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ARTE
Como o materialista histórico lida com as imagens do passado
Afonso Machado
Campinas

No teatro da história existem velhos e novos figurinos. Sentados na primeira fila, alguns trabalhadores começam a desconfiar das ações heroicas dos ricos protagonistas da peça. Estes mesmos trabalhadores percebem que existe um espaço vazio no palco: este espaço é deles!

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No teatro da história existem velhos e novos figurinos. Sentados na primeira fila, alguns trabalhadores começam a desconfiar das ações heroicas dos ricos protagonistas da peça. Estes mesmos trabalhadores percebem que existe um espaço vazio no palco: este espaço é deles! Entre eles, um velho operário: ele nota que já existem outros operários no palco, preenchendo este espaço vazio. Mas eles são pouco numerosos... Para que os trabalhadores abandonem seus acentos e assumam o controle do espetáculo, é necessário tomar consciência de que diferentemente daquilo que as lorotas da indústria cultural contam, existe um grande drama encenado no qual cada Ato representa uma época.

Um jovem operário, apesar de esgotado, está atento ao que se passa na peça. Ele percebe o que muitos não sabem: o longo drama exibido no palco expressa as lutas entre homens livres e escravos, entre patrícios e plebeus, entre nobres e servos, entre mestres de corporação e companheiros, entre nobres e burgueses, entre burgueses e operários. Este rapaz trabalhador conclui, com o coração saltitante, que os oprimidos de ontem passaram o script para as suas mãos: são os trabalhadores de hoje que devem escrever um novo texto revolucionário! Enquanto atores os trabalhadores necessitam de imagens revolucionárias: imagens que formem aquela constelação carregada de tensões que Walter Benjamin se referiu quando tratou da maneira como o materialista histórico lida com o material do passado. Resumindo, um dos desafios postos para os militantes da cultura é realizar o apelo de Marx e Engels: a classe trabalhadora deve apropriar-se do conhecimento histórico.

Há de convirmos que esta é uma tarefa urgente, já que existe uma íntima relação entre o fato de um trabalhador não se mobilizar politicamente e as imagens que ele possui do passado. Quer dizer, quem olha passivamente para a tentativa do Estado destruir o sindicalismo e os direitos dos trabalhadores, só pode gostar das histórias pra boi dormir. Embora existam distinções entre o caráter científico e artístico na abordagem da história, o fato é que a popularização do conhecimento histórico depende a um só tempo de conceitos científicos( que explicam diferentes contextos sociais) e de soluções estéticas( capazes de atrair, de estabelecer uma experiência sensível com o passado). O que interessa aqui é refletir sobre as armas de longo alcance da cultura revolucionária: do romance à Ciência histórica, do teatro ao cinema, da poesia à canção popular, da pintura mural à fotografia, o grilo maior é saber como tudo isso pode ser útil para que o conhecimento histórico seja parte do oxigênio do movimento dos trabalhadores. Quem produz este conhecimento não parte do céu da cultura, mas sim do seu papel na produção econômica: o intelectual/artista trabalhador pensa a história com os olhos voltados para os oprimidos de todas as épocas. É este xeque-mate filosófico que caracteriza o melhor da trajetória do Materialismo Histórico Dialético(de Karl Marx a Walter Benjamin). No dizer de Bertolt Brecht é preciso “ desenvolver sensibilidade histórica “, fazendo da relação do espectador com o passado(no contexto teatral, por exemplo) um deleite que faz pensar. Isso é fácil? Não, pois no jogo ideológico sempre existem profissionais conservadores bem posicionados e dispostos a contar histórias da carochinha.

Criar narrativas materialistas embasadas na luta de classes pressupõe uma pesquisa permanente de formas artísticas que possam criar uma comunicação inconformista. Para um escritor marxista o que interessa é construir enredos que transmitam a tensão das lutas sociais: decompondo a História em histórias, é possível chegar de modo criativo e preciso às lições fundamentais do Materialismo Dialético. Trocando em miúdos: o negócio é elaborar situações fictícias para expor camponeses se rebelando contra a servidão coletiva na Mesopotâmia e no Egito antigo, escravos avançando contra os senhores na Grécia e Roma antiga, as guerras camponesas contras os senhores feudais, as lutas entre artesãos e burgueses, entre burgueses e nobres, as rebeliões dos escravos africanos e povos indígenas contra as autoridades coloniais na América(portuguesa, espanhola e anglo saxônica) etc. Sem contar que o clímax da narrativa envolve a derradeira luta entre a burguesia e a classe trabalhadora(um drama que está rolando no instante em que escrevo estas linhas...).

Será que todo este conteúdo histórico não é pesadão/enfadonho para os espectadores sentados diante do teatro da história? Já bati nesta tecla e continuo batendo: cabe ao narrador revolucionário pesquisar as estratégias estéticas para que a história da luta de classes seja contada de maneira em que a passividade do espectador/leitor seja quebrada numa pancada só. As imagens revolucionárias do passado são o combustível do presente.

 
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