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EDITORIAL MRT
Como encarar a luta antirracista e antifascista no Brasil?
Diana Assunção
São Paulo | @dianaassuncaoED
Odete Assis
Mestranda em Literatura Brasileira na UFMG
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A fúria negra que eclodiu nos Estados Unidos após o assassinato de George Floyd contra Trump e a extrema-direita racista, se expandiu pelo mundo com marchas e protestos em diversos países, trazendo novamente para as ruas a luta de classes, que havia ficado em segundo plano diante dos efeitos da pandemia do novo coronavírus. Nos Estados Unidos vemos entre os manifestantes uma parcela de jovens que protagonizaram greves anteriores contra o trabalho precário nas grandes empresas capitalistas como Amazon, Ifood e tantas outras, e também parte dos jovens que declararam ter mais simpatia pelas ideias socialistas do que pelo capitalismo.

Trump se esconde no bunker da Casa Branca, busca criminalizar os manifestantes como vândalos e enquadrar os Antifas como terroristas, coisa que seu capacho Bolsonaro está tentando copiar aqui no Brasil. Faz isso porque morre de medo dos impactos que a fúria negra pode ter nos resultados das eleições presidenciais esse ano. Por outro lado, o partido Democrata que sempre foi um pilar fundamental da sustentação do imperialismo norte-americano e do racismo, busca criminalizar as manifestações contra os símbolos do poder capitalista e dirigidos por Obama, buscam conter a revolta negra chamando a resolver esse problema pela via das eleições. Bernie Sanders se limita a neste momento apoiar Joe Biden.

Os ventos dessa luta internacional já mostram forte impacto no Brasil, o país mais negro fora do continente africano. Na mesma semana em que se intensificaram as ameaças de maior fechamento do regime por parte do governo Bolsonaro e militares a ideia de que Vidas Negras Importam dominou as redes sociais. O que também já vinha se expressando no repúdio à barbárie policial dos assassinatos de jovens negros pela polícia de Witzel no Rio de Janeiro como foi o caso de João Pedro.

A combinação entre a crise política nacional, os efeitos da pandemia tanto sanitários quanto econômicos, a crise econômica internacional e o impacto das eletrizantes imagens da revolta nos Estados Unidos começou a dar espaço a manifestações de rua contra Bolsonaro. Nesse domingo vimos manifestações antifascistas e antirracistas em São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre, Belo Horizonte e Curitiba. Um importante passo, mostrando que mesmo em meio a pandemia, não vai ser somente a extrema direita que ocupa as ruas. Com destaque para a presença dos trabalhadores precários de aplicativos, que mesmo com as suas mochilas durante seu trabalho, se colocaram na primeira linha do combate aos fascistas e a repressão policial em São Paulo. Isso na mesma semana em que a alucinada Sara Winter reproduziu o rito de supremacistas brancos da Ku Klux Klan. Já foram convocadas novas manifestações em várias cidades para o próximo domingo, dia 7, que precisam ser construídas amplamente. Isso fez inclusive Bolsonaro pela primeira vez orientar a que os bolsonaristas não se manifestem neste domingo, que já tinha se transformado na data dos fascistas saírem às ruas. Uma conquista do movimento e que mostra que as manifestações da extrema direita também vinham perdendo força.

Como Letícia Parks explicou no programa do Quilombo Vermelho, são os negros os que mais morrem pela Covid-19 em nosso país, não por questões genéticas, mas por questões materiais que os capitalistas impõem para as massas negras. Os negros são também mais da metade da classe trabalhadora brasileira, aqueles que estão nos postos de trabalho mais precários, sofrendo com as demissões, os cortes de salário, que são parte dos serviços essenciais como os trabalhadores da saúde e da limpeza, os que estão arriscando suas vidas em cima das bicicletas para entregas rápidas. Mas é justamente da luta em defesa das vidas negras que vemos surgir a resposta de resistência no enfrentamento à extrema direita, na defesa das nossas vidas em meio a pandemia e contra a miséria capitalista. Esta luta não se separa da batalha por Fora Bolsonaro e Mourão, e para que a resposta a essa crise política não seja canalizada pelo regime do golpe institucional: por isso mais do que nunca defendemos uma Assembleia Constituinte Livre e Soberana imposta pela força das mobilizações como apontaremos mais abaixo.

Os atos deste domingo foram convocados essencialmente pelas torcidas antifascistas de diversos times de futebol. Foram importantes não só no sentido da retomada das ruas para as bandeiras da esquerda, e mesmo não sendo massivos, ganharam um importante apoio popular. É nesse marco que precisamos debater qual a estratégia para seguir nossa luta, partindo do impacto muito progressista dos acontecimentos de ontem, em primeiro lugar debatendo se essa ideia de que “somos 70%” contra os 30% da base bolsonarista consegue responder às necessidades da luta do povo negro e da classe trabalhadora brasileira. Esse amplo movimento que vem ganhando adesão nas redes surgiu como expressão política das diversas iniciativas de manifestos em defesa da democracia que contam com a articulação de partidos e políticos da direita até setores da esquerda, com adesão de FHC, Luciano Huck, Haddad, Flávio Dino e até mesmo Guilherme Boulos e Marcelo Freixo do PSOL, numa ampla frente cujo objetivo anunciado seria recriar o clima das “Diretas Já” para defender a democracia contra os ataques de Bolsonaro. No Manifesto “Estamos juntos”, defende-se coisas como “é hora de deixar de lado velhas disputas em busca do bem comum. Esquerda, centro e direita unidos para defender a lei, a ordem, a política, a ética, as famílias...

