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COTAS ÉTNICO-RACIAIS
Holiday grava vídeo reacionário contrário a adoção de cotas na USP
Odete Assis
Mestranda em Literatura Brasileira na UFMG

O vereador criticou a conquista histórica que obteve o movimento negro nesta semana ao impor que a USP adotasse, finalmente, um sistema de cotas étnico-raciais. Para Holiday, a reserva de vagas na universidade para pretos, pardos e indígenas segrega a população, uma falácia facilmente desconstruída por qualquer um que conheça a história do povo negro no país.

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Fernando Holiday, vereador pelo partido DEM-SP, publicou, nesta quarta-feira (5), em suas redes sociais, um vídeo de conteúdo reacionário e racista, com um discurso raso e desinformado, em que critica a adoção de cotas étnico-raciais no vestibular da Universidade de São Paulo (USP), aprovada pelo Conselho Universitário esta semana. A conquista foi amplamente comemorada por estudantes, funcionários, professores e pelo movimento negro e indígena de conjunto, que há décadas travam uma importante luta pelas cotas no acesso à universidade mais elitista do país. Uma luta que escancara também o racismo estrutural sobre o qual está baseado a sociedade brasileira, sendo um dos países que mais mata a população negra, que é maioria no Brasil, e que historicamente é minoria em cadeiras universitárias, enquanto nossa história de luta e resistência é apagada nos currículos estudados nos cursos. Assim como a população indígena que continua sendo exterminada, dia após dia, em nome dos interesses do agronegócio e dos grandes latifundiários do país.

A luta pelas cotas étnico-raciais é parte de uma batalha histórica onde questionamos o caráter profundamente racista sobre o qual se origina e se sustenta a educação superior no Brasil. O reconhecimento da necessidade da implementação das cotas, inclusive numa lei federal que a até semana passada a USP se negava veementemente a cumprir, é parte de um processo mais profundo onde a burguesia é obrigada a reconhecer que no país do mito da democracia racial, existe racismo sim. A conquista de cotas na USP, ao contrário do discurso reacionário de Holiday, só vem para fortalecer a luta da população negra e indígena contra a segregação imposta, não por indivíduos isolados, mas pela burguesia e o seu sistema de dominação capitalista.

Aqueles contrários, assim como Holiday, a adoção das cotas étnico-raciais, dizem que a reserva de vagas deveria ser pautada pela questão social, e não racial, como se as duas coisas não estivessem diretamente relacionadas e como se os alunos negros não fossem uma maioria nas escolas públicas (enquanto são uma ampla minoria das escolas particulares que mais aprovam alunos nos vestibulares públicos). O principal argumento contrário utilizado é de que as cotas são “preconceituosas” e que “segregam” a população.

Sabemos que preconceituosa e elitista é a posição de Holiday, como uma representante da classe burguesa, contrária a uma demanda histórica do movimento negro que vem para ampliar o acesso do nosso povo ao ensino superior gratuito e de qualidade. E que segregados são as negras e negros na atual conjuntura da universidade, onde em sua maioria entram, apenas pela porta dos fundos, para realizar os serviços mais precários, como trabalhadores terceirizados e não para frequentar as salas de aula, majoritariamente brancas.

Em seu vídeo e na sua argumentação Holiday exibe um enorme reacionarismo e falta de noção da realidade, demonstrando seu pouco, quase nulo conhecimento histórico, inclusive no que se refere à história do povo negro e as lutas que construímos em nosso país. Associando de forma conscientemente equivocada, a adoção do sistema de cotas ao apartheid e ao nazismo, regime que mais segregou pessoas no mundo e matou milhões. “É como se estivéssemos voltando para o tempo do apartheid e até do nazismo. Só que agora sob a liderança do politicamente correto representado por um movimento negro de esquerda. Agora essas faculdades querem segregar, separar os brancos dos negros”, afirmou ele, mentindo descaradamente, já que o fundamento da defesa das cotas é exatamente o contrário, pois pretendemos colocar nas cadeiras das salas de aula do ensino superior público negras e negros que durante anos tiveram esse direito negado pela burguesia, e que hoje ocupam os postos de trabalho mais precarizados dentro e fora da universidade.

Ao falar que o negro não precisa de cotas para entrar na universidade, por que isso o inferioriza, Holiday expressa uma total falta de compreensão do contexto histórico do período colonial do Brasil, do significado da ideologia racista como sustentáculo de um sistema de exploração e opressão. A pobreza aqui no Brasil tem cor, e mora em sua maioria em zonas periféricas onde o acesso à escola até existe, porém, as condições de estudos são precárias, faltam professores, materiais didáticos, acompanhamento pedagógico e o aluno muitas vezes precisa estudar no período noturno, pois necessita trabalhar durante o dia. Após a abolição da escravidão, os negros ditos “livres” foram esmagados pelo processo Imigratório, e encurralados a se entregarem aos piores postos de trabalho. O estudo nessas condições na maioria das vezes não podia ser uma prioridade, pois era necessário trabalhar para sobreviver. E essa dinâmica, bem como o peso da história, recaem sobre muitas famílias negras até hoje.

O que diz Holiday é uma demonstração da total ignorância histórica e expõe a política reacionária e sua atuação política completamente a favor do sistema capitalista. Holiday é o tipo de cara ideal para reforçar a ideologia da direita, na qual o mérito está acima de todas as coisas, suas competências só dependem do seu esforço individual, discurso bastante alinhado com o pensamento neoliberal que ele tanto defende, e para isso precisa pregar o ódio aos setores de esquerda.

Nós revolucionários negros nos colocamos o tempo todo na linha de frente dessa luta, seguindo os exemplos de resistência como do Zumbi dos Palmares, Dandara e tantos outros negros lutadores, pois sabemos que o racismo só terá fim quando o capitalismo for abaixo. A cor da nossa pele significa resistência, a afirmação da nossa identidade negra, seja se auto declarando negro, seja levantando nossos blacks, vai na contramão das políticas defendidas por Holiday, politicas essas que servem apenas para tentar tirar as poucas conquistas que foram arrancadas com muita luta. Mas a nossa resistência continua e se organiza a cada dia mais, ela foi parte fundamental de fazer com que a USP e a Unicamp fossem obrigadas a reconhecer a necessidade de adoção das cotas étnico-raciais, ela se expressa a todo momento com os trabalhadores e a juventude se colocando a cada dia mais na luta contra o racismo e todas as formas de opressão que o capitalismo se apropria para seguir nos explorando mais e mais.

A conquista de cotas na USP é uma conquista muito importante, que nos permite seguir na luta para avançar por mais, garantindo o direito à permanência dos estudantes que ingressam nesta universidade, ampliando a porcentagem de cotas para que sejam proporcionais ao número de negros do estado, avançando para conquistar o fim do vestibular, um filtro social que impede que a população negra, indígena e pobre tenha acesso à universidade. E disputando para que o conhecimento produzido aqui dentro, esteja a serviço dos nossos irmãos de raça e classe, a serviço de toda população pobre e trabalhadora.

 
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