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HOMENAGEM AOS 78 ANOS DO ASSASSINATO DE TROTSKY
O internacionalismo de ação de Leon Trotsky
André Barbieri
São Paulo | @AcierAndy

Nenhum dos grandes problemas da luta de classes pode ser resolvido nos limites das fronteiras nacionais. Esta sentença de Trotsky atravessa como um fio vermelho a força lógica de todos os escritos, cartas e discursos do dirigente da Revolução Russa de 1917.

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Nenhum dos grandes problemas da luta de classes pode ser resolvido nos limites das fronteiras nacionais. Esta sentença de Trotsky atravessa como um fio vermelho a força lógica de todos os escritos, cartas e discursos do dirigente da Revolução Russa de 1917. Junto a Lênin, Trotsky é o grande expoente desta idéia simples, mas cujo incontestável caráter marxista seria considerado herético pela monstruosa burocracia stalinista: o destino da revolução russa estava desde o início vinculado ao destino da revolução mundial.

Marx e Engels escreviam no Manifesto do Partido Comunista de 1848 que a classe trabalhadora não tem pátria, sendo que sua atividade política era nacional apenas em sua forma, na luta cotidiana contra a burguesia e seu Estado nacional, mas internacional em seu conteúdo, por irmanar-se aos objetivos de todos os trabalhadores a nível mundial. E de fato, a emancipação de uma classe mundial (que dissolveria os antagonismos de classe em todos os países, dissolvendo os próprios países) não estaria concluída senão no terreno mundial.

Esta concepção, do internacionalismo proletário, caracteriza por excelência o pensamento político revolucionário de Trotsky, que determinava em sua ausência ou deformação um dos primeiros traços do oportunismo nas demais correntes do movimento operário.

As organizações da antiga socialdemocracia (pertencentes à Segunda Internacional), muito antes de sua capitulação histórica em 1914, quando votaram os créditos de guerra da burguesia e inauguraram a época imperialista obrigando os trabalhadores da Europa a massacrarem-se uns aos outros na Primeira Guerra Mundial, concebiam o “internacionalismo” como uma simples federação de partidos nacionais, que tinham pouca coisa em comum além da aversão ao controle internacional, do respeito aos próprios Estados e da “velha tática testada” de almejar o poder através da conquista gradual e pacífica de cargos parlamentares.

A sólida disciplina internacional na ação, que buscavam construir os jovens Partidos Comunistas na Terceira Internacional, fundada por Lênin e Trotsky em 1919, opunha-se justamente a esta visão estreitamente nacional, incapaz de enxergar o caráter e os nexos internos da nova época que chegara, e batalhava para que as idéias revolucionárias se cristalizassem em fortes partidos comunistas a nível nacional, centralizados internacionalmente, que conquistassem a imensa maioria dos trabalhadores na luta contra a burguesia mundial.

Como dirigente da Terceira Internacional e responsável pela seção francesa da Internacional Comunista, a abordagem de Trotsky era profundamente internacionalista. De fato, em março de 1922, logo depois do Terceiro Congresso da Internacional Comunista em 1921, Trotsky redige carta ao jovem Partido Comunista Francês, cuja política ainda apresentava marcas profundas da herança da Segunda Internacional, da qual vinha a maioria dos militantes. A primeira crítica às “sobrevivências do passado” incompatíveis com a nova Internacional era “substituir a disciplina internacional na ação por uma platônica soma de partidos nacionais”.

Insistia que, em nossa época imperialista, ou seja, a da economia e da política mundiais dirigidas pelo capitalismo, não havia mais lugar para que nenhum partido comunista pudesse estabelecer seu programa tendo essencialmente em conta as condições e tendências de seu desenvolvimento nacional. Isto valia igualmente para a URSS como para qualquer país capitalista.

A política do stalinismo, expressa na Terceira Internacional desde 1924, foi de aberto boicote à extensão da revolução internacional, configurando uma série de traições que em seu conjunto prepararam o caminho da Segunda Guerra Mundial, que só pode estourar quando o movimento operário mundial experimentou a derrota da Revolução espanhola.

A burocracia adquiria mais segurança à medida que as derrotas da classe operária internacional – pelas quais era responsável – eram mais terríveis. Deste ponto de vista, era impossível combater a monstruosa burocracia soviética com qualquer variante de socialismo nacional, sem conceber uma estratégia mundial da revolução que integrasse a atividade revolucionária dos trabalhadores em cada país. Da experiência da Revolução Chinesa de 1925-1927 e do combate ao stalinismo Trotsky extrai o material para dar o acabamento superior desta “Grande estratégia”: a Teoria da Revolução Permanente.

Assim, combatendo o stalinismo, que se fez herdeiro do nacionalismo reformista da socialdemocracia com a “nova teoria” do “socialismo num só país”, que agravava o isolamento internacional da URSS em benefício da usurpação do poder político dos trabalhadores, Trotsky batalhou por construir organizações revolucionárias com uma perspectiva política global, capazes de incidir no desenvolvimento real da luta de classes, ou em condições menos favoráveis, permanecer como correntes armadas com estas lições. Educava as organizações Oposição de Esquerda Internacional na necessidade de avançar a revolução mundial, cujas batalhas dariam origem à IV Internacional.

