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DEBATE
Fim do pacto lulista: espaço somente à direita e para preces de “Lula, o retorno”?
Leandro Lanfredi
Rio de Janeiro | @leandrolanfrdi

A imagem do barco à deriva é uma das mais recorrentes para analisar a profunda crise do governo Dilma. Um barco que além do mais está com algumas importantes avarias e frente a ondas que não se via em muitos anos, quiça décadas.

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Quadro de Ludolf Backhuysen

O ex-candidato a governador de São Paulo pelo PSOL, Gilberto Maringoni escreveu ontem um interessante artigo à importante revista Carta Capital onde desenvolve uma parte importante do que está em crise.

Para ele se trata de uma crise histórica que coloca em xeque o “bloco (histórico) organizador do sistema político brasileiro pós-PSDB. O vetor desse bloco era o PT, em torno do qual todas as facções políticas e sociais tiveram de se posicionar. Finda a fase de crescimento econômico observado entre 2004 e 2010 – e do amortecimento da luta de classes – o pacto perde razão de ser. Quem o rompe é a burguesia”.

A convocação da manifestação do dia 13 pela FIESP é uma imagem desta ruptura (leia aqui). A condução coercitiva de Lula também. Esta imagem da ruptura pela ação da burguesia que Maringoni argumenta joga luz somente sobre parte do que se rompeu nestes anos de conciliação de classes. Antes de retornar ao artigo que centramos este debate é importante tentar jogar luz em outros fatores além da “ruptura dos de cima”.

Crise política, econômica e crise orgânica

Uma inábil presidente flanqueada por uma mídia agressiva e “destituinte”, por setores do judiciário fortalecidos por ela e por Lula (o próprio FHC reconhece isto em artigo recente) e que agora se voltam contra os criadores; por uma situação econômica que beira a depressão e não a “mera recessão”. A tudo isto se soma continuada e aumentada divergência entre “representantes” e “representados”. Os escândalos de corrupção de um PT que se fez maioria parlamentar na repetição e aumento dos métodos históricos tucanos e peemedebistas dão a qualquer trabalhador brasileiro mais e mais o sentido de está tudo podre nesta república da Lava Jato.

O mais dramático de todo este “fim de ciclo” é que ele acontece no momento que deveria marcar o coroamento de um projeto que dizia hegemônico: o lulismo. Passada a terceira reeleição do projeto, com intelectuais petistas (como Singer) tendo afirmado que o lulismo deixava marca indelével na história nacional a ponto de comparar com Roosevelt, o choque entre expectativa e realidade não poderia ser maior.

Uma geração educada sob discursos que o país havia mudado estruturalmente, que as crises externas aqui viravam marolinha, que os tempos de “complexo de vira-lata” se apagavam num Brasil potência de Copa, Olímpiadas, pré-sal e até tecnologia nacional de ponta (parte do que a Lava Jato mira destruir como argumentamos aqui) . Lava-Jato, zika, e um aumento rápido do desemprego e da perda de poder aquisitivo marcam os tempos econômicos e sociais de um país que tem além de “ruptura dos de cima” com o pacto de conciliação, teve ação dos de baixo, em junho, em um ascenso de greves desde 2012.

Um país que vive algo que podemos entender como “crise orgânica” como argumentava Gramsci (ver o interessante artigo de Juan Dal Maso e Fernando Rosso). Entender este conjunto de fatores, que inclui os de baixo pode enriquecer a análise para além do que aponta Maringoni.

Olhando os de cima esquecendo os de baixo

Olhando a FIESP, Lula, Dilma não se vê o ruído que vem da rua. E na rua não pisaram só coxinhas.

No artigo do ex-candidato e professor da UFABC não há os de “baixo”. Não há Junho. Não há o ascenso de greves iniciado em 2012. Não há poderosas greves com elementos selvagens como os rodoviários de Porto Alegre e garis do Rio em 2014. Não há luta contra os ajustes, hoje, agora.

Sem esta ação, mais marcada em seu potencial na juventude de junho, nos estudantes secundaristas de São Paulo também não há orientação política que não medir o que Lula fará e qual seu retorno. Sem sujeito nos resta o sebastianismo.