Esse movimento se vincula às propostas de impeachment que vêm sendo debatidas, com as quais se espera convencer parte do congresso mais reacionário dos últimos anos a dar o aval para tirar Bolsonaro, canalizando nosso ódio contra Bolsonaro para colocar no seu lugar um general defensor da ditadura militar, como é Mourão. Ou então, nas tentativas que alimentam a ilusão de que o STF do golpe institucional, do apoio às reformas da previdência e trabalhista, o judiciário que mantém 40% da população encarcerada sem julgamento (em sua maioria negros) possa defender os direitos democráticos dos trabalhadores e especialmente das massas negras. Como essas medidas podem ser uma alternativa em defesa das vidas negras?

As torcidas acabaram saindo à frente dos sindicatos, que foram um grande ausente nas manifestações de ontem e em qualquer manifestação já faz um bom tempo. Isso é o reflexo da política das burocracias sindicais da CUT e CTB, e das burocracias estudantis da UNE e Ubes, todas dirigidas pelo PT e PCdoB. Burocracias que estão com seus privilégios mantidos e protegidos em suas quarentenas, enquanto tentam mascarar os efeitos de ataques como a MP 936, o aprofundamento da reforma trabalhista e a retirada de direitos sem precedentes, fechando os olhos para os setores mais precários da classe trabalhadora. Isso sem falar nos setores da esquerda que estão se colocando contrários às manifestações antifascistas como por exemplo declarou Marcelo Freixo à CNN. Não podemos aceitar essa paralisia generalizada.

O petismo também vem mostrando como seu programa e estratégia não serve para combater o racismo e o fascismo. Já tinha mostrando como não responde às demandas do povo negro. Foi durante o governo do PT que assistimos à invasão das tropas brasileiras no Haiti, liderada no governo Lula por ninguém menos que o General Heleno e vários generais do governo Bolsonaro, e a criação das UPPs nas favelas e comunidades do Rio, que ampliaram a força das milícias. Fortalecendo assim as bases mais reacionárias das forças policiais, dos latifundiários e das bancadas religiosas que sempre defenderam toda a ideologia racista e escravocrata contra o povo negro.

Retomando o que colocamos em nosso último editorial, mais do que nunca é urgente uma estratégia revolucionária pra derrotar Bolsonaro e Mourão. Por isso atuaremos com força nas manifestações antifascistas levantando a bandeira de Vida Negras Importam: basta de morrer pelas balas policiais, pela COVID-19 e pelo lucro capitalista, mas também para fortalecer uma estratégia da classe trabalhadora para derrotar Bolsonaro, Mourão e os militares, sem que isso busque fortalecer os crescente autoritarismos do STF e outros poderes sem voto. Por isso não adianta somente mudar os jogadores por meio de eleições gerais, como defendem setores do PSOL e o PSTU, é preciso apontar uma alternativa que busque se enfrentar com esse regime degradado, com essa democracia herdeira da escravidão, lutando por uma Assembleia Constituinte Livre e Soberana. O que passa por transformar essa revolta e indignação contra Bolsonaro e contra o desprezo pelas vidas negras em auto-organização da classe trabalhadora e da juventude, coordenando desde cada local de trabalho e estudo como podemos realizar novos atos, seguindo todas as orientações de segurança sanitária, mas buscando torná-los cada vez mais massivos pois essa é a única forma de defender as vidas negras e lutar contra os ataques dados em nome dos lucros capitalistas.

Mas não podemos nos limitar a atos de rua, a única forma de barrar todos os ataques econômicos em curso, de colocar um basta à violência policial e o racismo, impor as medidas necessárias contra a pandemia, a falta de saúde, segurança no trabalho e renda e ameaça de desemprego, e intimidar verdadeiramente os fascistas é sim com uma grande unidade, mas não com a burguesia, suas instituições e representantes políticos parlamentares – inclusive golpistas – que nos atacam, mas uma unidade da classe trabalhadora, com seus sindicatos à frente, com o conjunto dos movimentos populares e o povo pobre e negro. É o que chamamos de Frente Única dos Trabalhadores, uma unidade muito maior e mais potente para impor derrotas aos fascistas e racistas e barrar os ataques aos nossos direitos. Para isso, é preciso exigir de cada sindicato, e das centrais como CUT e CTB, que rompam com a política que descrevemos acima, e tomem medidas para a organização dos trabalhadores que estão sendo massacrados em cada local de trabalho. E nós batalhamos por essa unidade na luta também apostando que é por dentro dela que pode se abrir espaço para o desenvolvimento de uma perspectiva revolucionária, que é a única capaz de resolver estes problemas de fundo, passando da revolta das ruas à revolução.

Construir manifestações antifascistas e antirracistas que avancem para defender este conteúdo independente seria a melhor resposta à estratégia da frente ampla que quer impedir a resposta das massas colocando os golpistas de ontem, como Rodrigo Maia e tantos outros, como supostos aliados. Tudo que eles querem é preservar esse regime político para seguirem atacando os trabalhadores. Esta batalha demos início com a plenária aberta do Quilombo Vermelho que reuniu mais de 500 pessoas neste domingo, com a presença de trabalhadores da saúde, garis, rodoviários, metroviários, professores, trabalhadoras domésticas, terceirizadas, trabalhadores precários de aplicativos e estudantes, debatemos juntamente com nossos companheiros do Left Voice a importância e os desafios internacionais da luta contra o racismo e o capitalismo sempre a partir de uma perspectiva de classe.

Ainda que em pequeno, a atitude dos motoristas de ônibus de Nova York ao se recusarem transportar os manifestantes presos pela polícia e a carta dos trabalhadores da saúde em solidariedade às manifestações mostram que a aliança com a classe operária, da qual negras e negros são parte essencial, é a via para conquistar não só justiça para cada vida negra assassinada, mas também para dar respostas mais profundas na luta contra a exploração e a opressão capitalista. É essa nossa aposta.

 
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