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GOVERNO GREGO | Syriza à beira de votar o não pagamento da dívida por moção da sua ala esquerda

Em uma votação acirrada de 75 votos a favor e 95 contra e uma abstenção, o Comitê Central do Syriza reunido, não aprovou a proposta da Plataforma de Esquerda de que Alexis Tsipras rompa com a Troika e declare o não pagamento da dívida.

Diego LotitoMadri | @diegolotito

quarta-feira 27 de maio de 2015 | 10:41

A moção, apresentada pela "Plataforma de Esquerda" na última reunião do Comitê Central de Syriza, propõe a ruptura com os credores, começando pelo não pagamento da dívida, assim como a "nacionalização imediata dos bancos" e a "eliminação de toda rede protetora da oligarquia corrupta do país", entre outras medidas.

A proposta foi desaprovada com 95 votos contra, e 75 votos a favor, e mais uma abstenção. Composto por 201 membros, 30 integrantes do Comitê Central do Syriza não votaram, pois já haviam deixado Atenas para voltar a seus lugares de origem.

Na manhã do domingo, o líder da Plataforma de Esquerda, Panayiotis Lafanzanis, havia declarado que "não seria uma catástrofe se a Grécia abandonasse a zona do euro e não seria um ato terrorista não pagar a próxima cota do FMI".

Em um texto publicado em sua conta no Facebook, o líder da DEA (um setor da Plataforma de Esquerda) e membro do Comitê Central de Syriza, Stathis Kouvelakis, informa que no texto adotado pela maioria do Comitê Central se estabelecem quatro condições para um "compromisso aceitável": superávit primário orçamentário reduzido, nenhum corte a mais de salários e pensões, reestruturação da dívida e um pacote de investimento público, particularmente em infraestrutura e novas tecnologias.

A estes quatro pontos, informa Kouvelakis, o texto agrega "o restabelecimento indispensável dos convênios coletivos e o aumento gradual do salário mínimo a 751 euros [o nível de 2009]" e estipula que "qualquer mudança de política tributária deveria promover a justiça social reduzindo a carga dos economicamente desfavorecidos e obrigando aos acomodados e aos evasores fiscais a pagar"

Apesar de a moção pela ruptura com a Troika não ter sido aprovada, a esquerda de Syriza mostra um importante avanço na sua influencia dentro do Comitê Central. Na reunião do CC realizada a princípios de março, a Plataforma de Esquerda propôs uma emenda que repudiava ao acordo com o Eurogrupo e a "lista de reformas" apresentada aos credores pelo governo de Tsipras, ao mesmo tempo em que defendia a implementação do governo eleitoral de Syriza. Nesta votação, a emenda obteve 68 votos a favor, frente a 92 contra e 6 abstenções.

Já neste momento Kouvelakis sustentava que a Plataforma de Esquerda havia "ampliado significativamente sua influencia, incorporando em uma votação estratégica aos maoistas de KOE e o grupo ao redor do (agora ex) chefe do departamento econômico do partido John Milios". Uma influencia que hoje se confirma e se amplia com a obtenção de 75 votos positivos na última reunião do Comitê Central.

A Plataforma de Esquerda, seus setores e sua política

A Plataforma de Esquerda, que obteve o 30% dos delegados no último congresso de Syriza em 2013, está integrada em sua maioria pela Corrente de Esquerda (proveniente de uma ruptura do partido comunista grego - KKE - em 1991, que formou o "ala esquerda" de Sinaspismos hoje majoritariamente em Syriza) e pelo grupo DEA.

Os principais referentes da Plataforma de Esquerda são o economista Costa Lapavitzas e o matemático Pangiotis Lafazanis, principal porta voz da Corrente de Esquerda. Lafazanis é atualmente ministro de reconstrução produtiva, meio ambiente e energia no governo. A plataforma conta com outros membros no gabinete, como o vice ministro de Segurança Social, Dimitris Stratoulis; e o vice ministro de assuntos europeus, Nikos Hountis, além de vários deputados.

O grupo encabeçado por Stathis Kouvelakis, DEA, é um grupo menor que se reivindica da tradição do marxismo revolucionário, relacionado internacionalmente com a corrente mandelista do Secretariado Unificado e com a ISO (Organização Socialista Internacional) dos Estados Unidos. Recentemente se fusionou com o grupo KOKKOINO. Não tem ministros no governo e conta com 2 deputados no parlamento.

O setor majoritário do Plataforma de Esquerda, com Lafazanos e Lapavistas a frente, está integrado em ministérios e cargos de importância. À estratégia mais socialdemocrata e "europeísta" de Tsipras lhe opõe uma política de reconstrução de um "capitalismo social" e nacional.

