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BOLSONARO E ESTADOS UNIDOS
O vassalo Bolsonaro no altar de Trump
André Barbieri
São Paulo | @AcierAndy

Poucos movimentos político-econômicos entre Estados nacionais se dão hoje por fora da disputa geopolítica entre Estados Unidos e China. Ambos os países se encontram em guerra comercial aberta, de variada intensidade. Não está descartado que Trump utilize a vassalagem de Bolsonaro como alavanca para conter o avanço da China na América Latina em geral, e no Brasil em particular.

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Há muito Bolsonaro promete estender um tapete vermelho que vai de Washington a Brasília. Em 2017, estando em evento na Florida, enquanto afirmava defender o legado da ditadura militar de 64, patrocinada pelos Estados Unidos, Bolsonaro batia continência à bandeira norte-americana e prometia que "se for eleito, estejam seguros de que Trump terá um aliado no hemisfério Sul [...] Trump é um exemplo pra mim".

Tampouco se distingue pela dignidade a entrevista posterior de Bolsonaro, própria de um esbirro submisso, na qual afirmava esperançoso que "com certeza, Trump sabe que eu existo...".

Essa vassalagem de Bolsonaro a Trump e aos Estados Unidos compõe boa parte de seu programa. A orientação proposta pelo dueto Bolsonaro-Guedes na política externa surge com enorme sintonia aos interesses do Pentágono e da CIA. Prometeram retirar-se do Conselho de Direitos Humanos da ONU (que expediu liminar pelo direito de Lula participar das eleições em 2018); transferir a embaixada a Jerusalém; opor-se ao avanço econômico da China; adotar uma política de "mudança de regime" para a Venezuela.

Além disso, Guedes foi enfático ao afirmar à imprensa argentina que o Mercosul "não é prioridade" para o futura gestão do Brasil, que terá como prioridade "comercializar com todo o mundo". Isso alarmou o gabinete direitista de Macri até os cabelos.

Já tendo oferecido a base de Alcântara no Maranhão aos Estados Unidos, e seguindo a entrega "express" do pré-Sal às petroleiras norte-americanas, Bolsonaro atende os requisitos do que poderíamos chamar como a filial local do programa "America First" de Trump.

Não à toa, o novo presidente – fruto das eleições mais manipuladas da história recente, diga-se de passagem – ajoelhado no altar de Washington, foi imediatamente parabenizado por Trump, que através de tweet afirmou que os Estados Unidos terão "boas relações comerciais e militares com o Brasil"

A relação militar é uma das formas em que Trump quer aproveitar o novo servo brasileiro. O setor aeroespacial dos EUA ainda não metabolizou bem a perda para a Suécia, em 2013, da encomenda de 36 supersônicos para renovação da frota da FAB, uma transação de 5,4 bilhões de dólares. A escolha de parceiros franceses e chineses para atender aos programas de satélites também não foi bem aceita. Entre os quatro grupos finalistas na escolha do consórcio que construirá quatro novas corvetas para a Marinha não há nenhuma empresa dos Estados Unidos (cujo contrato é do valor de 1,6 bilhão de dólares).

Assim, o escravista Bolsonaro quer ir muito mais longe do que a subordinação de Lula e Dilma ao "amo do Norte", que em meio a sua completa submissão ao capital financeiro internacional, mantinha ainda alguma margem de manobra com suas "global players" e divergência parciais em temas como o acordo nuclear com o Irã.

Segundo Leon Trotsky, esta subserviência entreguista é uma característica vital de um governo bonapartista de direita em países de desenvolvimento capitalista atrasado, como o Brasil, dependentes do capital estrangeiro em cada aspecto de sua vida política, social e econômica. Para os países latinoamericanos, Trotsky analisava que esse tipo de governo "é a expressão da dependência mais servil ao imperialismo estrangeiro".

A “era Donald Trump” já se destacava pelo agressivo retorno dos “nacionalismos econômicos” e por uma maior tentativa de ingerência na política interna dos países, não só por parte dos EUA, mas do imperialismo mundial de conjunto. A Operação Lava Jato com a prisão arbitrária de Lula, a pressão por privatizar enormes empresas como a Petrobras e a Eletrobras, o autoritarismo judiciário e a politização das Forças Armadas são expressões dos interesses imperialistas no país.

Agora, com Bolsonaro, tem um aliado importante para nutrir planos de intervenção nos países latinoamericanos, e especialmente para avançar no restabelecimento de seu pátio traseiro econômico e geopolítico.

Bolsonaro será um ator nas disputas geopolíticas entre Estados Unidos e China?

Poucos movimentos político-econômicos entre Estados nacionais se dão hoje por fora da disputa geopolítica entre Estados Unidos e China. Ambos os países se encontram em guerra comercial aberta, de variada intensidade. A crise econômica mundial reestruturou as disputas interimperialistas, e em particular a guerra comercial entre o imperialismo estadunidense e o gigante chinês. Com isso, modificou o curso da política interna nos países dependentes e semicoloniais.

Não está descartado que Trump utilize a vassalagem de Bolsonaro como alavanca para conter o avanço da China na América Latina em geral, e no Brasil em particular.

