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DEBATE SOBRE A CRISE VENEZUELANA
Qual a política para a esquerda socialista da Venezuela?
Eduardo Molina

A crise política venezuelana acumula tensão na medida em que se aproxima o dia 30 de Julho, momento de eleger os representantes para a enganadora Assembleia Constituinte convocada pelo governo, que tem colhido um amplo rechaço não só da direita, mas também de setores do próprio chavismo e da esquerda. Na edição venezuelana do Izquierda Diario, editada por nossos companheiros da Liga dos Trabalhadores pelo Socialismo (LTS), pode-se acompanhar dia após dia a situação que muda a cada momento.

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Nicolá Maduro governa por decreto a partir de um "estado de exceção" permanente, cada vez mais repressivo (não somente contra as ações da direita, mas também contra protestos populares, militarizando bairros humildes, impedindo eleições sindicais ou proscrevendo setores de esquerda), para impor sua linha econômica inflacionária, de ajustes e de pagamento fiel à dívida externa. Com a farsa de uma Constituinte "democrática" e "originária" manipulada para garantir de antemão uma maioria regimentada pelo Partido Socialista Unido da Venezuela, pretende legitimar os caminhos bonapartistas para se prorrogar no poder.

A Mesa de Unidade Democrática (MUD), coalisão da estirpe golpista e pró-imperialista, coloca em disputa um programa ainda mais reacionário, envolvido numa afrontosa demagogia "democrática". Chama a novas demonstrações - como o chamado do dia 16 por um simulacro de consulta popular contra a convocação da Assembleia-.

Levanta a exigência de "restituição da ordem constitucional" enquanto bate nas portas dos quarteis pedindo que as Forças Armadas (FANB) abandonem Maduro para discutir "um governo de união nacional e a realização de eleições".

Ao mesmo tempo, existem fissuras no oficialismo, o rompimento da Procuradora Geral Luisa Ortega (quem Maduro pretende deslocar) e rumores de mal estar entre os militares poderiam indicar que setores moderados do chavismo se colocam em resistência a um percurso que consideram aventureiro, e preferem abrir uma negociação com a direita. No meio da luta pela Constituinte, não se pode descartar uma intervenção militar, já que a FANB se preserva como um árbitro em última instância, tampouco qualquer tipo novo de "diálogo" que destrave o impasse político e possa casar, de alguma forma, a fratura institucional entre o poder executivo chavista e o legislativo dominado pela oposição. De qualquer forma, o quadro de aguda crise política segue com um "prognóstico reservado" e um "final em aberto".

O pano de fundo é a gravíssima crise geral -econômica, social e política, em que resultou o projeto chavista de "desenvolvimento nacional" e "socialismo do século XXI" com empresários sobre a base do capitalismo dependente enquanto a renda petrolífera despencou. A velha luta entre as camarilhas chavistas "boliburguesas" e a burguesia tradicional pelo controle desta renda petroleira, agora menor, se intensifica em torno do problema do poder político, já que o seu controle e sua distribuição dependem do Estado. O grande confronto entre o governo chavista -que não é capaz de conter seu desgaste mas mantém o apoio das FANB com um grande peso na vida nacional e no manejo do Estado-, e a MUD -apoiada pela alta burguesia e das camadas médias com respaldo do imperialismo-; se estende sem resolver o "empate catastrófico" na relação de forças enquanto se agravam as penúrias dos trabalhadores e do povo, os mais golpeados pela brutal crise econômica.

Neste quadro de putrefação das condições objetivas sem irrupção da classe trabalhadora e das massas, a crise se alarga e prepara o terreno para uma saída reacionária. Isto conta com a colaboração, mesmo com suas disputas e diferenças, tanto do bonapartismo chavista quanto da oposição "republicana" pró-imperialista, que também compartilham do temor por um "estalo social"; ou seja, são inimigos de que as massas intervenham de maneira independente.

