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FUNDAÇÃO SANTO ANDRÉ
Defender a Fundação Santo André é preciso
Maíra Machado

Com poucas paredes e grandes espaços abertos, livres para o livre pensamento, foi inaugurada em 1967 a Fundação Santo André. A partir de uma parceria entre Santo André, São Caetano e São Bernardo Campo, estava fundada e sem fins lucrativos a universidade do ABC que tinha como princípio primeiro atender aos milhares de filhos e filhas dos trabalhadores das grandes montadoras que se acumulavam no subúrbio paulistano e que precisariam de uma formação de qualidade e principalmente barata.

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Com poucas paredes e grandes espaços abertos, livres para o livre pensamento, foi inaugurada em 1967 a Fundação Santo André. A partir de uma parceria entre Santo André, São Caetano e São Bernardo Campo, estava fundada e sem fins lucrativos a universidade do ABC que tinha como princípio primeiro atender aos milhares de filhos e filhas dos trabalhadores das grandes montadoras que se acumulavam no subúrbio paulistano e que precisariam de uma formação de qualidade e principalmente barata.

A Fundação é querida de todos que por ela passaram, mudou a história individual de muita gente, contribuiu para um grande número de professores que atuam nas salas de aula das escolas públicas na região de todo o ABC, graças a um passado de teoria marxista, principalmente no curso de Ciências Sociais, podemos afirmar com certeza que milhares de alunos do estado entram na vida adulta sabendo que no século passado uma grande revolução de trabalhadores sacudiu a Europa e foi responsável por mudanças indescritíveis em todo o planeta.

Quantas alegrias sentimos ao compartilhar com um colega de trabalho, professor ou professora que tem sua história marcada pelos conflitos entre FAFIL e FAECO, pela luta ideológica perpetuada há anos entre as ciências humanas e as exatas, os projetos comuns entre os que serão professores, os sonhos que todos tínhamos e temos de que alguma hora a Fundação será pública e gratuita.

Eu sou parte orgânica dessa história, fiz o colégio na Fundação, ali comecei a descobrir o mundo adulto, quantas paixões eu vivi naquele lugar! Em 1997 fiz o Vestibulinho que era muito concorrido e entrei no colégio com uma bolsa de estudos considerável, eram na época 8 salas de primeiro ano cada uma com cerca de 60 alunos, nos perdíamos entre os universitários e conhecíamos cada buraco daquele lugar. Verdade, eu era de uma turma um pouco rebelde, fazia teatro e participava das discussões políticas acaloradas que tomavam já naquela época os prédios da Fundação.

Ali comecei a me interessar por política, grande novidade para jovens que nem tinham saído das fraldas, minhas amigas na época diziam que votariam em mim pra presidente, maioria esmagadora simpatizava com o PT, que ainda nos anos 90 conseguia passar a ilusão que estava ao lado dos “pobres”. Penava em cada prova de física e amava encontrar o Rubão, inspetor dos alunos que nos dava balas pra convencer que tínhamos que subir pra aula, até hoje me emociono quando o encontro casualmente perto da Estação de trem tentando ganhar algum trocado. Sim o Rubão foi um dos demitidos nas ultimas levas de ataques, há uns 5 anos atrás. Estava velho. Já não servia mais pra cuidar dos alunos, os anos que dedicou a Fundação foram esquecidos, relegados. Como em qualquer empresa capitalista, a vida que deixou ali foi trocada por salário mais baixo e o aumento da precarização de trabalhadores e também da própria instituição.

Hoje o colégio da Fundação, tem mais pompa. Um prédio só pra ele. Porém não atende mais milhares de jovens, hoje são poucos que estudam lá. O colégio foi diminuindo ao passo em que as bolsas de estudo foram ficando mais restritas e a mensalidade mais alta. De pensar que na minha época todo mundo queria estudar lá.

Quando terminei o colégio, nem pensava mais em estudar na Fundação. Fui fazer história na PUC-SP e lá conheci muita gente e a perspectiva revolucionaria de transformação da sociedade. Lá encontrei um grande mestre que me levou de volta à Fundação em 2007, o professor Rago dizia que precisávamos estudar os trabalhadores do ABC, fazer pesquisas pra saber o que pensavam e que ele era professor da Fundação porque foi convencido que poderia no ABC cumprir esse papel. Bom, lá estava eu de volta no curso de Sociais num grande ano pro movimento estudantil.

Em 2007 teve ocupação de reitoria em tudo que é canto. Ocupamos a reitoria da Fundação exigindo que o reitor Odair Bermelho saísse imediatamente! Ele roubou milhões de reais da FSA! Nossa ocupação exigia redução imediata das mensalidades e um setor importante do qual eu fazia parte, lutava pela anistia de todos os inadimplentes! Em poucas horas de ocupação a polícia chegou e bateu muito na gente, claro ali estavam jovens proletários, negros que deveriam agradecer por ter a oportunidade de estudar e não ficar fazendo baderna! Vários foram presos e os que se safaram foram em uma grande marcha até as portas da delegacia.

Enquanto estávamos “refugiados” entramos em contato com Rago, Lívia Cotrim, Ivan Cotrim e outros professores que nos encontraram na marcha para a delegacia. Esse episódio desencadeou uma greve de todos os cursos da Fundação que durou mais de 60 dias, com barricadas pelos corredores e um questionamento muito profundo do papel da universidade. A vida tomava conta daquele espaço. Assembleias nos cursos, discussões fortes sobre o rumo da luta, festas na quadra de milhares de pessoas, antes de sermos proibidos de usar o espaço que é nosso.

