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ELEIÇÕES REINO UNIDO | Análise: primeiros apontamentos acerca das eleições no Reino Unido

André Barbieri São Paulo | @AcierAndy

sábado 9 de maio de 2015 | 00:05

Apesar das previsões de uma disputa eleitoral acirrada no Reino Unido (com pesquisas de voto apontando empate de 34% entre conservadores e trabalhistas a um dia da decisão) o primeiro ministro conservador, David Cameron, assegurou maioria absoluta no Parlamento britânico em Westminster, com 331 bancadas, nas primeiras eleições desde 1983 em que o partido no governo aumenta sua margem de votos em relação à votação anterior.

O inesperado resultado foi devastador para os grandes perdedores da jornada, o Partido Trabalhista (Labour Party) e os Democratas Liberais. Os Trabalhistas perderam 48 assentos no Parlamento, ficando com apenas 232 (30,4% dos votos), deixando o partido com a menor representação parlamentar desde que Neil Kinnock perdeu as eleições para Margareth Thatcher em 1987. Enquanto isso, os Democratas Liberais perderam 49 assentos, restando com apenas 8. O partido da direita xenófoba UKIP, de Nigel Farage, perdeu 1 assento e ficou com somente 1 em Westminster (apesar de ter conquistado 4 milhões de votos).

Após os resultados, os líderes Ed Milliband (Trabalhistas), Nick Clegg (Democrata Liberal) e Nigel Farage (UKIP) apresentaram sua renúncia aos seus respectivos partidos.

A vitoriosa da jornada foi Nicola Sturgeon, do Partido Nacionalista Escocês (SNP), que conquistou 50 assentos em Westminster, com 56 cadeiras de um total de 59 possíveis para os escoceses. É a primeira vez que um partido declaradamente independentista é a terceira maior força do Parlamento (o SNP impulsionou o referendo separatista na Escócia em 2014, em que o “sim” foi derrotado por escassa margem, 55,3%).

A esquerda teve uma eleição desastrosa. O TUSC (Trade Union Socialist Coalition, uma coalizão de sindicalista com o Partido Socialista – vinculado à UIT – e apoiado pelo Socialist Workers Party britânico) conseguiram 0,1% nas urnas, 36.000 votos.

Cresce a polarização entre independentistas e “unionistas” no Reino Unido

Apesar dos debates abertos pela direita xenófoba acerca da questão imigrante – um dos grandes temas que atravessaram as eleições – o debate sobre o separatismo e a possível dissolução do Reino Unido dominou o palco eleitoral. Os conservadores liderados por Cameron, debilitados depois da curta margem que decidiu a permanência da Escócia no Reino Unido no referendo separatista de 2014, conseguiram recompor o desgaste da figura de Cameron na Inglaterra com um discurso de terror contra o nacionalismo escocês.
Também se beneficiaram das declarações da grande mídia que alegavam que os nacionalistas escoceses, que não gozam de prestígio na Inglaterra, apoiariam os Trabalhistas numa eventual coalizão de governo.

Os Trabalhistas se haviam fortalecido desde o último semestre de 2014 pelo papel considerado decisivo do ex-primeiro ministro Gordon Brown em “virar a balança” em favor da permanência escocesa a União, o que explica a disputa ombro a ombro com Cameron nas pesquisas de intenções de voto.

Entretanto, foram derrotados em seu principal centro político, o eleitorado escocês, que migrou fortemente para o SNP. Perderam prestígio também pela já consagrada adoção de um programa econômico e político liberal que em nada se diferenciava dos Democratas Liberais. Diversos deputados trabalhistas, como Ed Balls, haviam inclusive apoiado a moção do partido Conservador de cortar 30 bilhões de libras esterlinas do orçamento público.

Politicamente, baseou sua campanha em medidas que nada se diferenciavam do reacionarismo da direita: prometeu colocar um limite à entrada no Reino Unido de trabalhadores não pertencentes à União Européia e proibir a exigência de benefícios sociais aos imigrantes durante os seus primeiros dois anos na Inglaterra.
A queda dos Trabalhistas é parte da crise de representatividade que atravessa os partidos do centro político europeu, em meio ao oitavo ano da crise econômica mundial, de Portugal à Itália, da Grécia ao Estado espanhol.

Embora fortalecido na votação, Cameron se debaterá com sérios desafios para preservar as duas Uniões. Seu primeiro discurso enfatizou a necessidade de “manter o Reino Unido de pé e reconstruir as relações entre a Inglaterra e a Escócia”. Também assegurou que o Reino Unido celebrará um referendo sobre a permanência ou não na União Européia em 2017.

Tendo em vista que o surgimento de Sturgeon e do Partido Nacionalista Escocês está vinculado às propostas separatistas, não há dúvida de que a maioria conquistada por Cameron não lhe garante estabilidade. Uma eventual disputa acirrada com os nacionalistas poderia debilitar novamente Cameron, já questionado por não conseguir “apaziguar” um membro do Reino Unido, o que também fortaleceria o partido xenófobo UKIP.

De fato, a classe trabalhadora britânica, da Irlanda, Escócia e País de Gales, os trabalhadores e a juventude imigrante no Reino Unido e na Europa, não tem nada a ganhar das ofertas entre a direita conservadora inglesa ou da direita nacionalista escocesa. Todos se unificam no Parlamento – com a ajuda dos Trabalhistas – para votar grandes ajustes na saúde e na educação pública, que promoveram grandes protestos da juventude nos últimos anos.


O que é o Partido Nacionalista Escocês e o que propõe no referendo?

SNP (Partido Nacionalista Escocês), partido da direita escocesa relacionada com grandes empresários, foi fundado em 1934 pela fusão do Partido Nacional da Escócia e o Partido Escocês (de 1932, vinculado à burocracia sindical escocesa, partidária do nacionalismo). Aproveitando-se da crise mundial e do discurso separatista, tornou-se a principal força no governo escocês.

Seu discurso separatista se apóia no ódio dos escoceses diante da dominação britânica, pois tiveram as principais cidades industriais do país e seu estado de bem-estar desmantelados na década de 1980 pela Margareth Thatcher, (primeira ministra britânica que foi chefe da restauração burguesa) para conquistar a independência do Reino Unido.

Umbilicalmente ligada à burguesia nacional, (num estado como a Escócia que, ao contrário da Irlanda, não é um estado oprimido pela Inglaterra - apesar das lutas de independência nacional na Idade) sua proposta na votação pelo "Sim" no referendo só alteraria a Carta Magna da Escócia e o equilíbrio de poderes no parlamento britânico. Os trabalhadores e o povo pobre continuariam subordinados aos planos neoliberais de ajuste, à Coroa britânica e ao banco central do Reino Unido.




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