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A PROPÓSITO DA REVOLUÇÃO DE 1959
Breve história do trotskismo cubano
Claudia Ferri

Percorremos as origens do trotskismo em Cuba. Com acertos e limites desempenharam um importante papel, muitas vezes silenciados, na história social e política da ilha.

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Marcha cubana em Guantánamo. 15 de Setembro de 1933. Ph Keystone France/Getty

O contexto do trotskismo cubano pode ser identificado na formação de uma fração que surge dentro do PC em agosto de 1932. Foi chamada de Oposição Comunista de Cuba (OCC) e se opôs à política sectária de classe contra classe (1), impulsionada por Stalin, e a seus métodos burocráticos. Sandalio Junco se converteu em um dos dirigentes mais destacados deste grupo. Trabalhador padeiro, manteve uma relação estreita, desde 1925, com Julio Antonio Mella, quando ambos foram encarcerados (acusados de colocar uma bomba no teatro Payret de La Habana). Foi um dos poucos dirigentes negros que o PC já teve. Em 1942 foi assassinado por agentes stalinistas. Sandalio adquiriu conhecimento sobre o trotskismo em uma viagem para a URSS, onde entrou em contato com dirigentes da Oposição de Esquerda Internacional e foi ganho pelo espanhol Andrés Nin, antes da expulsão deste em 1930. Ao lado dele, encontrava-se o dirigente estudantil e poeta Juan Ramón Breá, que também conheceu Nin na Prisão Modelo de Barcelona, depois que o estudante fora obrigado a partir para o exílio como resultado da feroz repressão do governo de Machado. Breá, foi o encarregado de facilitar os contatos de trotskistas espanhóis com Cuba e de difundir revistas e livros políticos na ilha, especialmente a revista espanhola Comunismo publicada entre 1931 e 1934. Tempos depois o jovem poeta iria combater na guerra civil espanhola com o POUM, ao lado do surrealista Bejamin Peret e do escritor George Orwel.

Sandalio Junco

Juan Ramón Breá

A Junco e Breá se somaram outros dirigentes: Marcos García Villarreal, Pedro Varela, Carlos González Palacios, Carlos Simeón, Luís M. Busquet, Roberto Fontanillas, Armando Machado e Carlos Padrón, entre outros.

A OCC teve influência em organizações chaves: a nível sindical, na Federación Obrera de La Habana (FOH), aonde Junco e outros Trotskistas chegaram a ter peso na Mesa Executiva; a nível estudantil na Ala Izquierda Estudiantil (AIE) e, no campo democrático, na defesa dos presos políticos influenciando a organização Defesa Obrera Internacional (DOI). Através desta última conseguiram se inserir, além de Havana, em outras regiões importantes, como Matanzas, Santiago de Cuba, Guantánamo e no norte da província de Oriente. Ao final de 1932, os membros da OCC foram expulsos do PC.

Os trotskistas desempenharão um papel muito importante no processo revolucionário aberto em 1933. Desde a FOH chamaram uma greve geral (logo após a greve iniciada em julho pelos trabalhadores dos transportes) que começou com demandas sindicais e rapidamente se converteu em uma greve política, ao se apor à feroz ditadura de Machado, apoiada e sustentada pelo governo norte-americano. A OCC também dirigiu o Comitê de Greve de Guantánamo, zona localizada na região oriental e conhecida pelos altos níveis de exploração e pobreza no qual padeciam os trabalhadores. Segundo o historiador Rafael Soler, os trotskistas chegaram a ter centenas de militantes que dirigiram quarenta mil trabalhadores açucareiros armados com paus e machados. 

Em setembro de 33 ocorreu a queda do governo de Machado, porém o descontentamento social continuava. Os trotskistas formaram o Partido Bolchevique Leninista (também em setembro) que interveio na realidade política cubana durante o governo nacionalista de Grau e Guiteras. Apesar de ter uma posição correta definindo Cuba como um país semicolonial, de ter uma política para os trabalhadores negros chamando-os a se incorporar na luta, de opor-se a política do estalinismo de “Socialismo em um só país” e de chamar uma Frente Única para se enfrentar com a burguesia e com o imperialismo norte-americano (denunciando inclusive a negativa do PC); a forte repressão sofrida após o golpe de Batista fez com que a organização entrasse em uma profunda crise agravada pela ausência de uma direção homogênea que demonstrava sua debilidade estrutural. É preciso levar em conta que, nesse mesmo momento, o ciclo revolucionário se fechou devido ao fracasso da greve de 35, na qual as forças do movimento operário atuaram divididas. Segundo Daniel Gaido e Constanza Valera o PBL chegou a ter em 1934 entre seiscentos e oitocentos militantes.

