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REPRESSÃO | "Vadia, se vomitar no chão vai ter que limpar": relato de uma secunda presa em ato em SP

"Vadia, se vomitar no chão vai ter que limpar. Quietinhos, se sujar a farda vai ter que limpar com a língua." Foi assim que o policial se dirigiu a alguns dos secundaristas presos no ato do dia do estudante em São Paulo logo após a detenção aburda. Trazemos um relato de Inae Lima, secunda que foi detida por lutar em defesa da educação, expondo a extrema violência da polícia militar e os abusos do Estado.

sexta-feira 12 de agosto de 2016 | Edição do dia

O Ato do Dia Nacional do Estudante que ocorreu ontem, dia 11, foi marcado por forte repressão por parte da PM. Contou com cerca de 200 estudantes, secundaristas e universitários, que tomaram as ruas contra os cortes na educação, o projeto Escola sem Partido, o roubo de merendas e a reorganização que vem sendo feita por debaixo dos panos.

Logo em sua concentração, na praça Roosevelt, enquanto os estudantes cantavam palavras de ordem, três secundaristas foram detidos pela PM que alegou "desacato a autoridade". Mas só o que pôde-se observar na ação foram prisões arbitrárias, com clara intenção de acuar os estudantes e impedir a saída do ato.

Não foi o que aconteceu. Frente a esse ataque, os estudantes subiram a Consolação em direção à DP para onde os três secundaristas foram levados, fechando a rua e fazendo pressão para que os soltassem. Depois da notícia de que foram soltos, o ato ainda seguiu até o Anhangabaú e depois subiu a Consolação rumo a Avenida Paulista.

Na altura do cemitério da Consolação, mais repressão da PM. Os estudantes foram cercados pelos policiais, que jogaram bombas de gás lacrimogêneo. Ainda assim, mantiveram-se resistentes e tentaram continuar o ato até a Paulista, porém a perseguição policial fez com que fosse dispersado.
Dez estudantes foram detidos, sendo oito levados para a 78 DP e duas encaminhadas para a Fundação Casa por estarem sem documentos. Todos foram soltos. A maior parte dos detidos, por já terem participado de ocupações de escolas e diretorias de ensino, vêm sofrendo perseguições por parte de suas escolas e da polícia que sem nem mesmo perguntar já os identificava.

Abaixo o depoimento de Inae Lima, secundarista presa no ato, sobre o ocorrido:

"17h - Repressão em frente ao Cemitério da Consolação. Em meio as bombas gritos ecoavam, tanto de resistência quanto de desespero. "Junta o ato" "Resistência!!" "Agrupa"

18h - Cercados na Paulista. Fui pega pela alça da bolsa e depois pelo braço direito, que inclusive estava roxo e agora dolorido. Vejo meu companheiro de luta no chão, com um policial maior que ele lhe dando um mata leão. Colocados na parede, de mãos pra trás, ordens grossas, repressão do Estado. Perguntei por que estava sendo enquadrada, sem respostas. Fui revistada por uma policial feminina (pelo menos isso), onde fui ridiculamente revistada em meio a todos na Paulista.

18h30 - Encaminhados a base comunitária com mais dois companheiros. Mão pra trás, cabeça baixa e em fila indiana. Dentro da base já tinha 3 pessoas. A policial diz que ali cabia todos, coração de mãe era assim. E que mãe, hein? Parecia mais sala de aula de escola pública. Sentei no chão. E não pode falar! Arrombada, sem comentários ou conversa. Não pode ler um livro aqui. Por que não? Por que aqui não é lugar. Calem a boca!!! Vadia, se vomitar no chão vai ter que limpar. Quietinhos, se sujar a farda vai ter que limpar com a língua.

19h - No 4° DP, próximo a Roosevelt. Colocados em frente a uma parede que tinha cheiro de aquário. Fora os que estavam comigo haviam mais quatro. Rostos conhecidos, muitos conhecidos mesmo. Inclusive desde o ano passado. Mais um chá de cadeira.

20h - Encaminhados ao 78° DP. Em um ônibus da PM. Em meio a conversas entre os 10 detidos os policiais fazem comentários. Viu? Nem sabem política. Estavam na rua e nem sabem o por que. Não, nem adianta explicar, não perca seu tempo.

20h10 - Chá de cadeira, mas agora em um DP diferente. Delegado grosso esse. Somos terroristas aos seus olhos. Xingados e diminuídos. Ameaçados diversas vezes de irmos pra prisão ou pra fundação ao passo de qualquer desobediência.

22h - Ainda no 78° DP. Estava sem documentos autenticados, apenas as carteirinhas da escola. Precisava ir a Fundação CASA com mais uma companheira fazer o negócio dos dedinhos pra poderem saber que eu sou eu. Mãos pra trás, cabeça baixa, fila indiana. Três soldados e um general me acompanham dentro da viatura, enquanto a companheira vai na parte de trás (imagens do vídeo)

22h30 - Fundação CASA. Ali parecem ainda mais que você é rejeitado por tudo e todos. Te tratam como se você não fosse nada. Se te esbarram nem um "perdão" você merece. Os soldados puxam assunto. Enquanto o general escuta. Falo de política, ainda duvidam de minha capacidade de entender o mundo. Os soldados me ouviram, por conta de alguns conhecimentos acadêmicos já não era assim tão marginalizada. Porém entre eles sempre há o superior. O general me diminuía a cada fala, eram provocações. Vocês querem uma sociedade indecente, afinal todos os países de primeiro mundo que se preze tem seus valores e conceitos e vocês querem acabar com isso. Por isso o Brasil não muda. Concordei. Por isso o Brasil não muda...

23h50 - De volta a ao 78°DP. Mas a postura de todos mudam. Quando chego minha tia já estava lá, assim como a maioria dos pais e alguns advogados. Com certeza a postura mudará. Depois disso apenas mais chá de cadeira e muita resistência. Tanto dentro quanto fora do DP.

2h - Finalmente soltos. Finalmente saindo dali. Finalmente aos braços de quem, lá fora, gritava não tem arrego.

Afinal, é isso que gritamos tanto:
NÃO TEM ARREGO!!!"

A resistência dos secundaristas mostra que a violência do Estado contra os que lutam pela educação não vai calar a juventude. A luta segue por uma educação pública de qualidade e contra o roubo de merenda, o projeto "Escola sem partido" e as punições aos que lutam!




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