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LUTAS NA BAHIA | Uma reflexão sobre as lutas estudantis na Bahia

Hoje, o estado da Bahia faz parte do cenário atual de mobilização nacional com quatro das suas universidades estaduais, UESC, UESB, UEFS, UNEB, assim como a UFBA, em greve. As estaduais estão com mobilização estudantil auto-organizada a partir comandos de greve, em razão de seus diretórios acadêmicos estarem tomados por correntes governistas, as quais interessam apenas a manutenção das estruturas e não uma mudança radical de fato. Essa disposição estudantil, que se coloca junto aos funcionários e professores, tem como um dos motes principais de sua greve a permanência estudantil, em função de serem universidades localizadas no interior da Bahia, que possuem uma infraestrutura muito precária e serem compostas de muitos jovens da região- Jovens que vem de uma realidade bem diferente daquela do estudante para qual a universidade é pensada.

sexta-feira 12 de junho de 2015 | 00:30

O atual modelo de universidade na Bahia não foi pensado para um estudante trabalhador, nem para uma mãe e nem para o pobre que não possa manter-se na universidade. Essa é a realidade dos discentes baianos, que muitas vezes não conseguem manter-se estudando pela falta de estrutura, devido ao verdadeiro caráter desse projeto elitista. Por exemplo, a bolsa-moradia oferecida pela UESC, de 230 reais, não consegue sustentar um aluguel em nenhum lugar, nem mesmo no interior. A situação das universidades está calamitosa, inclusive na federal do estado, falta água, falta luz, falta manutenção, tudo como um reflexo da situação geral da maioria das universidades brasileiras, onde se percebe uma impotência de formar e servir interesses da população.

Outra prova da impotência desse modelo posto é o destino que tem a produção científica da universidade, que não atende às demandas da população. A tecnologia produzida não é utilizada na melhoria da condição de vida da população, como ficou evidente nos deslizamentos com as chuvas em abril deste ano, que deixaram muitos desabrigados e custaram 15 vidas.

Reitoria da UFBA: Defesa da universidade pública ou manutenção da ordem elitista?

O ato chamado em meados de maio pelo reitor da UFBA só aprofundou o contraste sobre o que passa a universidade pública atualmente e foi marcado por suas incoerências. Inicialmente, a mesa já era absurda, composta apenas por um misto de deputados, vereadores, reitores, docentes universitários, dirigentes sindicais, membros do diretório central de estudantes (governista) e por uma senadora. Nomes como Lídice da Mata (Senadora pelo PSB), Alice Portugal (Deputada federal pelo PCdoB), Jorge Solla (Deputado federal pelo PT), Aladilce Souza (Vereadora pelo PCdoB), Hilton Coelho (Vereador pelo PSOL), entre muitos outros, marcaram presença deixando bem claro o caráter do ato: a “defesa da universidade pública”- do jeito que ela é: racista, patriarcal e elitista. Dessa forma, cabem os questionamentos: Universidade Pública? Para quem? A quem serve essa universidade que tanto defendem?

Ao decorrer do ato víamos, cada vez mais, seu caráter hipócrita. Primeiro, que antes do início do ato, entrou em cena o coral da Bahia entoando o hino nacional em uníssono com a plateia, mostrando que aquele local saudava a pátria que não irá levar a pauta dos trabalhadores à frente, pois, na realidade, tem a intenção de manter a ordem existente. Ao longo das falas, a hipocrisia em defender a educação pública se deu. A existência de falas abstratas, como se fosse uma só a luta dos estudantes e reitores, somente pela educação, e que os reitores “gostariam de conceder as políticas exigidas, mas a falta de orçamento os impede”.

Essa lógica de discurso e de ação é bem característica da era petista, um discurso conciliador e de manutenção das estruturas e privilégios. Um discurso de se dizer “entendedor das pautas”, e dizer ter “um sentimento de querer ajudar, mas não poder fazê-lo, por uma série de coisas que estariam além deles”. E foi nesse viés que o reitor João Carlos Salles atuou, culpabilizando a falta de verbas para o não pagamento dos salários das trabalhadoras terceirizadas, para a diminuição no número de refeições servidas no restaurante universitário, para a falta de orçamento da creche que não consegue sequer pagar sua conta de telefone e internet e para a precariedade da residência universitária, tudo isso sem qualquer discussão do porquê dessas coisas e o que isso significava. A falsidade do discurso do reitor deu-se no fato de que as trabalhadoras terceirizadas estão sem receber desde fevereiro! Ele se esconde atrás do discurso da falta de orçamento e não toca na questão dos supersalários dos burocratas universitários, pois na verdade não tem intenção de questionar os seus privilégios.

Pelos moldes atuais, a universidade serve ao interesse privado e a ideologia dominante, além disso, permite o acontecimento diário de casos de LGBTfobia, machismo e racismo. A instituição fecha os olhos a esse tipo de comportamento, logo a defesa dessa estrutura é, por tabela, a manutenção de todo esse cenário. O reitor desviou as denúncias contidas nas falas de alguns estudantes, dizendo não ter noção do ambiente hostil que a universidade significa a esses setores, justificando ser o primeiro ato convocado pela reitoria e que esses tinham muito a aprender, mais uma vez jogando o debate para frente e saindo como uma postura de que “tudo irá se resolver”.

Pela transformação radical da universidade: estudantes e trabalhadores à frente!

Obviamente, o corte de mais de 9 bilhões nas verbas para a educação do governo Dilma aprofunda muito mais a crise da universidade, porém o problema dela não se dá apenas pela falta de recursos, existe um problema muito mais profundo e que é estrutural: na verdade refere-se a quem serve. O acontecimento desse ato, bem como a crescente mobilização nas universidades baianas e em todo o país evidencia que a burocracia também está atenta à crise aberta e, com isso, já começa a tentar manobrar e busca moldar os rumos das mobilizações em prol da manutenção de toda a estrutura existente. Por isso, uma lição que devemos tomar é que não podemos nos enganar com estes comportamentos aparentemente progressistas, pois, na verdade, buscam desconstruir os processos de luta e lançam uma falsa noção de que por dentro da estrutura existe uma resolução da crise instaurada.

Devemos nos solidarizar com os setores em luta na Bahia e não deixar que posturas conciliadoras como a do reitor João Carlos Salles tenham qualquer espaço. É importante lembrar, a todo o momento, que os estudantes e trabalhadores devem ser sujeitos políticos, disputando um projeto de universidade que atenda as suas demandas. A universidade deve ser um ambiente em que estes estejam e organizem. Os trabalhadores e estudantes devem disputar o conhecimento e produção da universidade em seu favor e da população pobre, pois são os únicos capazes de construir outro projeto de educação, humano, como já foi mostrado na história. É possível sim, que eles consigam promover os diversos debates, que eles levem as atividades culturais, que ocupem os espaços que a eles pertencem. Para isso, disputar as entidades estudantis, como os DCEs e os Centros Acadêmicos, é tarefa fundamental para fortalecer a luta. É necessário, através da organização de base, disputar para que tenhamos espaço dentro dessas estruturas e possamos combatê-las, para que consigamos ecoar nossa voz e mostrar que os estudantes e trabalhadores podem refundar a universidade, geri-la e, somente assim, torna-la um local de fato democrático e a serviço da população.




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