www.esquerdadiario.com.br / Veja online / Newsletter
Esquerda Diário
Esquerda Diário
http://issuu.com/vanessa.vlmre/docs/edimpresso_4a500e2d212a56
Twitter Faceboock
ECONOMIA
Para onde vai a economia brasileira e o que "os mercados" demandam dos golpistas?
Leandro Lanfredi
Rio de Janeiro | @leandrolanfrdi

A situação da economia mundial e da inserção brasileira na mesma, demandam da burguesia brasileira um aprofundamento dos ataques levados a cabo por Temer&Cia. A maioria dos analistas prevê uma importante crise fiscal nos próximos anos. A proposta que levantam perante esta situação é de destroçar a saúde e a educação muito mais do que já conseguiram com PEC55/241. E além disso, atacar fortemente as aposentadorias para assim garantir mais recursos para pagamento da dívida e um grau maior de subordinação da economia nacional aos ditames do capital financeiro e, evidentemente, do imperialismo também.

Ver online

Foto: Agência Brasil

Importantes setores da burguesia brasileira e do imperialismo defendem uma agenda de aprofundamento dos ataques dos golpistas para aumentar seus lucros e como resposta a uma tendência a forte crise fiscal em uma economia que tende a recessão ou a crescimento medíocre. A dificuldade da implementação desta agenda que esbarra em uma classe trabalhadora que protagonizou sua maior greve geral em abril do ano passado, e ainda dá mostras de não estar derrotada, apesar de vários elementos reacionários na situação política, motivam a ações golpistas para garantir melhores condições de um “nome do mercado” nas eleições em outubro.

Nos planos do IPEA e da OCDE, Temer atacou foi é pouco. Dedicamos este artigo a entender as tendências na economia nacional e o que estes setores defendem como agenda para os próximos anos. A agudez dos ataques que necessitam e planejam os coloca em uma encruzilhada que trataremos em um artigo futuro, sobre o “problema burguês com a democracia burguesa“, como ilustração vale ver a preocupação deZeina Latif, economista-chefe do poderoso grupo de investimentos XP ela dizia no ano passado (este ano depois da prisão de Lula ela se mostra apreensiva mas menos cética): “Minha maior preocupação é se essa volta da economia será suficiente para termos eleições organizadas."

“Neoliberalismo senil” e sua inflexão em um Brasil cada vez mais subordinado

Este ano apesar de as principais economias no mundo estarem crescendo no ritmo mais acelerado desde o início da crise em 2008 as contradições na economia mundial mostram a profunda debilidade desta retomada do crescimento. Por um lado tensões geopolíticas e um renascido “nacionalismo econômico” (Trump, Brexit, p.ex) colocam limites às possibilidades deste crescimento e por outro, exibe-se uma retomada da contradição que a economia exibia antes da crise de 2008: a disparidade entre crescimento da economia e o aceleramento do preço dos ativos no mercado financeiro. Ou seja, as ações “descolam” do ativo real. Nos EUA o preço das ações das companhias já é 31 vezes maior que seus lucros. Uma separação que “expressa a escassez de fontes para o novo investimento lucrativo de capital, é a base de uma instabilidade estrutural e a essência da tese burguesa do “estancamento secular” – uma visão defendida até mesmo por ex-presidente da FED, o banco central americano, de que a economia tende a um estancamento duradouro senão vierem guerra ou um expressivo aumento da produtividade do trabalho, que não está vindo pela robótica, nanotecnologia, etc e só pode vir de rebaixamento das condições de vida e trabalho.

Para se aprofundar na visão sobre situação da economia mundial ver: “Tensões econômicas e instabilidade política na situação mundial”

Para resolver as tensões políticas e da luta de classes com esse “estancamento secular” a burguesia tem adotado um neoliberalismo senil, ou seja, sem possibilidades de ser hegemônico como nos anos 90, sem bases geopolíticas estáveis e, que produz renovadas polarizações políticas e sociais com sua agenda de agressivos ataques como as reformas trabalhistas e da previdência.

