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Carestia de vida | Privatizações e reformas potencializam a inflação no Brasil, produzindo carestia e fome

A atual alta de preços é uma tendência global, ainda assim a população trabalhadora brasileira é das que mais sofrem no mundo, como deixam claro as brutais cenas da “fila do osso”, a “fila do lixo”, os roubos de alimentos. A política de descarregar a crise nos trabalhadores, com as reformas e privatizações, abriu o terreno para o efeito devastador da inflação sobre a classe trabalhadora.

terça-feira 19 de outubro de 2021 | Edição do dia

Uma pesquisa da OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico) mostrou que a inflação média esperada para o final de 2021 nos países do G20 é de 3,7%. Em setembro, o índice de alimentos da FAO (Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura) alcançou média de 130 pontos, alta de 1,5 ponto (1,2%) em relação a agosto e de 32,1 pontos (32,8%) em comparação com o mesmo mês de 2020. O resultado mensal, segundo a FAO, é o nível mais alto em uma década e foi impulsionado, em grande parte, pelos preços mais altos da maioria dos cereais e óleos vegetais.

Esses dados mostram como a inflação é uma tendência global da economia, com perspectiva de manutenção no curto prazo. Porém, dentro dessa tendência, o Brasil se mostra entre os países mais fortemente impactados, devido a política de terra arrasada do governo Bolsonaro. Com a inflação acumulada de 10,25% nos últimos 12 meses, o Brasil está atrás apenas da Argentina, com inflação de 51,4%, e da Turquia, com variação de 19,58%, considerando o G-20. E está em quinto lugar considerando as economias das Américas do Sul, Central e Norte .

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Justamente, um dos grandes países produtores de alimentos no mundo - propaganda que nosso agronegócio faz questão de se vangloriar -, está entre aqueles em que sua população trabalhadora mais se vê ameaçada pela fome.

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Globalmente, a valorização das commodities têm pressionado a inflação, com o aumento dos preços dos combustíveis e dos alimentos, principalmente dos grãos. Por um lado, o controle da pandemia em diversos países, possibilitando a retomada da economia, tem pressionado a demanda. Já a oferta caiu, fruto da diminuição das safras de diversos produtos que vem sofrendo com fatores como as mudanças climáticas. A alta do preço do açúcar, por exemplo, é causada pelo temor de que geadas e o prolongamento da seca reduzissem a safra no Brasil, que é o maior exportador mundial da mercadoria.

Ou seja, dois fatores que não irão desaparecer, à medida que avança a imunização nos países, em diferentes ritmos; e as mudanças climáticas seguem se intensificando e impactando as colheitas, enquanto a humanidade segue submetendo o planeta à lógica produtiva capitalista de consumo desenfreado para atender o lucro da burguesia.

A relação entre os ataques econômicos e os impactos da inflação

No Brasil essa tendência à inflação tem se manifestado de forma muito mais severa, não apenas nos dados nominais que superam a inflação dos demais países, mas pela combinação com os demais ataques do regime às condições de vida da população e o desastre da gestão econômica de Paulo Guedes, produzindo cenas grotescas, como pessoas buscando ossos para o consumo nos açougues, a disputa pelo lixo nos supermercados, e o aumento dos crimes relacionado ao roubo de alimentos.

No país, há um forte efeito em cadeia que puxa ainda mais para cima essa inflação. A alta do dólar encarece produtos importados, insumos usados na produção nacional e itens que tem seu preço definido no mercado internacional, como os combustíveis. O recente megavazamento, denominado Pandora Papers, expôs que Guedes enriqueceu seu patrimônio em R$ 14 milhões com a valorização do dólar que ele mantém em offshores em paraísos fiscais, enquanto descarrega esse verdadeiro inferno na população. Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central e outro responsável pela política cambial, também mantinha dólares guardados em paraísos fiscais.

Nesse sentido, o barril de petróleo, que internacionalmente vem em alta, tem seu aumento no país potencializado pela alta do dólar, que é diretamente repassado ao consumidor pela política de preços da Petrobras que prioriza o lucro dos acionistas acima do fornecimento de combustível barato à população. Entretanto, como mostramos nesse artigo-, não é apenas o lucro dos acionistas da Petrobras que compõe o preço da gasolina e do gás de cozinha, também entra na conta o lucro do agronegócio, que produz o biodiesel, e o lucro das distribuidoras. Com isso, vemos como o atual preço exorbitante da gasolina, que chega a R$ 9 nas cidades mais caras, tem relação direta com a privatização.

A Petrobras era a segunda maior produtora nacional de biocombustíveis mas resolveu vender tudo (a preço de banana é claro) para que o agronegócio e a Shell (Raízen) abocanhem esse mercado. Na distribuição a mesma coisa, a estatal BR Distribuidora que era maior empresa de distribuição também foi vendida, no gás de cozinha as participações nas empresas também estão sendo vendidas.

Assim como os combustíveis, outro insumo que produz um efeito cascata sobre os demais preços é a energia. A energia elétrica aumentou 21,1% em 12 meses no país. A crise hídrica levou o governo a acionar, desde o final de 2020, as usinas térmicas, mais caras que as hidrelétricas. A falta de chuvas não é um mero acaso, mas como dizíamos, fruto da reprodução desenfreada desse sistema, que por meio da ação predatória do agronegócio se expande, consumindo em chamas a Amazônia, o Pantanal e o Cerrado; desequilibrando o regime de chuvas. Não bastasse isso, a privatização da Eletrobrás, que já está aprovada, e veio sendo implementada aos poucos com o sucessivo desinvestimento na estatal, o que é parte do atual despreparo frente à crise hídrica, com o país nunca ter diversificado sua produção de energia para outras fontes.

