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50 ANOS
Um manifesto “sem vergonha” que abalou a França
Andrea D’Atri
@andreadatri

A declaração publicada em 5 de abril de 1971 na revista Le Nouvel Observateur e assinada por 343 mulheres, exigia a legalização do aborto na França.

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Publicado originalmente em espanhol em 05/04/2021 em La Izquierda Diario México. Clique aqui para ler o original

A capa da revista trazia a "lista das 343 francesas que tiveram a coragem de assinar o manifesto ’Eu abortei’ ". A ideia partiu de uma jornalista da própria revista Le Nouvel Observateur, Nicole Muchnik, que achava que se as mulheres que fizeram aborto falassem publicamente isso teria um grande impacto na luta pela legalização do aborto na França. Nicole entrou em contato com uma das fundadoras do Movimento de Libertação das Mulheres (MLF) e conversou com a filósofa e escritora Simone De Beauvoir.

Além da autora de O segundo sexo, participaram escritoras como Marguerite Duras, atrizes como Catherine Deneuve e Jeanne Moreau, cineastas como Agnès Varda, entre outras personalidades. A publicação do manifesto fez com que 55% da população francesa passasse a apoiar a legalização do aborto, o que, após várias manifestações, foi aprovada em 1975.

Um milhão de mulheres abortam a cada ano na França. (...) Eu declaro que sou uma delas. Eu declaro ter feito um aborto.

As 343 mulheres que assinaram o manifesto apoiaram-se no seu reconhecimento público, na sua fama e no respeito que gozam nas suas áreas, para confrontar o Estado francês que pune as mulheres que abortam com prisão.

Foi a revista satírica Charlie Hebdo que, uma semana depois de ter sido divulgado o manifesto, publicou uma capa zombando da hipocrisia dos políticos franceses, com os dizeres "Quem engravidou 343 salopes?" (Palavra que em francês pode ser traduzida como sem-vergonhas, putas ou prostitutas, que eram os insultos que a direita lançava contra as feministas)

Capa da revista satírica Charlie Hebdo, que deu o nome pelo qual, o manifesto ficou conhecido “Eu abortei”.

Em 1972, a advogada francesa de origem tunisiana Gisèle Halimi defendeu uma adolescente pobre de 16 anos que fez um aborto após ser estuprada pelo namorado com ajuda da sua própria mãe. O argumento da advogada, no conhecido julgamento de Bobigny, que terminou com a absolvição da jovem Marie-Claire Chevallier, abriu outro precedente fundamental para que a legalização do aborto fosse finalmente promulgada três anos depois.

Gisèle Halimi e Simone de Beauvoir, na Assembleia Nacional Francesa durante o debate sobre o aborto em 1974

  • Para ler o texto completo do Manifesto das 343 “sem-vergonhas”, você pode clicar aqui

50 anos se passaram desde aquele confronto das mulheres contra um estado imperialista cruel com aquelas que decidiram sobre seus próprios corpos, mas especialmente cruel com as mulheres mais pobres. Mulheres famosas e respeitadas pelo seu trabalho, colocaram essas (suas) vantagens a serviço de uma causa que nunca mais permitiria que uma mulher pobre fosse presa por fazer um aborto.

O que acontece hoje nas democracias onde já conquistamos direitos perante a lei, onde já não mais se justificam legalmente a desigualdade entre homens e mulheres? Como a desigualdade entre mulheres e homens, ainda dilacerante, continua se reproduzindo, mesmo com a aparente punição da justiça, mesmo com as leis que aparentemente dissolvam essa desigualdade e os discursos públicos aparentemente a repudiem?

Enquanto a sociedade nos diz que basta, que mulheres e homens têm os mesmos direitos e as mesmas possibilidades e que, portanto, não tem o que reclamar pois se trata apenas de "empoderar-se", as mulheres continuam sendo vítimas de feminicídios, a maioria nos empregos mais precários e com os piores salários, a maioria absoluta no trabalho doméstico e novamente a maioria entre os mais pobres, sem trabalho, sem moradia no mundo.

A sociedade capitalista, em que um punhado de parasitas se senta sobre uma montanha de riquezas extraída do trabalho de milhões de seres humanos, ainda dá um rosto feminino à pobreza, à precariedade, ao desemprego, ao analfabetismo e à violência sexista. Contra ela, continuamos a lutar, mesmo quando as propagandas convencionais nos bombardeiam com mulheres bem-sucedidas, que conseguiram se destacar porque não há mais impedimento para o sucesso.

 
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