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IX COLÓQUIO MARX-ENGELS
Nas trilhas de Karl Karl Liebknecht: a atualidade do Parlamentarismo Revolucionário, um estudo do PTS na Argentina
Gonzalo Adrian Rojas
Shimenny Wanderley
Campina Grande

Na quarta-feira 18 de julho na primeira sessão do Grupo de Trabalho 10: O socialismo na atualidade apresentamos um trabalho de nossa autoria sobre Parlamentarismo Revolucionário que articula a tradição política do marxismo revolucionário da III Internacional bolchevique, em particular Karl Liebknecht com a prática política do Partido de Trabajadores Socialistas (PTS) da Argentina. Neste artigo realizamos uma síntese de nossa comunicação no evento.

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O objetivo desta foi problematizar um fenômeno político que não é novo política e institucionalmente em termos históricos, mas que aparece como novo e de forma original na Argentina, retomando uma tradição política no campo do marxismo revolucionário internacional que é conhecida como “Parlamentarismo Revolucionário”. Trata da participação de partidos políticos revolucionários no Parlamento de uma forma específica em termos táticos, não estratégicos, no marco de uma democracia liberal. A atuação no parlamento é entendida aqui como um dos métodos de luta política da classe operária.

Nos interessa relacionar uma experiência paradigmática, a do socialista alemão Karl Liebknecht, que foi o único deputado no Reichstag (Parlamento) em votar contra os créditos de guerra na Primeira Guerra Mundial, com a prática política dos legisladores do Partido de los Trabajadores Socialistas (PTS) integrante da Frente de Izquierda y de los Trabajadores (FIT) na Argentina, no período de dezembro de 2013 até março de 2018, cientes que continua e cresce como fenômeno político.

Dividimos o trabalho, depois da introdução, em duas partes, a primeira sobre K. Liebknecht analisando seus posicionamentos através de seus escritos políticos e sua prática parlamentar e a segunda parte sobre o PTS e atuação de seus legisladores em termos táticos e estratégicos, para finalizar com uma breve conclusão.

Trabalhamos duas hipóteses. A primeira que existe uma continuidade histórica no marxismo revolucionário na tática do Parlamentarismo Revolucionário, entre K. Liebknetch e os legisladores do PTS, uma trilha, uma continuidade, poderíamos afirmar um fio vermelho. A segunda é que chamamos, esta participação política como contendo elementos transicionais.

Tomamos a teoria marxista em términos teóricos para realizar uma análise empírico, entendendo em termos epistemológicos que fazem parte de uma totalidade, fazendo parte o Parlamentarismo Revolucionário da herança do comunista e socialista do século XX, articulando elementos históricos, teóricos e políticos, que se expressam na luta pelo socialismo na atualidade.

Karl Liebknecht, o “inflexível” como parlamentar revolucionário

O Partido Bolchevique cria uma nova base para a tática do proletariado em relação ao Parlamento, que conhecemos como Parlamentarismo Revolucionário, nos remitindo suas primeiras experiências a Rússia posterior a Revolução de 1905, centralmente na experiência deste partido na segunda Duma (parlamento russo) em 1907. Em múltiplos escritos e polémicas Lenin defendia a participação nesses espaços como uma tribuna de agitação, de propaganda das ideias revolucionárias, de denúncia do próprio regime político, sem nenhuma ilusão quanto aos limites desse espaço, fazendo um uso tático desse espaço em prol da estratégia revolucionária.

O caso mais emblemático de parlamentarismo revolucionário aconteceu na Alemanha, foi do deputado socialista Liebknecht em 1914 com seu voto contra os novos créditos de guerra, que a classe dominante alemã precisava para a I Guerra Mundial. A articulação entre a luta parlamentar e extraparlamentar subordinando a primeira a segunda, a tática a estratégia, faz de Liebknecht o mais emblemático dos parlamentares revolucionários.

Os escritos políticos do camarada de Rosa Luxemburg, estão bastante dispersos, mas conseguimos organizar os principais para sua análise.

