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EDITORIAL | REFORMA DA PREVIDÊNCIA
Confundir para dominar: o que Bolsonaro quer com sua proposta de idade mínima?
Odete Assis
Mestranda em Literatura Brasileira na UFMG

Em sua primeira entrevista após a posse, Bolsonaro deixa claro que sua intenção corresponde ao interesse do mercado: quer aprovar uma reforma da previdência draconiana, mas depois de sua declaração, nas mídias burguesas (Globo, Estadão, Folha) reinou a confusão sobre se sua proposta de reforma é melhor ou pior do que a de Temer. Mais uma vez, a velha tática de confundir para dominar.

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Em entrevista concedida para o SBT, Bolsonaro comentou alguns dos principais temas de seu governo. A tônica geral das perguntas dizia respeito a quais serão as medidas adotadas pelo novo governo para fazer com que seja a classe trabalhadora aquela que pague pela crise capitalista. O ex-capitão do exército deixou claro suas intenções: reafirmou como é difícil ser patrão no Brasil e que para ele a resposta frente ao desemprego e a precarização da vida estaria na retirada completa dos direitos historicamente conquistados por muitas lutas da classe trabalhadora.

Entre os temas abordados estavam a reforma da previdência, tendo sido a primeira vez que Bolsonaro se pronunciou sobre o tema, em uma clara resposta à enorme pressão que consome os debates econômicos no país. Todos os setores da burguesia querem a "mãe de todas as reformas", o que tem levado a uma aceleração e fatiamento para garantir que seja aprovada o mais rápido possível, anunciando a apresentação de uma proposta final para debate no Congresso ainda em fevereiro. A reforma trabalhista, a posse e o porte de armas em nosso país, o papel das forças armadas para “evitar que o socialismo dominasse nosso país”, o papel das escolas e universidades na formação de “militantes políticos", a prisão em segunda instância, as relações com o congresso e os parlamentares da oposição, as questões sociais do nordeste, as relações com Israel e o mundo árabe, o papel dos Estados Unidos e do Brasil na América Latina e o caso Coaf foram outras questões elencadas. Nesse artigo debateremos essencialmente as declarações sobre a reforma da previdência e trabalhista.

Reforma da previdência no centro da política do novo governo

Como não poderia ser diferente, a primeira pergunta ao presidente herdeiro do golpe institucional e das eleições manipuladas foi sobre a reforma da previdência. Quanto a isso, Bolsonaro afirmou que estão trabalhando na revisão de partes do projeto do ex-presidente, o golpista Michel Temer. Para ele “a boa reforma é aquela que passa, na câmara e no senado, não a que tá na minha cabeça ou na da equipe econômica”. Defendeu o aumento da idade mínima de 57 anos para mulheres e 62 para homens, e fez demagogia ao declarar que é preciso levar em conta as diferentes expectativas de vidas de cada região do país. Disse que não pretende aumentar a alíquota de imposto de renda para os servidores públicos, como foi levado adiante pelo prefeito de Sâo Paulo por meio do Sampaprev.

O tema da idade mínima levou a uma série de debates e confusões na mídia burguesa. Houveram analistas que embelezaram a proposta de Bolsonaro, dizendo que é mais amena do que a de Temer e que mostra uma divisão entre o presidente e sua equipe econômica, em especial Guedes, que já havia se pronunciado adepto da reforma já apresentada por Temer. Outros, explicaram que a reforma de Temer, ainda que tivesse idades mínimas maiores (62/65 até 2029 para funcionários públicos e até 2039 para privados) não previa o aumento da idade mínima imediatamente, o que fazia com que a proposta de Bolsonaro fosse ainda mais ácida e difícil de engolir, porque como disse ele próprio, haveria a possibilidade de não haver transição - fazendo que em 2020 já haja um salto na idade para 56/61 (o que na de Temer aconteceria daqui alguns anos apenas), com aplicabilidade a trabalhadores privados e, um dos aspectos mais comprometedores, que a formulação do texto da reforma 62/57 já deixe ali no texto constitucional que a idade a cada X ano é regulamentada por “lei orgânica”, ou seja de maioria simples, nas palavras dele, chegaríamos a 2022 em 57/62 e o presidente ali decide o que fazer.

