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BALANÇO DA GREVE
Reflexões sobre o fim da greve dos professores estaduais paulistas após 92 dias
Professores do MRT

A greve dos professores da rede estadual de São Paulo terminou no último dia 12 de junho, após 92 dias, sendo a mais longa já protagonizada por esse setor. Porém, ao contrário do discurso da burocracia petista da Apeoesp, a greve não foi vitoriosa. E isso não ocorreu por falta de determinação dos educadores grevistas. Mas primeiramente pela ação do governo tucano. E em segundo lugar pela direção da Apeoesp, que foi incapaz de conduzir os professores à vitória.

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Um governo determinado a atacar os trabalhadores e a Educação

O governador tucano Geraldo Alckmin foi exemplar no quesito intransigência para atacar os trabalhadores e precarizar a Educação. Todos os artifícios foram postos em marcha para derrotar os professores. Primeiro declarou que a greve não existia. Depois, obrigado a reconhecê-la, afirmou que seria “sem sentido”. Essa campanha envolveu desde um gasto oficialmente declarado de R$ 1 bilhão com bônus, até a publicação dos salários dos professores falsamente elevados no portal da transparência. Alckmin mudou a data-base dos professores de março para junho. E repetidamente negou-se a abrir uma mesa de negociações.

Esse esforço de Alckmin em derrotar os professores foi altamente valorizado pelo PSDB. A convenção tucana acabou se transformando em um ato de apoio à sua candidatura à presidência em 2018. Ridiculamente, o deputado estadual Pedro Tobias afirmou que “o país está doente, corrupto”, e por isso precisaria de Alckmin. Mas no ano passado estimou-se que R$ 232 milhões escoaram pelo ralo da corrupção durante o governo de Alckmin. O que querem os tucanos é alguém que não hesite em atacar os trabalhadores.

Nesse objetivo Alckmin não esteve só. Nacionalmente, o governo federal petista também está avançando contra a Educação, promovendo corte de R$ 9,2 bilhões. Portanto, a grande polarização entre PT e PSDB desaparece quando se trata de atacar a Educação. Isso ficou claro na greve de São Paulo. Mesmo no Paraná, em que os parlamentares petistas buscam se localizar frente a crise do governo tucano de Beto Richa, isso não se transforma em apoio à luta dos professores. Tanto é que a greve teve que recuar também lá.

Assédio institucionalizado para atacar a greve

O governador Geraldo Alckmin institucionalizou a prática do assédio para reduzir os efeitos da greve. Através das diretorias de ensino, proibiu os comandos de greve de entrar nas escolas. Várias denúncias apareceram de professores grevistas que sequer podiam entrar nas suas próprias escolas.

Além disso, o governo se utilizou da precarização da categoria para aterrorizar os professores em condições mais vulneráveis. Diversas direções ameaçaram romper o contrato de professores categoria O, PA’s, e PAA’s que se negassem a substituir grevistas. Criar subcategorias, sem os mesmos direitos e garantias que os professores efetivos, é parte do projeto estratégico do governo do estado para dividir os professores e enfraquecer nosso movimento. Entendemos a raiva sentida pelos grevistas, mas é necessário refletirmos quem são os reais culpados dessa situação para não responsabilizar o elo mais débil dentre nós, professores, e fortalecer a política divisionista do governo.

Uma burocracia que não merece o nosso respeito

No que diz respeito a APEOESP é preciso dizer que a burocracia petista não preparou essa greve. Não criou um fundo de greve que mostrasse ao governo que os professores não seriam derrotados pela fome. Não aproveitou a comoção após a repressão aos professores do Paraná, para organizar uma ação que pudesse colocar em xeque o governo tucano aqui em São Paulo. Não unificou com as demais greves de professores pelo país, inclusive com o Paraná, cujo sindicato APP também é dirigido pela CUT. E cerceou a cada instante o novo ativismo, não fazendo esforços para dissimular sua hostilidade contra os comandos de greve. O acampamento que a APEOESP fez na frente da Secretaria da Educação nada tinha a ver com o da greve de 2000, pois não foi tomado pela base dos professores. Era por isso absolutamente inofensivo.

