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OPINIÃO
As vacinas entre lucros bilionários e possíveis efeitos adversos: estão nas mãos de quem?
Fernando Pardal

Mortes após a administração da vacina da Pfizer e que possivelmente apresentariam uma relação com o imunizante colocam em primeiro plano a questão sobre a responsabilidade das empresas e do Estado em casos de reações adversas na população.

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Foto: Justin Tallis/AP

A situação de emergência promovida pela pandemia fez com que os imunizantes pesquisados por distintos gigantes da indústria farmacêutica, como Pfizer, AstraZeneca e Sinovac fossem liberados para uso emergencial, ou seja, antes que todas as etapas de testes exigidos em situações normais fossem finalizadas. Hoje, a aplicação destas vacinas em larga escala garante um lucro bilionário às empresas responsáveis por sua produção, mas, frente à celeridade da sua testagem e aprovação de seu uso por agências reguladoras dos governos em diversos países uma questão precisa ser respondida: quem será responsabilizado caso ocorram situações adversas, com efeitos colaterais para a população que está sendo imunizada? E, além disso, porque os governos não garantem imunizantes em quantidade suficiente para que todos tenham o direito, se assim quiserem, de tomas as vacinas? O que é necessário para garantir esse direito?

Com o início da imunização na população, notícias tem vindo à tona que alimentam suspeitas sobre as possibilidades de efeitos colaterais graves. Uma delas foi a morte de 33 idosos na Noruega desde o início da vacinação com o imunizante da indústria alemã Pfizer. A Agência Norueguesa de Medicamentos se apressou em afastar qualquer suspeita de relação entre as mortes dos idosos e a administração das vacinas. “Em lares de idosos noruegueses, uma média de 350 a 400 pessoas morrem por semana. Muitos dos que vivem em lares de idosos têm doenças subjacentes graves, como insuficiência cardíaca, demência, derrame”, disse Steinar Madsen, diretor da agência. “Enquanto você estiver vacinando os mais fracos e vulneráveis é provável que haja mortes próximas ao momento da vacinação em si”, justificou ele ao se dirigir à imprensa. No entanto, ele mesmo deixou a entender que existe risco para pacientes com a saúde mais debilitada, ao afirmar “Não estamos alarmados com isso. É bastante claro que essas vacinas têm muito pouco risco, com uma pequena exceção para os pacientes mais frágeis”.

A própria agência deu início a um processo de investigação, que até o momento investigou 13 das mortes e apontou, de acordo com Sigurd Hortemo, médico-chefe da instituição, que "Os relatórios sugerem que reações adversas comuns às vacinas de mRNA, como febre e náusea, podem ter contribuído para um desfecho fatal em alguns pacientes frágeis". Após as mortes, o Instituto Norueguês de Saúde Pública atualizou seu guia de vacinação, instruindo a avaliar e pesar os possíveis riscos e benefícios de administrar a vacina na população com esse perfil. Um trecho do guia diz: "Para aqueles com fragilidade mais grave, no entanto, mesmo os efeitos colaterais da vacina relativamente leves podem ter consequências graves. Para aqueles que têm um tempo de vida restante muito curto, o benefício da vacina pode ser marginal ou irrelevante". Até o momento das mortes, haviam sido vacinadas 48 mil pessoas no país. Cabe ressaltar que os estudos sobre a vacina antes de sua liberação não incluíram voluntários com doenças instáveis ou agudas, como pode ser o perfil dos idosos que morreram em consequência dos efeitos colaterais. Isso coloca uma primeira questão que é falta de acesso aos estudos que fundamental a liberação das vacinas: para além dos dados superficiais divulgados, o grande público e mesmo cientistas independentes não tem como saber exatamente como são conduzidos esses estudos fundamentais para garantir que esses imunizantes são seguros e eficazes.