O primeiro são os Fundamento do voto contra a aprovação dos créditos de guerra na sessão parlamentar do dia 02 de dezembro de 1914 na Alemanha. No fundamento de seu voto caracteriza de forma adequada a Primeira Guerra Mundial como uma guerra inter-imperialista, em termos leninistas, pela dominação capitalista do mercado mundial e pela dominação política de importantes regiões para instalar capital industrial e bancário. Também a entende como um empreendimento bonapartista buscando desmoralizar e destruir a ascensão do movimento operário internacional. Vota contra a guerra e explica sua posição, acatando o acúmulo de deliberações do VII Congresso da Internacional Socialista, realizado em Stuttgart em 1907; as resoluções do Congresso de Copenhagen de 1910 e o Manifesto do IX Congresso Extraordinário de Basileia, novembro de 1912, já que se referem ao posicionamento político sobre a guerra, que estabeleceu que em caso fosse pautado nos Parlamentos os créditos de guerra, os deputados socialistas deveriam votar contra estes. Liebknecht contrariou a deliberação do Partido Social Democrata Alemão (PSDAl) impulsionada pela ala oportunista maioritária, mas esta desconheceu resoluções da Internacional.

Liebknecht dirige uma Carta a redação do Labour Leader da Inglaterra, desde Berlin, Alemanha, em dezembro de 1914, em termos de fraternidade internacionalista aos trabalhadores socialistas ingleses desde o socialismo alemão, em momentos em que as classes dominantes desses países estão em guerra. Depois da confusão causada pelo abandono dos princípios socialistas por parte da maioria dos partidos da II Internacional, esta iniciativa política tem ainda mais relevância e já enxerga a necessidade de construção de uma nova internacional. Tanto os trabalhadores socialistas internacionalistas ingleses, assim como os russos e os sérvios são tomados como exemplos de luta contra a guerra e pela paz. Antecipa a tese de que cada Partido socialista tem o inimigo no seu próprio país e é a ele que se deve combater, assim que, frente a todos os discursos demagógicos da burguesia, a libertação de cada povo será obra dele próprio. Na sua perspectiva não tem dúvidas que a prosperidade dos povos está indissociavelmente ligada a luta de classes do proletariado e esta não pode se dar senão numa base internacional. Conclui com a frase do manifesto do Partido Comunista: Proletários de todos os países uni-vos! e acrescenta Guerra à Guerra!

Em maio de 1915 Liebknecht publica O inimigo principal está no próprio país e continua aprofundando argumentos contra a guerra inter-imperialista. Sendo que as classes dominantes partem do suposto que o povo esquece rápido e especulam com a paciência das massas, o revolucionário alemão levanta como palavras de ordem: “Tudo a aprender, Nada a esquecer!”. Além disso, destaca a luta heroica dos socialistas internacionalista italianos e a importância de ter como orientação política geral a luta de classe proletária contra a matança imperialista internacional para reafirmar que o inimigo principal de cada povo está no próprio país, e exorta ao fim do genocídio apelando a unidade do proletariado numa luta de classes internacional, contra a diplomacia secreta e por uma paz socialista.

Escreve também uma Carta a Conferência de Zimmerwald, desde Berlin, na prisão, em 1905. Para Liebknecht duas tarefas centrais têm a Conferência: a primeira é um acerto de contas com os desertores da Internacional e o apoio político aqueles que estão resolutos em não recuar um só passo diante do imperialismo internacional. Deve-se ter clareza da posição dos socialistas internacionalistas com relação a guerra mundial e tirar as conclusões táticas de princípios sem relativizar por países.

Impulsionando a luta de classes internacional pela paz e a revolução socialista contra a unidade nacional e harmonia que querem impor as burguesias. O parlamentar revolucionário tem a perspectiva também de construção de uma nova internacional sobre bases mais solidas sob a ruina da antiga.

Por sua vez John Reed agrupa textos do revolucionário alemão num livro intitulado Contra a guerra Karl Liebknecht. No artigo Declaração no Reichstag em 02 de dezembro de 1914, conta a trajetória de Liebknecht, com foco no dia 02 de dezembro de 1914, na segunda sessão pela aprovação de créditos de guerra, expressando que seu voto negativo dividiu a social democracia entre os reformistas dirigidos por Karl Kautsky e os revolucionários, que mais tarde formaram a Liga Spartaquista, base do futuro Partido Comunista da Alemanha.

Junto com a de Liebknecht podemos mencionar no mínimo duas outras experiências de Parlamentarismo Revolucionário, nesse mesmo período histórico, a de Zeth Höglund na Suécia, e as experiências do bloco parlamentar revolucionário búlgaro, que contou com 47 legisladores ou a maioria parlamentar socialista internacionalista na Finlândia mencionada pela revolucionária polonesa-alemã, Rosa Luxemburg no texto A Revolução Russa na sua polémica sobre a autodeterminação nacional com Lenin e Trotsky.

Depois do assassinato de Luxemburg e Liebknecht, León Trotsky redige uma matéria intitulada Karl Liebknecht inflexível onde afirma que seus nomes farão parte do livro de ouro da revolução proletária. Sobre Karl Liebknecht com motivo dos 99 anos de seu brutal assassinato recomendamos a leitura desta outra matéria de nossa autoria.