Venezuela ainda é, junto do Brasil, um dos focos mais ferventes do cenário latinoamericano. Em ambos há uma boa parte da definição da conjuntura latinoamericano, em um contexto de incertidão econômica e contradições sociais e políticas há o esgotamento do "ciclo progressista" e a ofensiva da direita retornada ao poder no Brasil e na Argentina. Uma razão a mais para o debate sobre o processo venezuelano e sobre a política a ser impulsionada a partir da esquerda.

POSIÇÕES DA ESQUERDA

Os rumos de Maduro tem provocado grandes crises e divisões no "progressismo" latinoamericano, já golpeado pelos retrocessos do lulismo e do kirchnerismo. Um setor "nacional e popular" apoia o indefensável governo de Caracas em seu giro bonapartista, repressor e ajustador "heterodoxo". Outro setor, mais centroesquerdista, passa a criticá-lo em nome do "diálogo", alinhados com uma transição à "democracia" que querem os setores do imperialismo, o Vaticano e as burguesias da região.

A crise venezuelana também coloca em prova as posições da esquerda socialista. É uma situação muito difícil, dada a extrema polarização social e política e a escassa atividade autônoma da classe trabalhadora. Isto só reforça a necessidade de uma política revolucionária a altura da situação. Entretanto, não é o que caracteriza a política de várias das correntes de esquerda.

Na sua época de ascenso, com nacionalizações parciais e concessões ao povo humilde, o chavismo fagocitou grupos de esquerda que acreditaram ser possível "alterar o conteúdo" nacionalista burguês do movimento, se integrando como "conselheiros" do Comandante. É o caso da autointitulada "corrente marxista" do PSUV, que apoia disciplinadamente Maduro, implorando de tempos em tempos alguma mudança de caminho.

Outras tendências, aderentes do processo chavista, são críticas a Maduro porém apoiam sua convocação por uma Assembleia Constituinte, difundindo a ilusão de que se trata de um espaço de participação democrática onde será possível influir nos rumos do governo e "aprofundar" o processo bolivariano. Setores do PSOL brasileiro, a Frente Popular Darío Santillán na Argentina, franjas da esquerda anticapitalista europeia (como coloca a revista Vientosur) entre outros. Lavam a própria cara com a ideia "comunal" preparada pelo governo, uma vez que já está colocado que essa Assembleia, manipulada pra assegurar de antemão a maioria oficialista se apoiando em uma caprichosa representação territorial e na organizações já regimentadas pelo Estado e pelo PSUV, está a serviço de um projeto bonapartista cada vez mais reacionário de Maduro.

A esquerda que se proclama "independente" e anticapitalista mas que se alinhou "criticamente" ao projeto bolivariano de Chávez, não faz mais do que consumar uma nova capitulação por trás do bonapartismo decadente de Maduro. Demonstram, assim, sua falta de independencia política e estratégica, incapazes de apresentar uma alternativa de conjunto ao povo trabalhador. As consignas "ecosocialistas", feministas e anti-imperialistas que adornam a su apropaganda não conformam um programa para mobilizar as massas diante da catastrófica situação que padecem -o que indefectivelmente os levaria se chocar com o governo de Maduro e todo o seu plano econômico e político-, não passam de listas de pedidos e conselhos ao governo. A partir desta lógica, apoiam a Assembleia para propor "projetos radicalmente democráticos e alternativos aos da sociedade capitalista", da mão do poder bonapartista em pleno giro até o grande capital nacional e estrangeiro. Fazem o papel de quinta roda "anticapitalista" para o bonapartismo chavista na sua etapa de máxima degradação "madurista".

Lamentavelmente, outras tendências socialistas, com as quais compartilhamos muitas críticas ao chavismo, sucumbem em uma nefasta adaptação ao campo burguês opositor e sua demagogia "democrática".

