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TRIBUNA ABERTA | A mulher tem direito de escolher o nome do filho?

A Constituição assegura a igualdade formal entre homens e mulheres, sem prejuízo do Estatuto da Criança e Adolescente que atribui o poder familiar para ambos os genitores.

terça-feira 7 de março de 2017 | Edição do dia

A escolha do nome do bebê deverá ser feita por pai e mãe, exceto nos casos de relações homoafetivas, na qual a escolha será feita por duas mulheres (mãe e mãe) ou dois homens (pai e pai). O importante é deixar bem claro que, a mulher também deverá participar da escolha do nome da criança já que a Lei de Registros Públicos é antiga (1973) e não traz essa previsão expressamente. Contudo, é preciso fazer uma interpretação conforme a Constituição que assegura a igualdade formal entre homens e mulheres, sem prejuízo do Estatuto da Criança e Adolescente que atribui o poder familiar para ambos os genitores.

Sobre a igualdade formal e material cumpre esclarecer que a primeira diz respeito a não se estabelecer nenhuma distinção entre os gêneros. Porém, quando tratamos todos por iguais, podemos estar causando prejuízos, já que materialmente somos diferentes. Essa é a razão principal que justifica a especial proteção que a mulher tem, por exemplo, no vagão preferencial do metrô e do trem, pois, a condição a que a mulher é submetida no transporte público é marcada por um histórico dos mais variados níveis de abuso sexual e violência. Outros exemplos de distinções legais que visam à igualdade material são: a Lei Maria da Penha, já que a mulher é a principal vítima das relações abusivas; a aposentadoria especial, pois a maioria das mulheres tem dupla jornada de trabalho em decorrência dos cuidados do lar e dos filhos; e, prova física diferenciada nos concursos públicos para homens e mulheres já que biologicamente ambos são diferentes.

Já em relação ao direito ao nome, trata-se de um direito da personalidade e, na verdade, com esta se confunde. De acordo com a língua portuguesa, o nome de uma pessoa é um substantivo próprio utilizado para individualização de determinado ser humano. Para o mundo jurídico, o nome exerce um binômio em relação ao indivíduo. Por um lado, o nome é o direito de individualização da personalidade de determinado ser. Por outro, o nome é um dever de individualização de determinada pessoa humana perante o mundo externo.

Apesar de ser a Declaração de Nascido Vivo (DN) o primeiro documento que faz prova da existência de um ser humano, o documento oficial comprobatório do nome do indivíduo é a Certidão de Nascimento, cujo conteúdo é extraído do assento de nascimento lavrado em livro depositado aos cuidados de um cartório de Registro Civil de Pessoas Naturais.

A Certidão de Nascimento é considerada um repositório de Direitos Humanos já que é o local onde a história do ser humano começa a ser contada. É o documento no qual constam os dados biológicos do indivíduo, tais como filiação, sexo, data e local de nascimento. Sem esse documento, além de inexistir perante o Estado, o indivíduo fica impossibilitado de obter outros documentos básicos que dele derivam em cadeia obrigatória. E, não para por aí.

Na verdade, a cadeia documental funciona tanto de documento para documento – não se tem Carteira de Identidade sem a Certidão de Nascimento -, quanto de ascendente para descendente – se a mãe não tem documentos não pode registrar seu filho. Portanto, são duas cadeias documentais distintas.

Se para um adulto a falta de documento é um complicador, para uma criança significa a exposição a todos os tipos de violência, principalmente o tráfico de pessoas e separação da família em caso de desastres, como o que ocorreu em 2011 na cidade de Nova Friburgo, por exemplo.

Na maioria das vezes, essa violação ao direito ao nome, ao Registro Civil de Nascimento e a Certidão de Nascimento é causada pelos próprios pais que também não possuem registro, ignoram a gratuidade do serviço e/ou tem dificuldade de acesso aos Cartórios de Registro Civil. E, especialmente no caso das mães, que por falta de reconhecimento da paternidade, desconhecem que elas próprias podem fazer o registro só com o seu próprio nome.

Nesse sentido, cumpre esclarecer que as mães têm direito de fazer o Registro Civil de Nascimento de seus filhos, ainda que os pais das crianças não o queiram fazer ou em caso de desconhecerem a paternidade dos mesmos. Quando o registro de nascimento é feito pela mãe, o campo destinado ao nome do pai na Certidão de Nascimento fica em branco, sem nenhum preenchimento.

Entretanto, o pai que desejar reconhecer a paternidade de seu filho poderá comparecer ao Cartório de RCPN onde foi lavrado o Registro Civil de Nascimento para solicitar a inclusão de seu nome na Certidão de Nascimento da criança. Portanto, por ato voluntário, pode o pai suprir uma lacuna de dados no documento de seu filho.

Faz-se necessário esclarecer ainda que, a primeira via da Certidão de Nascimento é gratuita a todas as pessoas. Já a 2ª via, é gratuita por lei aos reconhecidamente pobres, através de declaração de hipossuficiência do próprio solicitante.

Cabe destacar que a ausência de Registro Civil de Nascimento é apenas uma das questões relacionadas ao tema documentação. O acesso aos demais documentos básicos podem ser burocratizados, seja pela ausência da Certidão de Nascimento, seja pela dificuldade de acesso aos órgãos emissores de documentos, principalmente para a população mais pobre, que por muitas vezes desconhece o trâmite para providenciá-los ou não possui condições financeiras para arcar com as taxas de sua emissão.

Dessa forma, torna-se imprescindível a atuação estatal para garantir o comando legal previsto na norma civil-constitucional que diz “Toda pessoa tem o direito ao nome, nele compreendido o prenome e o sobrenome”. Também há previsão semelhante na Convenção Americana de Direitos Humanos – conhecida como Pacto de San José da Costa Rica –, da qual o Brasil é signatário, que estabelece que “Toda pessoa tem direito a um prenome e aos nomes de seus pais ou ao de um deles. A lei deve regular a forma de assegurar a todos esse direito, mediante nomes fictícios, se for necessário.”

Cabe frisar que, os nomes fictícios são popularmente conhecidos como “nomes de misericórdia” e encontram expressa previsão no Estatuto da Criança e do Adolescente.




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