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ALEMANHA
Alice Weidel: a nova cara da ultra direita alemã
Celeste Murillo
Argentina | @rompe_teclas

A nova cara da ultra direita alemã volta a confirmar a decadência do feminismo liberal. A direita colhe os frutos da igualdade e da diversidade acríticas a democracia capitalista?

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Imagem: Pinknews

Alice Weidel foi eleita pelo seu partido, Alternativa para Alemanha, como candidata a deputada nas próximas eleições legislativas em setembro deste ano. Um dado que difere Weidel dos demais é sua orientação sexual. A presença de uma mulher abertamente lésbica a frente de uma organização política de ultra direita chama a atenção dos meios de comunicação.

Que o gênero, a identidade e a orientação sexual nada tem a ver com as políticas que uma pessoa defende é uma afirmação que soa quase como óbvia. No entanto, depois de décadas de “progressismo neoliberal” e de “calendários de gênero e diversidade”, a ausência de ao menos uma só crítica às democracias capitalistas não somente é algo que deve ser debatido, como também temos que refletir como tem servido para abrir caminho para que hoje seja a direita quem se apropria de diferentes formas deste discurso.

Assim como demonstraram figuras como Marine Le Pen na França, Ivanka Trump nos EUA, e Frauke Petry, companheira de partido da “nova estrela” da ultra direita alemã. O perfil de Weidel volta a pôr em discussão as demandas, objetivos e estratégias do feminismo e do movimento LGBT, e sua integração às democracias capitalistas. Essa integração, condicionada e restringida, tem tido como outro lado da moeda a utilização do discurso feminista ou a inclusão das LGBTIs em partidos políticos de direita, como uma forma de “se modernizar” frente ao eleitorado, sem que seja incompatível com a defesa das políticas reacionárias (inclusive contra as mulheres e as LGBTIs).

Feminismo e diversidade de direita?

Weidel é a cara de um partido abertamente homofóbico, no entanto sua presença como lésbica acaba por relegitimá-lo ao mostrar uma direita moderna que se “adapta” aos tempos em que vivemos. Cabe ressaltar que a doutora em economia não tem feito nenhuma crítica à homofobia e a transfobia do partido que representa porque, entre outras coisas, defende os valores cristãos (que tem menos a ver com as crenças pessoais que com a ideologia de seu partido).

Da mesma forma que Le Pen e outras políticas da direita europeia, é xenófoba e uma crítica ferrenha, à direita, das políticas migratórias de Angela Merkel (que não tem nada de progressistas, diga-se de passagem). Adere ao chamado “euroceptismo”, é inimiga das políticas de resgate das economias em crise do continente, defende a “identidade alemã” e o cristianismo contra o islã.

Em maio de 2016, Weidel cancelou uma reunião com Aiman Mazyek, líder do Conselho de Muçulmanos da Alemanha, porque não queria ter relação com “defensores confessos da Sharia” (lei islâmica), uma identificação estigmatória da comunidade muçulmana. Na última convenção de seu partido na cidade de Colonia disse: “como mulher, quero poder tomar o último trem sem medo”. A frase de Weidel não foi inocente. No final de 2015, nesta cidade foram denunciados casos de abusos sexuais e violência contra jovens alemãs pelas quais foram culpados imigrantes, sem ao menos uma prova, pela sua aparência física.

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Marine Le Pen já havia aproveitado avidamente esses ataques ao afirmar em uma coluna do jornal francês L’Opinion, “Temo que a crise imigratória assinale o começo do fim dos direitos das mulheres (...) Sobre este, assim como outros temas, as consequências da crise migratória são previsíveis”. Le Pen já havia empregado em outras situações o discurso feminista, esvaziado da crítica anticapitalista, utilizando de forma funcional a uma ideologia abertamente reacionária (como foi com a respeito das guerras e das invasões dos EUA, em nome dos “direitos das mulheres”, no Iraque, Afeganistão e suas intervenções em todo o Oriente Médio).

Como suas companheiras da direita, provoca desconforto entre as feministas (neo)liberais, que durante décadas outorgaram um caráter progressista à somente a presença das mulheres em lugares de poder ou conferiram um caráter “universal’ a luta das mulheres em romper o “teto de vidro”, que na realidade só alcançava uma minoria de mulheres brancas, profissionais e, é claro, ocidentais. Em nome destas “batalhas”, relegaram a crítica às democracias que incorporaram ao seu contingente parlamentar diversas ministras, deputadas, presidentas e primeiras-ministras.

O incômodo cresce quanto são as mulheres da direita são as que colhem os frutos destas críticas deixadas de lado. Weidel, assim como Marine Le Pen ou Ivanka Trump, em outro espectro político, encarnam valores similares aos defendidos por este feminismo neoliberal ou corporativo (meritocrata, empreendedorismo e igualdade de oportunidades), enquanto os partidos e organizações as quais representam reproduzem e alimentam valores abertamente reacionários. Em muitos casos, inclusive rechaçam (e atuam consequentemente contra) os direitos reprodutivos das mulheres, ou os direitos civis as LGBTIs, como o casamento entre pessoas do mesmo sexo e o direito à adoção.

O partido Alternativa para Alemanha defende que, “o modelo clássico de família é necessário para que a sociedade se reproduza, mas não excluímos outros modelos. Os consideramos exceções”. Entre essas “exceções” se encontram, por exemplo, a própria Weidel que tem 2 filhos com sua parceira.

Mas além de sua ideologia reacionária, que nada tem a ver com seu gênero ou sua orientação sexual, a realidade é que ser mulher abertamente lésbica cumpre um papel importante na legitimação das ideias e valores da direita (assim como os do neoliberalismo disfarçado de progressismo), especialmente entre setores que não escutariam os velhos líderes tradicionais destes partidos. Desta forma a Alternativa para Alemanha, como a UKIP no Reino Unido ou a Frente Nacional na França, renovaram seus dirigentes com mulheres. Ironicamente, várias delas não “se encaixam” ao velho modelo tradicional da sociedade; a direita tem sabido “se atualizar” e elege divorciadas, profissionais e lésbicas sem maiores problemas.

Então, a presença de mulheres e LGBTIs nas fileiras da direita reacionária invalida a luta para conquistar todos os direitos que nos pertencem e são negados pelas democracias capitalistas? Sem a menor dúvida não. Mas um alerta: aceitar a “tolerância”, a integração e a “igualdade” restringida às franjas que podem “pagar o preço da liberdade” somente abriu o espaço em que hoje caminha a direita. A emancipação das mulheres, a luta por uma sociedade sem opressão abraça um “calendário” urgente que não aceita condições e reivindica, desde às ruas, a igualdade para as maiorias, não somente perante a lei, mas também perante a vida.

 
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