O fio vermelho

Um estudo de caso do Parlamentarismo Revolucionário no PTS da Argentina

Em nossa perspectiva existe um fio vermelho que une a prática política de Karl Liebknetcht com o PTS.

O PTS foi fundado no final dos anos oitenta, a partir de uma cisão do Movimiento al Socialismo (MAS), originado na Tendência Bolchevique Internacionalista (TBI), uma corrente interna formada no processo de debate iniciado no III Congresso do MAS.

O MAS foi um partido fundado por Nahuel Moreno, que teve sua origem no Partido Socialista dos Trabalhadores (PST) e fez parte da Liga Internacionalista dos Trabalhadores (LIT). Como afirma Gabriela Lizst em Historia y balance del MAS argentino, publicado na Revista Lucha de Clases (2006), em seus primeiros documentos, o PTS declarava que o MAS tinha uma definição revisionista do internacionalismo e que se convertera em nacional-trotskista, polemizando com a linha oficial do MAS naquele momento, segundo a qual a Argentina era "o centro da revolução mundial" porque tinha o maior partido trotskista do mundo. Nestes primeiros documentos, o PTS ainda reivindicava o legado político de Moreno entendendo que a direção do MAS havia se "degenerado" depois da morte deste.

Posteriormente o PTS publicou vários balanços críticos sobre a trajetória de Moreno, os mais completos são realizados por Manolo Romano elaborado para a Fração Trotskista – Quarta Internacional (FT-QI) intitulado Polémica con la LIT y el Legado Teórico de Nahuel Moreno e publicado na Revista Estratégia Internacional número 3 de dezembro de 1993 e janeiro de 1994 e por Emilio Albamonte, Freddy Lizarraga e Manolo Romano para os números posteriores (4 e 5) de julho de 1995, da mesma revista, La estratégia soviética en la lucha por la república obrera.

Num momento que as outras organizações da esquerda no país focaram sua construção no movimento dos trabalhadores desempregados, o PTS escolheu construir-se nas principais concentrações operárias, assumindo um papel decisivo na luta dos operários de Zanon e outras fábricas de Neuquén, Córdoba e da zona norte da Grande Buenos Aires.

Esta estratégia, com o crescimento econômico, depois do ano 2003 depois da crise do “Argentinazo” e no marco da recomposição política do regime realizado pelos governos kirchenristas levou o partido a participar das principais experiências da luta de classes nessa década, sendo protagonista do fenômeno conhecido no país como “sindicalismo de base”, classista e antiburocrático, fortalecendo uma tradição da luta independente dos trabalhadores.

Ligada a este desenvolvimento, surge a FIT em 2011, num momento de aprofundamento da crise capitalista mundial, longe de ser apenas um “fenômeno eleitoral” foi o produto de uma década de luta dos trabalhadores na Argentina. Representou, em síntese, o “salto” de uma enorme camada de trabalhadores, mulheres e jovens, das lutas sindicais para a militância política “anticapitalista”.

Articulado ao anterior focamos num estudo de caso a experiência do PTS e a FIT na Argentina, no qual encontramos exemplos concretos do que significa o parlamentarismo revolucionário em ação, tendo em consideração os mandatos legislativos tanto no plano nacional, estadual e municipal.

Estes deputados são referências por suas denúncias dentro do parlamento argentino contra os ataques aos explorados e oprimidos. Isto junto a uma caraterística destes deputados que é sua vinculação as lutas extraparlamentares. Atuam no Parlamento como “tribunos do povo” realizando de forma original o uso tático do mandato parlamentar, dentro de uma estratégia revolucionária, anticapitalista, submetendo seu mandato à luta extraparlamentar, colocando-se ao serviço dos trabalhadores, do povo pobre, das mulheres e da juventude nas principais lutas no país, mantendo sua independência política dos patrões, dos governos e do Estado.

A atuação no parlamento é entendida aqui como um dos métodos de luta política pela libertação da classe operária. Nesse sentido comparamos sua ação política com as resoluções do Segundo Congresso da Internacional Comunista, III Internacional Comunista. Manifestos, teses e Resoluções do 2.º Congresso, realizado em Moscou em julho de 1920, onde recuperamos especificamente a parte III que se refere a Tática revolucionária e que apresenta um conjunto de medidas políticas sobre a atuação dos parlamentares revolucionários, para caracterizá-los desta forma.
Na resolução constam doze medidas políticas, mas por questão de espaço, destacaremos três por questões de espaço, para exemplificar.

