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CHINA ECONOMIA | A Grécia é um Thriller, a China é um filme de terror

No final de junho, talvez querendo chamar a atenção sobre o que estava se passando no gigante asiático, inundando todas as manchetes com os vai e vens do default grego, um jornalista australiano colocava este título catastrófico sobre as fortes quedas na bolsa de Xangai e Shenzhen.

Juan ChingoParis | @JuanChingoFT

quinta-feira 9 de julho de 2015 | 18:35

Este naufrágio, apesar das intenções cada vez mais desesperadas das autoridades de Pequim em freá-lo, não se deteve e começa a se estender em direção a outros mercados asiáticos.

Uma queda nas bolsas que as autoridades não conseguiram ainda frear
As bolsas de valores chinesas estão despencando. O principal índice da bolsa desmoronou 32% em menos de um mês após nova queda de 6% na última quarta-feira. Um desastre para as pessoas que se apressaram a comprar ações chinesas e o governo central, que busca por todos os meios conter a explosão de uma bolha que foi provocada por ele mesmo.

O governo chinês tomou todo tipo de medidas para tentar conter o naufrágio das bolsas. Assim, o Banco Central cortou as taxas de juros, suspenderam novos IPOs (lançamento de ações na bolsa), atenuou as condições de financiamento para operar (agora se admite até casas e antiguidades como garantia) e os maiores operadores e fundos de pensão se comprometeram a comprar ações para sustentar os índices. Dito de outra maneira, uma intervenção brutal nos mercados que até o pregão de quarta-feira teve pouco êxito. O que faz com que a melhor forma de evitar a queda na bolsa é diretamente não colocar ações no mercado.

No começo desta quarta-feira, mais de 500 empresas não negociaram suas ações na China, e anunciaram que iriam deixar de fazê-lo, o que elevou o número de suspensões a quase metade de todas as empresas com cotação nos mercados continentais chineses (sem considerar Hong Kong).

A maioria das suspensões de negociações ocorreram na bolsa de Shenzhen, que está dominada por pequenas empresas. Estas suspensões congelaram cerca de 1,4 trilhões de dólares em ações, o que supõe 21% de capitalização chinesa, e se converteu numa medida popular com as quedas das últimas semanas.
De fato, se não fosse pelas suspensões, é provável que os 28% de queda do índice Xangai Composite desde a última alta do dia 12 de junho, teriam sido muito superiores. Desde este ponto máximo, após duplicar seu valor nos últimos 18 meses, o total de perdas aumentou para 3,2 trilhões de dólares de queda no valor das ações chinesas, ou seja, mais do que a capitalização na bolsa dos mercados de valores da França e Espanha juntos.

A criação de uma bolha nas bolsas como resposta à desaceleração na economia

A desaceleração da atividade no interior da China tem conduzido a uma série de estímulos monetários e fiscais que dispararam suas bolsas até uma “ exuberância irracional”, tão criticada por Pequim diante do desastre de Wall Street em 2007/08 desencadeada pela crise dos subprimes.

Efetivamente, diante dos sinais evidentes da desaceleração de sua atividade econômica que assustaram as autoridades, estas tomaram toda uma série de medidas monetárias e fiscais. Expressão da primeira medida foi a redução das reservas compulsórias dos bancos – a fim de que possam emprestar mais – por meio de seu Banco Central. A nível fiscal, foram tomadas medidas de estímulo ao sobreaquecido setor imobiliário tais como o rebaixamento dos lances iniciais e entradas que são necessários para comprar a primeira casa (de 30 a 20%) ou a segunda e demais casas (60 a 40%). Receitas muito parecidas as de todos os bancos centrais, para expandir um modelo que não vai mais e que cria uma falsa sensação de segurança, permitindo que as bolsas disparem.

Todos os ingredientes estavam ali para fazer inflar a bolha. O auge do mercado de valores foi controlado artificialmente por Pequim. As autoridades têm manejado a propaganda estatal para arrastar a um máximo de chineses em direção à Bolsa. Encorajaram-se as práticas de risco, como a compra de ações com fundos emprestados, introduzindo doses importantes de volatilidade.

De repente, se instalou a loucura nas bolsas. Alguns exemplos: os volumes de negociação dispararam e chegaram a, supõe-se, até quatro vezes a média diária do NYSE (bolsa de Nova Iorque). A abertura de novas contas para operar na bolsa foi produzida a um ritmo superior a um milhão... por semana (1.138.500 concretamente). Dito de outra forma, quase 8 milhões de novas contas de corretagem foram abertas no primeiro trimestre deste ano e outros 4 milhões somente na última semana de maio. Segundo os dados publicados pela Bloomberg, mais de um terço dos novos investidores não frequentaram ou se formaram na escola primária (5,8% não sabem nem ler).

