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POLÊMICA | Por que é um equívoco a esquerda defender eleições gerais?

A consumação do golpe institucional trouxe uma nova corrente de politização, no marco de uma crise política e de representatividade já prolongada, uma situação que veio abrindo espaço para novas formas de pensar e de fazer política. O que a esquerda radical pode oferecer às novas gerações frente à bancarrota do projeto de conciliação de classes do PT? Uma polêmica com os companheiros do Mais.

terça-feira 6 de setembro de 2016 | Edição do dia

Sem dúvida temos vivido dias intensos. Ninguém se arrisca a fazer previsões de médio prazo na conturbada situação brasileira. É a instabilidade e os giros inesperados à esquerda e à direita que dão o tom da situação. Mudanças bruscas no estado de ânimo de amplos setores de massas, a possibilidade sempre presente de respostas espontâneas da juventude, a ausência de um plano comum mesmo entre os setores golpistas e entre os vários polos burgueses que atuam sobre a crise política (quem esperava o desfecho final da votação no Senado, preservando os direitos políticos de Dilma?); mas a ausência também de uma resposta contundente do movimento de massas pela relativa desmoralização provocada pela política petista.

Entre hoje, depois da grande manifestação na Av. Paulista, e junho de 2013, muitas diferenças podem ser traçadas, ainda que seja inegável certo “aroma de junho” desde a votação no Senado. É importante remarcar que a própria consumação do golpe torna mais difícil a explosão de um movimento semi-espontâneo e massivo contra Temer, ao mesmo tempo em que o clima de politização é mais amplo e mais profundo, temperado por uma crise política prolongada.

É uma questão decisiva a forma como o movimento atual vai ser canalizado, ou abortado. Uma questão que vai além do processo imediato de mobilizações em curso, que pode até refluir sem que com isso se resolva o que chamamos de crise orgânica. A pergunta maior é: crise atual vai desembocar em um ascenso de massas, em uma situação pre-revolucionária ou revolucionária, ou ao contrário, vai ser resolvida à direita dando lugar a uma situação mais reacionária? Para que se desenvolva num sentido revolucionário, qual é o papel da esquerda em relação às ilusões de que uma mera eleição pode responder a atual crise numa perspectiva progressista?

Neste sentido, com uma visão mais voltada ao cenário estratégico mais amplo, é mais fácil compreender o erro da tática de eleições gerais. No plano imediato parece oferecer um caminho que empurra os atos uma pouco mais além da política petista de “Volta Lula” com “Diretas Já”, eleições presidenciais antecipadas; mas amanhã ou depois, se as manifestações se massificam e ameaçam o governo, eleições gerais podem ser uma via para a canalização eleitoral da crise. Um governo de direita poderia surgir fortalecido para impor uma saída conservadora, com um parlamento renovado, mas tão conservador quanto o atual. É claro que para a burguesia aceitar essa saída, precisaria ter diante de si uma ameaçadora mobilização popular. Mas esse é justamente o nosso objetivo, organizar e estimular essa mobilização. Não é um erro construir uma saída que necessariamente se volta contra nós se criamos as condições para que seja aplicada?

É falso, no entanto, acreditar que eleições gerais agora faz o movimento avançar. Por mais que se polemize nos textos contra a “insuficiência” da demanda de “diretas já” do PT, a bandeira de eleições gerais é assimilável pelo PT dentro de uma lógica de atos de pressão para desgastar Temer e preparar o terreno para 2018. Por isso não afirmaríamos que a política de “diretas já” é insuficiente, mas sim que é uma farsa, mais um engano petista, que aposta em desgastar Temer até 2018 e recompor o PT pela via eleitoral, através de sua principal figura. Antes da votação na câmara de deputados, levantar eleições gerais equivalia a estar no campo burguês que defendia a saída de Dilma, correspondia a fazer o jogo do fora Dilma pela direita. Agora, com o golpe consumado, equivale a fazer o jogo eleitoral do PT para 2018 (e 2016 também!) e de outras frações burguesas que jogam a cartada das eleições antecipadas (como Marina Silva).

Os companheiros poderiam agregar que a política de eleições gerais não seria com as mesmas regras das atuais. Isso não muda em nada na discussão anterior, mas nos leva a outro aspecto do debate: não podemos questionar somente os políticos e os partidos, nossa denúncia tem que se voltar contra todas as instituições podres de um regime político carcomido pela corrupção mais desavergonhada, não somente sobre as regras eleitorais e o sistema de representação. O fato é que o “complemento” de novas regras não tem nenhum papel na agitação que vem sendo realizada, e se tivesse, caberia questionar como se dariam essas novas regras senão com uma Constituinte? Esse congresso reacionário iria votar as “novas regras”?

Poderíamos afirmar junto com a companheira Silvia Ferraro, do MAIS, que: “As pautas pelas demandas concretas contra os ajustes e as reformas que estão se desenhando devem ser combinadas com a pauta política da derrubada do governo. Aproveitar a centelha de retomada de consciência para disseminá-la, para ampliá-la em direção a uma saída política que não passe por respeitar o calendário eleitoral.” Porém para isso precisamos de uma política que não se contente em trocar os atuais governantes por outros, mas que vá na raiz dos problema, que permita que o povo decida sobre todas as questões, como o salário dos políticos ou o salário mínimo por exemplo. Por que não defender, contra a máfia que governa o país, e que controla o parlamento e o judiciário, uma nova Constituinte, com ampla participação popular? Por que ao invés das “diretas já” do petismo não opomos a nossa “Constituinte já” imposta pela força da mobilização para mudar de cima a baixo o atual regime político?

Temos que nos organizar para a guerra com as armas corretas. Além de opor a essa democracia dos ricos corrompida e deslegitimada, não uma renovação da casta política via eleições gerais, mas uma assembleia constituinte para rever tudo, é preciso colocar no centro da agitação a exigência de que a CUT e a CTB rompam com a sua política de conciliação e organizem a luta contra os ajustes. O caminho para preparar a queda de Temer é o da frente única na luta contra os ajustes, tendo uma política ativa nos sindicatos para forçar medidas de lutas contra os ataques e exigir a participação nas mobilizações com os métodos da classe operária (e não mera presença superestrutural nos atos) e ao mesmo tempo levar com toda força essa exigência para os atos. Não fazer isso é seguir incorrendo na velha divisão petista entre o sindical e o político.




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