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UNICAMP
Onde está a crise orçamentária da Unicamp?
Flávia Telles

Nesta segunda-feira, o atual reitor da Unicamp, José Tadeu Jorge, estampou a capa do jornal campineiro “Correio Popular” com uma entrevista que tinha como centro a crise financeira pela qual passa a Unicamp.

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Na entrevista, o reitor disse que a crise por que passa a Unicamp tem como responsável a queda no orçamento do ano de 2016, e se orgulha da reserva que fez em seu mandato, de mais de 700 milhões de reais. É certo que realmente houve uma queda no financiamento da universidade, já que este ocorre por meio do ICMS - Imposto sobre circulação de mercadorias e serviços, o que significa que é um financiamento que depende do consumo dos trabalhadores, que teve uma queda significativa no ano de 2016 devido à crise econômica, com alta da inflação e demissões.

Mas também é certo que os mais de 101, 4% da receita da universidade que foi gasta com “pagamentos de salários” poderia ser redistribuída de outra formas, e aqui não fazemos coro com as grandes mídias, que defendem a privatização da universidade, a diminuição nos salários dos trabalhadores, a terceirização, etc. Mas denunciamos o abismo entre os salários de quem faz o serviço essencial da limpeza e o da docência ou administração da universidade, enquanto uns recebem em torno de um salário mínimo, outros além de desfrutar de condições “magníficas”, ainda contam com dupla matrícula e podem receber supersalários, chegando a mais de 60 mil reais mensais.

O mais estranho é que durante a greve histórica de estudantes, professores e trabalhadores por que passou a Unicamp no ano passado, a reitoria respondia às demandas dos estudantes com o discurso da crise, de que não teria dinheiro para arcar com os custos do que exigia os três setores. Mas diferente do que disse Tadeu na entrevista, as nossas demandas não foram criadas depois da ocupação da reitoria, mas existem e são fruto da nossa mobilização há anos.

Nos posicionamos com muita força contra o golpe institucional que estava em curso naquele momento, porque sabemos que o golpe da direita reacionária não é contra um governo, mas contra os direitos dos trabalhadores e da juventude, é um golpe também contra a educação pública, como podemos ver com a reforma do ensino médio e no Rio de Janeiro com o fechamento da UERJ.

Mas junto ao nosso posicionamento contundente contra o golpe, lutamos pela implementação imediata (já que em comparação a todo o país a Unicamp está atrasada nesse debate) das cotas étnico-raciais, a ampliação da moradia que não atende a demanda desde sua criação, das bolsas permanência, pelo fim da terceirização, para que todas os trabalhadores terceirizados pudessem ser reconhecidos como trabalhadores da universidade e fossem efetivados, pela finalização da obra do Teatro do IA e contra os cortes de mais de 40 milhões, sendo 10 milhões no Hospital Universitário.

Mas a única dessas demandas que foi citada pelo reitor na entrevista, foi a construção do Teatro do IA e dos chamados elefantes brancos que moram na universidade, Tadeu chegou a dizer que esse problema “é meio clássico na Unicamp, tem algumas obras que ficam patinando por diversos problemas, mas as obras não estão paradas porque não tem recursos”, o que por si só já é um absurdo, já que “obras patinando” significam dinheiro público pago com o trabalho da população sendo jogado fora, e é um argumento bastante diferente do usado durante a greve.

O que realmente ocorre em relação aos prédios da Unicamp, é que os cursos “não lucrativos”, ou seja, que não servem às empresas privadas, como das ciências humanas e das artes estão caindo aos pedaços, com diversos problemas na fiação e na estrutura dos prédios. No IFCH não podemos nem ligar o ar condicionado, porque corre risco da fiação pegar fogo, e quando chove corremos o risco de perder livros e computadores. Além disso, faltam funcionários e professores para atender às necessidades, o quadro está longe de ser reposto nesses cursos.

Mas não só os três setores da universidade sentem a crise chegando no seu cotidiano, mas toda a população de Campinas, do corte de mais de 40 milhões do ano passado, 10 milhões atingiam o hospital, principal serviço de saúde pública de Campinas e região, e significou falta de leitos, e de diversos materiais hospitalares essenciais para o atendimento. A empresa terceirizada da limpeza foi trocada em 2015 por um contrato mais barato, que na prática significou demissões e mais trabalho pelo mesmo salário. Mas o corte de gastos não chegou ao gabinete do reitor e da burocracia universitária, que continuam desfrutando de ótimos salários e condições.

Sobre a greve, o reitor também usou o argumento da autonomia universitária para justificar o porque não colocou a polícia no campus, ignorando o fato de que a reitoria nos ameaçou diversas vezes com a polícia no decorrer da nossa mobilização, com o corte de ponto dos trabalhadores e que agora pune os estudantes que lutaram, além do fato de que a greve teve uma aderência histórica, com cursos como a medicina se incorporando, e que colocar a polícia no campus significaria um ônus político enorme para o reitor que sempre se afirmou como o “reitor do diálogo”.

O discurso de Tadeu se molda conforme o momento por que passa a universidade, de debate sobre as eleições para reitor, quer mostrar que foi um bom gestor da universidade nesses dois mandatos e fazer o caminho para uma sucessora, a reitorável Rachel Meneguello. Mas o que ocorreu durante todos esses anos é que a universidade foi gerida não para atender às necessidades da população que paga por ela, mas para as grandes empresas que se utilizam do conhecimento produzido na universidade para lucrar ainda mais, não foi gerida para reconhecer o trabalho das centenas de mulheres negras que mantém a limpeza e o serviço dos restaurantes universitários, não foi gerida para ampliar o acesso e permanência da juventude negra e pobre ao ensino superior, pelo contrário, querem manter a universidade pública como ela é hoje, para poucos.

2017 é um ano de grandes desafios. Teremos as eleições para reitor logo no início, e não podemos cair no discurso do “menos pior”, a reitoria veio mostrando todos esses anos que está do lado dos que não querem a transformação da universidade, quer mantê-la como é hoje, elitista e racista, e isso nós mostramos no ano passado que não aceitaremos. Um grande exemplo é a votação que também ocorrerá esse ano sobre a implementação das cotas étnico-raciais, fruto da nossa mobilização e que instalou na universidade um grande debate sobre a necessidade das cotas para avançar no acesso da juventude negra ao ensino superior no Brasil, debate esse que está totalmente atrasado e que só ocorreu com as audiências públicas, com a presença de Tadeu em todas, mas sem nenhuma posição sua sobre o assunto.

A Universidade que defendemos é pública, gratuita e de qualidade para todos, que reconheça o trabalho que mantém a universidade funcionando todos os dias, que sirva aos interesses dos trabalhadores, que produza cultura e um serviço de saúde para toda a população. Se são os estudantes, os professores e os trabalhadores que mantém todo o funcionamento da universidade, porque não podemos gerí-la conforme o que defendemos? Porque temos que ter um reitor, que ganha altos salários, e está totalmente desligado do dia-a-dia da universidade sustentando uma educação superior para poucos?

 
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