A medida número cinco, que define que “os deputados devem subordinar toda sua atividade parlamentar a ação extraparlamentar do partido”, e também a número seis, que pauta que “todo deputado deverá se colocar a cabeça das massas proletárias, na primeira fila, bem à vista e nas ações revolucionárias.” Para estes parlamentares revolucionários, isto é uma questão cotidiana, mas aparece com mais força em momentos de repressão como são os exemplos dos deputados del Caño no conflito de LEAR e o de Raul Godoy: em outubro de 2014. O então deputado nacional del Caño foi reprimido com balas de borracha durante um bloqueio de estrada, na Avenida Panamericana na zona Norte da grande Buenos Aires, no marco do conflito operário mais longo da década kirchnerista, em solidariedade com os trabalhadores da fábrica de autopeças LEAR; e mais recentemente, no dia 08 de dezembro de 2017, o deputado em Neuquén Raul Godoy, operário de Fasinpat (Fábrica sem Patrões), foi ferido durante a repressão para desocupar a madeireira “Maderas al Mundo” (MAM) ocupada pelo seus trabalhadores exigindo a reabertura e reinstalação dos postos de trabalho.

A medida política número onze, define que a “tribuna parlamentar deve ser usada para desmascarar a burguesia e seus lacaios” assim como as demais forças políticas com ausência de independência política, fato que ficou claro com o exemplo do juramento de Myriam Bergman na ocasião de sua posse: “Pela luta dos trabalhadores, as mulheres e os povos oprimidos do mundo. Por continuar a luta contra a impunidade dos empresários que organizaram e se beneficiaram com o golpe cívico militar. Por Rafael Nahuel e Santiago Maldonado. Por acabar com a barbárie capitalista.”

Outra caraterística destes deputados é seu internacionalismo, a deputada Bregman em 2016 como deputada nacional, solicitou um posicionamento político do Congresso da Nação Argentina em repúdio ao golpe institucional no Brasil e em solidariedade à classe trabalhadora brasileira contra o avanço da direita. No dia 24 de janeiro de 2018, na ocasião do julgamento do ex-presidente Lula, a mesma deputada, agora como legisladora da Cidade Autônoma de Buenos Aires se pronunciou contra a condenação arbitrária de Lula, mas com independência política do PT e diante do brutal assassinato da vereadora do Rio de Janeiro Marielle Franco, do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), no dia 14 de março, propôs uma moção de repúdio no dia posterior na Assembleia Legislativa de Buenos Aires, a bancada do PTS na FIT conseguiu a sua aprovação, que expressa o repúdio ao assassinato, exigindo o esclarecimento do caso e punição dos responsáveis políticos e materiais assim como o fim da intervenção federal a Rio de Janeiro. Dias depois fez o mesmo Del Caño no Congresso Nacional.

Estes são alguns elementos a partir dos quais nos permite caracterizar estes parlamentares como revolucionários. Seu comportamento político não individual, mas como referentes partidários, dos legisladores, expressam as posições do PTS na FIT. A diferença de outras organizações de esquerda, como por exemplo o PSOL no Brasil é que o PTS que dirige a seus parlamentares.

Denominamos, nesse sentido, sua participação política como agindo numa perspectiva transicional, pois as propostas elaboradas, bem como suas práticas políticas tem elementos que poderíamos chamar transicionais, como por exemplo que todo político receba o mesmo salário que uma professora. Esta proposta, como já mencionado, foi inspirada na Comuna de Paris de 1871, onde se decidiu que cada político ganhe o mesmo que um trabalhador qualificado. Além desta proposta o PTS vem defendendo, em suas propagandas e no parlamento, a redução da jornada de trabalho sem redução de salário, como uma forma de garantir que todos tenham emprego; a estatização das fábricas sob controle operário, centralmente para aquelas que fecham e demitem todos os seus trabalhadores; a efetivação de todos os terceirizados; entre outras mas para mencionarmos algumas, desta forma, entendemos estas como medidas de política transicional. Sobre a FIT na Argentina e a importância do Parlamentarismo Revolucionário recomendamos também esta outra matéria de nossa autoria.

Existe uma continuidade histórica no marxismo revolucionário na tática do Parlamentarismo Revolucionário, entre K. Liebknecht e os legisladores do PTS, uma trilha, que poderíamos afirmar um fio vermelho e que esta forma de intervenção tática no marco de uma estratégia revolucionária. Trata-se de um enorme exemplo a ser seguido pela esquerda brasileira.

 
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