O objetivo fundamental da direção petista tendo à frente Maria Izabel Noronha foi se relocalizar. Era mais importante para Bebel desgastar o Alckmin para que o PT pudesse ocupar eleitoralmente esse espaço. Apropriou-se da palavra de ordem “não tem arrego”, distorcendo-a. O “não tem arrego” é uma consigna forjada na greve dos garis do Rio de Janeiro, de 2014. Que foi vitoriosa, por ser uma genuína batalha operária e, sobretudo, antiburocrática. Os garis atropelaram sua direção sindical. Algo oposto pelo vértice à dinâmica imposta pela direção majoritária da APEOESP, que coloca sua autopreservação no aparato sindical acima de tudo e de todos.

Agora, a direção majoritária da Apeoesp defende que a “luta deve continuar com manifestações com o MST e MTST” em datas indefinidas. Nenhum plano concreto de como seguir a mobilização, e nos defender dos novos ataques. Fica claro que o principal objetivo da direção petista de Bebel era fazer uma greve controlada, que não poderia arrancar uma vitória. É um absurdo o que essa direção faz com um dos maiores sindicatos da América Latina, abrindo espaço para ataques do governo e da grande mídia.

As oposições não foram alternativa

As oposições tampouco conseguiram se colocar como alternativa. Perderam uma excelente oportunidade de avançar não apenas em conquistar as demandas da greve, mas em combater a direção majoritária, algo estratégico para a luta dos professores. Na verdade sequer se colocaram essa tarefa.

Todas as forças das oposições cada qual à sua maneira, desde Bloco, composto pelo PSOL até a Oposição Alternativa – não trataremos aqui do PCO, pois atuaram como uma ala da burocracia petista - não defenderam que os comandos de greve dirigissem essa luta. Era necessário que o conjunto das oposições defendessem que houvesse uma coordenação dos comandos de greve para colocar a direção da luta nas mãos daqueles que de fato a construíram.

O Professores pela Base, integrado por professores independentes e do MRT, foi a única organização a defender que os comandos de greve dirigissem essa luta, tal como expressamos aqui, e aqui. Que as assembleias deixassem de ser comícios, onde os que falam são sempre os mesmos, e passassem a ser instrumentos a serviço da democracia operária. Mas não encontramos apoio a essas propostas entre a oposição, sendo o único setor que as defendeu no CER (Conselho Estadual de Representantes da APEOESP) com membros dos comandos, e a partir da cadeira que ocupamos na diretoria.

Além disso, ao longo de mais de três meses de greve tampouco se viu um combate contra a burocracia. Os companheiros do PSTU, além de não cederem uma única fala sua no carro de som aos comandos de greve, não promoveram nenhum debate sério sobre como enfrentar a situação de refluxo que tomou a greve já semanas antes de que acabasse. Apesar de denunciar a CNTE por não ter efetivados a unificação das greves em curso que se ocorriam em 11 estados e diversos municípios, se abstiveram de denunciar Bebel e a burocracia que minava nossa greve a todo o momento, a começar por não organizar seriamente um fundo de greve para que os professores não fossem vencidos pelo bolso. Com isso deixam de oferecer uma perspectiva a esse novo ativismo, o que faz com que parte dele se influencie por posições autonomistas, e outras diretamente antissindicais.

A grande conquista da greve: um novo ativismo

Quase como uma comemoração, a capa da Folha de S Paulo do último final de semana vaticinou a derrota da greve. Uma provocação que pretende desmoralizar toda a categoria, preferindo tomar posição favorável aos desmandos e arbitrariedades cometidas pelo governo do estado. Por isso sequer menciona o elemento mais importante dessa greve. Trata-se do surgimento de um novo ativismo de base.

