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OCUPAÇÕES
A escola que queremos
Santiago Marimbondo
São Paulo

As ocupações de escolas feitas pelos secundaristas levantam o debate sobre que educação queremos, uma educação voltada aos interesses dos patrões e dos ricos ou uma educação que represente os interesses dos trabalhadores e filhos dos trabalhadores?

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As ocupações nas escolas tem levantado o debate sobre qual a educação que queremos nós trabalhadores e filhos de trabalhadores. Uma educação mecânica e alienante, que forma para ser mão de obra barata pronta para ser explorada no mercado de trabalho ou uma educação crítica e emancipadora, que nos forme para criar um novo futuro, uma nova realidade; uma educação a serviço e voltada aos interesses dos patrões e dos ricos ou voltada para os interesses da maioria da população, dos trabalhadores e dos oprimidos e seus filhos?

Além disso as ocupações são hoje o principal fenômeno de luta dos oprimidos em nosso país, a luta que hoje aponta as possibilidades criativas da juventude trabalhadora quando essa toma em suas mãos a criação do futuro. Frente a todos os casos de corrupção, que envolvem todos os principais partidos institucionais do regime, a tragédias como a de Mariana causada pelo descaso capitalista e sua sede de lucro, os secundaristas do estado de São Paulo dão uma verdadeira aula de como criar uma relação comunitária, uma sociedade, em que solidariedade, responsabilidade, compromisso com a comunidade, sejam norteadores da criação de novas relações sociais.

Os estudantes dão aula pois mostram a possibilidade de nesse novo momento de luta de classes, com grandes instabilidades políticas, em que novas possibilidades cada vez mais se apontam, tanto à esquerda quanto à direita, de sairmos do falso impasse em que nos encontramos entre uma direita aventureira e um governo petista que ainda tenta se passar por amigo, mas em que a pele de carneiro está cada vez mais rota. Não é a esquerda reconhecida (PSOL, com sua frente povo sem medo, PSTU) que aponta as perspectivas, mas os secundaristas em luta. Não por acaso foram eles os responsáveis pela grande queda de popularidade do governador Alkmin do PSDB que mesmo com todos os problemas de sua administração (casos de corrupção no metro, falta de água, etc) sustentava ainda um alto grau de aprovação entre a população paulista. A luta dos secundaristas mostrou ao conjunto da população a falácia do discurso de bom gestor do governador de São Paulo e além disso mostrou a possibilidade de construirmos alternativas a partir de nossas lutas.
Mas qual deve ser o programa da luta dos estudantes, qual o objetivo a ser levado a frente em sua luta? Devem os estudantes com sua grande mobilização apenas conquistar o fim da reorganização das escolas, mantendo sua educação nas mãos de um governo que representa os interesses dos patrões e ricos ou devem conquistar um novo sistema de educação, auto-gestionado pelos estudantes em conjunto com professores, comunidade escolar e funcionários, que de forma democrática decidam os rumos da educação?

É com o objetivo de dar uma pequena contribuição a esse debate que é escrito esse artigo.

A escola como aparelho de transmissão de ideologia

As formas ideológicas, os signos e símbolos, os conceitos e ideias ,através das quais os seres humanos apreendem a realidade que os cerca não surgem de forma espontânea, imediata, em suas cabeças, ainda mais em uma sociedade dividida em classes como a nossa. As ideologias para surgirem e se reproduzirem contam com aparelhos ideológicos que permitem a sua criação e difusão.

Cada sociedade particular conta com seus próprios aparelhos ideológicos que permitem a criação e difusão das ideias que possibilitam manter e reproduzir a coesão necessária para a manutenção da sociedade; esses aparelhos ideológicos são tantos e diversos quanto tantas e diversas são as sociedades humanas.

Como numa sociedade dividida em classes “conhecimento é poder” as classes dominantes cuidam para que os principais aparelhos ideológicos estejam sob seu controle e representem seus interesses.

Na sociedade capitalista existem muitos aparelhos ideológicos, que criam e difundem ideologia: televisão, rádio, jornais, igrejas e uma longa lista de etc. Um desses principais aparelhos é certamente a escola. Entrando em contato com o jovem desde um momento muito precoce de sua vida é possível à escola moldar e efetivamente adestrar o jovem de maneira muito eficiente, desde o ponto de vista da classe dominante.

