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Carta aberta de um histórico militante trotskista sobre a crise do NPA na França
Rob Lyons

Rob Lyons é um ex-membro da seção canadense da USFI (Secretariado Unificado - Quarta Internacional) e ex-coordenador internacional da Ação Socialista/Ligue pour l’Action Socialiste. Nesta carta, dirigida em especial à A&R (Anticapitalismo e Revolução) e à l’Étincelle, responde aos ataques contra a Corrente Comunista Revolucionária (CCR) na França por parte de setores do Novo Partido Anticapitalista (NPA). Suas reflexões são parte de um debate em curso sobre a formação de uma organização socialista revolucionária internacional na França, uma discussão de importância estratégica para os socialistas de todo o mundo.

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“Ousar lutar, ousar vencer”: uma carta aberta aos camaradas da AeR e da L’Étincelle, e aos membros da Tendência por uma Internacional Revolucionária (TRI).

Caros camaradas:

Escrevo esta carta a vocês sobre as recentes atividades e orientações das tendências do Novo Partido Anticapitalista, uma das quais pertence à TRI, a tendência Anticapitalismo e Revolução.

Como vocês sabem, a ex-maioria do NPA, continuadora da “estratégia de partidos amplos” do Secretariado Unificado, está fazendo um ataque contra uma tendência que é ativa entre os trabalhadores e os movimentos sociais, conseguindo agrupar dezenas de jovens trabalhadores e trazê-los para o NPA. Não estamos falando apenas de Anasse Kazib e dos demais ferroviários, mas de camaradas da RATP (empresa de transportes parisiense), da TOTAL de Grandpuits (refinaria de petróleo), dos setor aeronáutico, da educação e da juventude. Estou falando dos camaradas da Corrente Comunista Revolucionária (CCR), editores do diário de notícias Revolution Permanente.

O motivo desse ataque é claro para qualquer pessoa com história no movimento marxista revolucionário. O projeto político da ex-maioria é incompatível com a maioria dos militantes do partido, e para impor o seu projeto é necessário criar uma maioria artificial, excluindo os militantes que compõem a maior tendência da ala esquerda do NPA, a CCR.

Todas as outras razões são usadas ​​para esconder o real motivo. Qualquer pessoa de esquerda que repete essas estupidezas ou não tem consciência política, ou as está usando para objetivos sectários e cínicos.

Qual é o projeto que a ex-maioria deseja impor? Mais uma vez, não é segredo que eles desejam formar um bloco político com a France Insoumise [França Insubmissa] e outros projetos políticos neo-reformistas e centristas como o do Parti de Gauche [Partido de Esquerda]. Basta olhar para a atuação do NPA na Occitanie para ver a direção que a ex-maioria deseja seguir. Em outras palavras, eles apoiam uma versão neo-reformista atualizada da “União da Esquerda” de Mitterand, que é uma “grande união da esquerda” envolvendo, em última análise, o Partido Socialista e os Verdes. Esta é a lógica de orientação deles, não é?

Eles veem o projeto de Mélenchon como uma extensão de sua estratégia de “partido amplo”, que se provou desastrosa do Brasil à Espanha, do México à França. A crise dentro do NPA é precisamente um produto dessa estratégia.

Dando as costas aos camaradas da CCR

Infelizmente, enquanto a ala direita do NPA atacou, algumas seções da ala esquerda recuaram, especialmente as tendências AeR e L’Étincelle. Enquanto pronunciam frases de unidade destinadas a lhes dar cobertura, suas ações na última reunião do Comitê Político Nacional (CPN) falam por si só. Em particular, duas ações se destacam: a primeira é a recusa em apoiar uma moção dos camaradas da CCR que proíbe explicitamente a ex-maioria ou qualquer organismo do partido de excluir a CCR ou qualquer camarada das assembleias do partido. Tanto a AeR como a L’Étincelle recusaram-se a apoiar esta resolução que era clara.

A segunda é o apoio dessas duas tendências para o que parece ser um congresso nacional fictício do NPA, um processo que foi claramente desenhado para excluir os camaradas da CCR. Essas ações dizem muito mais do que qualquer protesto dos camaradas da AeR e da L’Étincelle sobre a defesa da democracia partidária ou da integridade do NPA.

Dando as costas ao projeto da tendência

Não é preciso ser um gênio da política para entender a motivação por trás das atividades desses dois grupos. O caso da AeR é particularmente triste. A AeR é uma organização membro de uma tendência da ala esquerda dentro do EUSecFI (Secretariado unificado europeu) cujo objetivo principal é lutar contra a orientação de “partido amplo” e substituir essa orientação por uma de construir partidos leninistas de trabalhadores revolucionários.

Para tal tarefa, é necessária a destituição do atual grupo dirigente do Secretariado Unificado, e isso inclui os seus membros dentro do NPA, a ex-maioria que segue Mélenchon como produto direto dessa estratégia.

Portanto, a pergunta que todos os membros desta tendência deveriam fazer é esta: por que, quando a esquerda tem a oportunidade de assumir a liderança do NPA, o “carro-chefe” da estratégia de partidos amplos do Secretariado Unificado e reorientar para a construção de um partido revolucionário dos trabalhadores, a AeR abandonou este projeto?