Em outras palavras, segundo esta agência de informações financeiras, os taxistas e carregadores de mala em hotéis, estão entrando na festa. Festa totalmente fictícia, pois o crescimento dos lucros das sociedades cotadas em bolsa neste ano é menos de um 1%, enquanto seu valor de mercado duplicou.

Um grande desafio à infalibilidade do PCCH e um forte questionamento aos seus planos expansionistas a nível internacional

A imaturidade ainda do desenvolvimento das instituições capitalistas na China, em especial, do mercado de capitais, faz com que, aparentemente, o risco sistêmico das atuais turbulências nas bolsas seja menor se comparado aos países capitalistas avançados.

Assim, a capitalização total de seu mercado de valores – após a queda recente – representa 66% da produção nacional. Nos EUA, este número é de 140%. Ainda assim, os bancos e as bolsas que emprestaram para as operações de “margin trading” (uma compra de papéis de valor por créditos bancários) poderiam ter problemas se os devedores não puderem pagar.

Outra vítima potencial poderia ser as ambições de refinanciamento das corporações privadas chinesas, que devem o equivalente a 125% do PIB em dívidas, segundo a consultoria norte-americana McKinsey. Por sua vez, as empresas de propriedade estatal, que representam a maioria das sociedades com cotação em bolsa, e que frente às dificuldades de suas fontes usuais de financiamento, particularmente tentando obter novos capitais num mercado em expansão, agora constatam que estes planos estão em xeque.

Ainda em 2007 viveu-se um momento de euforia similar a atual e que foi seguida por uma queda de 71% nos doze meses seguintes de suas principais ações negociadas em bolsa. E apesar da forte queda na economia, o mercado não se deteriorou. Portanto, este precedente mostra que a queda atual teria ainda, no entanto, algum caminho a percorrer.

Porém, além desta comparação numérica, as circunstâncias são totalmente diferentes. No último mercado em baixa, a economia estava crescendo dois dígitos. Agora, a economia se contraiu para um crescimento oficial de 7% (há economistas que sustentam que o primeiro trimestre de 2015 foi menor do que 6% de crescimento). Neste marco, Pequim, se viu obrigada a intervir para dar suporte ao seu mercado de ações e assim, evitar as consequências políticas, sociais e financeiras de um colapso total.

Apesar dos fortes temores financeiros dos últimos dias, possivelmente Pequim tem as ferramentas para controlar a queda em seu volátil mercado de valores, mas qualquer movimento que se faça no curto prazo para domar o mercado sem uma alternativa de investimento viável gerará consequentemente a desaceleração do crescimento do consumo privado no longo prazo, dificultando sua estratégia para reequilibrar a economia em meio a uma desaceleração mais ampla. Para se entender a dificuldade, é preciso lembrar que o desenvolvimento do mercado de valores foi encorajado pelas próprias autoridades para responder ao excesso de poupança interna e à falta de oportunidades de investimento, em especial depois que a bolha imobiliária começou a se desinflar.

Por último e com consequências mais estratégicas, revela fragilidades na fonte inesgotável de capital chinês em momentos em que Pequim lançou iniciativas de financiamento exterior ambiciosas, como a “Rota da Seda”. Este programa tem como objetivo impulsionar a conectividade e o comércio entre a China e 65 países com uma população de 4,4 bilhões, este também depende do financiamento das instituições financeiras chinesas, como o Fundo Rota da Seda, o Banco de Desenvolvimento da China e o China Ex-Im Bank, todos eles captam fundos dos mercados de capitais nacionais.

Do ponto de vista da estabilidade interna, a preocupação é que se o partido perde muito sua “cara” em sua disputa com o “mercado” e fracassa em estabilizar o mesmo (e não consegue por sua vez uma forte recuperação dos níveis atuais) pode levar a uma crise de confiança do até agora infalível, aparato estatal.

O que demonstra estes acontecimentos e contra a peregrina crença na capacidade infinita de controle da burocracia chinesa - questão que ilusoriamente havia sido reforçada depois da crise pós-Lehman frente à capacidade chinesa de manter seu crescimento elevado enquanto os países centrais estavam em crise – é que os enormes excessos de sobreacumulação de capital que saltavam pelos poros da economia chinesa, sejam tapados. Especialmente quando, para sustentar a economia, tenham criado projetos de infraestrutura ou urbanos – que supõem um consumo de cimento em três anos equivalente a todo o consumo dos EUA ao longo do século XX!


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