Das areias do Marrocos e dos porões da profundeza da governabilidade burguesa azeitada pelo PT e seus parceiros da Odebrecht e Cia, revelados sob o chicote bonapartista de Curitiba que nos venha a esperança do retorno de Dom Sebastião.

O retorno heróico (improvável) ou que se repita como farsa, nas palavras do Maringoni: “ Lula que tem alguma chance de voltar em 2018 será outro Lula. Ou teremos – pouco provável – o Lula do confronto com os de cima, ou o Lula que virá para implantar o pacto regressivo, iniciado por Dilma, no qual a conta é paga pelos de baixo.”

À uma esquerda que valha a pena e se orgulhe de dizer seu nome, há mais esperança que torcer pelo retorno de quem capitaneou um governo de conciliação de classes, o retorno de quem conduziu um dos maiores partidos operários criados pelos trabalhadores no hemisfério ocidental a bancarrota de hoje. Sem os de baixo há pouco balanço e lições a extrair.

Só com os de cima e sob impacto mecânico da economia não se entra nos debates que percorreram a esquerda todos estes anos. Onde foi parar o desenvolvimentismo de Dilma cantado em verso e prosa agora no acordo com Serra? Estava correta a defesa da “governabilidade”? E o “mal menor”? Buscamos contribuir neste debate com este artigo.

Mas cabe outra reflexão posterior. Como algo tão marcante do passado super-recente, de outubro de 2014, o discurso “não vou cortar direitos nem que a vaca tussa” não faz explodir a ação dos “de baixo” contra um governo tão ajustador que é atacado por uma FIESP e uma oposição que quer mais ajustes ainda?

Porque mesmo sob impacto da decepção do estelionato eleitoral, de uma corrupção tremenda, o regime político brasileiro conta com dois fatores de contenção chamuscados mas ainda muito fortes: Lula e a CUT.

Sua capacidade de conter a espontaneidade da luta dos trabalhadores, desviar a raiva contra a elite e seus governos ajustadores sejam eles nas facetas tucanas ou petistas, enfraquece não só a capacidade de resistência dos trabalhadores agora, mas sua própria auto-percepção. Educados por Lula e pela CUT um dos maiores proletariados do mundo se vê muitas vezes incapaz de barrar qualquer ataque.

“Perdemos nos vinguemos na urna”, o pensamento recorrente que nos é repetido desde as derrotas construídas por Lula lá nos idos da gigantesca greve metalúrgica de 80.

Ganhar em base à luta de classes é um segredo que os trabalhadores reaprenderam com a juventude em Junho de 2013. Com isto e com slogans diretamente copiados da juventude (“não tem arrego”, entre outros) se animaram processos recentes. A vitória dos secundaristas paulistas mostra como até mesmo o tucano Alckmin é derrotável.

O fim do pacto lulista não se deu somente por ação da burguesia e não abre espaços somente à direita. Eles não estarão abertos para sempre. A direita está muito bem posicionada. Lula, o PT, a CUT golpeados mas vivos para se reinventar e repetir seu papel.

Uma esquerda que seja digna de seu nome deve voltar-se no olhar e na ação para o novo ar que se respira na juventude e com ele ajudar a “contaminar” os trabalhadores. Os garis, rodoviários, já mostraram como muitos setores dos trabalhadores anseiam por isto.

É possível e necessário outras práticas no “mundo operário”. Um mundo que pode ser muito mais rico, democrático, plural e prenhe de iniciativas, do que o que se respira na estreiteza do mundo sindical CUTista com sua divisão entre a política (petista) e a pauta (econômica e limitada) na porta da fábrica, entre as categorias que se unificam somente sob ação eleitoral e não para a luta de classes. Em meio a uma profunda crise no país que também se apresenta como uma crise para e da esquerda é necessário uma revolução e renovação na esquerda do país.

Para esta revolução-renovação na esquerda brasileira acontecer é imprescindível olhar para os de baixo tanto quanto contribuir para que tiremos lições sobre o PT, sobre Lula, sobre a CUT. Esta batalha de ideias é crucial para uma esquerda que não caia em velhos erros e saiba, sem voluntarismos, “fazer sua hora” e não o igualmente velho rezar para acontecer.

 
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