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Poesia contemporânea: a "Caravana", de Carina Castro
Gabriela Farrabrás
São Paulo | @gabriela_eagle

Coluna sobre poesia contemporânea sendo produzida hoje, agora, todos os dias, em cada canto. Hoje: a poesia sonora de Carina Castro.

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O que se destaca na poesia de Carina Castro é a sonoridade. A poesia de Carina é lindamente sonora, é por si só - as palavras como arranho sem a necessidade de instrumentos - música.

"A poesia (de quando temos notícia) nasceu indissociada da música, e sabedorias ancestrais nos ensinam que o canto afasta os malefícios, Carina vive a cantarolar colocando sua voz sobre o papel e sobre o ar, e percebe que assim nos orientamos e nos expandimos para todos os cantos: com a voz da poesia, respiro dos caminhantes, e com a valiosa palavra que afortuna na partida o viajante. Os encantamentos com a palavra são seu amuleto."

Carina é luz. Me trouxe seu livro vestida de laranja, com uma menina no útero, sorrindo. Me disse que escolheu o adesivo (parte do kit que vem com seu livro e um zine) pensando em mim, mas que se eu quisesse podia escolher outro. Não, eu queria o que Carina escolheu pensando em mim. Me acompanhou até a porta da minha sala de aula; essa gentileza me surpreendeu e me aqueceu um cadinho mais o peito.

minha boca está muito seca
me dissolvo em sua saliva

Carina é luz e sua poesia também. O título de seu livro "Caravana" é exatamente o que ele é; uma caravana para a qual somos apresentados pouco a pouco, como quando precisamos da vivência cotidiana para conheceremos o que nos cerca. Enquanto vamos conhecendo essa caravana também seguimos com ela registrando essa caminhada e nos guiando através de imagens, gestos e principalmente, dos sons das palavras.

E não é acaso que essa viagem tem de ser feita em caravana; avançamos junto com a poeta caminhando também. Não há máquinas para nos mover, nossa caminhada é necessária; é necessário que escutemos e sigamos os sons, as palavras de Carina Castro.

um inverno de meio-sol
uma vida de meio-dia

As ilustrações do livro, do zine e do adesivo são de Deborah Erê pra quem Carina dedica o poema "crinas" que tem, talvez, os versos mais bonitos de seu livro.

meninos pernambucanos
éguas russas andando na beira da praia
comendo os restos das coisas
bebendo água salgada

Cartográfica

de distâncias traçadas entre sonhos
passos e pousos
redimensiono o interior do meu interior
e a brevidade entre pensamento e pensamento
não acompanha o vagar do corpo
entregue ao manejo da maré
nem o vagar da garrafa ondulando sobre os dias
entre soluços de bêbado e pranto
encontraste a carta, mas não entendeste a letra
e não há legendas, coordenadas, vozes,
mapas para minha memória
dói fundo a longitude dos meus garranchos
perdidos no efêmero de um idioma
ilegível entre latentes caligrafias, alfabetos
e não vês no céu
a constelação com meu nome
não podes ler minhas mãos
e latejando minhas letras dizem
teu futuro, te dão leme
leem tuas digitais
no leme, no copo, na garrafa
só não traduz a lancinante latitude
do teu entendimento

envias de volta um papel em branco

foto por Daisy Serena

"Carina Castro (SP, 1988) é poeta e pesquisadora na área de Literatura Comparada. Escreve também Literatura Infantojuvenil, com um conto que recebeu o Prémio Lusofonia (2012) de Portugal. Estudante de Língua e Literatura Árabe na USP. Tem poemas publicados em antologias, revistas digitais e suplementos literários. Reminiscências do mar a embalam a estar perto da poesia, do canto, do sopro, orientar-se pelo que diz o desconhecido. " Ministra o curso Tramas do texto: oficina criativa para mulheres.

Caravana foi publicado pela editora Patuá em 2013.

foto principal de Camis Fontenelle

 
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