A verdade é que ainda não há ainda reforma da previdência oficialmente, há vazamentos seletivos para testar reações populares e dos mercados, há conflitos de interesses mas também teste consciente para ver o que fazer. Um conflito que já está claro é o de Onyx e Guedes - Onyx "desmentiu" Guedes no tema do IOF - mas no tema previdência talvez também haja uma divisão entre os militares e Guedes, que pressionam contra a inclusão dos militares no texto da reforma. Os vazamentos vem junto da demagogia de Bolsonaro, típica de sua postura em geral de "homem comum", dizendo que "não foi colocado ali pra fazer mal pros mais pobres", e ainda que seja difícil determinar exatamente o que é a "reforma de Bolsonaro", algo que está claro é que ela é potencialmente mais dura do que a de Temer. Os tensionamentos na mídia dizendo que ela é "mais branda que a de Temer" servem apenas para garantir uma negociação com mais ataques até que se apresente, finalmente, a proposta, ao mesmo tempo que ajuda Bolsonaro na batalha da opinião pública pró-reforma, erguendo o grito de "esta é pouco".

A mesma pressão faz Rodrigo Maia como porta-voz de um setor do mercado financeiro, ao declarar que se a proposta for 62/57, não pode ter transição, exigindo que seja implementada a idade mínima de Bolsonaro imediatamente. Tivemos dois vazamentos de propostas. Um vazamento foi o de Guedes para a Folha sobre ataques ao BPC, aposentadoria rural e outros assuntos que poderiam ser por MP (regras de calculo e correção, regras de controle, várias maneiras de atingir os mais pobres) que se combinariam a alguma PEC, e a prova de que a confusão serve apenas como fator de "dominação" da opinião pública, a Bolsa não reagiu mal na sexta-feira, continuando a bater recorde de alta, e a ação coordenada do governo em criar essa confusão é clara: antes de Bolsonaro usar a frase “reforma boa é a que passa”, Heleno e Mourão já tinham usado frase similar.

Ainda que esteja incerto qual vai ser o projeto apresentado pelo governo em relação a reforma da previdência, uma coisa está claríssima, Bolsonaro e sua equipe econômica irão fazer de tudo para saciar os desejos dos grandes empresários imperialistas e aprovar esse enorme ataque a classe trabalhadora brasileira. São capazes de tudo em nome da sede de lucros e do pagamento da ilegítima dívida pública, uma verdadeira bolsa banqueiro que nenhum governo brasileiro deixou de pagar. Ao contrário do que os políticos e a mídia burguesa tentam afirmar a salvação do país frente a crise econômica não virá da enorme exploração dos trabalhadores, os obrigando a trabalhar até morrer com a reforma da previdência, ou vendendo nossas empresas estatais para os empresários estrangeiros. A saída da crise passa necessariamente pela organização da nossa classe para derrotar esse enorme ataque, retomando seus sindicatos como ferramentas de luta e organização contra a reforma da previdência e todos os ataques desse governo, e na defesa de uma programa anticapitalista e anti-imperialista, que passa pelo não pagamento da dívida pública, pelo fim das privatizações com estatização total das empresas que já foram vendidas total ou parcialmente, com funcionamento sob gestão dos trabalhadores que ali trabalham e controle popular, para enfrentar as burocracias estatais e as máfias que sugam os recursos públicos das estatais do petróleo e energia, aeroportos e transporte público. Por isso, a passividade com que as centrais sindicais têm encarado esse momento, mantendo a paralisia da classe trabalhadora em nome de tentar preservar seus privilégios, vem se tornando uma grande traição.

Qual a oposição necessária para se enfrentar com essas medidas de Bolsonaro?

Ao comentar sobre a oposição, Bolsonaro deixou claro que não pretende estabelecer diálogo com nenhum dos parlamentares do PT, PCdoB e PSOL. Enquanto isso, as centrais sindicais assinam uma carta de “respeito” ao presidente inimigo dos trabalhadores mostrando como a oposição que pretendem fazer é não só uma oposição que aceita o golpe institucional, como também está disposta a rifar direitos dos trabalhadores, negociar a reforma da previdência e esperar 2022, para tentar minimamente manter seus privilégios de burocracia frente a um governo que já deixou claro não querer nenhum diálogo.