É justamente neste contexto e como resposta concreta para aprofundar uma localização mais favorável ao imperialismo americano em toda América do Sul que opera a Lava Jato e foi feito o impeachment de 2016 (importante notar que o imperialismo alemão, no entanto, foi muito crítico do impeachment, saiba mais lendo aqui). Processos que tinham como objetivo aprofundar ataques à classe trabalhadora (as “reformas”) e que não podiam ser implementados na mesma intensidade e rapidez por Dilma e o PT, e atuaram para minar o espaço conquistado pelos capitalistas brasileiros na competição mundial. Um espaço de uma Odebrecht, Petrobras, etc, que ocorria ao mesmo tempo que a economia nacional continuava subordinada ao capital imperialista. Para aprofundar esta agenda que ocorre agora a continuidade do golpe.

Previsões para a economia brasileira

A economia tende à estagnação ou a novas recessões e a uma importante crise fiscal e isso coloca como imperativo para a burguesia aprofundar uma agenda de reformas ainda mais agressiva que a de Temer, propondo acabar com os “excessivos” gastos em saúde e educação pública, e retomada da reforma “original” de Temer, como defende o IPEA1, ou somando a todo esse programa uma proposta ainda mais agressiva como defende a OCDE2: desvinculação das aposentadorias do salário mínimo, para que os idosos se “sustentem” com 300 ou 500 reais.

A tendência mais provável no médio prazo é de retorno da recessão ou de uma estagnação/crescimento medíocre devido às características do crescimento atual onde a própria burguesia se assusta com o nível de dependência das flutuações do comércio exterior, que se beneficia do crescimento (débil) da economia mundial e sofre ao mesmo tempo com o desemprego e o trabalho informal que atrapalham suas felizes estimativas de aumento do consumo interno3.

No curto prazo é provável que exista um crescimento do PIB sem que isso se traduza em qualquer sentimento de melhora nas condições de vida. E, não podemos descartar dinâmicas mais catastróficas na economia se houver uma rápida deterioração do comércio exterior produto do nacionalismo econômico de Trump ou rápida piora na crise fiscal devido a variações nos juros e no câmbio que piorem os gastos com a dívida, como resultado de uma possível rápida elevação dos juros nos EUA. Por outro lado, algumas tensões entre EUA e China podem levar a maior demanda chinesa pela soja brasileira contribuindo positivamente no curto prazo para o PIB.

Para se aprofundar nos impactos econômicos e geopolíticos das taxações de Trump sobre o aço brasileiro, leia: “Trump não garante isenção ao aço brasileiro e exige redução de exportações”

Mas a situação econômica atual caracteriza-se sobretudo por um crescimento débil e que não é sentido pela população (daí a preocupação da economista da XP Investimentos citada acima) e por isso também que os pré-candidatos do centro golpista (Alckmin, Temer, Maia, Meirelles) tem muita dificuldade em conseguir popularidade, somados não chegam a 10% das intenções de voto em 7 dos 9 cenários eleitorais pesquisados pela Datafolha. O PIB cresce mas é persistente a continuidade do desemprego, que mesmo nas projeções otimistas continuará acima dos 11% mesmo com um hipotético crescimento do PIB de quase 4% no acumulado entre 2017 e 2018.

Fonte: OCDE, para ler o crescimento do PIB veja a escala à esquerda, para ler a taxa de desemprego ver a escala à direita.

As projeções de 2018, com um crescimento do PIB de 2,8% segundo o último relatório do Banco Central4, que, para além do exagero “feliz”, se baseia em:

1) na tendência de alta do preço mundial da soja devido à seca na Argentina que é o terceiro maior produtor mundial, e esta commodity sozinha é responsável por 11,5% do PIB5, ou seja, pesa mais que 50% de todo o peso da indústria do país, estimado em 18,5% pelo IBGE6; 2) outras commodities em alta como o petróleo também ajudam – ainda que menos – a economia7; 3) uma tímida retomada da indústria que ainda está muito abaixo de seu pico (ver gráfico abaixo); e 4) uma ainda mais tímida retomada do consumo das famílias, que segue sofrendo o impacto do desemprego que continua em elevados patamares, negando o mentiroso efeito benéfico que teria a reforma trabalhista.

