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FORA BOLSONARO, MOURÃO E OS MILITARES
O ódio contra Bolsonaro não pode ser capitalizado pelos militares
Valéria Muller

Com o general Braga Netto assumindo o comando das ações do governo frente à crise do coronavírus, o "braço forte" do exército se coloca cada vez mais como árbitro autoritário dos conflitos institucionais, se posicionando também para canalizar a legítima raiva popular gerada pela política absurda de Bolsonaro. Nenhuma confiança em Braga Netto, Mourão e os militares!

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Desde a última semana a política negacionista e anticientífica de Bolsonaro vem dando lugar a um discurso mais mediado e vãs tentativas de se mostrar menos insano frente à pandemia do coronavírus. Não pelo presidente de extrema direita ter sido, subitamente, convencido de que a covid-19 não se trata de mera gripezinha. Tal mudança é determinada por diversos fatores. Um deles diz respeito ao peso cada vez mais decisivo que os militares têm tomado no governo e na gestão da crise.

O enorme descaso expresso pelas declarações de Bolsonaro desde que a pandemia do coronavírus chegou no Brasil despertou um ódio muito legítimo em amplos setores. Embora ele mantenha uma base social fiel, sua política gerou rupturas também entre seus apoiadores. A isso se somou o fato de que o vírus acometeu um Brasil já permeado por agudas crises políticas. Os distintos atores do regime, que antes já disputavam entre si, se viram com a tarefa de conter as insanidades de Bolsonaro e, ao mesmo tempo, defender os interesses dos capitalistas em meio à pandemia. Os governadores, encabeçados por Doria e apoiados pelo Congresso e o STF, buscaram disputar a direção do país, conflito que escalonou a ponto de colunistas de grandes jornais se mostrarem preocupados com a falta de unidade de comando a nível nacional. Em meio à disputa, se ergue o "braço forte" dos militares como mediador autoritário.

Na última segunda-feira tal papel se consolidou ainda mais com o General Braga Netto passando a coordenar as ações do Governo Federal relativas ao coronavírus. Vale lembrar que Braga Netto assumiu a Casa Civil no final de fevereiro, em meio à greve dos petroleiros e aos motins policiais no Ceará. Embora seja uma figura recente no governo, seu currículo político inclui também o comando da intervenção federal no Rio de Janeiro, imposta pelo governo golpista de Michel Temer em 2018, um mês antes do assassinato da vereadora Marielle Franco. Tal intervenção gerou ainda mais desgraça ao povo carioca, principalmente a população negra e moradora das favelas, que sentiu na pele as operações sanguinárias dirigidas pelo general. Segundo o Estadão ele vem sendo chamado de "interventor da crise" por outros militares do governo, que cumpriram um papel importante para a manutenção de Luiz Henrique Mandetta no cargo de Ministro da Saúde.

Tudo isso ocorre sem nenhum questionamento vindo daqueles que disputavam, até então, o comando do país com Bolsonaro. Os governadores, Maia, Alcolumbre e o STF respaldam o salto de qualidade que significa Braga Netto tomando à frente das ações do governo na crise do coronavírus. Terminam por formar, neste momento, um bloco político com a ala militar do governo, cada vez mais fortalecida. Em que pese inúmeras e profundas diferenças entre eles, o objetivo imediato de isolamento institucional de Bolsonaro une não somente os militares e aqueles que formam o heterogêneo bloco do bonapartismo institucional, mas também colunistas da Rede Globo e de outros jornais, porta-vozes de setores da burguesia. Em um acordo mais ou menos tácito, o objetivo imediato em relação ao presidente se soma às necessidades de salvar os lucros dos capitalistas e conter, o tanto quanto for possível, qualquer tipo de revolta social gerada pela crise sanitária, social e econômica. Um governo cada vez mais comandado por militares herdeiros da ditadura não hesitará em aplicar seu "braço forte" contra expressões de revolta da classe trabalhadora e do povo frente à barbárie imposta pelo colapso sistema de saúde e pela miséria oriunda da crise econômica. Os mesmos que hoje respaldam o crescente papel dos militares no governo foram parte ativa do golpismo institucional, que derrubou Dilma para aprofundar e acelerar ataques e manipulou as eleições de 2018 mantendo Lula preso e inelegível, o que resultou na vitória de Bolsonaro.