O caso da Noruega não é o único que levanta a questão dos efeitos colaterais e mortes. Nos EUA, um médico de 56 anos, Gregory Michael, morreu 16 dias após ter recebido a vacina da Pfizer no dia 18 de dezembro. Sua esposa, Heidi Neckelmann, relatou sobre o marido, que, ao contrário dos idosos noruegueses, “Ele estava com muito boa saúde, não fumava, e álcool bebia de vez em quando, apenas socialmente. Ele fazia exercícios, tínhamos caiaques, era pescador de alto mar.” Três dias depois de receber o imunizante, Michael percebeu manchas vermelhas nos pés e nas mãos. Ao ser internado, foi diagnosticado com púrpura trombocitopênica idiopática, uma doença auto-imune em que o organismo ataca as próprias plaquetas sanguíneas, responsáveis pela coagulação sanguínea. No dia 3 de janeiro Michael sofreu um derrame cerebral e morreu. Sobre seu caso, a Pfizer informou à imprensa que tomou conhecimento da morte “altamente incomum”, mas afirmou: "Não acreditamos, neste momento, que haja qualquer conexão direta com a vacina."

Em Portugal, outro caso chamou a atenção: Sonia Acevedo, uma trabalhadora da saúde de 41 anos, foi uma das 538 funcionárias do Instituto Português de Oncologia que recebeu o imunizante da Pfizer-BioNTech. No dia 30, Sonia recebeu a vacina, e no dia 31 de dezembro sofreu morte súbita em sua casa. O hospital afirmou ao jornal Estadão, no dia 7 de janeiro, que resultados preliminares da autópsia indicaram que a morte de Sonia não estaria relacionada à vacina.

Outros relatos de mortes ocorridas após a administração do imunizante da Pfizer-BioNTech foram relatados nos EUA por meio do Vacine Adverse Event Reportin System (VAERS), um sistema que recebe notificações de efeitos adversos ocorridos após a administração de imunizantes. Estes incluem o caso de um homem de 66 anos do Colorado que no Natal, que um dia após receber a vacina foi encontrado em sua cama morto; ou um homem de 53 anos de Dakota do Sul que recebeu o imunizante no dia 4 de janeiro e morreu no mesmo dia após sentir as “pernas pesadas”. As investigações sobre tais mortes devem ser feitas por comissões independentes que possam dizer com segurança se estão ou não relacionadas aos efeitos do imunizante da Pfizer-BioNTech.

Um artigo publicado pelo Center for Disease Control and Prevention (CDC) fez um levantamento com base nos casos reportados ao VAERS que apontou, entre os dias 14 e 23 de dezembro, 21 casos de anafilaxia – um caso muito grave de reação alérgica que pode levar a óbito – em um universo de 175 reações alérgicas graves ocorridas após a administração da vacina da Pfizer. Até o momento, haviam sido ministradas 1.893.360 doses do imunizante, o que levaria a proporção de 11,1 casos por milhão de doses administradas. Contudo, como o próprio artigo indica, os dados sofrem viés devido a sua fonte por recepção passiva nos bancos de dados do VAERS – ou seja, só chegam os casos que são informados por iniciativa dos próprios serviços de saúde.

Um artigo publicado no Le Monde Diplomatique relata o vazamento de documentos da Agência Europeia de Medicamentos nos quais se pressionava pela liberação rápida do uso da vacina da Pfizer. Tratam-se de e-mails trocados entre os dias 10 e 25 de novembro entre diversos responsáveis pela agência. Ainda que tenha dito que os e-mails foram “manipulados” por hackers, a agência admitiu ao Le Monde que “os e-mails divulgados refletem os problemas e discussões que ocorreram”. Ali se falava sobre a falta de dados em relação à vacina, a falta de inspeção de algumas fábricas responsáveis pela produção do imunizante, e que existiam dados evidenciando diferenças qualitativas entre as vacinas que haviam sido utilizadas nos testes e aquelas que seriam distribuídas comercialmente. Um exemplo dessas diferenças de qualidade está na porcentagem de RNA “integrado”, a sequência que permitiria a produção da proteína Spike e a consequente imunização. Nas vacinas utilizadas nos testes clínicos havia entre 69% e 81% de RNA integrado, enquanto em alguns lotes da vacina a ser comercializada essa porcentagem chegava a oscilar entre 51% e 52%. A discussão apontava que isso poderia não apenas comprometer a eficácia da vacina, mas também sua segurança.

Também o Wall Street Journal noticiou que um informante diretamente envolvido com o desenvolvimento das vacinas alegou que alguns dos primeiros lotes de matéria-prima do imunizante não estavam dentro dos padrões exigidos – o que confere com os dados contidos nos e-mails vazados na Europa –, o que fez com que a previsão da produção das vacinas fosse reduzida de 100 para 50 milhões em 2020. A empresa também anunciou que devido a uma reforma para ampliação de sua fábrica na Bélgica, reduziria a quantia de vacinas entregues este ano. A notícia da redução fez as ações da empresa caírem 2% em um dia no início de dezembro. Curiosamente, o presidente da empresa havia vendido 62% de suas ações no dia em que a eficácia da vacina foi anunciada, pelo valor de US$ 5,6 milhões. Apenas nesse dia, as ações da Pfizer haviam subido 15%.

