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RESPOSTA AO ILISP | A matemática de botequim do ILISP e a educação como direito

Camilo Caetano, do ILISP, diz ser impossível a criação de uma "universidade pública, gratuita e para todos". Tentaremos nesse texto tentar apresentar um outro tipo de matemática, menos interessada no lucro, e mais voltada à busca pelo direito à educação.

segunda-feira 11 de abril de 2016 | Edição do dia

"Todo direito é universal. Se não é universal, não é um direito, e sim um privilégio” Emmanuel Kant



Em um texto recentemente publicado pelo ILISP (Instituto Liberal de São Paulo), Camilo Caetano responde ao video de Jéssica Antunes, estudante da USP e militante da Faísca, onde ela defende a ideia da “universidade pública, gratuita e para todos”.



Sua tese central é a de que “defender o ensino público, gratuito e de qualidade é defender a desigualdade no ensino brasileiro”. Para comprovar essa estranha ideia (para não dizer paradoxal), ele usa cálculos matemáticos simples e de um populismo de direita que vem ganhando espaço nas universidades ultimamente. A necessidade de se responder esse tipo de texto, por mais rasteiro que seja, se dá pela ilusão crescente em parte da juventude em torno desse tipo de “neo-populismo” a la Donald Trump. Pois vamos à discussão!



A elitização no ensino superior 



O figura diz corretamente que as universidades públicas do Brasil são centros da elite, em especial universidades como USP, Unicamp, UFRJ, UFMG e UFRGS. Dados como os feitos pela Folha de S. Paulo mostram que metade dos calouros da USP figuram entre os 20% mais ricos do Brasil. No censo da USP de 2015, apenas 7% dos estudantes eram negros, composição monstruosa ao comparar com os 36% de negros que vivem no estado de SP ou com mais de 50% da população brasileira. Mas não precisa ir para os dados para saber disso, basta andar pelos corredores de alguma dessas universidades para ver a base social que hoje tem acesso a universidade.



A paradoxal resposta do comentarista do ILISP diante desse cenário é nada mais nada menos que… cobrar mensalidades. O problema é que num país com desigualdades abissais como o Brasil, cobrança de mensalidades em universidades públicas significa na prática a expulsão da camada pobre dos estudantes. Aí o populista de direita diz “mas defendemos que apenas os ricos paguem, enquanto os pobres não”. O problema é que um passo como esse significa um avanço em direção a elitização e a privatização. Não apenas separam aqueles que pagam daqueles que não pagam, como aprofunda a lógica mercadológica do conhecimento. 



A verdade é que setores liberais fazem demagogia com isso para poder privatizar. Porque então são contra que se cobre impostos progressivos em cima de grandes fortunas para financiar a educação pública? Porque no final das contas eles são contra o ensino público e se utilizam do enorme rechaço a elitização do ensino superior para privatizar. O norte deles é a privatização, a espoliação, a diminuição dos salários e o aumento da exploração - e como todo bom liberal, fazem de tudo e falam de tudo para isso ao sabor da melhor demagogia de direita. Como Lenin disse, “todo liberal é um fascista de férias”.



Reconhecer essa realidade significa reconhecer que a universidade hoje é elitista, restrita às elites (hoje, por conta das cotas raciais e sociais, uma parcela ínfima dos mais pobres podem estudar, apesar das dificuldades de se manter). Os ricos que não entram nas grandes públicas, conseguem pagar uma privada. Os pobres contraem dívidas e trabalham duro para talvez conseguir um diploma. Mas mesmo assim estamos falando de uma minoria dos jovens no Brasil. Dados do IBGE mostram que apenas 15% dos jovens entre 18 e 24 anos cursam ensino superior. Esses dados são de 2013, mas nos últimos 3 anos não houve mudança significativa nesse número, aumentando um pouco a porcentagem. 



Isso mostra como hoje o acesso a universidade é um privilégio. A larga maioria dos jovens hoje ou trabalham ou nem estudam nem trabalham. Em 2013, um quinto da juventude se enquadra nessa categoria de “nem-nem”. Hoje, com a inflação e o desemprego crescente, esse número certamente é bem maior.

