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CONFERÊNCIA LATINO-AMERICANA E DOS EUA
Christian Castillo: "O desafio é construir partidos revolucionários e a IV Internacional"
Redação

Confira a intervenção de Christian Castillo, dirigente do PTS na Argentina e integrante da Fração Trotskista - Quarta Internacional (FT-QI), na abertura da sessão final da Conferência Latino-Americana e dos EUA.

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Ontem, 01 de agosto, ocorreu a sessão de encerramento da Conferência Latino-Americana e dos EUA. A conferência foi impulsionada pela Frente de Esquerda dos Trabalhadores da Argentina, reunindo organizações e partidos socialistas de todo o continente americano, e já teve sessões na quinta e sexta-feira.

Companheiras e companheiros, em primeiro lugar quero dar uma saudação fraterna à todas as delegações presentes, tanto da parte do meu partido, o PTS, como do conjunto das organizações que conformam a Fração Trotskista - Quarta Internacional, da América e Europa. Com elas, impulsionamos a Rede Internacional La Izquierda Diario, presente em 14 países, 7 idiomas diferentes e que tem chegado a 13 milhões de acessos mensais. São jornais de combate da nossa militância, que intervém na luta de classes defendendo um programa transicional e uma estratégia revolucionária socialista e que têm mostrado seu papel nos eventos mais relevantes da luta de classes, como na luta contra o golpe na Bolívia ou o levante chileno - onde fomos perseguidos pelos governos - nas grandes lutas operárias na França, ou agora na rebelião nos Estados Unidos.

Queremos partir de reivindicar os documentos de convocação para esta Conferência. Em primeiro lugar porque estabelecem uma delimitação política e programática clara com os diferentes agrupamentos da burguesia na região, desde o pró-imperialista Grupo de Lima até o Grupo de Puebla, uma versão desfalcada e mais à direita do Foro de São Paulo, um agrupamento que, hoje, todos criticamos, mas que em sua fundação junto a correntes nacionalistas, de centro-esquerda e stalinistas, integraram o velho MAS e também os companheiros do PO, que foram parte entre 1990 e 1995, quando também era integrado pelo Frente Grande de Chacho Álvarez. Contra a colaboração de classes que expressava e segue expressando aquele Foro, fundado há 30 anos, devemos opor a luta consequente pela independência de classe que defendemos nesta conferência.

A convocatória propõe dez eixos programáticos, que incluem demandas transicionais fundamentais para que a classe trabalhadora irrompa no cenário político e imponha que a crise seja paga pelos capitalistas. Estes pontos e definições programáticas progressivas são um marco para o desenvolvimento dos debates que estamos fazendo nessa conferência. Porque não se trata de “unir os revolucionários” em geral, mas sobre quais bases programáticas e estratégicas se realiza a unidade, como dizemos na Frente de Esquerda - Unidade na Argentina. Por isso nossa proposta de editarmos juntos um boletim para continuar esses debates, que vai junto com as propostas de intervenção e campanhas de ações em comum que vamos votar nesta tarde.

Como foi dito aqui, a rebelião nos Estados Unidos antecipa o que vem pela frente e impacta todo o continente, com governos que de uma ou outra maneira se subordinam à política de Trump. Em todo o mundo, os governos e as patronais estão descarregando a crise sobre os ombros do povo trabalhador. Do outro lado, multimilionários tem incrementado obscenamente suas fortunas. Na América Latina e no Caribe, os mais ricos viram crescer suas fortunas em 48.200 milhões de dólares desde março deste ano.

A contradição capitalista, já identificada por Marx, da concentração da riqueza em um lado e da miséria no outro, se mostra crua e nua em crises como a que estamos atravessando. Diante disso o progressismo mundial se ilude que a crise signifique um retorno ao intervencionismo estatal, que retrocedeu durante o neoliberalismo. Lembremos que a ideia do Estado como órgão capaz de superar as contradições sociais já estava presente em Hegel (antecipando o chamado “Estado de bem-estar”), como visão distinta da concepção do Estado como “guarda noturno”, proclamada pelo pensamento liberal. Essa concepção de Hegel foi oportunamente criticada pelo jovem Marx na Crítica da Filosofia do Direito.

