O governo Bolsonaro, antes mesmo da batalha decisiva da Reforma da Previdência, vinha abrindo várias frentes de combate no interior mesmo do bloco que lhe apoia. Todo o chamado período de “lua de mel” foi utilizado pelo capitão reformado para tentar conquistar hegemonia dentro do próprio governo que preside, e terminar de consolidar uma base de massas própria. Esses movimentos mais de uma vez levaram toda a grande imprensa e até seus aliados mais próximos a reagirem com um misto de espanto e preocupação: centre na Reforma da Previdência, lhe diziam em uníssono.
Teimoso e dado a lances arriscados, como gosta de alardear, deu de ombros aos apelos e exortações. Antes mesmo de consolidar uma maioria congressual, sem sequer ter deixado curar as feridas dos duros embates com Maia, Bolsonaro foi abrindo mais frentes, primeiro com Moro e depois com os próprios militares. Utilizou a alta popularidade para tentar consolidar no governo a cruzada contra o “marxismo cultural”, seja lá o que isso signifique na boca dos bolsonaristas (já que não só o PT, mas até FHC, jornais como Folha e Estadão, a Globo e inclusive banqueiros, recebem o título de “comunistas”), mas os setores empresariais e das finanças que o apoiaram nas eleições estão preocupados em outra cruzada, a de elevar a taxa de exploração sobre a classe trabalhadora brasileira e maximizar os seus lucros. Esse discurso só cola para os setores mais retrógrados do campo, que veem FHC como um risco para a propriedade do campo e clamam pelo direito de armar até os dentes os seus jagunços. Mas até entre estes, a cruzada ideológica do bolsonarismo causa desconfiança, quando se traduz no plano externo num alinhamento automático com Trump e num esfriamento das relações com a China.
Se tivesse triunfado nas suas lutas intestinas a situação atual seria outra, mas Bolsonaro não obteve nem uma única vitória decisiva. Sua popularidade decaiu, a economia patina, até sua base mais dura começa a ficar inquieta com os rumos do país, mesmo apoiando o presidente. Ao invés de dar um passo atrás, um recuo pragmático, abriu mais uma frente, só que dessa vez com o movimento de massas: um ataque frontal contra a educação e as universidades. Talvez seu cálculo agora seja o de que polarizando de novo a sociedade consiga galvanizar todos os aliados que não conseguiu subordinar, e nesse enfrentamento contra os “maconheiros das universidades” recompor algo da sua base eleitoral.
O desafio do movimento estudantil
As manifestações deste 15 de maio, já esperadas, transbordaram todas as previsões e cálculos. O movimento estudantil, marchando lado a lado dos professores que também foram às ruas, deu uma mostra contundente de força. O grito entalado na garganta contra contra o avanço das forças obscurantistas pode ecoar com força. Toda uma revolta acumulada pode ganhar as ruas. A questão que se coloca é: podemos triunfar, derrotando os cortes e a Reforma da Previdência?
A juventude universitária e secundarista, que sentiu sua própria força neste 15M, está chamada a cumprir um grande papel histórico: encabeçar a oposição contra o governo Bolsonaro e contra toda a velhacaria da política burguesa, despertar atrás de si a insatisfação e a revolta das maiorias populares e opor ao projeto destrutivo de Bolsonaro e dos grandes empresários não um retorno aos tempos do lulismo, um tempo que não volta mais, de bonança econômica e um projeto de concitação de classes com a elites que hoje apoiam Bolsonaro, mas um projeto radicalmente oposto ao das elites.
Não podemos dar de barato que a força do setor da educação, por si mesma, basta para derrotar o governo Bolsonaro. Não podemos cair no conto de que as composições e negociatas com Maia e com toda a escória parlamentar, vão ser decisivas para nosso triunfo. O que estes senhores nos derem com uma mão, vão tirar com a outra ao mesmo tempo. A Reforma da Previdência vai se revelar um ataque tão duro contra a educação quantos os cortes impostos agora. Tudo o que estão cortando e os ataques às aposentadorias servem para seguir pagando a dívida pública, que todos os governos anteriores pagaram também. As direções da UNE, da CUT e da CTB – PT e PCdoB – vão agora lutar para manter o movimento da educação dentro “do seu próprio quadrado”, lutando somente em defesa da educação, e levar a um embate parcial contra Bolsonaro, enquanto negociam pelas nossas costas com Maia os termos da Reforma da Previdência. Nesse jogo o PSOL poderia cumprir um papel importante para o movimento, se mudasse sua política de separar as duas pautas, o que até agora não parece querer fazer.
É a unidade do movimento estudantil que começou a se levantar, junto com todos os setores da classe trabalhadora e do povo oprimido que estão fora das universidades, o caminho que pode nos levar ao triunfo contra as forças do obscurantismo e da reação. Mas antes que os estudantes brasileiros possam repetir a célebre frase dos estudantes franceses de 1968 “trabalhadores, tomem de nossas frágeis mãos nossas bandeiras de luta”, é preciso calibrar melhor os dizeres das nossas bandeiras.
Sem virar as costas para as entidades, exigindo que o próximo dia 30 convocado pela UNE se transforme em um dia de greve geral: não podemos esperar até 14 de junho para unificar as lutas.
A luta em defesa da educação precisa ser articulada com bandeiras que defendam os interesses de toda a população. O primeiro passo, mais elementar, deveria ser transformar numa bandeira da juventude a luta contra a Reforma da Previdência e abrir um caminho de diálogo com as maiorias populares: quem vai pagar o custo da crise econômica? Que sejam eles, os ricos e as elites que comandam o país. Esse é o chamado que a juventude marxista Faísca - Anticapitalista e Revolucionária, faz a todos os estudantes. Temos que falar para a juventude que não concluiu seus estudos, que sofre com o desemprego, a miséria e trabalhos precários, que atacam a educação e a aposentadoria para beneficiar um punhado de banqueiros que controlam a dívida pública. Temos que falar com a maioria da classe trabalhadora, que vê seu nível de vida decair a cada mês. Se o movimento estudantil abre esse caminho, se é capaz de ser e também aparecer como o maior defensor dos interesses da maioria, se é capaz de tirar ao menos uma parcela dessa maioria da passividade e de arrastá-la para uma luta comum, aí sim, Bolsonaro terá que se enfrentar contra um verdeiro tsunami.
|