MST-MAREA SOCIALISTA, PELO DIÁLOGO ENTRE O GOVERNO E A MUD E POR ELEIÇÕES

O Movimento Socialista dos Trabalhadores (MST) e seu grupo irmão na Venezuela, Maré Socialista (MS), que se posiciona a partir de um "chavismo crítico", sustentam suas posições pela esquerda.

Em acordo com ex-ministros chavistas e opositores "moderados", a Maré Socialista impulsiona um chamado em nome de uma "saída democrática a atual crise política, antes que a crescente violência dê um passo sem retorno em direção a um enfrentamento fratricida generalizado", reivindica a restauração do "cronograma eleitoral" e nos diz que, ao mesmo temop, "é preciso acompanhar os anúncios da abertura de Outro Diálogo, amplo e inclusivo, que não se limite às cúpulas partidárias da oposição e do governo." (Declaração da Maré Socialista, 22/04/17). Como "a sociedade venezuelana e o povo trabalhador estão presos entre duas cúpulas irracionais e ambiciosas. Ambas violam a Constituição", segundo insiste Gonzalo Gómez Freire, dirigente do MS, o caminho seria:
"1) Iniciar uma rota democrática constitucional para diminuir os conflitos do país;
2) Instaurar Outro Diálogo, não exclusivo nem somente das cúpulas, mas do povo, aberto e público, com acesso a todos os meios de comunicação."

Diante do chamado pela Constituinte enganadora, a Maré se pronunciou para que o Conselho Nacional Eleitoral (CNE) "reestabeleça o funcionamento da Constituição de ’99, assuma sua responsabilidade histórica e ative as suspensas eleições regionais a governadores e representantes e que dê certeza da realização das eleições presidenciais do próximo ano, instalando desde agora um cronograma para as mesmas". Como se vê, a Constituição de 99, o diálogo e as eleições são os pilares da política da Maré. Não é ilusão de ótica que se pareçam tanto com os da política da direita.

A Maré Socialista se espanta com os níveis de violência alcançados pela crise política e recomenda uma saída conservadora e legalista de reconduzir ao marco constitucional o enfrentamento dos poderes entre a MUD e o chavismo. É uma lógica que, além de descansar na eventual conciliação de dois blocos burgueses em choque, submete os trabalhadores a estreita legalidade do próprio regime bonapartista edificado sobre a Constituição de 99, no lugar de ajudá-los a superar os prejuizos constitucionalistas.

Pode ser uma linha sensível aos temores de camadas médias aterrorizadas pela "violência" mas não é uma política pela mobilização independente dos trabalhadores com seus próprios métodos enfrentando a repressão estatal, paraestatal e da direita, em uma crise que não admite solução progressiva senão a da sua própria irrupção.

No entanto, a crise política se caracteriza, precisamente, por se embasar desde muito tempo nos marcos constitucionais. É certo que a crise geral que atravessa a Venezuela se expressa no completo esgotamento do projeto bolivariano e da crise de seu ordenamento institucional, sintetizado na Constituição de 1999, que tanto os opositores quanto o governo juram defender. Esta solidificou, por fora de algumas concessões democráticas, o andaime jurídico do bonapartismo plebiscitário que praticou Chávez e que pretende acentuar, em condições antagônicas, seu sucessor Maduro.

Apelar à Constituição de 99 não serve para enfrentar-se com a Assembleia que propõe Maduro para "aperfeiçoá-la", e capitula totalmente à linha que segue o programa eleitoral exigido pela MUD. Só serviria para orquestrar uma saída política dentro do regime, uma vez que a eventual reposição plena da Constituição, incluindo um calendário eleitoral, dependeria de um pacto entre o chavismo e a oposição burguesa, com a aprovação da Força Armada Nacional Bolivariana (FANB), o visto de Washington e a benção papal, para avançar nesta "transição"; ou seja, em direção a um regime abertamente reacionário.