A escola e o interesse dos capitalistas

Quando falamos nos interesses dos patrões, dos capitalistas, em relação a esse aparelho ideológico essencial que é a escola temos que mostrar a diferença entre os tipos de escola que existem na sociedade capitalista. A escola no capitalismo reflete as divisões que existem nessa sociedade. Numa visão bem esquemática iremos aqui diferenciar 3 tipos de escola; esse esquema proposto aqui é evidentemente apenas uma primeira aproximação, podendo ser corrigido ou aprofundado a partir de debates que venham a se desenvolver.

a) Uma escola para os filhos dos patrões e dos ricos: esse tipo de escola serve para ensinar os filhos da classe dominante a serem partes dessa classe, ensina a serem dominantes, a mandarem. Irá se caracterizar por uma educação de qualidade que permita a seus estudantes adquirir o conhecimento necessário para exercer uma dada função social e por ser altamente elitizada.

b) Uma escola para os setores médios da sociedade, os gestores, gerentes e pequenos patrões: serve para formar os setores que ocupam uma posição intermediaria na sociedade, que não são nem grandes patrões, capitalistas, nem efetivamente trabalhadores, proletários. Se caracterizará por transmitir a esse setor os conhecimentos técnicos e científicos necessários para que ele exerça sua função social específica na sociedade capitalista, serem os gestores e administradores dos negócios dos grandes capitalistas; em geral no Brasil as escolas que cumprem essa função são as particulares menos elitizadas, mais acessíveis a setores de classe média e as chamadas escolas técnicas.

c) O tipo de escola que mais nos interessa, a escola que serve para formar os trabalhadores, a mão de obra que deve estar pronta para ser explorada pelos patrões: no Brasil essa função é cumprida em geral pelo sistema público de educação. Mas porque hoje é tão necessário para os ricos ter um sistema de educação que transmita ideologia para o conjunto da juventude trabalhadora e dos filhos dos trabalhadores, posto que é algo recente em nosso país um sistema educacional de massas como o que existe hoje?

Porque fruto das transformações tecnológicas pelas quais passou o capitalismo nos últimos 60 ou 70 anos é cada vez mais essencial para os patrões que os trabalhadores tenham um mínimo de educação formal para que possam ser explorados como mão de obra barata. Hoje um trabalhador que não sabe ler e escrever, que não tem um conhecimento mínimo tecnológico e científico acaba sendo praticamente peça descartável na engrenagem da acumulação capitalista.

É necessário, portanto, para os capitalistas construir um instrumento que transmita esses conhecimentos essenciais para que os trabalhadores e trabalhadoras se tornem aptos a serem explorados no mercado de trabalho. E que melhor instrumento seria esse que a escola nas mãos do estado capitalista?

Outro fator ainda do porque a escola é um instrumento essencial para os capitalistas; nós não somos como as formigas ou as abelhas, não nascemos com uma determinação fisiológica ou biológica sobre a função ou papel que iremos ocupar na sociedade, ninguém nasce biologicamente patrão ou trabalhador, mas nos tornamos isso socialmente, temos que ser educados para cumprir essas funções. É necessário, portanto, para os capitalistas nos educarem (nos adestrarem, para falar a verdade) para que ocupemos a função que dentro do ponto de vista deles deve ser a nossa. Temos que ser educados para obedecer, ter a disciplina imposta de forma autoritária, para respeitar a hierarquia e as regras das quais não participamos da formulação. A escola cumpre também essa função essencial para os capitalistas, ensinar aos filhos dos trabalhadores a obedecer, a serem submissos e retraídos, sem criatividade.

Não são por acaso as grades, os sinais, os muros, o autoritarismo, a rígida hierarquia, a disciplina imposta, a falta de participação dos estudantes na formulação das regras e dos rumos da escola; são partes essenciais da “educação” que os capitalistas tentam nos impor e é isso que devemos querer transformar.

A escola que queremos

Do exposto acima não se deve tirar a conclusão que não temos nada a defender na escola tal como ela é hoje, muito pelo contrário. Contraditoriamente para poder nos explorar mais os capitalistas tiveram que nos transmitir conhecimentos e criar um instrumento para isso, mesmo que de forma parcial e limitada, que devemos defender com unhas e dentes. Devemos certamente lutar contra a “reorganização” das escolas (na verdade sua desorganização) e ainda mais, devemos lutar para que mesmo a escola nas mãos dos patrões e dos ricos seja melhor do que ela é hoje. Menos estudantes por salas de aula, mais escolas, mais verba para a educação, contratação de mais professores, por uma educação em que os estudantes tenham mais voz e participação, onde eles possam participar das decisões de forma democrática são todas demandas certamente legítimas.

Mas a força das mobilizações e a capacidade demostrada pelos estudantes de gerir as escolas sob seu controle, os avanços de educação que se dão nessas escolas, o desenvolvimento da criatividade, responsabilidade, consciência social desses jovens, a luta contra as opressões, contra o machismo, o racismo, a homofobia, que acontece nas escolas ocupadas, o papel emancipador que tem a educação que hoje acontece nesses espaços mostra que podemos lutar por muito mais do que uma escola igual ou melhor nas mãos do governo que defende os interesses dos capitalistas.

Os exemplos mostrados acima e a coordenação demostrada pelos estudantes de forma espontânea coloca a possibilidade, necessidade, de que lutemos por um novo tipo de escola, por uma novo sistema de educação, onde as escolas sejam auto-geridas, de forma democrática, por estudantes, professores, funcionários e comunidade escolar e que esses setores juntos possam decidir os rumos da educação, tendo como perspectiva um ensino emancipador e crítico, criativo e sensível, artístico e humano, que seja a base de relações sociais novas.

 
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