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ELEIÇÕES GRÉCIA
Syriza e ANEL voltam ao governo para aplicar o terceiro memorando
Diego Lotito
Madri | @diegolotito
Josefina L. Martínez
Madrid | @josefinamar14

Com 35% dos votos, o Syriza conseguiu uma folgada vitória nas eleições gregas. Um triunfo que dá em meio a um clima muito distinto à euforia de janeiro. O establishment pede um governo que aplique sem demora os ajustes. Uma alternativa anticapitalista e de classe é mais necessária do que nunca.

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Somando os votos do Syriza e da ANEL (Gregos Independentes), estes obtém 155 cadeiras , o suficiente para a maioria absoluta e formar governo, repetindo a coalizão que governou desde fevereiro e aprovou o terceiro memorando, que implica duros cortes, aumento de impostos e novas privatizações.

Há alguns dias as enquetes prognosticavam uma disputa “ombro a ombro” entre o Syriza e os conservadores de Nova Democracia. Muito se especulava sobre quanto o povo grego castigaria Tsipras após a aceitação do terceiro memorando com a Troika e a cisão dos setores críticos.

A diferença a favor do Syriza, não obstante, foi mais folgada do que se esperava. Equivocaram-se tanto as enquetes? As sondagens eram tendenciosas? Em parte sim. Mas há outro fato chave para ter em conta: 13% dos votantes terminou definindo seu voto no próprio domingo. Até o dia anterior não sabiam o que fazer.

Grande parte dos indecisos havia votado no Syriza em janeiro, com muitas ilusões. Desta vez, pelo contrário, muitos voltaram a votar em Tsipras mas sem entusiasmo algum, desencantados, como “mal menor” para que não volte o Nova Democracia, um partido conservador identificado com a oligarquia grega e um sistema político corrupto que levou à crise atual.

Isso não significa que o Syriza não tenha perdido apoio. Pela direita e pela esquerda houve setores que retiraram seu apoio. Mas é possível que também tenha ganhado outros, como por exemplo uma boa parte dos votantes de To Potami, um partido de centro que passou de 6% para 4,12% agora.

Por sua vez, a participação eleitoral seria uma das mais baixas da história democrática grega: aproximadamente 54% frente a 63,6% de participação em janeiro deste ano. A alta abstenção se destacou em toda a jornada junto com a volatividade nas preferências de voto.

Neste marco, não obstante, o Syriza venceu e estaria perdendo apenas quatro cadeiras no parlamento com respeito aos 149 que obteve em janeiro. Um custo irrisório, em vista das transformações que sofreu a formação desde que Tsipras assumiu o governo em fevereiro.

Em apenas 8 meses, o Syriza passou de ser o partido que prometia enfrentar a Troika, terminar com a austeridade e dar marcha ré nas privatizações, a converter-se após uma série de concessões no partido do terceiro memorando, que vai administrar “o melhor possível” o ajuste e dar um rosto “humano” a um novo e duríssimo golpe contra os trabalhadores e o povo grego. Em meio a isto, se livrou dos setores mais críticos, que romperam com o Syriza e formaram o novo partido Unidade Popular.

Longe ficou o clima de euforia e entusiasmo popular que reinava há 8 meses, quando o establishment europeu pintava Tsipras como um esquerdista e os mercados estremeciam na incerteza do “Grexit”. Hoje, o líder “antiausteridade” do Syriza é visto pelos mercados e a União Europeia como um aplicado discípulo das receitas neoliberais.

Não por nada seu rival conservador nas eleições para a chefatura do Governo, Vangelis Meimarakis, chegou a dizer que depois da assinatura do resgate Tsipras se converteu na “criança mimada” da União Europeia.

Um governo “sólido” para aplicar o memorando

O presidente do Parlamento Europeu, Martin Schulz, foi um dos primeiros em felicitar a vitória de Tsipras, sem deixar de chamá-lo a que forme “um Governo sólido preparado para gerar resultados.”

Iguais felicitações obteve o líder do Syriza por parte do presidente do Eurogrupo, Jeroen Dijsselbloem, que tampouco esqueceu o pedido de uma rápida formação de Governo para “prosseguir o processo de reforma” na Grécia. Em seu breve comunicado, teve a gentileza de assegurar que estava “preparado para trabalhar estreitamente com as autoridades gregas e para seguir acompanhando a Grécia em seus ambiciosos esforços de reformas”.

O establishment europeu pede a seu novo discípulo que se apresse em aplicar as duras medidas neoliberais do terceiro memorando, que pouco tem a invejar frente aos programas de ajuste anteriores.

Com o chamado a eleições antecipadas, o arriscado objetivo de Tsipras era relegitimar seu governo para aplicar o ajuste, após a crise aberta no partido com a capitulação ante a Troika. A coalizão Syriza-ANEL havia perdido sua maioria parlamentar pela cisão dos críticos, e necessitava recuperá-la. Conseguiu.

