um tri-empate entre PP, PSOE e Podemos, para um quadri-empate que inclui o partido Cidadãos. Este auge foi o seu primeiro em Andaluzia: Cidadãos passou de 0 para 9 deputados em 6 semanas de campanha e de pré-campanha. Um partido que desde a direita liberal, espanholista e com um discurso xenófobo que ainda não explora abertamente para manter-se enquanto uma opção de “centro”, quer disputar o flanco de centro direita do tabuleiro, em nome da regeneração da democracia e uma segunda transição.

Cidadãos é o componente necessário para que a crise do bipartidarismo golpeie também o PP. Até agora era o PSOE o mais afetado. Mas também ameaça retirar uma parte do bolo de votos do Podemos. A aposta de Iglesias por uma estratégia eleitoralista e com um discurso desideologizador de reforma democrática cada vez mais moderado, se defronta agora com um sério competidor que vem da direita a disputar-lhe esta “centralidade”.

No entanto, ainda é preciso ver de onde virão as bombas em novembro. Além disso, o voto em Andaluzia não é diretamente generalizável ao resto do Estado. Agora, porém, as eleições andaluzas marcam limites importantes às previsões de boa parte da esquerda de que no outono haverá um novo efeito Syriza, mas, desta vez, no Estado Espanhol.

O Podemos se encontra em meio a uma sinuca de bico na qual ele mesmo se colocou com a aposta por uma moderação extrema que o leva a abandonar demandas como o não pagamento da dívida, medidas contra o desemprego com as 35 horas de trabalho semanais ou a aposentadoria aos 60 anos, e optando por gestos e discursos cada vez mais responsáveis em favor das Forças Armadas, de respeito com a Coroa e às grandes fortunas.

Pela esquerda, estão à espera de uma “pasokização” que não chega. O PSOE vai evitar sua decadência a qualquer custo, marcando distância com a direita do PP, enquanto o giro socialdemocrata e de responsabilidade de Estado de Pablo Iglesias faz com que seja difícil encontrar diferenças entre o original e a cópia. Pela direita está o Cidadãos, que atua como pressão sobre o Podemos para acelerar e aprofundar seu giro ao centro.

Uma sinuca de bico à qual também se somam outros fatores, como a grande dificuldade em chegar à maioria nas Cortes com o atual sistema eleitoral, com os resultados modestos que obteve em Andaluzia ou como os que se vislumbram para o Podemos na Catalunha. Ou que Cidadãos sirva para oferecer uma muleta de estabilidade ao PSOE, governando juntos a Junta de Andaluzia, um esquema que poderiam, inclusive, repetir-se durante as eleições gerais.

Se o governo Syriza já está mostrando os limites de um programa de gestão do capitalismo, Podemos pode mostrar algo “anterior”: os limites de uma estratégia e um programa cada vez mais deslocados à direita para entusiasmar o suficiente os milhões de jovens e trabalhadores golpeados pela crise e descontentes com o regime político nascido em 1978.

Lamentavelmente, diante deste panorama, a maior parte das correntes de esquerda se mantém num seguidismo acrítico ao Podemos. O caso andaluz tem sido uma boa prova disso. As candidaturas foram fruto de um pacto entre o setor de Iglesias e o Anticapitalistas (corrente do mandelismo europeu da SU). A cabeça da lista, Teresa Rodríguez do Anticapitalistas, esteve ao lado de Iglesias e seu grupo enquanto lançavam “vivas” à Guarda Civil democrata nos comícios ou destacavam que a questão da República ou Monarquia era uma debate que não interessava à cidadania.

A estratégia de conquistar as instituições da democracia capitalista para gerenciá-las, sem propor sua transformação radical por meio da luta de classes, não somente é uma ilusão que está mostrando seus limites na Grécia, mas que também ajuda a desarmar política e organizativamente os trabalhadores e os setores populares para enfrentarem os responsáveis pela crise capitalista.

Por isto, num ano eleitoral em que o “novo” prepara grandes desilusões (já que não está escrito em nenhum lugar que as “velhas” forças não vão aproveitar a chance junto com outras novidades nada progressistas como o Cidadãos), o que é urgente é retomar o caminho da mobilização operária e popular, colocando em movimento as forças sociais capazes de mudar a correlação de forças.




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