Em meados da década de 1930, o trotskismo se fragmentou por diferenças internas. Um dos motivos foi a política de Jovem Cuba, um grupo pequeno-burguês anti-imperialista radical criado por Antonio Guiteras, assassinado em 8 de maio de 1935. Trotsky havia proposto, em pleno governo de Grau-Guiteras, que em relação a Cuba “(…) não podemos empreender nós mesmos a conquista do poder como tarefa imediata se a maioria da pequena burguesia rural e urbana não nos segue”. Embora o plano original do Partido Bolchevique Leninista fosse manter independência organizativa e política do Jovem Cuba, um setor terminou diluindo-se em seu interior e cedendo às pressões nacionalistas. Segundo algumas fontes (2), a organização chegou a contar, em seu início, com quinze mil membros.

Em 19 de setembro de 1940 é fundado o Partido Obrero Revolucionário (POR). Ele manteve alianças com o Partido Revolucionário Cubano do ex-presidente Ramón Grau San Martín, no entanto, não teve continuidade. Já em 1946, estava muito enfraquecido pelo assassinato de um de seus dirigentes operários, Rogério Benache, produto das torturas que enfrentou nas prisões de Batista. Outro de seus dirigentes foi Pablo Díaz, um dos sobreviventes do Granma.

Apesar desta desintegração, os trotskistas voltaram a se destacar anos depois formando parte da organização da greve geral desencadeada em 1957, com centro em Santiago, após o assassinato do dirigente urbano do M26, Frank País. Durante esta greve feroz, o trabalhador Gustavo Fraga, também desempenhou um papel de destaque. Embora ele fosse militante do M26 desde o seu surgimento, e chefe da seção operária desta organização em Guantánamo, se reivindicou trotskista até sua morte em agosto de 1957, devido a um confronto ao manipular explosivos. Fraga foi um dos vários militantes do M26, comandado por Castro e Guevara. Também participaram da grande greve de Janeiro de 59, que possibilitou o triunfo da revolução formando parte das milícias e destacamentos dos trabalhadores. Em Santiago chegaram a dirigir a seção de ação e sabotagem.

Tempos depois o POR conseguiu reorganizar-se conformando o Partido Obrero Revolucionario Trotskista (POR-T). Se ligando a um setor do trotskismo chamado Posadismo, grupo mais propagandista do que organizativo. A dirigente posadista Olga Scarabino viajou a Cuba e rapidamente se aproximou de membros do M26, que lhe abriu espaço na rádio e na televisão. Em uma de suas transmissões de 1959, Scarabino chamou a todos os trotskistas da ilha a se unir para reconstruir um partido trotskista em Cuba. Finalmente, em fevereiro de 1960, é fundado o partido.
Sua Composição era majoritariamente de trabalhadores. Um dos pontos centrais sobre os quais se baseava a crítica ao governo de Castro era a demanda pela independência dentro dos sindicatos e o estabelecimento de uma democracia mais ampla nas organizações dos trabalhadores cubanos. Exigiram liberdade nas eleições de dirigentes sindicais e repudiaram a imposição das “listas únicas”. Também consideraram essencial a criação de organismos de base, necessários para consolidar e expandir as conquistas da revolução. Outras das consignas corretas que levantaram era a eleição popular pelas tropas dos oficiais das milícias.

Com o tempo, os trotskistas do POR-T foram submetidos a uma constante perseguição logo após o fracasso da invasão norte-americana à Bahia dos Porcos (abril de 61) e da aproximação de Cuba à URSS. Castro encabeçou uma onda de detenções, muito dura entre 1962 e 1965, contra militantes trotskistas, inclusive acusando-os de “agentes e provocadores da CIA” por levantarem a consigna: “fora Ianques de Guantánamo”. Che Guevara, primeiro apoiou a medida persecutória para depois se opor. Inclusive intervindo ele mesmo na libertação de vários militantes prisioneiros na prisão de La Cabaña em Havana. Entre os presos libertos se encontrava Roberto Acosta, um trotskista que ocupava uma posição muito importante no ministério que presidia (Indústria) e que, fazia muito tempo, havia ajudado a organizar a empresa elétrica nacionalizada. Che deu a ordem se liberá-lo após uma entrevista com Acosta, o mesmo ocorreu com outro dirigente trotskista, Armando Machado.

Algum tempo depois, Guevara acabou se afastando do governo cubano enquanto o processo de burocratização na Ilha se acelerava. Naquele momento, o grupo trotskista que ainda permanecia em Cuba sofria com a prisão e constante assédio por parte do Estado, atingindo uma nova onda de repressão em 1973, devido a constante pressão que a URSS exercia sobre Castro e a burocracia cubana. Apesar da constante perseguição e da denúncia ao regime castrista, foram grandes reivindicadores das conquistas que o povo cubano alcançou graças a revolução.

1. Levantava a necessidade de uma reforma agrária anti-imperialista porém negava a unidade de ação com outras forças de esquerda que eram opositoras da ditadura de Machado.

2. La Revolución cubana del 30. Ensayos. Fernando Martínez Heredia, Ed. Ciencias Sociales. La Habana, 2007.

 
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