Unidade Popular, os grandes derrotados da eleição

O novo partido Unidade Popular não conseguiu entrar no Parlamento, ficando abaixo dos 3% dos votos. Isto significa um retrocesso imenso para o partido liderado pelo ex-ministro de Energia Panagiotis Lafazanis. Quando formaram o partido, há um mês, contavam com 25 deputados.

A Unidade Popular não conseguiu convencer, e isto em parte se explica porque durante 8 meses integraram o governo Syriza-ANEL, atuando como uma oposição meramente testemunhal que publicava resoluções críticas no seio do Comitê Central do Syriza mas votavam todas as suas políticas e sustentavam o governo.

Ante aqueles setores desiludidos com a capitulação completa do Syriza, a Unidade Popular não se ergueu como uma alternativa. Seu discurso e perspectiva política seguiu sendo “voltar a um Syriza das origens”, sem questionar seu DNA reformista e sem a mais mínima autocrítica sobre os 8 meses que formaram parte do governo, nos quais alguns de seus principais referentes tiveram importante responsabilidade como ministros.

Compartilham com o Syriza uma estratégia reformista de ocupar espaços constitucionais “por cima”, em detrimento da mobilização independente dos trabalhadores e do povo. Sua estratégia soberanista de esquerda, de “saída ordenada do euro”, busca a “reconstrução da economia nacional” nos marcos do capitalismo grego mediante a volta à moeda nacional de maneira a gerar liquidez e uma desvalorização com respeito ao euro, para aumentar a competitividade deprimindo o poder de compra dos trabalhadores, já diminuído por anos de recessão e austeridade. Uma proposta percebida por muitos como um caminho direto a maiores penúrias.

A necessidade de uma alternativa anticapitalista e de classe

À esquerda do Syriza, o outro partido que atualmente tem presença parlamentar é o KKE de tradição stalinista, que mantém uma importante influência em alguns sindicatos através de sua corrente sindical PAME. Nestas eleições manteve seus votos de janeiro (5,4%) e obteria 12 deputados no parlamento, constituindo uma importante força política parlamentar e extraparlamentar.

O KKE, não obstante, ainda que se oponha ao terceiro memorando, sustenta uma política sectária e autoproclamatória, cuja maior expressão é a negativa permanente a desenvolver a frente única dos trabalhadores e das organizações combativas, bloqueando o desenvolvimento da mobilização operária contra os planos do governo e do imperialismo europeu.

A coalizão de esquerda anticapitalista Antarsya + EEK, que participou das eleições com uma posição política independente dos reformistas, colheu um magro 0,83% dos votos, ligeiramente superior aos resultados obtidos em janeiro.

A maioria das forças integrantes do Antarsya resistiu à Unidade Popular e sua política de colaboração de classes “anti euro” desde uma posição independente das variantes reformistas (apesar de que grupos que formavam parte desta romperam para apoiar a campanha da Unidade Popular), apresentando uma alternativa unitária da esquerda que não está com o Syriza nem com a UP e o KKE. Em seu interior, não obstante, continuam os debates sobre que tipo de partido e que estratégia desenvolver no próximo período, onde alguns setores buscam confluência com setores reformistas, enquanto outros sustentam uma política anticapitalista.

A revalidação do governo Syriza-ANEL prenuncia tempos sombrios para os trabalhadores e o povo gregos. O terceiro memorando significa um novo “pacto de colonização” com o aumento de impostos à população, reforma das aposentadorias, privatizações, ataques aos convênios trabalhistas e novos cortes.

Ao mesmo tempo, o partido neonazista Aurora Dourada conseguiu este domingo manter-se como terceira força política do país, obtendo 19 cadeiras no parlamento apesar de que a maior parte de sua cúpula está no cárcere ou em liberdade condicional acusada de ser uma banda criminosa. Ainda que o fascismo não seja hoje uma perspectiva que a burguesia grega defenda como saída à crise, as bandas fascistas do Aurora Dourada são a reserva com a qual conta o capital para sustentar seu poder se vê seu domínio seriamente ameaçado pela classe trabalhadora.
A desilusão que atravessa uma grande parte dos trabalhadores e do povo gregos – incluídos aqueles que voltaram a votar no Syriza “como mal menor” – pode desencadear uma maior oposição ao governo quando comecem a sentir-se mais diretamente os efeitos das novas medidas.

Neste cenário, será fundamental no próximo período organizar e promover a mobilização e a autoorganização operária e popular para enfrentar as medidas reacionárias do governo. Um caminho no qual a construção e o fortalecimento de uma forte esquerda anticapitalista e revolucionária, com influência orgânica entre os trabalhadores e a juventude, é uma necessidade urgente.

 
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