Enquanto isso, nos meses que precederam os lançamentos das vacinas, todos os laboratórios responsáveis pelo desenvolvimento das vacinas viram suas ações dispararem e seu valor de mercado crescer. A Moderna, por exemplo, cujas valorização chegou a 354% em 2020 até o mês de novembro, antes possuía valor de mercado de US$ 6 bilhões, e está hoje no patamar de US$ 62 bi; já a Novavax, cujo imunizante está em fase de testes, passou de US$ 205 milhões para US$ 8 bilhões; a Pfizer, entre fevereiro de 2020 e janeiro de 2021, se valorizou 5%, chegando a US$ 204 bilhões; a AstraZeneca se valorizou 6%, atingindo US$ 133 bilhões; a Johnson & Johnson, subiu 11% e chega a US$ 428 milhões. Especuladores de Wall Street estimam que apenas as farmacêuticas Pfizer e Moderna irão lucrar US$ 32 bilhões em 2021 com a venda de vacinas. A Moderna, em 2019, teve um faturamento global de US$ 60 milhões; e em 2021, o banco Goldman Sachs projeta receitas de US$ 13,2 bilhões para a empresa apenas com a vacina.

Todos esses fatos nos remetem a questões elementares que não podem ser ignoradas: quando falamos das vacinas para a Covid-19 não estamos apenas tratando de uma questão de saúde pública, mas de um negócio bilionário que está sendo disputado ferrenhamente por empresas muito poderosas que utilizam os governos como seus testas-de-ferro nesse embate. No Brasil, por exemplo, vemos não apenas uma disputa evidente entre o governo federal de Bolsonaro e o governo de São Paulo de Doria para ver quem é capaz de capitalizar politicamente a pandemia, mas também entre as gigantes farmacêuticas por trás.

Enquanto se alardeia que o “Instituto Butantã” seria o responsável pela Coronavac, se omite o fato de que é a Sinovac, gigante farmacêutica chinesa, que é a proprietária da vacina e que irá lucrar bilhões com esta – cada dose irá custar US$10,30, aproximadamente R$ 54 aos cofres públicos. O atraso de semanas na divulgação do resultado dos estudos, bem como o fato de que quando finalmente foram divulgados apresentavam distorções grosseiras (como o fato de que sua “cura de 100% dos casos graves” divulgada era baseada em uma suposta evidência do estudo, mas que na verdade era estatisticamente irrelevante), são uma demonstração disso. O preço pago por outros imunizantes pode ser ainda mais elevado, como os 18 dólares por dose (cerca de 95 reais) pagos pela União Europeia à Moderna por cada dose. Bolsonaro, que fracassou até mesmo na compra de vacinas da AstraZeneca/Oxford na Índia, não à toa procura comprar os imunizantes da empresa inglesa, enquanto “demoniza” o concorrente chinês. Toda a imprensa, que hoje se alinha com João Doria e o bloco do bonapartismo institucional nessa disputa, denunciam a incompetência de Bolsonaro para garantir a compra das vacinas. Contudo, o que não é dito pela grande imprensa e pelos governos é que, se as patentes dessa vacina fossem quebradas, os insumos poderiam ser produzidos aqui mesmo no Brasil, como afirmou a reitora da Unifesp, Soraya Smaili, o que garantiria não apenas uma massividade muito maior da produção, mas um custo muito menor, e, portanto, a possibilidade de muito mais vacinas disponíveis em um prazo muito mais curto. Isso, no entanto, não é defendido em nenhum grande meio justamente porque toca nos lucros bilionários das farmacêuticas.