Além disso, Bolsonaro segue afirmando que o autor da facada que ele sofreu era um militante do PSOL, quando na verdade foi comprovado que ele já não era mais filiado a esse partido, e levanta suspeita de ligações políticas por trás do atentado, sem ter nada que comprove seus argumentos. Enquanto isso, os gabinetes de parlamentares dos partidos da oposição foram invadidos no dia da posse de Bolsonaro. Sendo que até agora, não foi divulgado o responsável pela invasão e pela intervenção nos gabinetes, supostamente autorizada pela polícia legislativa, que não informou a mando de quem e alegou motivos de segurança.

Os avanços no autoritarismo judiciário, o programa de governo de Bolsonaro a favor dos patrões contra os direitos da classe trabalhadora, e as declarações reacionários de seus ministros, como a de Damares Alves, ministra de Direitos Humanos, que nessa semana declarou que "vivemos uma nova era no Brasil: meninos vestem azul e meninas vestem rosa", mostram como a nova era que esse governo pretende instaurar em nosso país é uma era onde a classe trabalhadora, principalmente seus setores mais oprimidos como as mulheres, negros e LGBTs serão o alvo prioritário dos grandes ataques aos direitos democráticos e econômicos, com a reforma da previdência como a mãe de todos eles.

Frente a tudo isso, a estratégia de atuação por dentro da normalidade que as grandes centrais sindicais vem levando adiante configuram uma enorme traição a classe trabalhadora. Uma traição de quem busca se submeter totalmente para manter seus privilégios e garantir sua sobrevivência, às custas de rifar os direitos dos trabalhadores, num momento onde Bolsonaro promete acabar com o socialismo e chama um movimento onde uma das suas reivindicações será por fim ao sindicalismo. A CUT e CTB cobrem pela "esquerda" as centrais golpistas, e atrai até mesmo a própria esquerda, como aconteceu com a Intersindical e a CSP-Conlutas, que se adaptaram e assinaram uma carta na qual o objetivo das outras centrais era negociar a reforma com o governo. Uma submissão à estratégia de resistência parlamentar, onde tentam nos fazer acreditar que 70 parlamentares podem ter mais força para derrotar Bolsonaro do que a força de milhares de trabalhadoras e trabalhadores organizados desde seus sindicatos e locais de trabalho.

O PSOL compõe a mesma frente com o PT, porém, apesar de muitos posicionamentos de suas referências públicas, não apresenta outra saída estratégica ao se silenciar sobre as manobras da burocracia sindical, sem fazer qualquer tipo de chamado a organização dos trabalhadores para superar esse obstáculo enorme de um punhado de burocratas que não se enfrentam com o governo para não perder seus poucos privilégios.

A corrida para aprovação da reforma da previdência já tem data marcada, e até fevereiro, precisamos organizar nossas forças para mostrar o peso da nossa classe e impedir a aprovação desse grande ataque. Cabe às centrais sindicais convocarem em todos os locais de trabalho e estudo assembleias e comandos de base para organizar a luta, preparando uma greve geral contra a reforma da previdência.

Nós do MRT faremos parte de qualquer medida unificada contra a reforma draconiana que querem implementar os capitalistas, apresentando nessa frente única dos trabalhadores nossa perspectiva também de batalhar por uma saída para que os capitalistas paguem pela crise, que deve desenvolva, junto ao rechaço urgente à reforma da previdência e às demais retiradas de direitos econômicos e políticos, pontos programáticos que ataquem a espoliação imperialista e os lucros capitalistas. Além disso, é preciso atacar o reacionarismo contra a população LGBT, mulheres, negras e negros e indígenas, lutando pela demarcação das terras quilombolas e dos povos originários, igualdade salarial entre negras, negros, brancas e brancos, homens e mulheres, trans e cis. Precisamos nos organizar desde cada local de trabalho e estudo, impondo aos sindicatos e centrais sindicais um plano de luta e batalhando para recuperar os sindicatos e centros acadêmicos para a luta de classes. E lutar juntos para derrotar a reforma da previdência, a reforma trabalhista e todos os ataques já anunciados pelo novo governo.

 
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