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UNICAMP
Balanço da gestão e eleições: É preciso subverter o CACH
Flávia Telles
Vitória Camargo

Sobre o papel das entidades estudantis frente a uma conjuntura conservadora em distintos níveis.

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Nesta quarta, 18, foi realizada uma reunião de balanço da gestão do CACH e aberto oficialmente o processo eleitoral para a nova gestão que deve assumir a direção do centro acadêmico pelo próximo ano. A própria composição restrita dessa reunião, formada quase integralmente por alguns dos membros da gestão e sem nenhum estudante ingressante, evidenciou que o CACH está totalmente afastado do conjunto dos estudantes e para uma maioria significativa destes não é capaz de transmitir seu sentido de existência.

O CACH tem um longo histórico de luta e subversão desde a sua fundação nos anos 70. Sua história se cruza com o desenvolvimento do IFCH e da Unicamp, fazendo pesar sua articulação diante de momentos políticos decisivos, como na tentativa de intervenção militar durante a Ditadura, ou numa intensa disputa pela construção de um conhecimento crítico e social, alternativo ao projeto dominante e empresarial que sempre esteve no DNA da Unicamp. Foi também parte de lutas fundamentais dos trabalhadores e movimentos sociais da cidade. Resgatar esse histórico e refletir a história recente é importante para encarar o porquê do CACH existir e quais os desafios colocados hoje.

É chocante o nível de conservadorismo que vivemos em nosso país. Um momento político de protagonismo da direita moralista e corrupta, fruto de um golpe institucional a serviço de aprofundar os ataques que já vinham sendo feitos pelo PT para responder à crise internacional. Choca ver que professores e estudantes estão sendo expostos e assediados com a censura do Escola Sem Partido, com o peso de que muitos de nós poderemos sentir na pele isso como futuros licenciados. Choca ver que direitos elementares estão sendo questionados, como o aborto em caso de estupro, ou que as nossas vidas podem ser condenadas a perseguições porque tratam da nossa identidade e sexualidade como doenças a serem tratadas. É chocante ver que o livre pensar, as opiniões e expressões humanas mais profundas como a arte estão ameaçados em prol de uma sociedade do silêncio e da mais despudorada exploração, com reformas e até mesmo as relativizações com relação aos trabalhos análogos à escravidão, para que sejam aceitos em nome dos sagrados lucros.

Dentro dos muros da Unicamp esse conservadorismo encontra espaço. A partir da ação da reitoria e do Conselho Universitário está em curso um novo projeto para a Unicamp. Com um discurso de “gestor democrático”, Knobel em menos de um ano de mandato aprovou um ataque profundo aos trabalhadores com os cortes. Ataque que afeta também os estudantes, pela via dos efeitos no ensino e pesquisa que terão os cortes, assim como pela via da retirada de direitos que ainda pretende, como o aumento do bandejão adiado para o CONSU de novembro, além das punições exemplares aos grevistas. Nisso a maior conquista da reitoria e de seus aliados está sendo política e subjetiva, afinal conseguiram dividir os estudantes e trabalhadores para disputar seu discurso e, o que é mais chocante, não está encontrando qualquer resistência séria por parte das entidades estudantis.

Existe aí uma contradição, afinal o sentido de existência das entidades estudantis é defender os interesses dos estudantes e escolher o outro lado da trincheira em relação ao projeto empresarial e excludente que impõe a direção da universidade. Os maiores combates do Movimento Estudantil se deram a partir dessa compreensão e disputa, mas o que vemos hoje são entidades apáticas e rotineiras, quando não completamente paralisadas como vemos o DCE, onde o que prima nos valores de suas gestões são o conformismo em nadar na corrente do conservadorismo imposto, devido a um ceticismo profundo na possibilidade de uma saída combativa e independente. Essa concepção que se fortaleceu esse ano na direção do CACH, por isso os debates nas salas de aula, biblioteca e corredores estão tão descolados da entidade desses estudantes, que hoje mais se configura como um clube de amigos, com reuniões de gestão fechadas e até realizadas por whatsapp, no lugar de uma gestão aberta e democrática. Por isso passou um ano inteiro sem que a porta do CACH fosse aberta aos estudantes e sem que a gestão promovesse por sua iniciativa uma única festa, espaço de vivência ou socialização dentro do instituto. Por isso no ano em que as semanas dos cursos de Ciências Sociais e História foram mais ricas e amplas o CACH passou ao largo de tudo.

No balanço feito pela gestão não houve problematização dessa realidade de apatia. Ao contrário, a conclusão que apresentaram foi de “um balanço positivo, devido à boa relação com a direção do instituto e a importância de uma disputa institucional”, juntamente com a absurda afirmação de que “o esvaziamento do CACH se deu por falta de vontade dos estudantes em participar dos espaços”. Essa é a mesma concepção equivocada que a gestão expressou de que “fazer festa dá trabalho” e por isso o melhor é não fazer, e para resolver a contradição das auto-festas desorganizadas e prejudiciais ao espaço a saída que propõem é abrir espaço à repressão, cogitando pedir à direção do instituto que tranque os banheiros e corte a luz. Também, num outro âmbito, a concepção de que para ser parte ativa do CACH é preciso sacrificar a graduação. São todas concepções que demonstram uma lógica burocrática e administrativa da entidade, que alimenta o conservadorismo, se isola ainda mais e abre espaço para derrota da autonomia e organização independente dos estudantes.

Nós da Faísca fomos parte da atual gestão do CACH como uma minoria, desde onde sempre buscamos fazer grande parte dessas críticas e disputas de concepções, às quais sequer puderam se expressar para fora como posições que também eram defendidas na gestão, com a qual rompemos depois. Acreditamos que uma gestão viva, politicamente ativa, aliada dos trabalhadores e setores oprimidos só pode ser construída de maneira muito consciente, com propostas claras e uma disputa incessante para que o maior número possível de estudantes sejam também parte dessa construção, de seus debates, ações, projetos políticos, acadêmicos, artísticos e culturais.

Em meio ao momento nacional conservador que vivemos e que vemos sua cara se expressar na universidade nós precisamos ter uma discussão profunda sobre como retomar as entidades estudantis para que sejam ferramentas em nossas mãos para uma resistência decidida. Os cientistas sociais, historiadores, antropólogos, sociólogos, cientistas políticos, pesquisadores ou professores que aspiramos ser terão uma formação mais profunda se passarmos por uma rica experiência de organização coletiva através de um centro acadêmico subversivo. Em tempos de individualismo e censura, é mais do que hora de refletir sobre os acúmulos de uma entidade e gestões que não partem do zero, debater seus acúmulos e erros para avançar em ser uma alternativa que faça diferença na realidade.

 
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