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RELATO
Como é ter suspeita de Covid-19 sendo uma trabalhadora da Fhemig?
Maré
Professora designada na rede estadual de MG

Uma delas - técnica em enfermagem, é do grupo de risco, mora com quem também é, mãe, avó – relatou como é estar nessa situação por culpa de Bolsonaro, Romeu Zema e da direção da Fhemig. A trato aqui como Adriana, um pseudônimo para resguardar sua segurança política frente às perseguições aos trabalhadores que lutam.

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“Fiz o teste hoje, o resultado sai em dois dias”. Adriana teve sintomas e precisou tirar licença por 10 dias e fazer um teste. “Acho errado a gente tem que sair passando mal lá para o Eduardo de Menezes para fazer o teste, tinha que ter em todas as unidades.” É que no hospital onde ela trabalha não tem testes para os funcionários, mesmo que já hajam dezenas de colegas infectados e inclusive há casos graves, no CTI. “Eu saí de casa passando mal, fiquei em torno de duas horas aguardando ser atendida, lá naquela distância, transitando por aí, tenho quase certeza que estou com vírus, o médico me falou que tudo indica que estou com Covid. Todo servidor independente de sintomas ou não deveria fazer o teste”.

Mas a Fhemig se nega a testar os trabalhadores, chegando ao nível drástico de haver um surto de Covid-19 no Hospital João XXIII, com contágio de pacientes, ao que tudo indica, feito por funcionários, como os próprios trabalhadores denunciaram em sua assembleia na última quarta-feira. Vai além: chegou ao ponto de orientar que aqueles que estão comprovadamente com Covid, mas não têm sintomas, que trabalhem normalmente. Nessas horas o diretor da Fhemig, que é médico, esquece todo o seu conhecimento em medicina – se não fosse isso, saberia que os assintomáticos transmitem a doença – e só sabe calcular números: o quanto o Estado, que vive isentando os impostos dos mega empresários, economiza em testes e licenças remuneradas, mesmo que o dinheiro custe vidas essenciais de trabalhadores da saúde.

Preocupada? Sim, tem filhos, netos lindos que são seu xodó, é do grupo de risco, convive com seu marido que também é. Se você é do grupo de risco – perguntei – por que não recebeu uma licença no início da pandemia? “Não pedi, senão perco a ajuda de custo. Inclusive vou perder os 10 dias de licença. Atestado médico, férias a gente perde ajuda de custo. Muitos preferem trabalhar doentes.” – para entender melhor, leia aqui. Mas, para resumir, o salário desses trabalhadores é muito baixo. O que os impede de passar grandes necessidades são alguns adicionais, mas, como eles não são parte do salário, é preciso arriscar sua vida e a de outras pessoas para que o dinheiro a receber por seu trabalho seja suficiente para alimentar a si e às suas famílias.

“Estou com muita dor no peito e nas costas o médico não me pediu nenhum raio-x, pelo meu quadro tinha que fazer um raio-x pelo menos”. Tinha mesmo, Adriana. Afinal, quem cuida dessas que cuidam? As vidas de quem salva vidas importam realmente? Como me disse uma vez uma colega de Adriana: a enfermagem está sendo levada para o abatedouro. O Brasil é o país com mais mortes de profissionais da saúde por Covid-19. É o país que há décadas precariza o SUS, com sucessivos cortes de verbas. É onde hoje governa um presidente que odeia os trabalhadores, principalmente se forem mulheres, negros, indígenas, LGBTs, imigrantes. No Brasil de capitalismo atrasado, a burguesia nacional arranca suor e sangue do nosso povo para bater continência para a bandeira dos EUA e entregar religiosamente rios de dinheiro para imperialistas e banqueiros. Em Minas Gerais, essa cartilha é seguida com entusiasmo.

O cálculo deles? “Essas vidas estão nos trazendo lucro? – pode estar pensando agora um empresário do agronegócio, da indústria farmacêutica ou até um tubarão da saúde com seus hospitais e convênios caríssimos – Se sim, que vivam, ainda que dá forma mais desumana... Caso contrário, abram as valas coletivas para aqueles e aquelas que morrem sem ter acesso a tudo o que produziram e foram forçados a nos entregar. Afinal, temos a polícia em nossas mãos.”

“Esse Zema acha que nós somos mercadorias dele”. Pior, sabe muito bem que nossa força de trabalho é uma mercadoria que produz tantas outras, a mercadoria mais lucrativa que existe. E por isso quer aprovar no Estado a reforma da previdência, para sugar essa lucratividade dos nossos braços, pernas e mentes até o nosso último suspiro, sem nos deixar ter descanso após trabalhar por décadas.

E é mais ou menos por essa lógica que chegamos à situação que Adriana, angustiada, me relata: “O nosso setor está ficando sem servidor para trabalhar, todos adoecendo, bato na mesma tecla da roupa privativa que não temos. Tem um andar lá no hospital com enfermeiras isoladas e sem ventilação suficiente”. Sem ventilação suficiente; sem as máscaras mais seguras na quantidade necessária; sem óculos, capotes, álcool, lenços descartáveis o quanto for preciso; sem roupas privativas disponíveis para cada trabalhador; sem testagem massiva e constante de todos os profissionais; sem licenças realmente remuneradas, que não tenham desconto da ajuda de custo... Em outras palavras, sem condições de salvar vidas.

Mas, mesmo assim, elas salvam vidas! Não são heróis nem heroínas, amam o que fazem, mas estão morrendo e não querem ser mártires. Na verdade, são algo ainda mais potente: trabalhadores e trabalhadoras, são da classe que tudo produz, tudo transporta, faz tudo funcionar. São trabalhadores e cuidam dos outros, que garantem que não morram todos, para que possamos seguindo produzindo alimentos e tudo o que for necessário para a humanidade. O que precisamos é mudar essa situação em que nosso trabalho está a serviço do lucro. As trabalhadoras da saúde são as únicas capazes de controlar todo o sistema de saúde no Brasil o no mundo, e nos mostram isso todos os dias. Podem controlar o país, e aliás, Fora Bolsonaro e Mourão, por uma nova Assembleia Constituinte Livre e Soberana. Podem colocar de pé uma nova sociedade, muito mais justa, sem o sistema capitalista.

Em meio a tantas más notícias, nos fortalece ver que nossa classe não para, que os e as enfermeiras, técnicas e auxiliares em enfermagem não abaixam sua cabeça e inclusive são capazes de sorrir. Acredito que o que as fortalece é sua luta, e certamente estarão (e estaremos) mais fortes se contarem com o apoio ativo de todos os trabalhadores e da população oprimida, com o apoio das professoras, metalúrgicos, estudantes e intelectuais das universidades, etc. Estaremos juntos, ombro a ombro, nos manifestando na próxima segunda feira, na porta do Hospital João XXIII às 7 horas.

 
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