Grande parte desse novo ativismo organizou-se nos comandos de greve. Esses organismos nasceram pela própria necessidade dos professores das diversas regiões de se coordenarem. Muitas vezes, reuniram os setores mais combativos e antiburocráticos dos professores grevistas. Foram esses comandos que incansavelmente saíram a percorrer escolas, mobilizar seus pares, e transformaram a greve em algo real, que Alckmin foi obrigado a reconhecer. Se essa greve teve o mérito de romper o isolamento da mídia, colocar dezenas de milhares nas ruas nos diversos atos, cortes de rodovia, e trazer para o debate nacional o caos da Educação paulista isso se deve a esses professores.

Muitos desses educadores são recém-integrados pelo último concurso, ainda em estágio probatório. Mas também havia professores precários, os “categoria O”, alguns da “velha guarda”, e até mesmo eventuais. Corajosamente se lançaram a construir essa luta, enfrentando assédio das próprias direções e diretorias de ensino, debatendo a necessidade de unir a base dos professores para reverter a precarização imperante. Muitos tinham a clareza, adquirida na experiência da greve de 2013, de que a direção majoritária da APEOESP atuaria como um freio.

Mas assim mesmo, percorreram as escolas chamando os professores a lutar pelos seus direitos. E iniciaram um processo de debate sobre que tipo de organização e sindicato deve haver, o que aterroriza a burocracia sindical da Apeoesp. Frente ao corte de ponto, e a inexistência de qualquer fundo de greve previamente organizado pelo sindicato em várias regiões, realizaram atividades de solidariedade.

Esses professores representam o novo, frente à obsoleta e burocrática prática imperante na Apeoesp. Um potencial que já se fez sentir nessa greve, e que não deve acabar com ela. Como dissemos aqui são mestres obstinados. Obstinados em lutar por uma Educação pública, gratuita, e de qualidade, para todos. Graças a esse novo ativismo, os professores podem retornar às escolas, de cabeça erguida. Mas é preciso que se dote de uma perspectiva sobre como seguir a luta.

Que fazer agora?

É fundamental que os professores sigam mobilizados. Nenhuma reivindicação foi conquistada. E se utilizando da correlação de forças, Alckmin aproveita para contra-atacar. Anunciou a reforma do currículo para 2016, que deixará vários professores sem trabalho. Autorizou os conselhos das escolas, isto é, as direções, a definirem em cada lugar como será a reposição, enfraquecendo a unidade dos grevistas.

A direção da APEOESP, por sua vez, está tentando transformar a ausência de um acordo de fim de greve, e a autorização de que os conselhos de escola definam a reposição como “vitória”. Quer esconder sua responsabilidade frente ao desfecho da greve.

A responsabilidade em garantir a organização dos professores nesse pós-greve deve ser tomada primeiramente pela oposição. Por isso, há que realizar uma plenária da Oposição Alternativa aberta a todo esse novo ativismo, para discutir um balanço e oferecer uma perspectiva que arme os professores a seguir em luta contra o governo. Os professores do MRT que integram o Professores pela Base já encaminharam às demais organizações que compõem a Oposição Alternativa essa proposta. A partir disso, munidos de um plano de mobilização há que lutar para que se imponha à direção majoritária da APEOESP e à CUT.

Esses 92 dias não foram em vão. Não é possível sobreviver na escola pública se não for lutando de cabeça erguida por outra educação, por outro futuro. Ainda que algumas vezes de forma pouco consciente, em meio a esse novo ativismo se fez sentir a necessidade de retomar o sindicato das mãos da burocracia. Para dar conta dessa luta fundamental, é necessário uma mudança radical na prática política da própria esquerda na APEOESP, à luz do balanço de sua atuação nessa greve. É preciso arrancar esse sindicato dessa burocracia encastelada e devolve-los para as salas de aula, para os que sujam as mãos de giz. Só assim toda essa grande estrutura vai poder estar a serviço de grandes batalhas vitoriosas pela educação pública e por nossos direitos. Chamamos as professoras e professores a lutarem conosco por essa tarefa.

Foto: A. BARBOSA (FOLHAPRESS)

 
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