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DIA DA CONSCIÊNCIA NEGRA
A nós, negros, nada, além de quadro escuro e uma resistencia perene
José Ferreira Júnior
Serra Talhada – Pernambuco
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A contemporaneidade brasileira mostra a existência das chamadas ações afirmativas. Ou seja, políticas focais que buscam beneficiar pessoas pertencentes a grupos discriminados e ou vitimados pela exclusão sócio-econômica no passado ou no presente. Tais ações se objetivam em medidas que se destinam a combater discriminações étnicas, raciais, religiosas, de gênero, entre outras. Além do limitado combate citado, também se traduziriam, ao menos em teoria, no aumento da participação, em certa forma controlada, das chamadas “minorias” nos espaços da política, da saúde, da educação, do emprego e, principalmente, da cultura.

No referente à população negra brasileira, esse tipo de ação se objetiva em pelo menos duas vertentes: O sistema de cotas para ingresso no Ensino Superior e a concessão de propriedade de terras à comunidades de ascendência quilombola.

Todavia, estamos falando do tempo presente. Inevitável que se pergunte o porquê de tais agires estatais. Assim fazendo, torna-se inevitável recorrer ao passado e, nesse espaço temporal, verificar que foi feito em relação ao negro e porque foi feito. Assim fazendo, acreditamos que fica clara a razão da existência de ações governamentais afirmativas, no Brasil. Mesmo que se possam apoiar pontualmente, deve-se compreender, também, que o objetivo durante os governos petistas foi manter separada a luta de classes da luta contra o racismo.

Brasil Colonial: o negro africano como força motriz do projeto mercantilista

Após trinta anos (1500 – 1530) terceirizando a exploração predatória de pau-brasil no litoral de sua colônia, enquanto se dedicava ao comércio de especiarias orientais, a Coroa portuguesa percebe ser imprescindível ocupar efetivamente o Brasil e isso, por pelo menos dois motivos: a concorrência do comércio de especiarias e a iminência de perder a colônia para invasores, principalmente franceses, que não respeitavam o Tratado de Tordesilhas, estabelecido, em 1494, entre Portugal e Espanha e que arbitrava sobre a divisão do Novo Mundo, hoje chamado América.

Colonizar tornou-se o verbo!

Todavia a necessidade de colonizar esbarrava na realidade vivenciada por Portugal: inexistência de condições financeira para arcar com a colonização. Tal empecilho foi removido com a “terceirização” da colonização, quando a Coroa lusa faz doações de lotes de terra (capitanias) a pessoas específicas (donatários), sendo a transação regida por dois documentos: a carta de doação (onde era oficializada a concessão de uso da capitania) e o foral (onde se definia direitos e deveres das partes participante: Coroa e Donatário).

Somado à “terceirização” do processo colonizador, também houve a inserção de capital holandês para a implantação da empresa açucareira, que era a intenção lusa inserir em terras brasileiras, isto ocorrendo por algumas razões:

1. O interesse imediato luso aqui, que era metalista, fora frustrado;
2. O açúcar era uma especiaria rara e cara, na Europa e, dessa forma, produzi-lo era sinônimo de mercado consumidor garantido;
3. Havia o capital holandês para financiar;
4. As condições climática e pedológica eram ideais ao implante da empresa açucareira;
5. O manejo com a cana e o fabrico do açúcar já eram práticas conhecidas dos lusos, nas Ilhas do Açores e da Madeira, onde tinham colônias;

Todavia, mesmo com a solução se mostrando aos empecilhos e contando com condições materiais favoráveis (condição imprescindível à feitura da história humana, segundo Marx, eis que Portugal se defronta com mais um problema; quem atuaria como mão-de-obra no latifúndio canavieiro?

Algumas soluções foram cogitadas pela Coroa:

1. O trabalho livre, mas se descartou, porque, além de gerar esvaziamento populacional em Portugal, não havia garantia que, sendo livre, haveria, por parte dessa mão-de-obra, o adequar-se à lógica mercantilista, que afirmava ser a produção diretamente proporcional ao lucro, ademais, esse tipo de mão-de-obra encareceria a produção e, consequentemente, diminuiria o lucro;

2. A escravidão nativa (índios), que seria a solução mais óbvia, porém descartada, em razão de a burguesia metropolitana discordar, uma vez que a venda de índios para a escravidão promoveria acúmulo de capital para a burguesia colonial. Tratava-se daquilo que Trotsky chamou de desenvolvimento desigual e combinado, ou seja, à colônia cabia o experimento de um crescimento econômico, mas que atendesse a uma finalidade previamente determinada e não o experimento de desenvolvimento. A burguesia metropolitana não queria a concorrência colonial, no processo de acúmulo de capital. Justaposta à discordância burguesa havia a da Igreja, que entendia ser necessário endereçar a catequese cristã aos nativos, buscando garantir um espaço de dominação em relação ao cristianismo protestante, ou seja, trata-se de se fincar o bastião cristão católico nas terras brasileiras.