Ensino superior como direito e não como privilégio - a necessidade da estatização



Reconhecer que hoje estar na universidade é um privilégio de uma minoria, branca e rica, não significa dizer que o acesso ao ensino superior deva continuar sendo um privilégio. Pelo contrário, estudar numa faculdade de qualidade é um direito de todos, ou deveria ser um direito de todos como prevê a limitada constituição de 1988. Lutar por uma universidade pública, gratuita e de qualidade para todos é lutar pelo fim desse privilégio de uma minoria e produzir pesquisas e conhecimento que não satisfazem as necessidades de lucro de empresas como Avon, Natura, Camargo Correia, Bosch, etc. Mas sim um conhecimento que sirva para as necessidades reais da população.



O que o ILISP e o senhor Camilo Caetano se recusam a admitir é que para resolver esse problema é necessário acabar com as mensalidades, com a venda de ações de empresas de educação na bolsa, com os privilégios de professores e burocratas (sim, como o da Marilena Chaui), com monopólios empresariais como Kroton/Anhanguera e o grupo Abril, e colocar toda a rede de ensino sob controle dos que trabalham e estudam. A única maneira de avançar em cima da elitização do ensino superior é tornando cada vaga particular em uma vaga pública. Em outras palavras, lutar pela estatização completa do ensino superior, sob controle dos trabalhadores e estudantes.

Mas daí alguém atento pode dizer “mesmo assim 75% da juventude ainda não vai ter acesso a universidade”. Isso é verdade, por isso exigimos que haja um investimento maior em toda a educação pública, coisa que o governo do PT se recusa a fazer. Se olharmos para o gráfico orçamentário da união, veremos que apenas 3,73% do PIB hoje é gasto com educação pública ao passo que 45,11% é gasto com juros e amortização da dívida pública (dados de 2014, como mostra o gráfico abaixo). Isso nos leva a outro debate, também contra a lógica matemática estática e estéril do senhor Camilo Caetano. Não há como garantirmos direitos mínimos hoje no Brasil se não atacarmos os lucros dos empresários e dos bancos. Eles sugam quase metade da riqueza nacional. Enquanto a “inteligente” lógica do comentarista do ILISP é atacar o salário daqueles que sustentam e movem a universidade todos os dias, os funcionários e professores, nós exigimos que os corruptos que sustentam as campanhas do PT, do PSDB, PMDB…, tenham suas fortunas expropriadas a serviço da educação, da saúde, transporte, etc. Exigimos impostos progressivos sobre grandes fortunas.

Um outro argumento do comentarista do ILISP é de que o Brasil é um dos países onde mais se gasta com ensino superior em todo o mundo. O gráfico que ele usa é verdadeiro. Acontece que ele deixa de lado um fato básico para comparar o nosso investimento com o de países como Polonia, Suiça, Chile e Argentina - o Brasil tem uma população muito maior do que esses países, portanto a demanda também é maior. Era de se esperar que investíssemos mais em educação. Apesar desse "descuido", um outro dado que foge à lembrança do ilustre Camilo Caetano é o fato do Brasil ser o terceiro país em todo o mundo que mais gasta com dívida pública, de acordo com o próprio FMI. Mas esse tipo de "detalhe" pouco importa na matemática dos "intelectuais" do ILISP...

fonte: http://www8d.senado.gov.br/dwweb/abreDoc.html?docId=92718



Acabando com a dívida pública, podemos redirecionar o orçamento a fim de satisfazer as necessidades do povo. A classe trabalhadora, larga maioria da população, é a única capaz de conseguir isso, se organizando e lutando pelos seus direitos.



Alguém um pouco mais perspicaz pode dizer, “mas tudo isso é impossível de se conseguir, estatizar o ensino privado, cobrar grandes fortunas, acabar com a dívida pública, etc. Apenas com uma revolução isso é possível, com o fim do capitalismo!” Nunca dissemos que a luta em defesa de nossos direitos mais elementares é fácil. Séculos atrás alguém poderia dizer o mesmo sobre o voto das mulheres, ou sobre o fim da escravidão. Mas com muitas revoltas e lutas avançamos em cima dessas questões. Lutamos pelo que é mais certo, não pelo que é mais “possível” dentro do capitalismo.



