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ECONOMIA INTERNACIONAL | Recessão global: segunda temporada?

As perguntas dos economistas e os temores de Yanet Yellen. Bancos e juros negativos. As revelações de Brad DeLong. Sobre ficções e realidades. Um novo substrato para a crise.

Paula BachBuenos Aires

terça-feira 16 de fevereiro de 2016 | 00:00

"Por que seria conveniente preparasse para a próxima recessão?" é a pergunta retórica de Martin Wolf. "O que está freando a economia mundial?", indaga Joseph Stiglitz. Janet Yellen advertiu que a “turbulência mundial poderia afetar o crescimento”, sugerindo a intenção do FED (Banco Central Americano) de postergar um novo aumento da taxa de juros.

Fatos disso e anúncios se retroalimentam. Oito das nove bolsas europeias fecharam no vermelho conduzindo as praças financeiras do velho continente ao seu nível mais baixo nos últimos dois anos e meio (El País 11/02/16). As dúvidas sobre a capacidade de financiamento do Deutsche Bank, seguida do Sociéte Général da França, se somaram aos bancos italianos afogados em ativos tóxicos, atuando como propulsores chaves das últimas quedas. A bolsa chinesa não operou durante essa semana devido as festividades do Ano-Novo Lunar.

Tóquio fechou a semana em seu pior nível desde 2008. No começo do ano o Banco do Japão – como sintoma da baixa inflação e dinâmica econômica – anunciou a implementação de uma taxa de juros negativa para os bancos que quiserem depositar na entidade (ou seja, quem quiser deixar seu dinheiro ali, terá que pagar). Assim que Yellen exteriorizava seus temores, o Banco da Suécia voltou a baixar as taxas de juros deixando-as em um nível mais negativo (-0,5%), com o intuito de debilitar sua moeda e combater as tendências deflacionárias. Suíça, Suécia, Dinamarca e o Banco Central Europeu, faz algum tempo que sustentatam taxas de juros negativas.

A própria Yanet Yellen sugeriu que não acha precipitado, como podíamos esperar, uma nova queda de Wall Street. Michal Roberts estava certo: as taxas negativas são resultado da incapacidade dos juros em nível zero de cumprir os objetivos de crescimento e inflação durante os anos posteriores a caída do Lehman. Mas além, as taxas negativas afetam os lucros dos bancos e contribuem para explicar o foco bancário da atual convulsão. Entretanto como põe em evidência Roberts, Brad DeLong agourava não faz muito tempo que “Os economistas do futuro provavelmente denominarão essa época como "A mais longa depressão". O professor de Berkeley se lembra que antes da crise de 2008 saia a ensinar para seus alunos que durante uma perturbação no ciclo econômico, ele estaria perto de 40% de retorno a normalidade em um ano. Junto com a tendência de longo prazo, que apenas seria afetada pelas alterações do ciclo no curto prazo.

Sempre haverão bolhas, pânicos, inflações e recessões que pressionarão a produção e o emprego fora da sua tendência de longo prazo, mas seriam transitórias. No entanto, lembremos também do contexto das reverberações de 2008, Stiglitz foi um dos que advertiu que ele e os economistas que pensavam como ele estavam equivocados. E que sem as políticas extraordinárias, sustentadas e agressivas, nunca voltaríamos ao que antes de 2008 pensávamos como normal. Agora DeLong reconhece que ele estava equivocado, enquanto Stiglitz era quem tinha razão. O que há por trás de tanto ceticismo?

Nove das últimas cinco recessões (ou ficções e realidades)

As políticas monetárias flexíveis e o incremento extraordinário das dívidas – incluindo o salvamento dos bancos e a contínua vulnerabilidade deles na Europa – constituem fenômenos que acompanharam como gato e rato o débil desempenho da economia mundial durante os últimos anos. Dito com maior precisão e como se manifestou em várias oportunidades, estes mecanismos junto com a vigorosa recuperação da China a partir de 2010, foram responsáveis que a economia mundial – ainda que ao custo de um crescimento baixo – evitasse uma depressão como aquela da década de 30 superando em termos técnicos a recessão de 2008/09.