Lapavitsas, por exemplo, se inclina mais claramente por uma orientação de saída imediata do euro, a um soberanismo de esquerda. O economista propõe uma saída de desvalorização (que provocaria uma queda imediata do salário real) no intento de recuperar uma "economia nacional" com medidas sociais progressistas. Há alguns anos durante uma palestra na Argentina disse que os gregos deveriam "aprender da América Latina", em referência a saída Kirchnerista pós 2001.

Os setores à esquerda como Kouvelakis e DEA sustentam por outro lado que sua participação dentro de Syriza esteja orientada a iniciar um processo de transformações sociais, com uma perspectiva anticapitalista como saída a longo prazo, propondo uma orientação que combina a participação nas instituições do Estado com a construção de "poder popular" desde os movimentos sociais.

Sua política é tratar de pressionar ao governo para tomar medidas mais radicais, ao mesmo tempo que "os movimentos sociais" exercem "um controle" sobre o governo. Neste marco, seu maior limite é que não propuseram uma política claramente independente da direção reformista de Syriza, fazendo da luta extraparlamentár dos trabalhadores e da juventude o eixo do combate político.

Frente a chantagem da Troika e a própria dinâmica do governo, que está descendendo rapidamente em seus índices de popularidade e há poucos dias enfrentou sua primeira greve no setor público, a perspectiva de "ruptura com a Troika" que defende a Plataforma de Esquerda dentro de Syriza - ganhando cada vez mais apoio - pode resultar em uma batalha formal se não se propõe como eixo a necessidade de retomar o caminho da luta de classes, com o objetivo de impor a anulação da dívida e um programa de medidas anticapitalistas para que crise seja paga por aqueles que a criaram..

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Texto completo apresentado pela Plataforma de Esquerda

Já está claro que as instituições não buscam o que alguns denominam um "compromisso honroso". Tal "compromisso honroso" não pode se basear de nenhuma maneira em privatizações e novas cargas para as classes populares e desde já que não podem existir sem que se coloque um fim verdadeiro na austeridade, sem uma reestruturação da (a maior parte da) dívida e sem um aporte suficiente de liquidez para revitalizar a economia.

O que insistentemente buscam os círculos dirigente da UE, o BCE e o FMI nos últimos quatro meses é estrangular a economia, tirando até o ultimo euro das arcas do país e empurrando o governo "desprotegido" à submissão total e a uma humilhação que sirva de exemplo. Esta tática dos sócios da União Europeia também se colocou de manifesto na cúpula de Riga. O governo não tem outra opção que contra-atacar com um plano alternativo baseado nas promessas pré eleitorais de Syriza e nos anúncios programáticos do governo. É preciso colocar imediatamente em pratica as seguintes medidas:

  • Nacionalização imediata dos bancos com todas as medidas de acompanhamento necessárias para assegurar que opere segundo critérios de transparência e produtividade e em prol do desenvolvimento e do bem estar social.
  • Estabelecimento da legalidade democrática e da transparência nos meios de comunicação dominantes, junto com um controle substancial de seus compromissos de crédito.
  • Eliminação imediata de toda rede protetora da corrupta oligarquia do país.
  • Suspensão dos privilégios, ajustes preferenciais e da imunidade dos grandes interesses econômicos.
  • Tributação substancial da riqueza e das grandes propriedades imobiliárias, assim como das rendas mais elevadas e dos grandes benefícios empresariais.
  • Reintrodução imediata e completa, assim como sua garantia e aplicação pratica, da legislação do trabalho e dos direitos sindicais.

O governo tem que contrapor decididamente a propaganda dos círculos dirigentes que aterroriza a população com anúncios catastrofistas em caso de não pagamento da dívida e de uma eventual saída da eurozona. A maior catástrofe que pode ocorrer ao país seria a imposição de um novo memorando em uma forma ou outra e a continuidade da aplicação dos memorandos anteriores. É preciso evitar esta perspectiva com todos os meios e sacrifícios necessários. Qualquer solução alternativa a favor de uma política progressista frente aos memorandos inclui antes de mais nada a suspensão do pagamento da dívida. Apesar de todas as dificuldades que lhe compõe, esta é de longe a melhor opção, pois oferece ao país esperança e perspectiva de futuro.

Se as "instituições" seguem com sua política de chantagem nos próximos dias, o governo tem a obrigação de declarar sem rodeios, a partir desde mesmo momento, que não vai tirar as economias do povo grego, que não irá pagar a próxima parcela do vencimento do FMI e que se propõe impulsar soluções alternativas a situação do país no plano econômico, social, político e estratégico que garantam a aplicação de seu programa.




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