A matemática dos privilegiados e a matemática dos de baixo



Aí vem o espertalhão liberal e diz “mas isso só existe na cabeça lunática do comunista louco. Vai pra cuba! Comunismo = ditadura assassina!” e toda a verborragia que já conhecemos. Acontece que durante anos criaram uma história sobre o que é o comunismo, que nada tem a ver com o que Marx, Engels (não Hegel), Lenin e Trotsky defendiam. A história nos mostra que muitas vezes entre a teoria e a prática pode haver um abismo. Dizer que o Capital de Marx corresponde na prática aos Gulags e à coletivização forçada é semelhante a dizer que a Bíblia corresponde diretamente à inquisição e à escravidão na América.



Ainda que para os “intelectuais” do ILISP isso seja difícil de compreender, vale retornar a um intelectual (esse sim) do mesmo século que as ideias liberais datam - do século XVIII - para que outras pessoas mais honestas não tenham dúvida sobre o que os marxistas e o que a esquerda defende. Emmanuel Kant, (que não era marxista, mas que cuja frase faz todo sentido) disse que “Todo direito é universal. Se um direito não é universal, não é um direito, e sim um privilégio”. Defender o acesso ao conhecimento como um direito universal significa defender a universidade pública, gratuita e de qualidade para todos. Trata-se de uma promessa que as elites vem defendendo desde o século XIX, mas são incapazes de cumprir. 



A única maneira de cumprir essa promessa é atacando os interesses dessa mesma elite, com um movimento forte, independente dos governos e patrões, com trabalhadores a frente. A juventude pode cumprir um papel decisivo nesse sentido e é por isso que vídeos como o da Jéssica atormentam tanto pequenos comentaristas como Camilo Caetano, Rodrigo Constantino e líderes ultra-reacionários como Kim Kataguiri. Nossas ideias estão crescendo. Elas são fortes, implacáveis e temos ao nosso lado todo o anseio de uma juventude que já não aguenta mais esse balbucio direitoso, as mentiras dos partidos da ordem (PT, PSDB, PMDB, etc.) e o capitalismo que só explora, oprime e mata.

Por último, vale ressaltar alguns problemas estruturais na argumentação do senhor Camilo Caetano. O mundo não é um gráfico cartesiano onde números explicam tudo ou, para bom entendedor, “há mais coisas no céu e na terra do que sonha sua vã filosofia”. Para desgosto dos “intelectuais” do ILISP, a sociedade é muito mais complexa do que eles pensam. Cada dado utilizado para justificar a privatização possui um interesse político e econômico por trás. 

O que dita a escolha dos governos de financiar mais ou menos o ensino público e a saúde, o preço da tarifa do busão, o preço do melão, não são equações compreendidas apenas por vencedores de prêmios Nobel. O que dita tudo isso são interesses políticos e econômicos. Assim funciona o capitalismo, assim funciona a tão adorada república burguesa que eles defendem.

Na matemática de botequim do senhor Camilo Caetano, a educação pública, gratuita e de qualidade é impossível pois ele defende interesses que vão contra o público, que favorecem o privado, o lucro, o privilégio de poucos. O mais correto seria passar a chamar a matemática do ILISP como a “matemática dos privilegiados”, que visa tão somente a privatização e o lucro. 



Na matemática da vida real, a matemática dos de baixo, do povão, faremos de tudo o que tiver ao nosso alcance para acabar com toda a desigualdade, garantir à população direitos básicos, avançar em cima da privatização que só mede o lucro e a exploração e organizar a juventude e os trabalhadores para acabar com o capitalismo. Isso só é possível com um forte movimento que faça reacender a faísca da juventude de Junho de 2013. E aqui essa direita ultrapassada não tem lugar.





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