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Misoginia na mídia
Folha de SP publica coluna misógina sobre Marília Mendonça
Patricia Galvão
Diretora do Sintusp e coordenadora da Secretaria de Mulheres. Pão e Rosas Brasil

Marília Mendonça era de fato um fenômeno. Não pelos 36 milhões de seguidores ou pelo recorrente topo nas paradas de sucesso. Mas porque conseguia como nenhum outro artista cantar a vida cotidiana de mulheres comuns, com seus dramas e contradições.

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Foto: Reprodução: Instagram/Gossipdodia

Não à toa, em cada canto do país alguém cantarolava suas músicas. Ela falava de amores perdidos, algo que ficou conhecido como sofrência e que tinha um tom pejorativo. Os grandes clássicos da música nacional ou internacional sempre falaram de corações partidos. Mas, as músicas populares eram desdenhadas pela indústria cultural. A exaltação de baladas clássicas de Edith Piaf a Michael Bublé, teve que se curvar a fenômenos como Marilia. Não por causa de um refrão chiclete, que não é exclusividade das músicas populares. Mas porque a canção que entoava com um voz rouca e potente conseguia expressar em poucas palavras dramas profundos como a traição e competição entre mulheres, o drama da amante, a violência doméstica e a prostituição.

Em um artigo da Folha, o colunista Gustavo Alonso faz uma análise rasa de um fenômeno como Marília. Além de desqualificá-la como cantora, algo bastante discutível para aquela chamada de Adele brasileira, há um certo desdém com o estilo musical. Embora a própria cantora tenha refletido sobre o trabalho de compositora que exigia uma produção em massa de hits, algo que a indústria cultural se encarregou de cobrar de qualquer artista, suas letras não eram simplesmente um choro desolado de uma mulher traída. Elas também expressaram em algum sentido o que foi a primavera feminista que varreu o mundo. As grandes marchas de mulheres, o grito de nenhuma a menos (Ni una menos), o Me too, representavam o grito contido por séculos de opressão. E Marilia, com suas contradições, foi parte de expressar esse grito Brasil afora.

E nadava contra a corrente num meio extremamente machista e conservador do agronegócio e da música sertaneja, que se apoia na negação da discussão política, especialmente entre as mulheres, como se o sofrimento cotidiano não se ligasse à política de avanços e retrocessos em relação às mulheres. Quando em 2018 Marilia aderiu ao #EleNão foi atacada por seu público e amigos do meio sertanejo. Se desculpou por trazer a política para a vida artística. No entanto, fez música contra a violência doméstica depois do escandaloso caso do DJ Ivis que espancou sua esposa. Fez música sobre a realidade de prostitutas e toda situação de exploração e opressão que vivem.

Alonso afirma que seu visual não era atraente. Marilia não era gordinha (o diminutivo trata como um defeito uma questão estética). Ela era gorda, o que não a impediu de marcar sua presença com imponência nos palcos sem esconder o corpo. O famoso cropped que vestiu foi um foda-se, nas suas palavras, aos críticos do seu corpo. Depois ela fez cirurgia e emagreceu, o que não é um problema, ainda que possa ter feito fruto da pressão estética da nossa sociedade que estabelece padrões inalcançáveis de beleza. Contradições da qual as mulheres não estão imunes, mas a briga não é com a balança, é com o sistema que nos mede por centímetros de cintura, quilos de gordura e data de validade.

Marilia tinha suas contradições, algumas das quais admitiu e buscou entender, como o comentário transfóbico que fez em um espetáculo. Também se calou quando um amigo pessoal e colega de profissão foi racista e homofóbico em rede nacional no reality show do BBB 21. Essas contradições demonstram uma artista conectada com seu tempo, pressionada pela indústria cultural, mas que com suas canções conquistou o coração de muitas mulheres reafirmando a necessidade de sororidade entre as mulheres e a superação de uma vida de opressão.

Sua voz rouca e potente deixa saudades.

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