Por fim, outra contradição é o país autointitulado celeiro do mundo, ter grande parte da sua população passando fome - 59% dos domicílios passaram por situação de insegurança alimentar no último trimestre de 2020. Os alimentos estão entre os produtos mais afetados pelo aumento de preços - na média, os alimentos subiram 21,7%, mas há itens que aumentaram bem mais, como óleo de soja (64%), feijão (por volta de 40,3%), arroz (32,7%) e carnes (quase 30%)-, o que tem como causa os já mencionados fatores do aumento da demanda global, valorização do dólar e impactos nas safras, em consequência da mudança climática. Mas o Brasil que devia ser menos vulnerável a esses fatores, sofre ainda mais pela ganância do agronegócio que prefere abastecer os mercados globais e lucrar em dólar, do que alimentar as famílias brasileiras.

Além disso, a inflação atinge de maneira diferente setores da sociedade. As camadas proletárias ou mais pobres sentem mais a inflação nas suas vidas quando os preços referentes à alimentação ou combustíveis sobem, porque a fatia que esses itens consomem em sua renda familiar é muito maior. Se olharmos apenas os números “frios”, para os indíces médios, como o IPCA (10,25% nos últimos 12 meses) ou o INPC (10,78% nos últimos 12 meses) que trazem cestas de produtos diversificados, não conseguimos ter ideia do real impacto que isso tem na vida de milhões de trabalhadores ou desempregados.

Impor um programa classista em resposta a carestia, a fome e ao desemprego!

Como vimos, as privatizações e as reformas foram determinantes para produzir a atual situação de miséria, fome e desemprego. Ataques que não foram implementados apenas pelo governo Bolsonaro, mas que contaram com uma ampla unidade da maioria dos partidos para aprovação no Congresso.

Ataques como a reforma trabalhista que arrancou os direitos de muitos trabalhadores, introduzindo novos regimes de trabalho precarizados e retirando benefícios. Desde sua implementação, apenas cresceu a informalidade dentro da classe trabalhadora. A reforma da previdência, é outra que também vai simplesmente impedir que uma parte da população se aposente, ou se aposente com salários menores, o que também vai contribuir para o aumento da miséria da vida dos trabalhadores.

Esse grave quadro mostra como é impossível esperar até as eleições de 2022, enquanto os trabalhadores estão tendo seus salários corroídos pela inflação, a insegurança alimentar e a fome crescendo, sendo que milhões de trabalhadores estão no desemprego. É preciso nos mobilizarmos contra essa situação, mas tampouco podemos nos mobilizar em unidade com aqueles que têm responsabilidade direta pela miséria atual, setores que se fingem de democratas enquanto defendem a continuidade desses ataques. Para impor uma saída para a crise, precisamos impulsionar um programa operário, a partir da unidade de ação da nossa classe, com a juventude e os setores oprimidos, pois enquanto a população passa fome, o agronegócio vê seus lucros dispararem com crescimento de 24,31% do PIB no setor e a fortuna dos bilionários brasileiros crescer 11,6%.

Por isso nós do Esquerda Diário estamos levantando a campanha “Reajuste salarial mensal igual à inflação” e do “Emprego com direitos para todos”. Enquanto tudo sobe, uma grande parte dos trabalhadores não tiveram seu salário reajustado, e mesmo o salário mínimo foi ajustado muito abaixo da inflação, por volta de 5,5%, o que dá uma valor em torno de 55 reais, ou seja, não consegue atender questões mínimas para a vida da maioria da população. Não adianta mais fazer campanha salarial a cada ano para repor o poder de compra do salário, porque a inflação rouba todo aumento anual no mês seguinte. Precisamos de uma campanha unificada de todos os sindicatos nacionalmente para impor o reajuste automático dos salários a cada mês de acordo com o aumento do custo de vida, repondo de imediato o valor acumulado dos últimos 12 meses, e esse exemplo pode começar a partir de todas as oposições às grandes centrais, que hoje estão paralisadas, e a partir disso fortalecer as forças que consigam impor uma verdadeira frente única dos trabalhadores.

Emprego com plenos direitos para todos!

Não podemos naturalizar a precarização, a terceirização e a "uberização" do trabalho. Precisamos unir nossa classe, empregados e desempregados, em defesa deste direito mínimo que é o emprego com plenos direitos para todos.

Nas empresas que tiveram que baixar a produção, não podemos aceitar que haja demissões. As horas de trabalho devem ser divididas entre todos os trabalhadores, sem redução salarial. Mas nossa perspectiva deve ser resolver o problema do desemprego em toda a sociedade, dividindo as horas de trabalho de todo país entre empregados e desempregados, começando pela redução para jornada de 6h, 5 dias na semana.

Para gerar empregos, é preciso um enorme investimento estatal em um grande plano de obras públicas para vários anos. Um plano controlado pelos trabalhadores, ligado a uma verdadeira reforma urbana, garantindo moradias, saneamento básico, transporte público rápido, hospitais, escolas, tudo o que é necessário para uma vida digna.




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