A greve deixou marcas profundas, até hoje quando encontramos alguém que viveu esse momento a nostalgia é forte. Infelizmente o movimento fortíssimo que se expressava ali acabou tomando um rumo muito perigoso, ao não defenderem maioria estudantil e um governo universitário que os estudantes pudessem expressar o peso que tem na universidade, as direções que estavam à frente do conflito levaram os estudantes para uma emboscada, transformaram a luta pela queda do reitor na defesa de um novo candidato, que esse sim “era do movimento”.

Em 2008, Bermelho cai, nem preciso dizer o tamanho da festa dessa vitória e no final do ano tem novas eleições. Todo o movimento sai em defesa de Oduvaldo Cacalano, com músicas que entoavam que esse seria o reitor para os estudantes! Nós da antiga LER-QI lutamos muito para convencer os estudantes que essa era uma armadilha, que não pode ser que um pequeno setor dos professores que ocupa cargos administrativos e assim assume a defesa de interesses privados contra o interesse da comunidade, possam levar a frente as demandas dos estudantes, era certo que Cacalano iria atacar.

Mas não teve jeito, assim as angústias de todo o corpo universitário foram canalizadas. Cacalano, o novo reitor não tardou em mostrar suas garras, em 2009 muitos estudantes não conseguiram se matricular porque acumulavam muitas dívidas, sem contar que nesse ano o curso de Geografia não abriu novas turmas! Cacalano manteve a intransigência, não negociava. Teve gente que se endividou por outro lado e pagou a matricula, mas e para pagar as mensalidades? Assim a Fundação foi chegando a um nível de 50% de inadimplência.

Mas teve resistência! “Desafiando a Miséria do Possível” dezenas de estudantes travaram a luta contra o aumento dos preços da cantina e contra a super exploração do trabalho a que estavam submetidos os trabalhadores e conquistaram ao final, refeições a preços mais baratos, mas, além disso, montaram uma chapa combativa para o Diretoria Acadêmico. A chapa foi motivo de discussões profundas nas salas de aula, com professores perguntando aos alunos o que isso queria dizer.

Um ano de gestão! Muito enfrentamento com a reitoria! Desafiar a Miséria do Possível permitiu que os estudantes resistissem e levantassem a cabeça frente aos ataques do reitor. Ao final do mandato, uma chapa branda assumiu o DA, com o discurso de que o diálogo era possível, contribuíram enormemente para uma reacomodação e um enorme esvaziamento do movimento estudantil, ao final dessa gestão um muro era construído pela reitoria Cacalano em frente ao Diretório Acadêmico, um retrocesso enorme que só agora começou a ser revertido.

2013 passou pela FSA sem grandes alardes. Os estudantes foram aos atos desorganizados e atuaram como indivíduos, mas a grande marcha da juventude deixou marcas e o movimento estudantil voltou a se mostrar. Uma “Faísca Revolucionaria” ronda os espaços dos estudantes e questiona a horizontalidade propagandeada pela atual gestão do Diretório Acadêmico que não aprendeu ainda que não existe dialogo possível com aqueles que nos atacam.

No início do ano o novo reitor, Amilton ex-professor do curso de história devolveu o DA para os estudantes. Tão bom o reitor! Anunciou na sequência a demissão de todos os professores com mais de 70 anos e o corte de verbas para a instituição, acompanhando o movimento que faz seu partido, o PT, nacionalmente descarregando a crise econômica e política nas costas dos trabalhadores e da juventude. Amilton anunciou a implantação de catracas para restringir o ir e vir dos estudantes e toda uma nova política de segurança do campus sem debate algum com a comunidade acadêmica, talvez em pouco tempo a polícia estaria lá para defender o patrimônio dos alunos em luta. Nesse ano de 2015 já teve greve, contra os ditames da reitoria que queria no marco de tantos ataques, reduzir a carga horária dos cursos de humanas e precarizar ainda mais a Fundação Santo André. Amilton devolveu o Diretório, pois sabia que os ataques seriam de fundo

Muitos inadimplentes e cursos cada vez mais reduzidos. Todo início de ano ex-alunos e atuais alunos da Fundação sofrem com a ameaça de que os cursos de humanas não sobreviverão, já que com mensalidades tão altas fica difícil de bancar. Além disso, a demanda de anistia das dívidas dos inadimplentes segue vigente, como estudar endividado? Se a Fundação está em crise financeira, todos nós que fazemos parte da comunidade acadêmica temos que ter acesso aos livros de contabilidade da instituição! Quanto entra e quanto sai? Para os bolsos de quem vai esse dinheiro? Porém, Amilton misteriosamente renunciou ao cargo de reitor na semana passada, parece que foi lecionar numa universidade federal, seus correligionários, como o prefeito Grana declaram que Amilton está doente. O que sabemos é que ele largou tudo para trás sem explicar nada! Talvez seja esse o anuncio de tempos mais difíceis ainda num cenário nacional de profundo questionamento e ataque ao ensino superior.

Nessa reorganização do Movimento estudantil em todo o país e na Fundação Santo André as lições devem ser tiradas, confiar em reitor não pode! As novas eleições serão chamadas e lutamos para que a estrutura de poder arcaica presente na Fundação seja duramente questionada! Acendemos uma pequena faísca na esperança que a luta por uma fundação pública e gratuita seja tomada por todos e que a nossa Fundação seja finalmente a universidade dos trabalhadores.

 
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