Antes de Braga Netto tomar a frente do governo, o general Mourão, vice de Bolsonaro, também chegou a aparecer como alternativa para setores que reivindicam o impeachment ou a renúncia, como o PSOL, PT, PCdoB, PCB e também PDT e PSB. Embora Mourão tenha assumido o papel de "intérprete" das asneiras que Bolsonaro falava, por muitas vezes contradisse as declarações do presidente, e desde o início do governo faz questão de manter uma política própria, valorizando as relações com a China e o multilateralismo característico dos militares. É bastante escandaloso, e até lamentável, que a esquerda cumpra o papel de reivindicar um general no poder. Ocorre que, com os militares assumindo o posto de mediadores das rusgas entre Bolsonaro e governadores, esta posição da esquerda faz com que ela seja parte de respaldar também um governo cada vez mais verde-oliva, ao lado de Doria, Witzel, o Congresso e o STF.

Estes militares não escondem seu orgulho pelas barbaridades cometidas durante a ditadura militar, como assassinatos, torturas, extermínio de etnias indígenas inteiras e outras. Seu ímpeto de retomar tais práticas nefastas de violência estatal se expressou novamente no último 31 de março, quando a ordem do dia do Ministério da Defesa, lida em todos os quartéis, assim como o tweet de Mourão, louvavam a ditadura e cinicamente colocavam o golpe de 64 como "marco para democracia". É inadmissível que estas viúvas da ditadura retomem o pode no país, e neste cenário eles buscam posicionar também para capitalizar o ódio contra Bolsonaro.

No mundo inteiro a crise do coronavírus contribui para significativos aumentos do poder autoritário dos Estados e da militarização das sociedades. Não é distinto o caminho que querem impor no Brasil. Às investidas autoritárias levadas à frente em meio à crise se somam aquelas que vêm escalonando desde o golpe de 2016. Naquele então era principalmente o judiciário que cumpria o papel de árbitro dos conflitos entre os distintos setores do regime político, em meio à profunda crise orgânica, que desde as manifestações de Junho de 2013 mostrava que não seria mais possível governar o Brasil como antes. Em todos os momentos decisivos os militares também deram seu aval ao autoritarismo do judiciário. Agora o judiciário, junto ao Congresso, os governadores e até mesmo junto à esquerda (!), dão seu respaldo para que os militares terminem de pisotear o pouco que resta da degradada democracia brasileira. Vale lembrar que tal democracia é fruto de uma constituinte completamente tutelada pela farda, em acordo com a burguesia e também com o PT, após a ditadura militar. Portanto, não se trata de defender a democracia em si mesma, e sim de apresentar uma saída dos trabalhadores para a crise sanitária, econômica, política e social.

Essa resposta dos trabalhadores pela qual é preciso batalhar parte da organização em cada local de trabalho que segue funcionando, particularmente os serviços essenciais que, com a crise, mostraram mais uma vez seu caráter estratégico na sociedade. Servem de exemplo e inspiração os trabalhadores da saúde nos EUA que se mobilizam contra as terríveis condições de trabalho às quais são submetidos, assim como os trabalhadores da Itália que fizeram uma greve geral e diversas paralisações. Também na França trabalhadores da Airbus protestaram pela reconversão da produção da fábrica para fazer respiradores. São as primeiras expressões de respostas da classe trabalhadora à crise, e vêm servindo de alerta à burguesia internacional. Com a crescente militarização da sociedade em diversos países, os capitalistas e seus governos se preparam estrategicamente para momentos de maiores conflitos. O peso dos militares no governo brasileiro se insere também aí. Os trabalhadores, o povo e a esquerda precisam também se preparar para estes momentos. Isso significa se organizar para lutar pelas demandas mais urgentes que surgem com a crise, como testes massivos, proibição das demissões, equipamentos e condições de proteção e prevenção, ampliação de leitos com respiradores, contratação de profissionais da saúde, e até mesmo água encanada que milhões de brasileiros não têm. Tal batalha precisa ser parte da luta para que o povo decida sobre os rumos do país em uma Assembleia Constituinte Livre e Soberana, que derrube Bolsonaro, Mourão e os Militares.

 
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