A Maré não alerta contra o perigo real que significam as Forças Armadas e todo o seu peso como árbitro que tanto o governo quanto a oposição apostam. Tampouco se questionam a respeito de propor um retorno a um calendário eleitoral que provavelmente significaria a vitória da direita e de seu prontuário mais antidemocrático. Se contenta em propor uma saída constitucional "razoável" dentro do regime e cumprir um papel de cobertura de esquerda à própria esquerda.

Todo o projeto político da Maré aponta para a participação em eventuais eleições, aglutinando em seu caminho os chavistas descontentes. De fato, reivindicam o "chavismo crítico" como aposta "a um novo emergente político que surja do próprio processo bolivariano e se coloque como oposição de esquerda ao governo" (Sergio García, em www.mst.org.ar/2017/06/07), tarefa empenhada junto a ex-ministros e outras referências chavistas que se afastaram ou foram expulsos do "chavismo oficial". Ainda assim as posições da Maré parecem demasiadas estreitas e "sectárias" para alguns de seus membros, entre eles seu principal porta-voz, Nicmer Evans, que acaba de se afastar para contribuir com a criação de "espaços mais amplos".

Este "chavismo crítico", setor que inclui socialistas, centroesquerdistas e bolivarianos é uma característica da "amplitude" oportunista que a Maré compartilha com o MST argentino. Este não teve problemas em marchar junto com "progressistas" como Luiz Juez ou "Pino" Solanas. Agora, depois do seu fracasso nessas tentativas frentistas, buscam se reafirmar na sociedade eleitoral com o Novo MAS. Porém, como demonstra o seu apoio ao projeto "neochavista" da Maré, não são uma corrente que se colocam pela independência de classe, não se propõem a construir um pólo independente com os trabalhadores e com a juventude, senão apenas conformar um espaço sem delimitação política e estratégica com as variantes neoreformistas ou, pior, somarem-se a elas.

IS-PSL, DA "REBELIÃO POPULAR" ATÉ A RETAGUARDA DA MUD

O Partido Socialismo e Liberdade (PSL, grupo irmão da Esquerda Socialista que integra a FIT) levanta uma consigna de Abaixo Maduro! como tarefa principal do momento. Ainda que declaradamente se posicione contra a MUD, ao colocar no centro de sua política a caída de um presidente dentro de uma lógica de "todos contra o governo", capitulam objetivamente a política da oposição direitista, inimiga mortal das massas trabalhadoras.

Para justificar a sua política, se veem obrigados a forçar sua análise, colocando na mesma sacola todas as até então minoritárias lutas genuínas de trabalhadores, ou ações desesperadas de setores populares (saques), com as manifestações cnvocadas pela direita, tudo dentro de uma mesma "rebelião popular democrática". É certo que o repúdio ao governo não é somente de uma classe média acomodada, mas também alcança a setores populares e de trabalhadores, porém segue sendo polarizada entre o governo e a MUD. Esta é a única força social e política que hoje pode capitalizar tal cenário, e que dirige todo o movimento opositor nas ruas é a reação concentrada na MUD, respaldada pelo imperialismo e pela direita latinoamericana.

Ainda que o majoritário e o decisivo dos atos de rua nestes três meses foi convocado e lidkerado pela direita com seu programa reacionário, o PSL se nega a admitir este feito argumentando, de maneira absurda, que reconhecer tal obviedade é repetir o discurso do governo e catalogar como de direita as mobilizações convocadas pela... direita, é "seguir utilizando a visão maniqueísta e polarizadora". Portanto, se permitem apoiar a "rebelião popular que reivindica que Maduro vá embora. Não apoiamos a velha oposição patronal de direita e pró-imperialista agrupada na Mesa da Unidade Democrática (MUD), que trata de capitalizar no descontentamento popular genuíno". "A MUD não convoca a luta contra os ajustes, nem questiona os pagamentos da dívida. Pelo contrário, buscam o poder para aprofundar este "pacote". Devido a ele, as marchas vão para além de suas convocatórias, e as mesmas são, cada vez mais, protagonizadas pelos habitantes dos bairros populares, tradicionalmente conectados com o chavismo. Por isso, junto a mobilização é necessário seguir impulsionando a formação de um pólo político alternativo da esquerda e do povo trabalhador que seja independente do PSUV e da MUD".