O alarme de morte dos programas nacionais soou definitivamente a 4 de agosto de 1914. O partido revolucionário do proletariado só poderá basear-se em um programa internacional que corresponda ao caráter da época atual, o de máximo desenvolvimento e decadência do capitalismo.” (“Crítica ao Projeto de Programa da Internacional Comunista”)

Trotsky afirmava que a base internacionalista do programa comunista não podia ser uma simples federação de programas nacionais, em que os trabalhadores não se ocupassem das grandes questões do movimento operário mundial, mas devia tomar diretamente como ponto de partida a análise das condições e das tendências da economia mundial, o estado das relações políticas entre os países e entre as classes sociais de cada país, para definir como atuar na arena nacional.

Esta era a base de sua crítica à seção alemã da Oposição de Esquerda em janeiro de 1931, contra a indiferença diante dos problemas internacionais que levava a colocar a disciplina do grupo alemão acima da organização internacional, traço marcante do centrismo, que “não compreende que na época atual somente é possível construir um partido revolucionário nacional como parte de um partido internacional” (“O centrismo e a IV Internacional”).

É incrível que, ainda hoje, em meio ao sétimo ano da crise mundial, exista um amplo arco de organizações que reivindicam o trotskismo e que digam que antes de “construir algo internacionalmente” precisam “ganhar força em nosso próprio país”! Ou mesmo organizações trotskistas que se satisfazem em “adicionar grupos” em alguns países que não mantêm qualquer relação política entre si!

A época imperialista eliminou qualquer possibilidade de êxito desta variante de socialismo nacional. Unindo entre si países e continentes que se encontravam em etapas diferentes de desenvolvimento através de um sistema de dependência e oposição, aproximando e combinando estes diversos níveis de desenvolvimento e opondo-os entre si através das fronteiras nacionais, o imperialismo havia convertido a economia mundial em uma realidade poderosa que determinava cada uma de suas partes componentes. A economia mundial dava então aos trabalhadores uma tarefa que, se dizia respeito também à solução das contradições nacionais, só poderia ser definida na arena internacional, já que a principal contradição a se enfrentar é a que existe entre o crescimento das forças produtivas mundiais e as fronteiras que separam as nações e os Estados. “Por si mesmo, este fato fundamental confere um caráter profundamente realista à idéia de um partido comunista mundial”.

Na época atual, infinitamente mais que durante todas as precedentes, só pode e deve deduzir-se o sentido em que se dirige o proletariado em sua atividade nacional a partir do ponto de vista internacional, e não o contrário. Nisto consiste a diferença fundamental que distingue, desde o ponto de partida, o internacionalismo comunista das diversas variantes do socialismo nacional”.

Este internacionalismo operário (e não as versões “remasterizadas” pelas organizações trotskistas que abandonaram este enfoque na segunda metade do século XX), foi provado pela história, que desautorizou a “teoria do socialismo num só país” ou o retrocesso que significavam, frente ao internacionalismo marxista, as ideologias nacionalistas de esquerda. Os triunfos revolucionários em um país só podem preparar as condições para a luta em maior escala contra o imperialismo a nível internacional, uma vez que não buscamos um “conjunto de ditaduras do proletariado”, mas sim uma sociedade comunista que emancipe a humanidade de toda divisão entre classes sociais e a existência estatal.

A burguesia e seus eminentes teóricos reconhecem a força desta idéia pela negativa, como uma “anomalia teórica” de Trotsky. O estratega militar norteamericano Harold Walter Nelson, que escreve um interessante trabalho sobre o pensamento militar de Trotsky e reconhecendo o brilhantismo de Trotsky na tomada do poder e na guerra civil, diz que, ainda que suas teorias da insurreição ganhassem apoio armado na Rússia, “sua política mais ampla de revolução mundial não se encaixou na realidade”. De fato, Trotsky, como Lênin, mirava o alvo da destruição do imperialismo em seu “centro de gravidade”, para o qual a revolução russa era uma conquista tática. Ao contrário de uma “anomalia”, trata-se da “Grande estratégia” da revolução operária e socialista na época imperialista.

Estas valiosas lições do tesouro ideológico do trotskismo são a base fundante do que para nós significa orientar-se por um internacionalismo operário de ação. O internacionalismo como compreensão de uma época histórica, a da revolução mundial dos trabalhadores; o internacionalismo como conteúdo político da atividade proletária, e portanto, o programa internacional como guia da política nacional; o internacionalismo como partido comunista mundial, o Estado Maior da revolução mundial como necessidade concreta que organize os grupos revolucionários dos trabalhadores em cada país, porque “nenhum dos grandes problemas da luta de classes pode ser resolvido nos limites das fronteiras nacionais”.

 
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