Em seu último livro “Capitalismo e Ideologia”, de 1400 páginas, Thomas Picketty mostra como cresceu brutalmente a desigualdade social em todo o mundo durante o neoliberalismo, voltando aos níveis de antes da primeira guerra mundial. Diante dessa verdadeira expressão de guerra do capital contra o trabalho, desenvolvida nas últimas quatro décadas, se ilude com uma redistribuição de renda e riqueza limitada, a partir de impostos progressivos. Porém, o certo é que propostas como essa não só são apenas gotas d’água no oceano da miséria capitalista, como também o que estamos vendo no mundo é uma gigantesca intervenção estatal, não para redistribuir a favor dos trabalhadores, mas para resgatar o grande capital e reproduzir os esquemas de acumulação herdados da ofensiva neoliberal. Os endividamentos crescentes dos Estados vão ser novamente pagos com cortes e ajustes para o povo trabalhador, como vimos logo após a crise de 2008. Somente um programa transicional para que os capitalistas paguem pela crise, que proponha a mobilização das massas para impor governos de trabalhadores em ruptura com o capitalismo - como colocamos na convocatória para esta conferência - pode evitar esse destino.

Junto com os importantes acordos que expressamos nos documentos de convocação, uma série de discussões e diferenças foram expressadas anteriormente e nos debates realizados, alguns dos quais a que vou me referir.

Em primeiro lugar, queria mencionar o caráter da época que atravessamos, a partir do que colocaram os companheiros da UIT de que, para além de disputas, não estaria colocada a possibilidade de uma guerra entre Estados Unidos e China, devido à presença das multinacionais estadunidenses no país asiático. Se fosse assim, o capitalismo teria se transformado em uma das variantes que, contra Lênin, defendiam Kautsky ou Hilferding, de “super imperialismo” ou “ultra imperialismo”, que descartavam a guerra como perspectiva, baseando-se justamente em um ciclo de internacionalização das forças produtivas.

Não podemos esquecer que Trotsky, já em meados da década de 1920, destacava que a competição entre Estados Unidos e as potências imperialistas europeias criava tendências a uma nova guerra mundial. Para nós, seguimos atravessando uma época de “crises, guerras e revoluções”, não só de “crises e revoluções”. Apesar do desenvolvimento que teve a internacionalização da produção, o comércio e as finanças capitalistas, as disputas entre os Estados seguem crescendo.

As crises de grande magnitude, como foi a dos anos 30 do século XX, ao agudizarem as contradições entre os Estados dominantes, aceleram as tendências à guerra, que somente um conjunto de revoluções socialistas triunfantes podem evitar. Se um Estados Unidos em declínio e uma China em ascenso vão à guerra em um período mais ou menos próximo, ou se as rivalidades crescentes se expressam em guerras por terceiros ou se mantém no terreno de guerras comerciais, é algo que depende de muitos fatores, entre outros o desenvolvimento da crise em curso. Mas o certo é que desde a crise de 2008, que quebrou o consenso burguês “globalizador”, e ainda mais desde a posse de Trump e a adoção nos Estados Unidos de uma política “anti-China”, que compartilha com os democratas, temos que destacar com clareza que essa perspectiva está aberta e que, se a revolução social não altera o curso dos acontecimentos, o capitalismo nos levará a guerras catastróficas como as que vimos no século anterior.

Por outro lado, vemos um perigo oposto em ver que as tendências agressivas e belicosas do imperialismo ianque sejam o argumento para buscar justificar acordos com correntes stalinistas que consideram como progressivos um Putin na Rússia ou o regime de Xi Jinping na China. Nesse sentido, queremos destacar que nos parece um erro a conferência que fizeram em 2018 os companheiros do PO com o Partido Comunista Unificado da Rússia para avançar em uma confluência internacional, um partido que reivindica Stalin e com boas relações com Putin.