O ex-guru de Trump, Steve Bannon, fez questão de terminar sua ode elogiosa a Bolsonaro, em entrevista para a Folha, justamente soprando esta nota: "Bolsonaro vai cortar gastos, fazer a reforma da Previdência, estimular o empreendedorismo. Mas o Brasil deveria estar preocupado e fazer algo a respeito do capitalismo predatório da China. Não se trata de confrontá-los, trata-se de aprofundar o relacionamento com os Estados Unidos."

Para isso confiam em Bolsonaro. A inimizade retórica de Bolsonaro com a China teve distintos episódios, sintetizados na sentença "Os chineses não estão comprando no Brasil, estão comprando o Brasil". Irritou Pequim ao visitar Taiwan, país considerado pela China como parte de seu território.

A China é o principal parceiro comercial do Brasil, com massivo consumo das matérias-primas exportadas pelo país em todo o ciclo econômico da década de 2000, especialmente a soja e o minério de ferro, mas também petróleo. O comércio bilateral entre a China e o Brasil foi de 75 bilhões de dólares em 2017, de acordo com estatísticas do governo brasileiro. A tendência vinha sendo que em poucos anos a China ultrapassaria os EUA e toda União Europeia em “estoque” de capital investido no Brasil.

Também no ramo do petróleo o interesse chinês adentra o Brasil. A Petrobras e o China Development Bank (CDB) assinaram um acordo em 2017 para a liberação de financiamento de 5 bilhões - segunda parcela de um empréstimo de US$ 10 bilhões - para a extração do pré-Sal.

Geopoliticamente, a China é contrária à intervenção dos Estados Unidos na Venezuela.

Diante da magnitude desses investimentos, o dissabor entre a China e Bolsonaro antes das eleições foi patente. O ministro-conselheiro da Embaixada da China no Brasil, Qu Yuhu, disse que as afirmações de Bolsonaro contra a China refletem "falta de conhecimento do conteúdo estratégico de nossa parceria [...] O novo governo vai ter uma nova agenda e vamos precisar de um período de adaptação".

O porta-voz do Ministério das Relações Exteriores chinês, Lu Kang, foi ainda mais duro, dias antes do segundo turno, afirmando que o Brasil não deveria permitir insinuações como as de Bolsonaro, já que os chineses se permitem investir num país tão arriscado quanto o Brasil.

Mas depois do triunfo de Bolsonaro, o governo chinês buscou amenizar o tom. O própio Kang foi encarregado de mostrar que as portas com a China estão abertas: "Esperamos que os dois países (China e Brasil) fortaleçam a cooperação dentro dos BRICS e a cooperação multilateral, servindo ao interesse comum dos países em desenvolvimento e os mercados emergentes". A China espera que o novo governo amplie as concessões de infraestrutura e realize privatizações com a participação do capital estrangeiro, dentro da qual busca lugar privilegiado.

Há que ver para onde se desenvolvem estes antagonismos, sabendo que grandes capitalistas nacionais tem polpudos negócios com a China, e não estão satisfeitos com os arroubos de Bolsonaro contra Pequim. É o caso da Vale, que tem grande participação de capital chinês e é a maior exportadora de minério de ferro ao gigante asiático. Fábio Scharvstman, presidente da Vale, pôs freios às críticas bolsonarista a Pequim.

Por um lado, o Brasil é dependente das vendas pra China; mas a China, por sua vez, teria dificuldade de abastecimento se tomasse medidas contra o Brasil (já as tendo tomado contra os EUA). Sem exagerar os termos, há a hipótese de que o alinhamento de Bolsonaro a Trump aumenta o poder de barganha dos EUA na guerra comercial com a China.

Não fique de fora a situação difícil da economia brasileira, que põe embaraços a qualquer ruído nas relações sino-brasileiras: o Brasil amarga 12% de desemprego, déficit de 8% do PIB, e uma dependência gigantesca das exportações de matérias-primas.

O que é certo é que, desde já, o Brasil se acirrará como campo de disputa de influência entre EUA e China, como plataforma para toda a América Latina. Por ora, Trump tem o trunfo.

Anti-imperialismo

Frente ao plano imperialista na região, de subordiná-la mais diretamente com o auxílio do escravista Bolsonaro, a batalha contra o imperialismo na região se torna ainda mais premente. Isso não pode ser feito com os métodos da "oposição pacífica e parlamentar" do PT, que durante 13 anos no Executivo, para além de divergências episódicas e secundárias, abriu espaço para os superlucros do capital financeiro imperialista, em primeiro lugar dos Estados Unidos, pagando religiosamente a fraudulenta dívida pública.

Essa foi a sina dos governos nacionalistas burgueses na América Latina, como o PT: enchiam a boca para falar sobre a “unidade latino-americana” e nem sequer foram capazes de discutir em comum a questão da dívida. Não são alternativa ao entreguismo autoritário de Bolsonaro.

Trata-se de apostar a que a própria classe trabalhadora conquiste sua força política com um programa anticapitalista que se proponha tomar o poder. Por exemplo, exigindo o não pagamento da dívida pública, e contra todas as formas de privatização, que a Petrobras seja 100% estatal sob gestão dos trabalhadores e controle popular.

A tarefa estratégica de garantir a unidade da América Latina, sua integração econômica e política, só pode ser feita sob a direção de governos operários de ruptura com o capitalismo, conquistando uma federação de repúblicas socialistas da América Latina que se transforme em um ponto de apoio para a luta de toda a classe trabalhadora internacional.

 
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