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Uma resposta à carta da jovem trans Lana Jones para o golpista Michel Temer diante da aprovação do impeachment na Câmara dos Deputados.

Virgínia GuitzelTravesti, trabalhadora da educação e estudante da UFABC

quarta-feira 27 de abril de 2016 | Edição do dia

Ontem me deparei com uma carta de uma linda jovem trans, Lana Jones, colunista da HuffPost Brasil direcionada ao golpista Michel Temer. Me senti profundamente tocada a responder, pois como ela, sei que este golpe em curso não dará mais direitos à população LGBT ou aos trabalhadores, justamente o contrário, que a vitória deste golpe colocará os movimentos sociais, assim como os trabalhadores e a juventude que saem às ruas hoje, em piores condições para resistir à crise econômica e aos ataques dos governos.

Me dirijo à Lana mas também a centenas ou milhares de LGBT que acompanham atentos a crise política pela qual passa o nosso país. O show de horrores da votação do Impeachment deixou sem sombra de dúvidas que não é por corrupção que votam os políticos, mas sim por valores conservadores, para que nós transexuais não tenhamos mais o direito ao nosso nome, aos banheiros nas escolas públicas e, principalmente, porque são contra qualquer combate à LGBTfobia, pois querem seguir dominando nossos corpos para impor de todas as formas mais exploração e opressão sobre nossas costas.

O que me incomodou profundamente na sua carta é o sentimento que milhares compartilham do medo do futuro. Da ausência de alternativas que muitas vezes obrigam com que recorramos, mesmo sem esperança alguma, às suplicas e a mais humilhações. O problema justamente é que de cabeças baixas só podemos apanhar mais, sem condições de reagir. O golpe ainda está em curso, e tenho certeza que seria possível revertê-lo, se não fosse pela influência e responsabilidade direta do PT, que fortaleceu esta direita reacionária durante todos os anos que governou e se aliou a estes para se manter no poder, se não estivesse nas direções dos movimentos de massas, como é na Marcha Mundial de Mulheres, na União Nacional dos Estudantes e na Central Única dos Trabalhadores. Essas organizações organizam shows e atividades culturais, que todos sabemos que não podem vencer este golpe, ao invés de colocar a revolucionária força dos trabalhadores e da juventude na rua para impor pela via da mobilização e da luta de classes que este golpe não passe.

Por outro lado, desde o começo do ano passado, com a enorme visibilidade que nossas pautas ganharam a partir do escandaloso e aterrorizante caso de tortura e humilhação de Verônica Bolina ficaram claros os limites do movimento trans brasileiro, que nem sequer teve a coragem de se enfrentar com "as regras" dessa democracia dos ricos, onde a polícia pode tudo, e a profunda desigualdade que mata e nos encarcera todos os dias é naturalizada.

Temer, assim como os demais políticos, Bolsonaro, Feliciano, Malafaia, nos conhece bem, LanaLana. Eles sabem que na ditadura militar precisaram criar operações próprias para nos fazer desaparecer, porque sabem que nossas identidades orgulhosas podem questionar muito mais do que o direito ao corpo, mas todas as regras que essa sociedade estabelece para castrar nossas liberdades individuais. Por isso, mais do que nunca, é a hora de nós LGBT nos posicionarmos politicamente sobre os rumos do país e nos colocarmos ao lado da classe trabalhadora na luta contra este golpe.

Fico feliz que compartilhamos que Dilma fez muito pouco pelos LGBT. Diria mais, diria que Dilma, assim como Lula, ao governarem para os capitalistas fortaleceram a bancada evangélica e levaram Marco Feliciano à Comissão de Direitos Humanos em 2013, assim como fizeram os pactos com a Igreja Católica que sedimentaram nossa opressão e as possibilidades de retirarem nossos direitos um a um. Por isso, não se trata de defender este governo, mas de organizar uma forte luta independente que possa tirar Dilma pelas nossas próprias mãos, rumo a uma sociedade igualitária, socialista e sem qualquer forma de opressão e exploração.

Termino minha carta chamando você, Lana, e todos os LGBT que acompanham nossas colunas, tão minoritárias frente à grande mídia golpista e sempre tão fechada a dar voz às pessoas trans, a reconstruir neste 1 de Maio a tradição deixada pelo grupo SOMOS - Grupo de Afirmação Homossexual, que marchou junto aos trabalhadores na luta contra a ditadura militar. Um grupo corajoso e orgulhoso de ser LGBT, que não confiava na polícia ou neste sistema e se colocou na luta para decidir os rumos do país. Se na época suas faixas eram "Contra a intervenção nos sindicatos do ABC", hoje, mais do que nunca, precisamos defender a força de Junho de 2013 e das fortes lutas de trabalhadores e jovens em curso, como são as mais de 70 escolas ocupadas no Rio de Janeiro, para gritar não a este golpe, nenhuma defesa do PT; sim, a vida dos LGBT importa.




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