Uma segunda questão que eu queria colocar é que, para nós, não é possível superar as direções nacionais e populares, ou centro-esquerdistas, se mistura-se bandeiras com a direita. Nem o autoritarismo de Maduro, nem as críticas a Evo Morales podem justificar marchar junto a Guaidó e as distintas variantes da direita venezuelana, ou com os golpistas bolivianos, considerando “rebeliões populares” levantamentos promovidos pela direita e o imperialismo. É uma posição liberal, democratizante, não marxista. A mesma coisa no Brasil: a oposição aos cortes de Dilma e ao governo do PT não podia justificar apoiar o golpe institucional no Brasil ou a proscrição e a prisão de Lula, falando de se prender todos os corruptos, como se está levantando fundamentando-se na operação Lava Jato, promovida pelo imperialismo estadunidense.

Por último, gostaria de falar sobre como lutar consequentemente pela independência de classe e por colocar de pé partidos revolucionários. Como articular a “intransigência ideológica e a flexibilidade tática” de que nos falava Lênin? Temos claras diferenças com os companheiros que, em nome do segundo, justificam a participação em frentes amplas de centro-esquerda, como a Frente Ampla do Peru ou Uruguai, que levantam claramente uma perspectiva oposta à independência de classe pela qual luta a FIT-U na Argentina. Outra discussão é com os que afirmam que pequenos núcleos de revolucionários podem encontrar um caminho até as massas sem utilizarem-se de diferentes tipos de táticas, como participar em certas condições nos “partidos amplos anticapitalistas” para enfrentar a estratégia oportunista de suas direções, não sempre e em qualquer circunstância, mas analisando cada situação concreta e estabelecendo limites de classe claros (por exemplo, se esses partidos assumem ou não responsabilidades executivas ou se integram plenamente em frentes populares).

O que aconteceu no NPA da França nos dá a razão plenamente, com o avanço das forças revolucionárias no seu interior a partir de uma intervenção audaz nos grandes fenômenos desenvolvidos na luta de classes nos últimos anos, como os jalecos amarelos ou a greve contra a reforma previdenciária. Esse é um importante avanço da esquerda no NPA, que está levando a direção, proveniente da antiga LCR, a comunicar através do seu jornal Le Monde que está disposta a provocar a ruptura do partido antes que sua ala esquerda siga avançando. Nossos críticos não têm nada para mostrar em troca desses avanços que temos conseguido dentro da esquerda revolucionária francesa. Nisso, o PTS e a Fração Trotskista não fazemos mais do que seguir os conselhos que Trotsky deu aos seus seguidores na década de 30 do século passado. Nos Estados Unidos, por exemplo, deu quatro táticas diferentes de construção partidária em poucos anos. Foi a mesma coisa no caminho percorrido até a fundação da IV Internacional, onde passou de fração da Internacional Comunista à tendência independente e da promoção do chamado “Bloco dos Quatro” à pôr de pé uma nova internacional, pouco depois da ruptura com os anti-defensistas no Socialist Workers Party. A utilização dessas e outras variantes táticas serão inevitáveis no período de agudização da luta de classes que temos adiante.

Companheiras e companheiros, como colocava Lênin, a consciência socialista não surge da luta espontânea dos trabalhadores. É necessário uma organização que, diante de cada ataque sofrido pelas massas, mostre a necessidade de derrubar a ordem existente. A luta por construir partidos revolucionários de combate em nossos países e pela reconstrução da IV Internacional é a perspectiva com a qual abordamos desde nossa corrente os debates que temos em curso nessa conferência.

Muito obrigado, companheiras e companheiros.

Veja o vídeo completo da sessão de encerramento da conferência:

 
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