Por que a AeR decidiu desistir frente a este ataque e concordar com a candidatura de alguém da ex-maioria? Um candidato que não refletirá a orientação da maioria dos militantes do NPA, mas que vai abrir o caminho para um chamado de votação em Mélenchon, caso ele chegue assim tão longe.

Um cinismo sem princípios

Na verdade, só há uma resposta para essa pergunta, e ela é muito triste. As pessoas que lideram a AeR são bons militantes, como mostra sua luta em torno dos correios.

No entanto, sua perspicácia política deve realmente ser questionada. Na época da fundação da TRI, os camaradas da AeR argumentavam que tinham o dobro do tamanho da CCR. Hoje a CCR é consideravelmente maior que o AeR e é a maior corrente da ala esquerda dentro do NPA. Na verdade, os camaradas da CCR propuseram um processo de fusão com os camaradas da AeR, já que não havia (até recentemente) diferenças políticas fundamentais (sem incluir desacordos táticos sobre um ou outro assunto).

Agora, porém, o peso político da CCR está aumentando, tanto por causa do crescimento da CCR por meio de sua intervenção na luta de classes, quanto por causa da perda de parte da militância da AeR para L’Étincelle, CCR ou outras correntes.

A incapacidade das lideranças da AeR de se conectar com a nova vanguarda dos jovens trabalhadores do movimento de massa, os leva a usar manobras cínicas dentro do NPA para tentar impedir o avanço da CCR. Isso é, francamente, um cinismo apavorante sem princípio político.

Deixando de lado a questão da falta de coragem dos camaradas da AeR em aproveitar a oportunidade para batalhar pelo fim da estratégia dos “partidos amplos”, algo que toda a TRI se dedicou, o princípio elementar de defesa da democracia dos trabalhadores, do direito da classe trabalhadora de ouvir, discutir e debater os diferentes pontos de vista apresentados pelos representantes políticos da classe está sendo pisoteado por aqueles que colocam temores organizacionais sectários acima da integridade política.

Passei mais de 54 anos como militante político, 50 deles como organizador trotskista. Parte fundamental de ser um trotskista é defender os direitos de tendências políticas com as quais não concordamos, participar dos debates políticos dentro do movimento de massas. Ao se recusar a defender os camaradas da CCR, os camaradas da AeR e da L’Etincelle estão, para usar uma expressão, cortando o galho em que estão sentados.

Os valores são honrados, a covardia será lembrada

Por fim, gostaria de lembrar a esses camaradas que a esquerda tem uma longa memória e que a covardia diante de um ataque nunca é esquecida. Esta carta está sendo escrita no último dia do mês de maio. Cinquenta e três anos atrás, os estudantes do quartier latin se levantaram em justa raiva contra a brutalidade dos policiais. Eles ergueram barricadas, fizeram fogueiras e arrancaram as pedras da calçada, levando ao slogan sous le pave, la plage (Abaixo da calçada, está a praia), onde lutaram bravamente. Esse valor foi recompensado com a maior greve geral na França desde 1930.

Naquela época havia um grupo chamado Federação de Estudantes Revolucionários (FER), uma seção do movimento trotskista liderado por Pierre Lambert. Na noite das barricadas, o FER marchou com seus militantes até as barricadas, viu a intensa luta em andamento e marchou para longe. Apesar de terem sido denunciados por “ultra-esquerdismo” pelo FER e Lambert, aqueles estudantes que lutaram, estando em primeiro lugar nas primeiras filas os camaradas da Juventude Comunista Revolucionária, a célebre JCR, são os lembrados por sua coragem. O FER, por outro lado, nunca viu sua covardia ser esquecida diante de uma batalha real, nem na época, nem mesmo até hoje.

Para os camaradas da AeR e da L’Etincelle, suas ações estão sendo vistas em todo o mundo. Vocês podem se curvar diante dos ataques da ex-maioria e tentar apaziguá-los concordando com seu projeto político, na expectativa de uma vantagem política sobre os camaradas da CCR, ou podem defender com todas as suas forças o direitos da CCR de participar plenamente no NPA e de construir um bloco de esquerda que porá fim à estratégia de partido amplo na França.

Podem ser lembrados ou como a JCR ou como a FER, a escolha é de vocês. Escolham com sabedoria, camaradas.

Ousar lutar, ousar vencer!

Saudações revolucionárias,

Nota: Rob Lyons juntou-se à seção canadense do Secretariado Unificado em 1971, após uma passagem como jornalista que cobriu o outono de Praga de 1968, e como organizador político da Nova Juventude Democrática, o grupo de jovens da ala esquerda do Partido Trabalhista canadense baseado nos sindicatos. Até recentemente, ele era o Coordenador Internacional da Ação Socialista, uma organização trotskista canadense excluída do Secretariado Unificado, assim participou da conferência de fundação da Tendência por uma Internacional Revolucionária. Ele foi piloto de ambulância aérea e em áreas silvestres, organizador sindical e líder sindical eleito. Durante 10 anos foi membro eleito para o legislativo na província de Saskatchewan, Canadá, representando um eleitorado fortemente sindicalizado da classe trabalhadora. Atualmente, ele escreve comentários políticos e milita a partir de um bairro operário no sul da Costa Rica.

 
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