Podemos afirmar que um mundo inundado de dinheiro barato não estava isento de episódios de risco financeiro – temos em conta a crise europeia de 2010/13 e posteriormente da Grécia. Mas vale a pena se lembrar da ironia de Paul Samuelson quando há 50 anos lançou que “o mercado de valores havia antecipado 9 das últimas 5 recessões”. Summers lembra que a parte do sarcasmo, esses indícios devem ser tomados em conta quando são de longa duração e provém de muitos mercados por vez. A atual crise parecia ser uma das cinco “boas”.

Por que os problemas da dívida – incluindo tanto as recentes caídas nas bolsas chinesas, como as de Wall Street, Japão e as derivadas da salvaguarda aos bancos europeus – se põe em evidência agora com tanta exaltação? O que explicaria o atual consenso de grande parte da ala dos economistas neokeynesianos a respeito da insuficiência ou ineficiência – com um pouco de exagero – das políticas monetárias e a exigência de políticas fiscais destinadas a reativar a economia real? Por qual razão a perspectiva de uma nova recessão mundial se mostra em um horizonte mais próximo ou mais distante dos economistas de tendências ideológicas tão diversas? É evidente que um cenário novo está sendo pintado e uma explicação sensata exige voltar a perspectiva sob a correlação entre o mundo das finanças e o mundo da economia real. Para dizermos graficamente e em poucas palavras, a China utilizou mais cimento nos últimos três anos que o Estados Unidos durante todo o século XX. E como também se expressou nessa coluna nossa – ainda independentemente do destino imediato do gigante asiático – o que parece certo é que sua economia já não está crescendo o suficiente para continuar atraindo o capital dos países centrais que não tem local para serem investidos “em casa”. Tampouco parece possível a continuidade da China como grande motor da demanda mundial, questão que por sua vez golpeia a Alemanha que utiliza-a como destino alternativo dos produtos invendáveis na Zona Européia.

O crescimento da China e suas “taxas chinesas” atuou como a “face real” de massas de dinheiro barato enviados ao mundo pelos países centrais. E a junção de ambos aspecto – o real e o financeiros – garantiu o crescimento vertiginoso dos preços das matérias-primas e com ele, o crescimento dos chamados mercado “emergentes” e outros exportadores de matérias-primas que por sua vez armazenaram grandes massas de capitais nos países centrais. Este processo está sendo revertido e em seu percurso parece estar emergindo ao custo “ineficaz” das políticas monetárias dos países centrais. Algo assim parece estar se verificando no aumento da Reserva Federal norteamericana das taxas de juros em um “mal momento” e nos riscos que ostentam em primeiro lugar o Deutsche Bank, o Société Général ou os bancos italianos. Outros destinos “reais” do capital resultam ainda como insuficientes, como o México, ou pouco prováveis – por enquanto – quando falamos da Índia.

Algo além de uma nova fase

Mais além dos tempos – imprescindíveis – e das formas, a conjunção desses fatores parece estar agudizando algo mais do que um novo episódio da crise. Se bem que até certo ponto o processo que começou em 2008 pode ser periodizado em fases, essa periodização deveria evitar uma operação somatória em que cada episódio resulte na expressão fenomênica de um conteúdo idêntico. Sobretudo se temos em conta a definição da distinção anterior relativa a sinergia entre o “fictício” e o “real”, devem definir-se – pelo menos retrospectivamente – nos grandes momentos.

O primeiro seria aquele que corresponde tecnicamente com a Grande Recessão internacional de 2008/09. O segundo está marcado pelo curso conjunto das medidas monetárias e o decolar chinês. É nesse momento em que se espante o fantasma da Grande Depressão que a recessão se contém. Supondo isso e pelo que já mencionamos, neste momento se caracteriza por uma debilidade endêmica e não esteve livre de diversos episódios incluindo a salvaguarda dos bancos europeus ou a inconclusa crise grega.

Mas se estamos elaborando corretamente, e o que está se esgotando é aquela sinergia, é muito pouco provável que novas medidas monetárias sem a concorrência de algum novo setor da economia real permitam retornar as condições do momento precedente. O que aparentemente se está modificando por baixo – de modo figurativo – se ergue o local onde se desenvolve os acontecimento desde 2010 até agora. Motivo pelo qual, para além da periodização e da forma que se adquiriu – insistimos – parece ser que estamos presenciando o início de um novo momento na crise econômica mundial.




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