A previsão do emprego, mesmo com um crescimento econômico da ordem de 2,5% a 3% ao ano é de terminar o ano em medíocres 11,8% segundo a CNI ou 11,2% como prevê a OCDE e nunca (literalmente) voltar aos patamares vividos em 2014. A indústria, com uma baixíssima taxa de utilização, mesmo com crescimento há alguns meses, está muito aquém dos picos de utilização do parque industrial em 2013, que rondava os 84%.

Fonte: OCDE

O consumo das famílias, comemorado por estar crescendo mês a mês desde o primeiro trimestre de 2017, ainda está abaixo do observado em 2016 (ou seja, do ponto de vista da vida do trabalhador o pior da recessão ainda não passou) e ainda está muito distante do pico do último trimestre de 2014, estando 6,6% abaixo do que estava8.

A maioria dos principais fatores positivos na economia se concentram no comércio exterior. Justamente um terreno instável, presa de medidas do nacionalismo econômico de Trump, como a tarifa sobre o aço que pode gerar um impacto muito maior na cadeia de empregos do que é o peso específico desta exportação aos EUA, e do ponto de vista de impacto em renda e consumo não será a atividade rentista de exportação de soja para China que compensará esta perda em empregos caso a China resolva retaliar os EUA nas exportações da oleaginosa.

A maior debilidade na economia não é só a fragilidade da retomada atual e como esta tem escassos impactos na percepção das massas, mas também é a expressão aguda no terreno nacional de uma das principais contradições na economia mundial, neste “neoliberalismo senil”: a disparidade entre crescimento da economia (e dos lucros capitalistas) com a taxa de investimento, debilitando a sustentabilidade desta retomada.

Um dos aspectos da debilidade da retomada pode-se notar na profunda depressão que encontra-se a indústria de máquinas (parte dos "bens de capital") que está muito abaixo do pico de 2013, sofrendo muito mais os impactos da crise do que outras áreas da indústria, conforme gráfico abaixo. Ou seja, uma hipotética retomada e sem novos investimentos, sem ganhos de produtividade.

Fonte: IEDI, carta IEDI n.842

Outro importante exemplo desta disparidade entre ganhos financeiros e economia real se mostra nas ações. Enquanto o país segue em recessão ou com um crescimento medíocre, meramente estatístico, as ações disparam. Enquanto o PIB cresceu cerca de 1% no ano de 2017, o preço das 343 empresas listadas na Bovespa saltou 21% no mesmo ano e acumula uma alta de 161% desde a votação do impeachment na Câmara em Abril de 2016. A disparidade entre economia real e finanças aumenta9.

Essa disparidade é gritante na economia nacional pós-crise, acentuando os aspectos rentistas e semicoloniais do país que dependerá ainda mais dos preços internacionais das commodities para ter algum crescimento econômico. Uma aposta que tende, no longo prazo, a produzir efeitos negativos na economia, já que as commodities tendem a se desvalorizar em relação aos produtos manufaturados.

Fonte: OCDE. A diferença entre a poupança interna (verde) e o investimento (azul) mostram a entrada de capital estrangeiro. Importante notar como o investimento é menor da série.

Ou seja, a burguesia prepara um de projeto de país que haverá menos migalhas para distribuir para o proletariado e para as classes médias. Se o “programa máximo” do IPEA fosse aplicado e não houvesse nenhum choque externo a economia cresceria pífios 3% ao ano até 2050, preveem. Portanto, o problema fiscal vai se mantendo e agravando tendendo a uma crise fiscal (tema tratado abaixo), exigindo mais e mais recursos entregues aos banqueiros e ao imperialismo e ataques mais duros às massas e ao funcionalismo.