Para o PSL, a direita seria a direção inconsequente da tal "rebelião popular" e insistem a chamar "ao povo e aos trabalhadores a seguir protestando até que este governo caia, e a rechaçar a falsa Constituinte de Maduro. É fundamental que os setores populares e os trabalhadores sigam incorporando-se aos protestos populares. (...) discutamos a organização e a conformação de brigadas de defesa contra a repressão da GNB, PNB e dos coletivos paramilitares". Nenhuma de suas três consignas centrais: "Fora Maduro!", "Basta de ajuste explorador!" e "Não à Constituinte fraudulenta!" se dirige contra a direita, talvez porque o PSL se concebe em "unidade de ação" dentro de uma ampla "frente antibonapartista". Mas nada pode ser mais nefasto do que uma política que se limite a derrubada de Maduro, quando a outra força opositora real que propõe a governar é a direita, no lugar de depositar todas as forças na organização e na luta por uma política independente dos trabalhadores.

Também o Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado (PSTU) brasileiro, que orienta a LIT-CI se entusiasma falando que "uma rebelião popular está nascendo na Venezuela. O país é palco de imensas mobilizações contra o presidente Nicolás Maduro, responsável por uma catástrofe social" (Opinião Socialista, n. 536, Maio de 2017). Também critica a direita por sua suposta inconsequência, já que "enquanto para o povo, que está nas ruas, arriscando sua vida, é cada vez mais forte a vontade de mobilizar-se até que caia o governo, a MUD e seus partidos insistem em seu "cronograma eleitoral", na restituição dos poderes pela Assembleia nacional, entre outras exigências similares, desviando o eixo ao não fazer uso da consigna "fora Maduro!", razão de ser das mobilizações populares." (O povo diz: "Maduro, se vá! O que diz a MUD?").

O PSTU eleva ao extremo os erros de análise e a política do PSL e da ES. Se entusiasmam com o fato de que "algumas mobilizações estão começando a escapar do controle da MUD e de seus partidos. As massas, sim, querem "derrubar" o governo, mas não existe uma direção independente para esta tarefa. No entanto vem surgindo a possibilidade de que se estale uma verdadeira "rebelião popular" que imponha o que já se escuta por todo o país: "Maduro, se vá!".

Seguindo esta particular pintura da realidade, os líderes e partidos da MUD não querem sair de Maduro, na realidade se veem obrigados a se colocar "a frente das mobilizações", da "rebelião popular democrática" porque se "a população" as impõe, certamente, serão superadas estas direções inconsequentes na luta contra o governo, uma vez que já chamam aos militares para que intervenham e forcem o governo a ceder ou arbitrem uma transição.

Lamentavelmente, com esta nefasta política "antimadurista" que não combate a direita, estas tendências socialistas terminam como a "quinta roda" do campo opositor "democrático" hegemonizado pelos partidos da MUD.

NEM COM O GOVERNO NEM COM A MUD! POR UMA ALTERNATIVA OPERÁRIA E POPULAR!

Algumas destas forças criticam nosso rechaço a nos somarmos ao carro do chavismo nem com o da oposição como um "abstencionismo político". Isto é falso, sustentamos que não há uma outra alternativa realista do ponto de vista da classe trabalhadora, que promover uma alternativa operária e popular. A ausência de independência política da classe trabalhadora é a debilidade mais importante do ciclo histórico do chavismo no poder. A energia e disposição de luta dos trabalhadores e dos setores populares foi canalizada e enquadrada pelo chavismo, e diante de sua queda é a direita que a capitaliza como opção visível de alternância política. Não apresentar uma política independente para lutar pela independência de classe ajuda a aprofundar este problema vital. Todos os esforços que a esquerda revolucionária empreende deve apontar para a expressão de uma voz própria dos trabalhadores, em aliança com os setores populares, combatendo tanto o governo dos ajustes econômicos, sua casta corrupta e a repressão, quanto a direita neoliberal que se prepara para voltar a governar.

