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OCUPAÇÕES NO PARANÁ | Quem é democrático e herói em Curitiba: Moro ou as quase 1000 ocupações?

Ítalo GimenesMestre em Ciências Sociais e militante da Faísca na UFRN

quinta-feira 20 de outubro de 2016 | Edição do dia

Com quase 1000 escolas ocupadas em todo estado, os estudantes do Paraná vem dando exemplo de democracia, a ser seguida pelo conjunto do país no que se refere à resistência aos ataques aos direitos dos trabalhadores e da juventude, se contrapondo ao exemplo da república de Curitiba de Moro, que é conclamada como a máxima da democracia por seus métodos de "combate" à corrupção.

Por um lado, aqui sedia o quartel general do mais novo herói dos coxinhas de camiseta da CBF, o juiz federal Sergio Moro, que no marco do estado capitalista representa o mais alto nível de democracia, conclamado pela mídia, pelos ricos e poderosos. Qual é a desse cara afinal? O que o famigerado comandante da operação Lava-Jato tem para nos dizer sobre democracia?

Bom, a primeira coisa que comumente vem a nossa cabeça quando pensamos no que constitui uma democracia é o sufrágio universal. Afinal nos é pregado que o momento último de consumação da democracia se dá a cada dois anos, quando votamos nossos representantes da cidade, do estado e da federação. Ou pelo menos, alguns deles. Um juiz federal, por exemplo, que recebe um salário de mais ou menos R$80.000, e que pela sua função cuida de processos judiciais de grande importância, como é o caso de Moro, este não adquire seu todo poderoso cargo através de um processo eleitoral. Ou seja, está por fora até mesmo dos métodos ditos democráticos do estado burguês, que nada tem democráticos, a exemplo das últimas eleições e da própria reforma política que nestas últimas eleições privilegiou os candidatos da ordem, que receberam fortunas de empresários para financiar suas campanhas, ao passo que calou a esquerda lhe tirando tempo de rádio, tv, e até mesmo publicidade nas redes sociais.

Nenhum juiz, inclusive Sergio Moro é eleito. Penso que se ele visitasse qualquer colégio ocupado deveria se sentir constrangido ao ver as assembleias, cotidianas mesmo em algumas ocupações, que são realizadas para decidir cada rumo do movimento, métodos de fato democráticos, parte da tradição dos movimentos de trabalhadores e estudantis. Ainda que, com a cabeça de quem vive e defende a democracia dos empresários e banqueiros, que perpetua um sistema político corrupto, de privilégios pros políticos e miséria para os trabalhadores e a juventude, penso ser difícil que ele se comova de alguma forma com as ocupações e seus instrumentos democráticos. Principalmente com um currículo nada exemplar como o dele – ou talvez muito exemplar de como é podre essa democracia dos ricos.

Ficando apenas com seus feitos recentes, Moro nos dá uma belíssima demonstração de que não merece confiança alguma quando se trata em exemplo de democracia. Ele usa e abusa dos métodos autoritários de um judiciário que nesse país possui 40% dos presos que não foram sequer julgados, utilizando instrumentos repressivos tais como delações, gravações, prisões ditas preventivas. Fez da Lava-Jato uma operação que visa substituir um esquema de corrupção de tipo petista, uma vez que o PT assimilou os métodos mais espúrios de corrupção da elite, por um com mais cara da direita, promovendo uma investigação seletiva aos primeiros e branda aos segundos. Ontem mesmo mandou prender Cunha preventivamente – esse que já estava mais desgastado que pano de chão de boteco – pouco tempo depois de ter perdoado seus crimes eleitorais, para dar uma cara “menos seletiva” e arbitrária ao poder judiciário e à Lava-Jato, mas não nos engana. Não obstante, fez isso para desviar os olhares das discussões acerca das reformas como a PEC 241, reforma da previdência e trabalhista, esta última que inclusive já vem sendo aplicada pelo judiciário ao aceitar acordos entre patrões e sindicatos, ainda que esteja fora das normas da CLT.

Os estudantes dão o exemplo de como tomar o poder e a democracia para si. Tiraram-no das mãos de seus diretores autoritários e arbitrários, cuja função é seguir os mandos do governo estadual de Beto Richa (ou, como lemos em um cartaz por aí, Beto “Hitler”), e não fazer da escola um espaço de educação emancipatória. No Paraná, o que estamos observando em cada colégio em que passamos, coletamos depoimentos e conversamos com os estudantes, é um tipo de organização interna muito democrática. Toda decisão é tomada coletivamente, seja para a delegação de funções e organização de comissões, como também de suas oficinas, aulões e atividades variadas.

Tamanha contradição que vemos aqui no Paraná, mais especificamente em sua capital, não se limita ao antagonismo entre ocupações de escola e a república de Curitiba de Sérgio Moro. A cidade convive também com uma direita forte, organizada, e com um perfil seriamente fascista, com expressão inclusive no segundo turno das eleições, na qual disputam dois candidatos muito de direita, mas convive também com diversos grupos antifascistas e organizações de esquerda.

Esse contexto nos parece uma espécie de representação da crise política que assola o país, de uma crise dos maiores partidos dessa chamada democracia, que se disputa, à esquerda e à direita. Ainda que a classe trabalhadora não esteja se expressando como sujeito dessa disputa, se as centrais sindicais imprimissem tal exemplo no interior das fábricas, e aliada a luta dos secundaristas poderíamos erguer uma democracia capaz de ser instrumento de emancipação da sociedade como um todo, livre da exploração, e opressão, a despeito dessa democracia dos ricos e dos juízes privilegiados e arbitrários.

Como avançar na organização democrática da luta secundarista aqui no Paraná?

E é para seguir nesse exemplo que a articulação democrática entre todas as quase MIL escolas ocupadas deve se dar através de um comando unificado, cujos delegados sejam representantes eleitos em cada escola por via de assembleias, para que este comando sirva de instrumento de canalização de todo o potencial acumulado nesse ascenso incansável de ocupações.

Deve servir para golpear com um só punho os ataques do governo Temer e massificar nacionalmente a resistência contra os ataques. Inclusive, deve servir para desbancar os burocratas da UNE, Ubes e Upes, que já estão negociando com o governador pelas costas dos estudantes, sem representarem qualquer tipo de discussão anterior das ocupações: por um lado porque não foram eleitos, por outro porque estes são rechaçados e expulsos dos colégios onde tentam se enfiar. Constituem uma verdadeira burocracia estudantil que somente este comando unificado é capaz de superar e representar de fato a luta dos estudantes do Paraná.




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