Tendência a crise fiscal motiva agressivos planos dos golpistas

A dívida drena recursos do país como não acontece em praticamente nenhum outro país do mundo. Ano a ano o país entrega 6% do PIB (ou um terço de tudo que todas as indústrias faturam). Nenhum país estudado pela OCDE tem um serviço da dívida tão pesado, como afirmam em relatório já citado. Anualmente o país precisa emitir novas dívidas para “rolar” 40% de seus débitos, de uma dívida que é muito curta e muito cara. Em um cenário que não há agressiva expansão da economia (e não há isso no horizonte internacional ou nacional como mostramos acima) para sustentar essa rolagem da dívida com aumento da arrecadação e um superávit primário produzido pelo aumento da arrecadação fiscal quando há crescimento econômico. Mesmo com PEC 55 e outros mecanismos de asfixia dos gastos sociais, a OCDE prevê uma dinâmica de grave crise fiscal.

O que é uma crise fiscal? Basicamente uma insustentabilidade dos gastos comparada ao que é arrecadado pelo governo. Um exemplo desse tipo de crise é o que vem ocorrendo com o governo do Rio de Janeiro.

Sem perspectiva de um novo boom econômico que dê um salto às arrecadações, se torna insustentável para o país ter um déficit nominal da ordem de 8% do PIB como se mostra hoje em dia.

Fonte: OCDE

Esse cenário nas contas nacionais se repete em alguns estados, especialmente o Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e Rio Grande do Norte e também em alguns municípios, daí a preocupação de Doria em votar o Sampaprev.

Para além do programa da OCDE para a crise (matar de fome os aposentados) mostra-se com toda clareza no gráfico acima como a situação fiscal do país não é sustentável e um novo governo terá que adotar alguma de várias medidas muito impopulares: aumento de impostos, reforma da previdência, fim da obrigatoriedade de gastos e universalidade da saúde e educação.

A vindoura crise fiscal tende a estourar mais rápida ou mais lentamente de acordo com o peso das tendências e contra-tendências no crescimento da economia nacional em relação com sua inserção na economia mundial, isto é mais um fator da realidade que dificulta o fechamento da etapa de crise orgânica que vivemos sem maiores embates da luta de classes, e também uma maior necessidade burguesa de continuidade de seu golpismo.

Notas

1 - http://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/livros/livros/180327_desafios_da_nacao.pdf
2 -http://www.oecd.org/economy/economic-survey-brazil.htm
3 - https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2018/03/emprego-informal-tira-forca-da-retomada.shtml?utm_source=whatsapp&utm_medium=social&utm_campaign=compwa
4 - https://www.bcb.gov.br/pec/GCI/PORT/readout/R20180406.pdf
5 - Dados calculados a partir do PIB da agricultura da ESALQ/USP e de estimativas do “Santander Negócios e Empresas”, segundo o banco espanhol 48,8% de todo faturamento do agronegócio do país é dependente da oleaginosa.
6- https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-sala-de-imprensa/2013-agencia-de-noticias/releases/20166-pib-avanca-1-0-em-2017-e-fecha-ano-em-r-6-6-trilhoes.html
7- Outa commodity que tem uma participação importante no PIB é o petróleo, que tem um preço médio previsto para o ano de mais de 60 dólares, tendo oscilado abaixo dos 50 em todo ano passado. A previsão média do mercado financeiro internacional é fechar o ano em 58 dólares valor quase 20% maior que a média do ano passado.
8- Dados calculados a partir de tabela do IBGE, disponível em: https://sidra.ibge.gov.br/tabela/6613#/n1/all/v/all/p/all/c11255/90687,90691,90696,90705,90707,93404,93405,93406,93407,93408/d/v9319%202/l/v+t,c11255,p/resultado
9- Cálculos próprios a partir dos boletins diários da BMF/Bovespa.

 
Izquierda Diario
Redes sociais
/ esquerdadiario
@EsquerdaDiario
[email protected]
www.esquerdadiario.com.br / Avisos e notícias em seu e-mail clique aqui