É a partir desta perspectiva que nossos companheiros da Liga dos Trabalhadores pelo Socialismo (LTS), da Venezuela, interveem com suas até então modestas forças, em espaços e atos progressistas, junto a outras organizações de esuqerda ou sindicatos independentes das burocracias sindicais, buscando construir o desenvolvimento de uma saída pela esquerda, realmente independente da direita e do governo.

Na Argentina, compartilhamos com os companheiros do Partido Obreiro muitos de seus termos de crítica contra o governo de Caracas e a MUD, também a crítica a estas correntes de esquerda. Jorge Altamira escrevia que "a classe operária da Venezuela necessita de uma política de esquerda a partir deste cenário. A crise deverá atravessar numerosas etapas e novos desafios para a esquerda. A oportunidade de um congresso operário e da esquerda para apresentar uma saída de conjunto e um plano de lutas frente a catástrofe econômica está a vista. Em oposição ao governo e aos autogolpes e golpes arquitetados, reivindiquemos uma Assembleia Constituinte Livre e Soberana convocada por um governo de trabalhadores. É um projeto para reunir as forças de classe e da esquerda, e por essa via desenvolver uma alternativa operária e socialista à crise". (07/05/17). Não aparece aqui, todavia, claramente definida a luta pela independência de classe, núcleo básico da estratégia operária. É isso o que pode delimitar uma política operária e socialista consequente de uma vaga "política de esquerda" como representaria, por exemplo, um "chavismo crítico".

Consideramos que é abstrato o projeto de um "congresso operário e da esquerda" (quem o convocaria hoje?) pois propõe a Assembleia Constituinte como uma tarefa posterior a tomada de poder por um governo de trabalhadores, quando na realidade, a luta pela Constituinte livre e soberana deve ser uma política para enfrentar hoje as saídas burguesas ao impasse político, e oferece o melhor ponto de apoio para o desenvolvimento da mobilização.

Nossos companheiros da LTS colocam a necessidade de se opor tanto à manobra "Constituinte" do governo quanto à demagogia "democrática" da direita, que são saídas dentro do regime, com uma saída política de ruptura com o mesmo. Para isto se faz necessário uma política que articule um programa operário e popular de emergência econômica com a luta por uma verdadeira Assembleia Constituinte Livre e Soberana (ACLS). Esta exigência aponta para que se coloque em discussão toda a ordem social existente, desde as relações de propriedade até as formas de governo, debatendo as medidas para a resolução dos problemas estruturais do país, ao calor das mobilizações para fazer valer as demandas e exigências dos trabalhadores e do povo pobre. Trata-se de uma via para impulsionar a aparição com força no cenário nacional das reivindicações, bandeiras e métodos dos trabalhadores, contra as manobras de ambas as frações desta ordem social e política.

A articulação dentro de um programa operário de luta por uma Constituinte verdadeiramente livre e soberana, entendida como uma consigna democrático-radical, propõe uma lógica transicional de ação diante da catástrofe que está multiplicando as penúrias do povo trabalhador e ameaça desembocar em alguma variante de saída reacionária; parte da perspectiva de que sobre as bases dos órgãos de luta das massas que surgirão na mesma, as próprias massas possam se convencer de que é necessário avançar até um governo operário e popular, pois somente um desenvolvimento revolucionário da luta de classes, com o movimento operário dirigindo a aliança com o povo pobre, pode garantir uma saída progressiva a crise geral da Venezuela.

 
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