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NAZISMO E SOCIALISMO
Entenda por que o nazismo nunca teve nada a ver com o socialismo
Simone Ishibashi
Rio de Janeiro

Essa dúvida pode parecer meio absurda. Mas após a manifestação de ultradireita ocorrida em Virgínia nos Estados Unidos esse debate veio à tona.

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Por conta da denominação do partido nazista de Hitler como “nacional-socialista” surgiram nas redes sociais e através de artigos dos grandes meios vozes que tentaram colocar o nazismo e o socialismo como algo que teria a mesma origem, e que manteria semelhanças políticas em seus projetos. Posts de facebook, twitter e vídeos de youtubers supostamente informados proliferaram, defendendo essa tese. Essa tentativa se aproveita do desconhecimento histórico existente, para lançar uma nuvem de fumaça a respeito das oposições de classe que separam completamente o nazismo e fascismo do socialismo.

O nazismo e o fascismo surgiram no período entre a I e a II Guerras Mundiais em meio a uma situação marcada pelo profundo arruinamento econômico da Europa, os sofrimentos da guerra, que levaram ao empobrecimento generalizado da pequena-burguesia, e a transformação de setores amplos dos trabalhadores em desempregados crônicos. A base de classe do nazi-fascismo era a pequena burguesia arruinada, que instrumentalizada pela burguesia, se volta contra a classe trabalhadora e suas organizações. Apesar de não ser orgânico da grande burguesia alemã e se utilizar de uma retórica contrária a aspectos da dominação dos grandes bancos e industriais de seu tempo, Hitler e Mussolini preservaram a base social existente, isto é, o capitalismo.

Trotsky, dirigente da revolução russa, afirma que o nazi-fascismo se erguia em meio “às penúrias dos pequenos proprietários sempre próximos à quebra, de seus filhos universitários sem trabalho, que exigiam mão de ferro (...) As fogueiras nas quais ardem a ímpia literatura do marxismo iluminam radiantemente a natureza de classe do nacional-socialismo. Ainda quando os nazistas atuavam como partido e não como poder estatal, não conseguiram se aproximar absolutamente da classe trabalhadora ”. Dessa maneira, o nazismo e o fascismo buscavam se apresentar como os defensores do pequeno e médio capital, contra o grande capital. Em nenhum momento se apoiou ou realizou qualquer interesse estratégico da classe trabalhadora, voltando-se ferozmente contra essa. Assim, o nazi-fascismo é absolutamente contrário ao socialismo.

A questão da raça e do nacionalismo, elementos que se notam novamente nas nefastas manifestações fascistas nos Estados Unidos, são a expressão da impotência desse setor da pequena-burguesia arruinada marcada pelo rechaço ao pensamento materialista, econômico, ou mesmo crítico. Fornece uma justificativa atemporal para defender a pretensa superioridade de uma raça sobre a outra, colocando aí, e não na exploração que levam às crises capitalistas a raiz dos males que sofre. Nas palavras de Trotsky “As qualidades da raça são construídas sem relação com as condições sociais em transformação(...) ao rechaçar o pensamento econômico, o nacional-socialismo desce ao nível mais baixo: do materialismo econômico recorre ao materialismo zoológico ”.

Já o socialismo é a luta pelo fim da exploração capitalista, produto de uma revolução cujo sujeito é a classe trabalhadora. A classe trabalhadora contando com um partido revolucionário, que deve organizar seus setores mais conscientes e resolutos, no calor de seu combate formula saídas para as aspirações de todos os setores oprimidos da sociedade. O objetivo que se coloca com a tomada do poder pelos trabalhadores é libertar a ampla maioria da escravidão assalariada que beneficia uma ínfima minoria, a classe dos detentores dos meios de produção, os capitalistas. A revolução socialista deve se iniciar nacionalmente, mas para atingir seu objetivo necessita se expandir internacionalmente, e se completará mundialmente, na medida em que o capitalismo deixa de existir. E ao contrário do que a direita ignorante gosta de propagar, pressupõe o avanço das forças produtivas, em base à uma organização superior da produção, que atualmente ao ser ordenada pela sede de lucro, e não pelas necessidades humanas desenvolve-se muito abaixo de suas potencialidades. Não há nenhuma sombra de semelhança com o nazi-fascismo.

Essa tentativa de igualar ambos não é sequer nova. Decerto que a burocratização da URSS sob Stalin colaborou para disseminar interpretações que buscam igualar socialismo e nazi-fascismo. Em 1941 Hannah Arendt, filósofa liberal, em seu “Origens do totalitarismo” já havia defendido que os nazistas e o stalinismo se assemelhavam. Uma das teses defendida nessa obra seria de que essa semelhança adviria sobretudo em relação a um objetivo supranacional dos nazistas, que se “assemelharia à propaganda nacionalista da URSS”, e que fazia em sua opinião com que a real substância do nazismo não fosse o nacionalismo restrito ao Estado-nação. Além disso, tanto o nazismo como a URSS seriam concretizações de um igualitarismo totalitário.

Existem vários problemas, mas nomearemos dois principais nessa perspectiva de Hannah Arendt. Um primeiro é que ela não distingue o stalinismo do socialismo, como aliás se faz até hoje tanto em jornais, quanto nas redes sociais, como nas universidades. A burocratização da URSS e a teoria stalinista do socialismo num só país era o reverso de preceitos fundamentais do marxismo revolucionário, e não sua derivação. Ignora absolutamente toda a crítica e combate que Trotsky e a Oposição de Esquerda, que atuava no interior do partido comunista russo, realizaram anos antes frente à burocratização da URSS, contra a política de Stalin, bem como o programa da revolução política para derrubar a burocracia do poder recolocar em marcha a estratégia de internacionalizar a revolução socialista. O segundo problema é que a base do Estado nazista era a propriedade privada, enquanto na URSS havia ocorrido uma revolução levada adiante pelos trabalhadores. Não é possível reduzir essas duas formações tão distintas em “igualitarismo totalitário”.

Como afirma Trotsky, “O regime totalitário de Hitler nasceu do terror das classes possuidoras da Alemanha diante da revolução socialista. Hitler recebeu dos proprietários o mandato para salvar sua propriedade da ameaça do bolchevismo a qualquer preço e de lhes abrir o caminho à dominação do mundo. O regime totalitário de Stalin surgiu do grande terror do povo revolucionário estrangulado que sente a nova casta que se apoderou da revolução”. São diferenças profundas, que não se podem ignorar, e que devem ser debatidas novamente. Para que não cair nas manobras e simplificações das direitas e seus “intelectuais” e formadores de opinião. E para elaborar uma saída aos desafios de hoje.

1. TROTSKY, Leon Que es el nacional-socialismo? Guerra y revolucion pag. 127
Idem. 129

2. Idem. 129

3. Idem pág. 259

 
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