O ataque na igreja de Charleston é um quadro tenebroso da vigência do racismo nos Estados Unidos. A impunidade institucional estimula o ódio racista, a despeito dos discursos.
Quarta-feira, 17, à noite, um jovem branco entrou numa histórica igreja do centro da cidade Charleston, na Carolina do Sul, no momento de uma reunião de estudo da Bíblia. A igreja Emanuel é popular entre a comunidade negra da cidade, e seu pastor Clementa Pinckney (também senador estadual), está entre os mortos. O resultado dos disparos deste jovem foi a morte de seis mulheres e dois homens.
O prefeito de Charleston, Joseph P. Riley, disse que o “único motivo para alguém entrar numa igreja e disparar em pessoas que rezam é ódio”. Todas as autoridades e a imprensa concordam que se trata de um crime de ódio.
A cidade amanheceu, na quinta-feira, 18, numa verdadeira caça humana para prender o suspeito, que finalmente foi detido numa barreira rodoviária a 300 quilômetros da cidade. A força policial estadual e o FBI mobilizaram todos os recursos numa grande operação, prometendo inspecionar todos os lugares em busca do assassino.
A Igreja Africana Metodista Episcopal Emanuel é tradicional na comunidade afro-americana da cidade, e também um símbolo da luta e resistência dos escravos nos Estados Unidos. A escolha do assassino teve profundas conotações racistas.
Os principais candidatos [às prévias para presidente] aproveitaram a oportunidade para aparecer. A candidata democrata Hillary Clinton fez declaração pelos mortos de Charleston; o pré-candidato republicano Jeb Bush também. Acontece que esta é uma grande oportunidade para políticos e autoridades, os mesmos que sempre silenciaram perante a impunidade da maioria dos policiais acusados pela brutalidade policial racista.
Qual seria a atitude de Bush e Clinton se tratasse de um novo Michael Brown? Mobilizaria o FBI para perseguir os assassinos de Eric Garner? Estes políticos teriam apoiado a rebelião de Baltimore que, com sua mobilização, conseguiu que se julgassem os responsáveis da morte de Freddie Gray? A resposta é simples: não.
O crime de Charleston se insere no cenário aberto pelo assassinato de Michael Brown em agosto de 2014 na cidade de Ferguson. A morte de Brown desencadeou protestos massivos por várias noites, o governador decretou o estado de emergência e a Guarda Nacional interveio com tanques e armamento militar.
Desde então, o movimento Black Lives Matter (as vidas dos negros importam) tem organizado protestos em todo o país exigindo justiça pelos assassinatos de jovens afro-americanos pela polícia. Desmascaram a existência do racismo numa sociedade profundamente dividida e desigual, na qual a comunidade afro-americana representa a maior porcentagem dos que ganham salário mínimo, vivem na pobreza e estão nas prisões.
O movimento de protesto contra o racismo e a evidente desigualdade batem de frente com a ilusão de uma sociedade pós-racial estimulada por ter o primeiro presidente negro. O governo de Barack Obama tem pretendido acalmar os ânimos, mas seus gestos têm sido insuficientes diante do incontestável racismo institucional do Estado.
Tradução Val Lisboa
|