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CRISE NO PERU
Peru: uma possível vitória do executivo e os ajustes capitalistas
Caio Reis

Avança uma aparente vitória do executivo sobre o parlamento peruano, uma disputa pelo poder político travada entre setores capitalistas unidos pelo neoliberalismo. O que o aspecto superficial da polêmica não mostra é a profunda crise orgânica que atravessa o país e seu papel na origem da crise de governo.

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Para começar, façamos um breve sobrevôo sobre os fatos políticos mais quentes da conjuntura peruana e os desdobramentos das últimas semanas. A atual tensão dos blocos políticos do país se constitui de um atrito entre o executivo, chefiado por Martín Vizcarra, e o parlamento, composto principalmente pelo bloco fujimorista (aliados do ditador que governou o país de 90 a 2000). Com os desdobramentos da operação Lava-Jato, no Brasil, se expôs um grande esquema de corrupção e financiamento de campanhas entre a construtora Odebrecht e políticos peruanos, principalmente os fujimoristas. Isso aumentou ainda mais a já alta rejeição aos direitistas e seus aliados do APRA. Vizcarra foi vice no último governo, de Pedro Pablo Kuczynski (PPK), estando lado a lado do fujimorismo em todas as pautas econômicas e trabalhistas contra a classe trabalhadora. PPK também estava envolvido no escândalo da Odebrecht e renunciou em função disto, assumindo Vizcarra.

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O Peru se encontra em uma ampla convulsão social, provocada pela indignação com o congresso fujimorista e com as medidas antipopulares do executivo, que reprime duramente mobilizações da população contra as diversas minas ilegais que brotam pelo país e novas minas legais que colocam os locais de moradia de diversos povos peruanos em risco (como do mega-projeto Tía María) e persegue as greves pelos direitos dos trabalhadores mineiros, uma importante categoria da economia nacional e que se encontra em um importante período de luta. Diante da crise social que ameaça seu governo, Vizcarra levantou a bandeira contra a corrupção, procurando ganhar setores urbanos da classe média para amenizar seu próprio desgaste, em detrimento dos fujimoristas, e para que pudesse avançar com as demandas do grande capital sem incendiar ainda mais a ira da classe trabalhadora e do povo pobre. Tirando do cenário as concessões às grandes mineradoras, os cortes nos direitos trabalhistas e a privatização dos recursos naturais e serviços públicos – uma demanda dos capitalistas para amenizar os impactos da crise econômica internacional que afeta o Peru – Vizcarra comprou guerra com seus antigos aliados do parlamento, buscando camuflar a crise orgânica com a polarização entre “bons” e “maus” políticos.

Entre as promessas contra a corrupção do líder peruano, se encontra a mudança nas regras de indicação para o Tribunal Constitucional (TC), uma espécie de STF peruano. O TC é definido por votos do Congresso, o que o coloca na mira dos fujimoristas para que possam interferir nos processos de investigação em que estão envolvidos e para que avancem em uma última cartada para soltar seus principais líderes, Alberto e Keiko Fujimori, atualmente presos por envolvimento no escândalo da Odebrecht. Em 30 de setembro, em meio às eleições para o TC no Congresso da República, o Executivo enviou um representante para o parlamento que, após quase ter de lutar fisicamente para chegar até a mesa, abriu um pedido de confiança (para mudar as regras do TC) que foi aceito a contragosto pelo Congresso, abrindo precedentes legais para que Martín Vizcarra anunciasse a dissolução do mesmo e iniciando uma nova etapa na crise.

Prontamente os congressistas fujimoristas e seus aliados abriram uma moção de vacância presidencial para destituir Martín e manter a imunidade parlamentar – que será retirada por causa da dissolução, o que já levou dois parlamentares a fugirem do país. Em bloco com o APRA, os parlamentares nomearam e juramentaram artificialmente a vice-presidente Mercedes Aráoz como nova presidente, que chegou a esboçar uma aceitação durante a madrugada. Com a manobra da ala parlamentar, Vizcarra se reuniu no palácio de governo com os representantes da polícia nacional e das forças armadas, que declararam apoio total a ele. Nessa mesma noite, foi anunciado um chamado a novas eleições parlamentares em 26 de janeiro de 2020, colocando o fujimorismo na linha de tiro do voto popular crescentemente descontente e isolando essa força política. Assim, Vizcarra avança no estabelecimento de uma base de poder para consolidar seu projeto político (que, para além da forma, em nada se diferencia dos incapacitados fujimoristas).

A vice nomeada presidente pelo parlamento, Mercedes Aráoz, renunciou na noite do dia 1º contra as expectativas dos fujimoristas e endossou um chamado a eleições gerais. Vizcarra continuará na presidência e inicia um processo de recomposição de seus ministérios, após a renúncia do ex-primeiro-ministro Salvador del Solar e a nomeação do novo premiê, Vicente Zeballos.

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Os ajustes dos capitalistas e a crise social

Como colocamos anteriormente, as diferenças entre o tradicional e decadente fujimorismo e a fração de Martín Vizcarra não se dão no plano do programa de governo, mas em uma disputa aparentemente em vias de resolução pelo controle do Estado. Se no plano midiático aparecem como antagônicos, em razão das manobras do fujimorismo para salvar sua própria pele e da demagogia anti-corrupção de Vizcarra, ambos os blocos estão a serviço dos grandes empresários e tem um apoio popular fragilizado. A origem da crise não se encontra na disputa entre essas forças, mas na progressiva degeneração das instituições e dos partidos políticos ao se tornarem serventes dos interesses dos empresários e do imperialismo.

Vizcarra conta com todo o apoio tácito da burocracia sindical, dos partidos da esquerda reformista e neo-reformista e diversas ONGs, que utilizam a justa indignação popular contra os poderes do Estado para instrumentalizar esta estratégia de desvio da mobilização social.

Novos conflitos sociais que explodem pelo país colocam em xeque a máscara progressista de um governo brutalmente repressivo. A ampla rejeição popular ao fujimorismo que se expressou em diversos atos por todo o país evidencia o descontentamento das massas peruanas com a política neoliberal que segue a pleno vapor desde o primeiro governo de Alberto Fujimori, na década de 90. Vizcarra, ainda que busque se renovar no cenário político, é um velho inimigo dos trabalhadores e dos setores oprimidos, parte ativa da aprovação de medidas como o plano de competitividade e produtividade, que aumentou a condição de precarização e o ritmo de trabalho, assim como da ampliação dos benefícios do agronegócio e das mineradoras. As lutas de diversas categorias e povos campesinos afetados pela ganância desses capitalistas devem confluir em espaços de coordenação coletiva pela construção de um Plano de Lutas Nacional, que organize uma greve nacional operária, campesina e popular contra as políticas de ajustes do Governo. As greves, ocupações e marchas que vem ocorrendo pelo país mostram que o problema não é simplesmente a corrupção da degenerada casta política, mas fundamentalmente se encontra no projeto de ataque dos grandes empresários e do capital internacional à classe trabalhadora peruana, a única que pode dar uma solução real para as demandas da massa do povo peruano. Esta é a batalha que a rede internacional Esquerda Diário e a Corriente Socialista de las y los Trabajadores (CST), organização irmã do MRT, vem dando no Peru.

 
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