Outro fato muito relevante é que nenhum dos governos garantiu a condição mais elementar para enfrentar a pandemia, que seria a testagem massiva para que se pudessem planejar medidas efetivas de contenção e tratamento; hoje, dizem demagogicamente que estão garantindo as vacinas massivamente, mas o que vemos é uma situação em que temos 3 milhões de vacinas para uma população de mais de 200 milhões. Ou seja, a compra de uma quantidade irrisória de vacinas não está atrelada não a um plano eficaz de combate à pandemia, mas à demagogia na disputa política entre Doria e Bolsonaro, bem como à necessidade de lucro bilionário das empresas. Doria fez o acordo do Instituto Butantã com a Sinovac para favorecer seus parceiros comerciais, enquanto Bolsonaro fez sua tentativa de comprar da AstraZeneca, monopólio britânico. A quebra das patentes poderia garantir a produção de insumos no país e a produção muito mais rápida e eficaz, mas os governos não fazem isso por respeitarem o "sagrado direito" à propriedade privada e priorizar os lucros das farmacêuticas sobre as vidas da população.

Não há transparência alguma nos debates sobre eficácia, sobre riscos, sobre os planos de vacinação e para que os imunizantes sejam amplamente disponibilizados para todos os que queiram, como nos mostram a disputa brasileira, mas também os e-mails vazados da Agência Europeia de Medicamentos. Ao invés de uma cooperação para salvar vidas, há uma disputa entre empresas e governos por lucros. Nas testagens e na produção acelerada dos imunizantes, as empresas também procuram se isentar da responsabilidade por possíveis mortes e efeitos colaterais, que podem ocorrer com qualquer medicamento novo, e com muito maior probabilidade quando são aprovados da forma como está ocorrendo em meio à pandemia.

É fundamental lutarmos para que essas empresas e os governos sejam diretamente responsabilizados por qualquer efeito adverso que possa ocorrer devido à administração dos imunizantes. Que sejam feitas investigações independentes para averiguar cada denúncia e caso de óbito possivelmente atrelado aos imunizantes, e que todos os testes feitos para a aprovação dos imunizantes sejam de acesso público. É preciso tirar as vacinas das mãos dos empresários que lucram com elas e colocar à disposição da população, e para isso é necessário quebrar as patentes, permitindo sua produção barata e seu conhecimento acessível, e fomentar as pesquisas independentes que não estejam subordinadas aos interesses empresariais. É necessária a contratação massiva de funcionários para produzir as doses necessárias para garantir a vacinação de todos os que queiram.

Além disso, já existem inúmeras pesquisas sobre tratamentos seguros, baratos e eficazes feitos em diversos países, e diversas aplicações sendo utilizadas em larga escala, bem como diversos tratamentos novos que estão sendo investigados em todo o mundo, como no próprio Instituto Butantã um tratamento baseado no mesmo princípio dos soros antiofídicos utilizados contra veneno de cobras. Essas pesquisas devem ser alentadas, para que se possa colocar todo o esforço científico em busca de soluções eficazes para a pandemia, combinados com a vacinação. Além disso, é fundamental garantir que a população contaminada tenha um isolamento efetivo e eficaz, com o confisco de hotéis, resorts e SPAs onde recebem alimentação adequada e todos os cuidados necessários para que possam zerar a carga viral e não transmitir o vírus, bem como um verdadeiro auxílio pandemia de R$ 2 mil para garantir o sustento das famílias. Tais alternativas não recebem a mesma atenção não por sua ineficácia, mas porque não significam lucros bilionários. Nossa luta deve ser para combater a pandemia da maneira mais eficaz, por todos os meios possíveis, lutando para preservar cada vida.

É necessário imediatamente um plano científico de vacinação que dê condições à imunização universal da população, e não apenas de uma parte mínima dela, como querem Bolsonaro e Doria. São ambos responsáveis pela catástrofe sanitária, e sequer possuem seringas para a campanha de vacinação da população. Sabemos que os trabalhadores da saúde, junto aos da metalurgia, da logística, etc., se possuíssem em suas mãos o controle da economia e das pesquisas, poderiam organizar com êxito todas as condições para a execução de um plano racional de imunização universal. Por isso defendemos que controlem a produção e a distribuição da vacina. Se Bolsonaro e Doria são incapazes de garantir o básico, como demonstram na prática, que sejam os trabalhadores os que tomem nas mãos essa tarefa, organizados pelos sindicatos, e garantam a disponibilização universal da vacina a todos. Da mesma forma, nos colocamos contra todo tipo de método autoritário e policialesco de imposição da vacina, como propõe o STF, que quer demitir por justa causa quem se recusar a tomar a vacina.

 
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