Diante das propostas e de suas negativas por parte da burguesia metropolitana e da Igreja – esses atores sociais tinham força diante do monarca português, uma vez que este ascendeu ao trono, instalando a Dinastia de Avis, mediante uma revolução idealizada e efetivada sob o comando da burguesia progressista e do clero, a Revolução de Avis (1383 – 1385) – surge a opção pela mão-de-obra escrava negra africana.

Para a efetivação desse plano, dois elementos foram determinantes: a conjuntura africana (ocorrência de conflitos tribais, onde os perdedores eram escravizados pelos ganhadores) e a justificativa do ato pela Igreja, que atribuía ao ser negro africano a condição de amaldiçoado e, por conta disso, carente de remissão, que deveria ocorres nos trópicos americanos, sob a égide do tacão escravista.

Assim, trocando a gente negra africana por cachaça, fumo e tecidos, a burguesia metropolitana inicia comércio de escravos para a América, principalmente para o Brasil. Comércio tão lucrativo que, mesmo ocorrendo perda de parte considerável da “carga humana”, transportada nos chamados navios negreiros, o lucro era exorbitante para aos traficantes de negros, visto que a adquirição dessa “mercadoria”, na África, era “praticamente gratuita!”; visto que a adquirição de negros se efetivava por trocas por tecidos, fumo e cachaça.

Desse modo, inicia-se um processo de imposição branca em relação aos negros, no Brasil. A busca pelo acúmulo de capital, naquilo a que Marx chamou de acumulação primitiva de capital (mercantilismo), ao negro é imposta, pelo branco colonizador, com a anuência da Igreja (basta dar uma olhada em determinados sermões do padre Vieira), tortura diária, que durará cerca de três séculos e meio.

Abolição e a inexistência de inclusão social para o negro

Mesmo anacrônica, a escravidão no Brasil demorou a acabar. Termina oficialmente em 1888, com a assinatura da Lei Áurea. Atrasada se mostra, quando comparada, por exemplo, com a Argentina, onde foi ditada a liberdade de ventres, a partir de 1813.

Todavia, toda uma engrenagem é montada para obstaculizar ao negro, ex-escravo, inclusão social e, desse modo, experimentar viver social, que possa ser considerado “digno”. Antes da decretação da abolição, trinta e oito anos antes, em 1850, foi aprovada a Lei de Terras, permitindo a comercialização da terra. Até então, era permitida, por parte da Coroa brasileira, meramente uma concessão de uso, onde quem detinha sua posse podia explorá-la, mas era impedido de comprar ou vender terra.

Com a Lei de Terras, dois acontecimentos vieram a acontecer:

1. O acesso à terra de quem já a explorava e ou de quem dispunha e capital para adquiri-la, promovendo a existência da concentração de terras nas mãos de poucos, consolidando, de maneira embrionária, a Questão Agrária brasileira (hoje geradora de conflitos e mortes no campo);

2. A adquirição, nos espaços urbanos, dos melhores lotes, por parte da burguesia, com isso canalizando a população negra, ex-escrava, para os morros, gerando a favelização desse seguimento da população brasileira;

Percebe-se, dessa maneira, que a Lei de Terras se torna a mãe do latifundismo e da favelização brasileiros. Agora não mais escravizados, mas excluídos socialmente, o negro brasileiro passa a vivenciar outra agrura: a continuidade do racismo e, com ele, o preconceito.

O Movimento Negro e necessidade de um programa

Mediante lutas e enfrentamentos, o Movimento Negro, mesmo não existindo concordância interna em relação a determinadas conquistas (Sistema de cotas, por exemplo), tem obtido conquistas: O direito de adquirição de terras, onde foi instalado quilombo, por parte dos descendentes quilombolas e, a criminalização do racismo, como prática inafiançável (mesmo que não se saiba de alguém que tenha sido condenado e preso pela prática do racismo... Os advogados conseguem desqualificar o crime de racismo para o de injúria e difamação... Paga-se fiança... Fica-se livre e volta-se à prática do racismo e ou do preconceito).

Quando já se passam 128 anos de abolição e não se percebe respeito ao negro, no Brasil, o dia de hoje, 20/11, deve ser lembrado de maneira acintosa, deve estar, mais que nunca, presente na memória de nós, negros, o que somos política ideológica e culturalmente falando!

No Brasil, hoje, temos no país uma classe trabalhadora que é na sua maioria negra. Por isso é central construir um programa político que, diferenciado do realizado pelo PT nos últimos anos, não separe a luta de classes do combate ao racismo, não separe, de forma alguma, a luta contra a exploração da luta contra as opressões como defendemos, enquanto Esquerda Diário.

Com esta política, sim, poderemos gritar alto e em bom som:

Vivas à resistência!
Vivas à consciência de ser negro, identificar-se como negro e gostar-se como negro!

 
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