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ELEIÇÕES ALEMÃS
Alemanha: a eleição de Weidel e as contradições do seu feminismo
Celeste Murillo
Argentina | @rompe_teclas

A vitoria do partido xenófobo e homofóbico Alternativa pela Alemanha, dirigido por uma política lésbica assumida, provoca questionamentos angustiantes no movimento feminista e na esquerda.

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A novidade nas eleições da Alemanha foi a entrada da extrema direita no parlamento. Alternativa pela Alemanha (AfD) superou os prognósticos e obteve cerca de 13% e se transformou na terceira força política parlamentaria.

A dirigente do AfD, Alice Weidel, foi uma das figuras mais chamativas da ultradireita em ascensão. Seu discurso duro contra os imigrantes, especialmente sua islamofobia, ganhou transcendência quando o governo de Merkel lançou sua política para a imigração.

Porém, o fato controverso não foi sua agenda reacionária mas sua orientação sexual. A presença de uma mulher assumidamente homosexual a frente de uma formação política de extrema direita chamou atenção. A deputada eleita do partido homofóbico e opositor ao matrimônio de pessoas do mesmo sexo convive legalmente com sua companheira, uma cineasta cuja família é oriunda do Sri Lanka e com quem tem filhos.

Que o gênero, a identidade e orientação sexual não tem nada a ver com as posições políticas é uma observação que parece óbvia. Mas depois de décadas de feminismo neoliberal e “agendas de gênero e diversidade”, sem uma só crítica às democracias capitalistas, não só é algo que deve ser debatido mas que também mostra como foi sendo invadido o caminho para que hoje seja a direita quem se apropria do discurso da inclusão de mulheres e LGBTs.

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A chegada de Weidel ao parlamento gerou questionamentos angustiantes no feminismo, o movimento de mulheres e na esquerda. Quem defende a igualdade (aceitando não questionar a democracia capitalista) e vê a presença das mulheres nas instituições como garantia de melhores políticas tem preferido guardar silêncio. Quem defende a idéia de que existe um caráter de contestação inato nas mulheres e pessoas LGBTs não encontra palavras para definira Weidel. Seu triunfo apresenta perguntas incômodas.

Algumas organizações tem aproveitado para insistir em sua negativa a apoiar a luta pela igualdade de gênero nas listas eleitorais, utilizando o exemplo de Weidel como uma comprovação do suposto “perigo” que implica. A existência de políticas como Margareth Tatcher, Ângela Merkel ou Alice Weidel é um fundamento para sustentar o status de cidadãs de segunda da metade da população? Acreditamos que não.

Com esse mesmo argumento se poderia dizer que muitas mulheres votaram e votam por partidos de direita, se tivessem oposto algumas correntes de esquerda então, ao direito ao voto das mulheres? Apoiariam hoje os projetos de reacionários ultrapassados e liberais desesperados por votos de colegiado?

É necessário advertir também que as políticas como Weidel não necessitam de leis de igualdade nem cotas femininas. Como representantes das classes dominantes são eleitas para levar adiante suas políticas em uma ou outra medida reacionárias. O mesmo fizeram, sem leis nem cotas, outras mulheres que, apesar dos “serviços prestados” seguem sendo minorias nos espaços de empresas, organismos e instituições. E se para impulsionar políticas reacionárias é necessário colocar a frente do partido uma mulher homossexual, a direita soube “modernizar-se” e contou com um discurso para fazê-lo.

Se a presença de Weidel prova algo, é que a falta de um a crítica corrosiva à cooptação das democracias capitalistas somente debilita a luta por uma verdadeira igualdade, não só diante da lei (que sempre será formal) mas também diante da vida (a única igualdade real). E acreditamos que essa luta não pode ceder à classe dominante e seus partidos sob a bandeira da igualdade, que usaram de forma hipócrita e funcional a suas políticas, como fazem com a lei de igualdade na Argentina.

Feminismo e diversidade de direita?

Weidel não está sozinha: Marine Le Pen, na França, Ivanka Trump, nos EUA, inclusive Frauke Petry, ontem companheira e hoje oponente da “nova estrela” da ultradireita alemã, são exemplos similares.

Como suas companheiras, provoca incômodo entre as feministas (neo)liberais, que durante décadas lhe outorgaram um valor progressivo ao simples fato da presença de mulheres em lugares de poder ou deram um caráter “universal” à luta das mulheres por romper o “teto de cristal”, que em realidade somente alcançava a uma minoria de mulheres profissionais, brancas e ocidentais. Em nome destas “batalhas” relegaram as críticas às democracias que incorporavam ao seu corpo político a ministras, deputadas, presidentas e primeiras-ministras.

O perfil de Weidel volta a colocar em discussão objetivos e estratégias do feminismo e o movimento lGBT e sua integração às democracias capitalistas. Essa integração, condicionada e restrita, tem tido como contracara a utilização do discurso feminista ou a inclusão de pessoas LGBT em partidos políticos de direita como uma forma de “modernização” diante do eleitorado, sem que seja incompatível com a defesa de políticas reacionárias (inclusive contra as mulheres e LGBTs).

A presença das mulheres e pessoas LGBTs nas fileiras da direita reacionária invalida a luta pela conquista de todos os direitos que nos pertencem e que são negados pela democracia capitalista? Em absoluto. Porém, são um alerta: aceitar a “tolerância”, a integração e a igualdade restritas aos pequenos grupos que podem “pagar o preço da liberdade” somente abonam o caminho que hoje utiliza a direita. A emancipação das mulheres necessita urgente de uma “agenda” que não aceite condições, que se apóie nos direitos conquistados para fortalecer nossa luta por uma sociedade sem nenhum tipo de opressão.

Texto originalmente publicado no Esquerda Diário Argentina e traduzido por Zuca Falcão

 
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