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TRIBUNA ABERTA
“Quando eu era criança eu ia pra escola sozinha”
Alexia Assoni

Relato comovente de uma jovem estudante de Caxias do Sul.

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Que esse texto seja um tapa na cara em todos e todas que merecem!

Quando eu era criança, há não muitos anos atrás, eu ia pra escola sozinha. Quando eu estava no pré, minha mãe pagava uma van que me levava até a escola e me trazia em segurança, a escola era longe da minha casa. Na primeira série, minha mãe consegui vaga em escola que era bem perto da minha casa, o que ajudaria no financeiro de casa, não sendo mais necessário ela pagar a van. Minha mãe me levou e me buscou por um bom tempo pra escola, mas ela começou a trabalhar mais e mais e não conseguia mais me levar, e quando raramente, me buscar.

Eu ia e voltava a pé, não tinha pai pra me buscar, dinheiro pra van levar, ou algum familiar que pudesse me acompanhar.

Às vezes a minha avó, que já era bem velha, me buscava.

Eu lembro que no caminho da escola, eu via várias "coleguinhas e amiguinhas" indo com as suas mães, quando algumas dessas mães me viam na rua, faziam questão de diminuir o passo pra eu não me aproximar das filhas delas. Não queriam que elas brincassem comigo na escola, muito menos em algum horário livre, eu não era o exemplo legal de criança pra elas. Sabe aquelas mães de merda que tem em toda a escola, que tem o rei na barriga e acha que só as ‘’suas crianças’’ prestam? Pois é, essas eram elas. Elas não achavam necessário ter no círculo de amizade das suas filhas uma amiguinha com menos condições que as filhas delas, com pais separados e pobre, mais especificamente, filha de mãe solteira, faxineira e que morava de favor na casa da avó.

Via várias coleguinhas indo de carro com os seus pais ou suas mães, mas nenhuma oferecia carona, nem mesmo em dias de chuva, menos ainda no "horário de inverno", horário este que escurece bem cedo.

Quando eu tinha doze anos, na saída da escola eu fui até a esquina, paguei uma conta pra minha mãe e voltava pra casa, era inverno, aproximadamente 18:30, um homem me pegou na esquina da Escola Estadual de Ensino Médio e Fundamental Santa Catarina.

Ele me pressionou na grade da casa da esquina do ginásio do santa e passou a mão por todo meu corpo, tentei me soltar na primeira vez, mas a tentativa foi falha, ele novamente passou a mão por todo meu corpo, eu tentei gritar, mas ninguém escutava, tentei chamar atenção, mas no escuro, ninguém via, na terceira tentativa, eu consegui me soltar e correr. Me joguei na rua, mais específica, avenida Rossetti e corri, corri o máximo que eu pude, e quase fui atropelada pelo ônibus que fazia a linha Santa Lúcia/Cohab, recebi várias buzinadas e continuei correndo, até que avistei um homem e pedi socorro, o mesmo, me levou até em casa em segurança. Nesse dia eu lembro de pessoas me dando as costas com medo que eu chegasse perto dos seus amados filhos.
Eu tive sorte, eu tive sorte, e mais uma vez, eu tive muita sorte!

Eu poderia ter sido a próxima Maria, a próxima Paula, a próxima Naiara, a próxima mulher, criança, e adolescente que viram estatísticas por abuso sexual.

Depois daquele dia, nada mudou, minha mãe tentava me levar pra escola e buscar, mas realmente era difícil, afinal, ela trabalhava e não tinha outra pessoa pra me buscar, muito menos dinheiro para um transporte particular.
O que eu quero dizer com esse texto, é que várias dessas mães eu vi aqui escrevendo: "Pena não ter te conhecido Naiara, seria um prazer levar-te até a escola."

Mentira, não seria um prazer não. A Naiara, assim como eu, não tinha pais casados, morava com a tia, gente humilde, não tinha o brinquedo legal, a roupa da moda entre as meninas, muito menos condição financeira pra ser convidada para um passeio com as outras coleguinhas.

Vocês não ajudariam essa menina no caminho da escola não, vocês nunca ajudaram ninguém, vocês apenas tentam se mostrar boas pessoas pra esconder toda a ruindade que tem dentro de um ser humano e parecer pessoas de bem, de família tradicional perfeita e de caráter exemplar que não pode deixar a máscara cair. VOCÊS ME DÃO NOJO!

A sociedade, não gosta de gente pobre, não gosta de gente que vai pra escola ‘’mulambeira’’, que tem pais separados, que tem mãe que faz faxina ou cata latinha, essa é a verdade.

A sociedade não gosta quando tem uma criança na saída de um restaurante pedindo comida e muito menos quando tem uma mãe pedindo alimento na sua porta. Essa é a sociedade, essa é a verdade.

Tinham vezes que eu me encontrava com algum amigo na esquina, como a Bruna ou o João e a gente ia junto até a escola, a irmã do João que não era muito mais velha que nós levava ele pra escola e ia cuidando da gente também. Eu lembro que ela sempre tentava falar coisas legais quando a gente ia a pé pra fazer a gente se sentir melhor enquanto caminhava, em dia de chuva ela dizia que era bem melhor ir a pé pois dava pra sentir as gotinhas de água, e que no verão era bom porque dava pra sentir o sol.

Tinha vezes que a mãe do Chris também levava a gurizada, ou alguns anos depois, a Tia Méri enfiava uma pirralhada no furgão da fiorino e a gente finalmente ia de carro pra escola. Mas mesmo assim, eu fui muitos anos sozinha pra escola, vendo algumas mães diminuindo o passo e outras atravessando a rua, para que a Alexia, não chegasse perto das suas filhas.

Enfim, cada pai nao quer se preocupar com o filho do outro, ainda mais se esse outro filho não trouxer nenhum benefício pro seu.

A sociedade é cruel, ela é interesseira, ela é preconceituosa, ela é seletiva e ela mata.

A sociedade te mata pelas beiradas, pela omissão de ajuda e pelo preconceito.

Essa é a triste realidade, isso é preconceito!

 
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